A Reforma Trabalhista e o Fim das Discussões Sobre a Natureza do Convênio Médico nas Empresas

13/03/2018

Coordenador Ricardo Calcini

Os custos com plano de saúde são um grande desafio para as empresas e, para contribuir, em 2016, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais se manifestou no sentido de que os valores relativos à assistência médica integram o salário, quando os planos e coberturas de saúde não são igualitários para todos os empregados. 

A Reforma Trabalhista, em contrapartida e de forma acertada, veio para encerrar essa questão e eliminar a insegurança jurídica nas empresas, dispondo quanto à natureza dos valores pagos à título de plano de saúde pelos empregadores.

No entanto, antes de esclarecer as alterações ocorridas pela Reforma, cabe destacar algumas considerações, a fim de entender melhor o impacto positivo nas empresas. 

Empregadores em geral, como forma de atrair profissionais mais qualificados e em destaque, utilizam, além de outros benefícios, a concessão de planos de saúde. 

Ocorre que, na prática, muitas vezes há uma diferenciação entre os planos concedidos de acordo com o cargo exercido por cada trabalhador ou mesmo faixa salarial. E exatamente essa oferta de planos de saúde diferenciados, para empregados distintos, que causava inúmeras discussões e diversos conflitos teóricos e práticos entre contribuintes e Fisco. 

Assim, prevalecia o entendimento pelas autoridades administrativas, no sentido de que não havia o caráter assistencial e social do benefício, havendo, portanto, tributação previdenciária. Ressalto que o amparo jurídico daquelas autoridades era com base na interpretação lato sensu da Lei 8.212/91, no seu artigo 28, § 9º, alínea "q", pelo simples fato de a exceção do presente dispositivo alcançar somente as empresas em que a cobertura da assistência prestada por serviço médico abranja a totalidade dos empregados e dirigentes da empresa. 

Igualmente, com base no art. 15, § 6º, da Lei 8.036/90, deveria haver o recolhimento do FGTS sobre o valor referente ao dito plano de saúde. 

Logo, segundo o Fisco, havendo, por exemplo, planos de saúde diferenciados de acordo com cada cargo, a exceção da Lei Previdenciária não poderia prevalecer. 

Neste sentido também era a jurisprudência majoritária, conforme se extrai das ementas abaixo: 

Tributário. Contribuição Social. Plano de Saúde com Diversas Coberturas. Não Isenção da Base de Cálculo do Salário de Contribuição. Artigo 28, caput, inciso I, e §9º, Alínea "q" da Lei nº 8.212/91, na redação dada pela Lei nº 9.528/97.

1. A isenção concedida pela legislação alcança apenas os valores pagos a título de assistência médica com cobertura abrangente à totalidade dos empregados. A impetrante contratou plano de saúde com três modalidades diversas de cobertura. Apenas a cobertura básica é oferecida a todos os empregados, sendo que se algum empregado optar pela cobertura mais cara, deverá arcar pessoalmente com os custos. Diretores, gerentes e coordenadores recebem as coberturas mais caras, sem qualquer desconto. A assistência médica não abrange a todos os empregados de maneira igualitária. A existência de várias modalidades de planos em que apenas alguns se beneficiam da melhor opção sem qualquer desconto adicional fere a idéia da norma. A hipótese de isenção quando o plano abrange a totalidade de empregados e dirigentes traz em sua razão o tratamento uniforme entre uns e outros. Apenas o valor pago pela cobertura abrangente a todos os empregados encontra-se ao alcance de norma isentiva, como corretamente entendeu a fiscalização e a r.sentença apelada.

