A opaca gestão transparente

06/02/2015

Por Fúlvio Brasil Rosar Neto - 06/02/2015

Desde 1988 a Constituição brasileira mantem no seu rol de princípios a transparência na gestão pública; tal princípio também encontra-se calcado na Lei de Responsabilidade Fiscal no seu artigo 1º, §1º[1]. No entanto, em tempos de mensalão, lava a jato, satiagraha, petrólão, - apenas para citar algumas das inúmeras operações e escândalos de corrupção e lavagem de dinheiro que o Brasil vem vivenciando nos últimos anos – é evidente o descaso dos administradores da máquina pública com os recursos provenientes dos impostos pagos pela população.

A gestão transparente, além de ser um imperativo legal (e ético e moral acima de tudo) representa tanto um desafio para os governantes públicos como um tipo moderno de prestação de contas. Atualmente a sociedade vive uma agressiva mutação, reflexo da volatilidade da economia, da pluralidade de informações acompanhada do aumento da participação social. E é neste cenário que governos e empresas buscam acertar o passo e se adequar as necessidade desse novo tempo.

Devido as variáveis que enfrentamos hodiernamente, os governantes necessitam repensar o modelo de gestão, levando em conta (efetivamente) o seu envolvimento e os impactos de suas decisões sobre todos aqueles com os quais se relaciona: governo, funcionários e suas famílias, sociedade, clientes, fornecedores e a comunidade do entorno, entre muitos outros stakeholders. Necessário se faz a implementação de uma postura clara e transparente no que diz respeito a seus objetivos e compromissos, enaltecendo a legitimidade social de suas atividades.

As inovações passam a exigir uma nova metodologia de irrestrita transparência e de um rígido controle interno, para que assim a população tenha maior controle dos gastos públicos. As reuniões restritas às quatro paredes estão dia a dia sendo extirpadas, dando espaço a participação das entidades, organizações da sociedade civil, ou seja, a todos aqueles que sentem-se impactados de alguma maneira pelas decisões que irão ser tomadas, buscando assim uma maneira de gerirem melhor o dinheiro público, minimizando os riscos e aumentando a produtividade e a qualidade do serviço.

Materializar os benefícios decorrentes de uma postura de transparência e responsabilidade é um dos grandes desafios para consolidar as boas práticas nessa área.

Esse novo modelo de governança nasceu com o escopo de criar um arcabouço eficiente de mecanismos, tanto de incentivos quanto de monitoramento, a fim de assegurar que o comportamento dos gestores estivesse sempre alinhado ao interesse da população, respaldado em quatro princípios: transparência, prestação de contas (accountability), equidade e responsabilidade corporativa.

Com cirúrgica precisão, Carlos Eduardo Lessa Brandão define os princípios basilares: “A transparência consiste em dar as informações que o outro lado quer ouvir, baseadas em aspectos tangíveis e intangíveis. Outro princípio, a equidade, trata-se de não cometer injustiças com as diversas partes envolvidas. A accountability (prestação de contas) também é importante porque na governança corporativa se define o processo de tomada de decisão e, portanto, são estabelecidos mandatos, o que cada um faz e quem dá satisfação para quem. Todo mundo que tem um mandato tem que dar satisfação do que fez e o que não fez e assumir as consequências. E tem o princípio da responsabilidade corporativa que é justamente incorporar aspectos ambientais e sociais no processo de tomada de decisão”.

Adaptar a governança a esse novo olhar significa modificar as estruturas existentes de forma a oferecer possibilidades e influenciar mecanismos de políticas públicas que favoreçam o debate sobre novos caminhos para a gestão transparente e participativa. Com atitudes transparentes, decorrentes de uma postura responsável, governos e sociedade colhem ativos intangíveis, buscando definição de metas claras e a promoção do comprometimento das partes para uma mudança efetiva de foco, do momento atual para um futuro muito mais promissor.

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Sem título-16Fúlvio Brasil Rosar Neto é formado em Direito e mestrando em Administração Pública. Advogado, e atualmente presidente do Departamento de Transportes e Terminais do Estado de Santa Catarina.

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[1] Art. 1º Esta Lei Complementar estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição.

§1º A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar.

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Imagem Ilustrativa do Post: Pretty Penny Foto de JD Hancock, disponível em: https://www.flickr.com/photos/jdhancock/8609444344/ Com alterações Licença de uso disponível em: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode

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