A POLÊMICA REABILITAÇÃO PENAL

20/12/2018

 

A reabilitação penal vem tratada nos arts. 93 a 95 do Código Penal, merecendo algumas notas acerca de seus requisitos e efeitos, até mesmo em razão da polêmica que tem suscitado na doutrina pátria.

Reabilitar significa recuperar, regenerar, tornar novamente hábil, permitindo à pessoa exercer atividades ou direitos dos quais havia sido privada por qualquer razão.

No âmbito penal, a reabilitação é a declaração judicial de que estão cumpridas ou extintas as penas impostas ao sentenciado, assegurando o sigilo dos registros sobre o processo e atingindo os efeitos da condenação.

O intuito da reabilitação é facilitar a readaptação do condenado, concedendo-se certidões dos livros do juízo ou folha de antecedentes, sem menção da condenação e permitindo-se o desempenho de certas atividades administrativas, políticas e civis das quais foi privado em decorrência da condenação.

Tenho, de minha parte, fundadas reservas com relação ao instituto da reabilitação, uma vez que, por meio dela, dentre outros efeitos, restam ocultas as penas impostas ao sentenciado e seu cumprimento, de certo modo enganando e induzindo em erro a sociedade, escondendo da parcela honesta da população que o sujeito ostenta antecedentes e que já cumpriu pena criminal. Imagine-se o exemplo de um casal que decida contratar uma babá para seu filho de tenra idade e que requeira das pretendentes ao posto a apresentação de certidão de antecedentes criminais.

É necessário deixar bem claro que o empregador tem todo direito de saber se o seu empregado (ou pretendente ao emprego) ostenta antecedentes criminais, condenações ou se já cumpriu pena anteriormente.

Pois bem, voltemos ao exemplo da babá. A pretendente ao emprego apresenta certidão de antecedentes criminais com a inscrição “nada consta” e é contratada justamente por conta disso. Ocorre que essa babá pode muito bem ter sido condenada anteriormente e cumprido pena por homicídio, por maus-tratos, por tráfico de drogas etc, e estar “reabilitada penalmente”, uma vez que o instituto ora versado faz com que seja decretado o sigilo sobre a condenação e o cumprimento de pena. Na certidão por ela apresentada vem estampada a informação “nada consta”, induzindo em erro e enganado o casal contratante, que acredita estar deixando seu filho aos cuidados de uma pessoa idônea do ponto de vista criminal.

Não se pode, a meu ver, a pretexto de reinserir o condenado à sociedade (pretensão legítima, diga-se de passagem), enganar a população, fazendo-a crer que uma pessoa condenada e que cumpriu pena não ostente qualquer antecedentes e que “nada consta” em relação à sua vida pregressa criminal.

A reabilitação, outrossim, poderá ser requerida decorridos 2 anos do dia em que for extinta, de qualquer modo, a pena principal ou terminar sua execução, computando-se o período de prova do “sursis” e do livramento condicional, sem revogação.

Segundo o disposto no art. 94 do Código Penal, para requerer a reabilitação, o condenado deve satisfazer as seguintes condições:

a) ter tido domicílio no País pelo prazo referido anteriormente, ou seja, 2 anos do dia em que for extinta, de qualquer modo, a pena principal ou terminar sua execução;

b) ter dado, durante esse tempo, demonstração efetiva e constante de bom comportamento público e privado;

c) ter ressarcido o dano causado pelo delito, ou demonstrado a absoluta impossibilidade de fazê-lo até o dia do pedido, ou exibido documento que comprove a renúncia da vítima ou novação da dívida.

O procedimento referente ao pedido de reabilitação e a menção aos elementos comprobatórios dos requisitos exigidos estão previstos nos arts. 743 e seguintes do Código de Processo Penal.

Assim, deverá o condenado, devidamente representado por quem tenha habilitação para postular em juízo (advogado), formular o pedido de reabilitação ao juiz da condenação, instruindo o requerimento com:

a) certidões comprobatórias de não ter respondido, nem estar respondendo, a processo penal, em qualquer das comarcas em que houver residido durante o prazo necessário para a reabilitação;

b) atestados de autoridades policiais ou outros documentos que comprovem ter residido nas comarcas indicadas e mantido, efetivamente, bom comportamento pelo prazo necessário para a reabilitação;

c) atestados de bom comportamento fornecidos por pessoas em cujo serviço tenha estado;

d) quaisquer outros documentos que sirvam como prova de sua regeneração;

e) prova de haver ressarcido o dano causado pelo crime ou persistir a impossibilidade de fazê-lo.

O processo de reabilitação não tem rito próprio nem está sujeito a formalidades, podendo ser processado nos próprios autos da execução. Daí por que o juiz poderá ordenar as diligências necessárias para a apreciação do pedido, cercando-as do sigilo possível e ouvindo-se sempre o Ministério Público.

A reabilitação, como já dito anteriormente, assegura o sigilo dos registros sobre o processo e a condenação.

Esse sigilo, entretanto, é relativo, pois, conforme o disposto no art. 748 do Código de Processo Penal, pode ser quebrado quando se tratar de informações solicitadas por juiz criminal.

Outro efeito da reabilitação é o de excluir os efeitos da condenação previstos no art. 92, vedada a reintegração na situação anterior quanto aos incisos I e II.

Assim, poderá o condenado, após a reabilitação, passar a exercer cargo, função ou mandato eletivo, não sendo possível, entretanto, a sua reintegração na situação anterior. Quanto ao exercício do poder familiar, tutela e curatela, recupera o condenado tal direito, exceção feita ao filho, tutelado ou curatelado contra quem praticou o delito. Pode o condenado, também, após a reabilitação, habilitar-se normalmente a dirigir veículo.

Outra questão que merece ser destacada é a que se refere à possibilidade de uma pessoa condenada criminalmente pleitear a sua inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil. O art. 8º da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB) estabelece os requisitos para a inscrição nos quadros da OAB, seja como advogado, seja como estagiário. Dentre esses requisitos, o inciso VI se refere a “idoneidade moral”. Nesse sentido, o art. 20, §2º, do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB, dispõe expressamente que “a conduta incompatível com a advocacia, comprovadamente imputável ao requerente, impede a inscrição no quadro de advogados.”

De acordo com o disposto no §4º do art. 8º do Estatuto, não atende ao requisito de idoneidade moral aquele que tiver sido condenado por crime infamante, salvo reabilitação judicial.” Crime infamante é aquele que traz ao sujeito má-fama, má-reputação, desonra, repercutindo, ainda, negativamente à dignidade da advocacia.

Entretanto, se o condenado por crime infamante tiver requerido e obtido judicialmente a reabilitação, readquirirá sua idoneidade moral e poderá pleitear a inscrição nos quadros da OAB.

Por fim, a revogação da reabilitação vem tratada no art. 95 do Código Penal. São dois os requisitos para a revogação da reabilitação: a) condenação do reabilitado como reincidente, por sentença transitada em julgado; b) condenação do reabilitado à pena privativa de liberdade.

Segundo o disposto no art. 750 do Código de Processo Penal, a revogação da reabilitação será decretada pelo juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público. Revogada a reabilitação, os efeitos suspensos da condenação voltam a ter eficácia.

 

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