A pena de morte como negação dos fins da pena - Por Alexandre José Trovão Brito

04/12/2017

Dentre os vários Hard Themes (Temas Difíceis) existentes no direito penal brasileiro, como por exemplo, a redução da maioridade penal, aborto de feto anencéfalo, pena de morte, dentre outros, este último se configura como um dos mais controvertidos nas ciências criminais. O motivo para tal celeuma se dá devido aos sentimentos de vingança e “justiça” contra àqueles que cometem toda sorte de delitos.

A pena de morte, também chamada de pena capital teve como nascedouro a antiguidade como um mecanismo de vingança privada, ou seja, aquele que eliminou a vida de um ser humano merecia perder a vida, pois deveria ser observada a lei de Talião. Ademais, acreditava-se na ideia de sacrifício, pois dessa maneira a morte do criminoso serviria como um meio para acalmar a divindade protetora da vítima.[1]

No século XVIII, conhecido como século das luzes, as penas passaram por várias transformações. O corpo do condenado não mais poderia sofrer o mal por ele praticado. Os suplícios foram eliminados e as penas corporais foram gradativamente substituídas pelas penas privativas de liberdade em plena sintonia com o respeito à dignidade humana.[2] Essa conquista iluminista não pode ser desconsiderada, pois do contrário estaríamos retrocedendo no tempo.

Apesar de alguns países ainda adotarem a pena capital, a exemplo dos Estados Unidos, China, Coréia do Norte, Irã, Iraque, Indonésia e Japão, existe uma tendência das nações em abolir tal tipo de pena, a qual costuma vigorar em países que possuem sistema penal excessivamente repressivo. O Brasil a reserva apenas para os casos de guerra declarada, nos moldes do artigo 84, XIX da Constituição Federal, sendo nesse caso, praticada por meio de fuzilamento, conforme determinação expressa do artigo 56 do Código Penal Militar.[3]

Cabe destacar que a adoção da pena alvo deste artigo contraria e fere princípios nucleares do Direito Penal da Modernidade, tais como o princípio da proporcionalidade (juízo de ponderação que se realiza entre o fato praticado pelo agente e a pena estabelecida para o crime), princípio da limitação das penas (aquele que estabelece que deve haver um freio tanto para a quantidade como para a qualidade das penas) e o princípio da humanidade das penas (a necessidade de que as penas não atinjam a dignidade da pessoa humana).

A pena de morte, além de ferir os princípios supra mencionados macula comandos constitucionais, uma vez que o artigo 5º, inciso XLVII estabelece que não haverá penas de morte (exceto nos casos de guerra declarada), de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis. Em outros termos, aplicá-la no Brasil seria inconstitucional, uma vez que os dispositivos mencionados estão acobertados pelo status de cláusula pétrea.

Por conseguinte, com a aplicação da pena capital, corre-se o risco de se politizar o Poder Judiciário, uma vez que sempre existiria o perigo de se condenar com tal pena os inimigos do sistema político.[4] Em uma democracia isso não deve ter vez, pois do contrário haveria a instalação de um sistema com poderes quase absolutos, próximos das ditaduras.

Cabe lembrar que a vida é um dos direitos estabelecidos no caput do Art. 5º da Lei Maior e deve ser um guia interpretativo para a aplicação do Direito, uma vez que sem ela nada existe. A pena que dá nome a este artigo torna impossível a correção de erros judiciários, além de não permitir a possibilidade do condenado voltar reabilitado para a sociedade. Por subsequente, os fins da pena, quais sejam, prevenção e ressocialização são negados, pois nem o primeiro e nem o segundo surtiriam efeitos caso o Estado permitisse a aplicação desse instituto jurídico.[5]

Para os processualistas Aury Lopes Júnior e Alexandre Morais da Rosa a pena de morte se revela completamente inútil e excessiva. Não foi por outro motivo que foi abolida do processo civilizatório, pois não surte nenhum efeito e os erros judiciários que podem vir a acontecer não podem ser compensados, uma vez que aplicada tal pena, o indivíduo não mais poderá obter reparações.[6]

Em sede de conclusão é possível afirmar que a pena de morte não atende aos fins da pena, pois não permite a prevenção de crimes porque estes continuarão a ser praticados e nem possibilita a ressocialização, por questões óbvias. Um Estado de Direito que não queira deslizar para punitivismos demagógicos não pode permitir a utilização desse instrumento de repressão social. 

 

[1] Lima Júnior, José César Naves de. Manual de Criminologia. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 197.

[2] Chiquini, Jeffrey. Legítima Defesa e a pena de morte do Brasil. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/leitura/legitima-defesa-e-a-pena-de-morte-no-brasil. Acesso em 27/11/2017.

[3] Greco, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Geral. 14. Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2012, p. 85.

[4] Jesus, Damásio Evangelista de. Pena de Morte: a Favor ou Contra? Disponível em: http://www.cartaforense.com.br/conteudo/colunas/pena-de-morte-a-favor-ou-contra/11275. Acesso em: 27/11/2017.

[5] Lima Júnior, José César Naves de. Manual de Criminologia. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 199-200.

[6] Lopes Júnior, Aury; Rosa. Alexandre Morais da. Pena de morte é barbárie inútil em qualquer lugar, até na Indonésia. Disponível em https://www.conjur.com.br/2015-mai-01/limite-penal-pena-morte-barbarie-inutil-qualquer-lugar-indonesia. Acesso em 26/11/2017.

 

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