A Invalidade de Investigações Conduzidas pela Polícia Militar

04/09/2017

Por Iuri Victor Romero Machado – 04/09/2017

1 REFERÊNCIA JURISPRUDENCIAL 

Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. 2ª Câmara Criminal. Habeas Corpus nº 893.032-7. Relator Valter Ressel. Julgado em 12/04/2012. 

Ementa do julgado: 

PENAL. HABEAS CORPUS. CORRUPÇÃO PASSIVA (ART. 317, DO CP), FORMAÇÃO DE QUADRILHA (ART. 288, DO CP), VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL (ART. 325, DO CP) E ESTELIONATO (ART. 171, DO CP). NULIDADE DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. INOCORRÊNCIA. NÃO É NULA A INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA REQUERIDA PELA AGÊNCIA LOCAL DE INTELIGÊNCIA DA POLÍCIA MILITAR. INCUMBE TAMBÉM A ESSE ÓRGÃO ZELAR PELA ORDEM PÚBLICA (ART. 144, INC. V, DA CF). PRECEDENTES DESTA CÂMARA, BEM COMO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ORDEM DENEGADA. 

2 O CASO

O paciente L.G.S. exercia a função de escrevente do Cartório Civil de Uraí. Existiam indícios de que o mesmo estivesse participando de um esquema de favorecimento a determinados advogados, para dar preferência de tramitação de determinados processos, o que seria feito mediante pagamentos.

A Agência Local de Inteligência da Policia Militar, por conta própria, iniciou investigação e representou, ao Juízo competente, pela realização de interceptação telefônica. O Ministério Público se manifestou favoravelmente e o juízo deferiu o pleito.

Somente após a realização das interceptações, foi instaurado o respectivo inquérito policial.

Foi impetrado habeas corpus ao Tribunal de Justiça paranaense, no qual se pleiteava (dentre outras coisas) “a nulidade da interceptação telefônica, desentranhando-a do inquérito policial, bem como a nulidade das provas decorrentes”.

A ordem de habeas corpus foi negada.

3 OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO 

A decisão proferida pela 2ª Câmara Criminal fundamentou-se nas seguintes premissas: 1º) o termo “autoridade policial” previsto no artigo 3º da Lei nº 9.296/96 não diz respeito unicamente ao Delegado de Polícia, porquanto cabe também a Policia Militar a preservação da ordem pública, sendo possível que realize investigações de crimes (independentemente de sua natureza). Função de investigação que se mostraria compatível com o exercício da segurança pública; 2º) O pleito de interceptação foi ratificado pelo Ministério Público e a Policia Militar não foi responsável pela condução do Inquérito Policial, mas tão só pela investigação que o antecedeu.

Nenhuma das premissas teve sua fundamentação aprofundada, sendo que quanto à primeira, a 2ª Câmara Criminal reforçou sua decisão citando outros julgamentos análogos realizados por outras Câmaras Criminais do próprio Tribunal de Justiça (Apelação Criminal nº 675516-6, da 4ª Câmara Criminal e Apelação Criminal nº 728824-8, da 5ª Câmara Criminal).

Com base nestes fundamentos, a ordem de habeas corpus foi negada, sendo validada a colheita de provas feita pela Policia Militar.

4 PROBLEMATIZAÇÃO

Conforme se pode visualizar, a interceptação telefônica que gerou a posterior acusação do paciente foi realizada por Policiais Militares, sem que a Polícia Civil fosse, sequer, alertada da existência de investigações ou da possibilidade de LGS estar praticando crimes.

Como é de conhecimento notório, a Polícia Militar não tem qualquer atribuição para investigar crimes comuns. Suas funções são estritamente delimitadas pela Constituição Federal no art. 144, §5º, in verbis:

“às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública, (...)”

O Código de Processo Penal Militar da mesma forma veda funções de polícia judiciária à polícia militar, exceto pela apuração dos crimes militares (definidos no Código Penal Militar).

Por outro lado, cabe às Polícias Civil e Federal as funções de polícia judiciária, ou seja, apurar infrações penais (nos termos do art. 144, parágrafos 1º e 4º da Constituição Federal).