2. Apelação desprovida. Agravo regimental prejudicado.

Apelação Cível nº 0058458-58.1999.4.03.6100/SP 

[...]. Despesa Médica. Contribuição Previdenciária. Incidência. 1. [...] 2. Se a contribuinte não traz prova inequívoca da sua alegação, permanece válida a autuação fiscal referente à contribuição previdenciária incidente sobre os valores de plano de saúde que não é pago à totalidade dos empregados e dirigentes da empresa conforme dispõe o art. 28, parágrafo 9º, q, da Lei nº 8.212/91. 3. Apelações e remessa oficial não providas. (BRASIL. Tribunal Regional Federal da 5ª Região. AC 2006.81.00.002941-3. Rel: Des. Federal Marcelo Navarro. 16.01.2009) 

Com imenso respeito às teses divergentes, sempre defendi que a interpretação do fisco estava certa, porém, apenas quando o benefício era concedido apenas a alguns empregados específicos e não a todos. Logo, se o plano médico era oferecido a um determinado empregado, a fim de assediá-lo a trabalhar para a empresa, por exemplo, outra natureza não poderia haver naquele benefício, senão a de salário in natura, portanto, devendo integrar o salário de contribuição. 

Contudo, em sendo o plano concedido a todos os empregados, porém com distinções internas, ou seja, planos diferenciados que levam em conta cargo, local da prestação dos serviços, faixa salarial, por exemplo, desde que não deixe de abranger a totalidade dos empregados, não há que se falar em tributação do benefício. 

À luz do entendimento proposto, data venia, a exceção do § 9º, do art. 28 da Lei 8212/91, deveria prevalecer, afinal o próprio dispositivo securitário já sugeria uma diferenciação ao dizer empregados e dirigentes

Pensar diferente é atacar a meritocracia, com uma dose venenosa de “comunismo”. Neste ponto, acertou a Reforma Trabalhista que, com uma pá de cal, resolveu essa questão. 

Com efeito, com a vigência da Lei 13.467/17, toda essa discussão tornou-se inócua, vez que a Reforma incluiu um dispositivo na CLT e alterou outro na Lei Previdenciária. 

Na CLT, o art. 458, § 2º, IV, já previa que a assistência médica não era considerada como salário. Com a Reforma foi incluído o § 5º que, além de ratificar a inexistência de natureza salarial do plano médico, destacou que este não integra os salários mesmo se fornecidos planos em diferentes modalidades. 

Art. 458 (...)

§ 2º - Para os efeitos previstos neste artigo, não serão consideradas como salário as seguintes utilidades concedidas pelo empregador:

IV – assistência médica, hospitalar e odontológica, prestada diretamente ou mediante seguro-saúde; 

§ 5º -O valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico, próprio ou não, inclusive o reembolso de despesas com medicamentos, óculos, aparelhos ortopédicos, próteses, órteses, despesas médico-hospitalares e outras similares, mesmo quando concedido em diferentes modalidades de planos e coberturas, não integram o salário do empregado para qualquer efeito nem o salário de contribuição, para efeitos do previsto na alínea q do § 9º do art. 28 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991.   

Já na esfera previdenciária, em plena sintonia com o novel dispositivo celetista, a Lei 13.467/17 alterou o final da alínea “q”, do § 9º do art. 28 da Lei 8.2012/91, excluindo  o trecho que dizia  “desde que a cobertura abranja a totalidade dos empregados e dirigentes da empresa”. 

Art. 28. Entende-se por salário-de-contribuição:

§ 9º - Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente: 

q) o valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico, próprio da empresa ou por ela conveniado, inclusive o reembolso de despesas com medicamentos, óculos, aparelhos ortopédicos, próteses, órteses, despesas médico-hospitalares e outras similares; 

Desta forma, não há mais que se falar em contribuições sociais previdenciárias e fundiárias sobre os planos de saúde, ainda que ele seja concedido de forma diferenciada para determinados empregados, permitindo que as empresas possam exercer suas estratégias de captação de mão de obra especializada, oferecendo melhores remunerações e benefícios àqueles que atendam seus interesses. Enfim, um fôlego para tão necessária meritocracia.

A Reforma Trabalhista, portanto, encerra essa questão, vez que ao incluir o parágrafo 5º no artigo 458 da CLT e alterar a alínea “q”, do § 9º do art. 28 da Lei Previdenciária, deixou claro que o valor relativo à assistência médica não mais integrará o salário para qualquer efeito.  

Esse é apenas um exemplo da influência positiva da reforma trabalhista em questões que causam grande insegurança jurídica e impactam fortemente nos custos das empresas.

 

Imagem Ilustrativa do Post: CARTEIRA DE TRABALHO // Foto de: Clóvis Ferreira // Sem alterações

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