Não haveria qualquer razão para que as interceptações fossem realizadas pela denominada “Agência Local de Inteligência” da Polícia Militar, a qual agiu numa função anômala e inconstitucional. Neste sentido, Alexandre Morais da Rosa leciona que: “a Polícia Militar é órgão da segurança pública e compete a polícia ostensiva e preservação da ordem pública, sem qualquer competência para instaurar ou conduzir investigações policiais, salvo nos crimes militares, mesmo no âmbito dos Juizados Especiais (CR, art. 144, §5º). (…) Decorre disto que não podem requerer medidas cautelares (interceptação telefônica, mandado de busca e apreensão, etc...).”[1]

Importante anotar que, se durante o policiamento ostensivo, os agentes policiais militares observarem algum ilícito, a prisão decorrente da abordagem será (obviamente) legítima já que realizada no exercício de sua atribuição legal. Mas não haverá, autorização constitucional para realizar qualquer procedimento investigatório diretamente.

Nem mesmo a chancela realizada pelo Ministério Público poderia convalidar o ato, contrariamente ao que foi afirmado pelos julgadores. Não é demais lembrar que se o Ministério Público passa por cima da expressa redação legal, não pode e nem deve o Poder Judiciário conceder seu beneplácito as violações, do que resultarão certamente abusos e coações que o constituinte e o legislador ordinário pretenderam obstar.

Vive-se em um estado democrático de Direito, no qual o direito a prova está limitado, de sorte que seu exercício não pode ultrapassar os limites da lei e, sobretudo, da Constituição Federal. O processo penal não pode ser uma busca insana por uma “suposta” verdade, muito menos por uma glorificação da “segurança pública”, malfada no conceito de “ordem pública”. Bem pontua o Delegado de Polícia Henrique Hoffmann que “não é aceitável, ainda que a pretexto de combater a criminalidade, que a polícia ostensiva, com a chancela de quem quer que seja, viole as normas constitucionais, amparando-se no falacioso argumento da defesa do interesse público. Não convence o “salto triplo carpado hermenêutico” daqueles que objetivam alargar o conceito de “autoridade policial” para ampliar atribuições à revelia da Lei Fundamental”[2].

Imperioso destacar o voto da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, proferida no Habeas Corpus nº 137.349-SP, no qual afirmou-se:

Ao atuar, o agente público deve ter o cuidado de fazê-lo dentro da legalidade, porquanto, mesmo exercendo seu múnus contra possíveis atos desviantes, é-lhe defeso abrigar meios de concreção absolutamente ilegais. Ai está o fundamento da atuação estatal, na medida em que 'o sujeito investido no exercício de competências estatais se encontra em situação de responsabilização administrativa no sentido de submissão ao direito e vinculação à realização dos fins que justifiquem a existência do Estado.

Não se pode aceitar que os órgãos administrativos façam o que bem quiserem, usurpando suas atribuições, pois cada um tem seu âmbito de atuação expressamente delimitado.

Há propósito, existe farta jurisprudência, de diversos Tribunais, no sentido de que a investigação de infrações penais incumbe à Polícia Civil ou Federal. Veja-se:

A investigação das infrações penais incumbe à Polícia Civil, por isto, havendo indícios de prática Delitiva, deverá o relatório da Polícia Militar ser encaminhado à primeira, para, após apuração dos fatos, e em se verificando a existência de prova idônea, requerer a medida cautelar de busca e apreensão.“ (TJMA – AP.Crim.:1.0702.09.585753-9/001 – Numeração única: 5857539-792009.8.13.0702 – 1ª C. Crim. – Rel. Des. Ediwal José de Morais  - p. 16.7.2010). 

Funções de investigador e inquisidor. Atribuições conferidas ao Ministério Público e às Polícias Federal e Civil (CF, artigo 129, I e VIII e § 2o; e 144, § 1o, I e IV, e § 4o). A realização de inquérito é função que a Constituição reserva à polícia.” (STF, ADI 1570/DF, Rel. Min. Maurício Correa, Pleno).

A 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, quando de um julgamento de Mandado de Segurança que discutia a legalidade de uma imposição de realização de escoltas à Polícia Civil, teve oportunidade de afirmar que à esta cabe investigar e que suas funções devem ser respeitadas, não lhes cabendo exercer funções anômalas. O mesmo raciocínio pode ser utilizado quando invertemos a situação. Veja-se ementa do acórdão:

MANDADO DE SEGURANÇA. OFÍCIO DETERMINANDO A DELEGADO DE POLÍCIA A ESCOLTA DE PRESO DO SISTEMA PENAL PARA AUDIÊNCIA, SOB PENA DE MULTA. ESCOLTA DE PRESOS DO SISTEMA PENAL. ATRIBUIÇÃO DA POLÍCIA MILITAR E NÃO DA POLÍCIA CIVIL.DECRETO 4884/1978 C/C RESOLUÇÃO 112/2012 DA SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO. ORDEM CONCEDIDA. 2

(TJPR - 3ª C.Criminal - MS 935118-4 - Foro Regional de Almirante Tamandaré da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba -  Rel.: Jefferson Alberto Johnsson - Unânime - J. 14.03.2013) 

Neste julgamento, o Relator Jefferson Alberto Johnson consignou em seu voto:

No tocante ao mérito do mandamus é de se confirmar a liminar. O art. 144, da Constituição Federal, dispõe que a segurança pública é dever do Estado e exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e patrimônios, por meio da polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal e polícias civis. O § 4º, do referido dispositivo legal, dispõe que "às policiais civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares". O Superior Tribunal de Justiça, já decidiu, em caso semelhante ocorrido no Estado de Minas Gerais, que "as atribuições das polícias, militar e civil, ficam na dependência do que estiver estabelecido na Constituição ou em lei local de cada Estado" (STJ - RMS 19269/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/04/2005, DJ 13/06/2005, p. 215). A Constituição do Estado do Paraná, praticamente repete o texto constitucional e estabelece, no art. 47, que "A Polícia Civil, dirigida por delegado de polícia, preferencialmente da classe mais elevada da carreira, é instituição permanente e essencial à função da Segurança Pública, com incumbência de exercer as funções de polícia judiciária e as apurações das infrações penais, exceto as militares".            

A nossa Suprema Corte tratou de questão similar quando do julgamento da ADI 3614 interposta pelo Conselho Federal da OAB e pela Associação dos Delegados de Polícia em face do Decreto nº 1.557/2003 do Estado do Paraná, decreto este que aventou a possibilidade de a Polícia Militar realizar atendimentos em Delegacias de Polícia. O Ministro Menezes Direito deixou registrado em seu voto que não se pode interpretar o artigo 144 da Constituição de modo diverso do que prevista em sua redação:

Veja bem, a disciplina do artigo 144, §4º, é expressa, dá atribuição de polícia judiciária à polícia civil. Nós estamos no Estado do Paraná, essa disciplina tem mais de vinte anos, nasce com a Constituição de 1988, e não há razão alguma para que não tenha sido aberto concurso público para o cargo de Delegado. Quer dizer, se não há delegado, não se pode indicar substituto que não tenha a mesma qualidade, porque, nesses casos em que não há, o escrivão de polícia responde. […] A meu sentir, o Decreto, como está posto, viola claramente o §4º do artigo 144 da Constituição Federal, porque nós estamos autorizando que, por via regulamentar, se institua um substituto para exercer a função de polícia judiciária, mesmo que se transfira a responsabilidade final pelo delegado da Comarca mais próxima. Isso, pelo contrário, é uma abertura, a meu ver, de exceção gravíssima na própria disciplina constitucional.

No mesmo julgamento, o Ministro Marco Aurélio frisou: “tem-se, no artigo 144 da Constituição Federal, balizas rígidas e existentes há bastante tempo sobre as atribuições das Polícias Civis e Militares. No caso da Polícia Militar, está previsto que cabe a ela a polícia ostensiva e a preservação da ordem, mas não a direção de uma delegacia de polícia”.

Da análise desta ADI, fica nítida a preocupação dos Ministros da Suprema Corte com a possibilidade de confusão dos papeis constitucionais de cada órgão policial, sendo ressaltado que não se pode usurpar as atribuições que lhes são específicas, i.e., selecionadas pela Constituição.

Restando bem demarcada as diferenças entre as funções das polícias judiciárias da polícia militar, faz-se necessário voltar os olhos à Lei de Interceptação Telefônica. O art. 6º da Lei nº 9.296/96 tem uma redação que não abre espaço para dúvidas, utilizando-se do termo “autoridade policial”. A previsão de a interceptação ser executada pela autoridade policial harmoniza-se com a previsão constitucional. Muito embora o conceito de autoridade policial já fosse pacífico em nossa doutrina, a Lei nº 12.830/2013 veio a reforçar a atribuição da polícia judiciária para investigação criminal, deixando inequívoco que deve ser conduzida pelo Delegado de Polícia:

Art. 2º. As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.

§ 1º Ao Delegado de Polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.

De tal modo, verifica-se que a representação pela interceptação telefônica realizada por policiais militares jamais poderia ter sido aceita.

Ad argumentandum tantum, necessário ressaltar que o Brasil foi condenado, no ano de 2009, pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, em caso que muito se assemelha ao da presente discussão.

O Caso Escher e outros vs Brasil versou sobre interceptação telefônica levada a cabo pela Polícia Militar do Estado do Paraná, entre os meses de abril e junho de 1999. De modo que faz-se imperioso citar o capítulo específico do acórdão que cuidou de referida interceptação:

  1. Quanto às pessoas competentes para solicitar a interceptação telefônica, o artigo 3º da Lei no. 9296/96 estabelece que a autoridade policial poderá fazê-lo no marco da investigação criminal. A esse respeito, a perita Maria Thereza Rocha de Assis Moura assinalou que quando a Lei no. 9296/96 entrou em vigor havia 'uma divergência sobre a que polícia caberia, eventualmente, fazer esse pedido, (e) se a palavra autoridade policial significa(va) apenas a polícia civil ou também a polícia militar'. Contudo, a perita afirmou que “t(omando-se) em conta a existência de uma investigação em curso, facilmente (se poderá) saber a quem caberá esse pedido. Se essa investigação estiver a cargo da polícia civil, normalmente a autoridade policial é o delegado de polícia (ou) o Secretário de Segurança Pública”. Por sua vez, o perito Luiz Flávio Gomes expressou que “essa autoridade policial pode ser militar, na hipótese de investigação militar”
  2. Nesse sentido, a Corte ressalta que, à luz do artigo 144 da Constituição, a investigação dos fatos delitivos indicados no pedido de interceptação, por sua natureza comum, competia exclusivamente à polícia civil.[3]                       

A IDH consignou nas disposições finais do acórdão que “o Estado deverá, dentro do prazo de um ano contado a partir da notificação desta sentença, apresentar ao Tribunal um relatório sobre as medidas adotadas para cumprir a mesma”.

Ou seja, o órgão máximo de proteção dos Direitos Humanos da América Latina, ao qual o Estado brasileiro é vinculado, deixou claro que se deve respeitar as atribuições de cada instituição policial. Como bem se sabe, as decisões proferidas pela IDH tem caráter de determinação[4], razão pela qual o Estado do Paraná, não poderia por mais uma vez descumprir o que foi decidido.

A ineficiência do Estado na segurança pública não pode se sobrepujar ao Estado Democrático de Direito. Vive-se sob o império do Direito e a competência administrativa somente decorre da Lei. E, tal Lei tem a Constituição da República como baluarte. Num Estado Democrático de Direito, os “fins” não podem justificar os “meios”.

Não há, em direito administrativo, competência geral ou universal: a lei preceitua, em relação a cada função pública, a forma e o momento do exercício das atribuições do cargo. Não é competente quem quer, mas quem pode, segundo a norma de direito.

A segurança da Sociedade não serve de escudo nem justifica às autoridades responsáveis pela persecução penal para que possam ignorar a legislação. De tal modo, quaisquer previsões que deem a Policia Militar uma usurpação de função[5] devem ser prontamente questionadas.


Notas e Referências: 

[1] ROSA, Alexandre Morais da. Guia Compacto do Processo Penal: conforme a teoria dos jogos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2013. p. 118.

[2] Disponível em: http://www.conjur.com.br/2015-set-29/academia-policia-termo-circunstanciado-lavrado-delegado. Acesso em 30 ago. 2017.

[3] Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_208_por.pdf. Acesso em 28 ago. 2017.

[4] Neste norte, imperioso conhecer os mecanismos da Corte Interamericana quanto ao descumprimento de suas decisões.: Viomundo – As decisões da Corte Interamericana têm caráter de recomendação ou de determinação ao Estado Membro condenado?

Pablo Gutiérrez – Não são recomendações, são sentenças que condenam e ordenam meios eficazes para reparação das vítimas. Desde 25 de setembro de 1992, o Brasil é um Estado Membro da Convenção Americana. O artigo 62 dessa mesma convenção reconheceu a competência contenciosa da Corte em 10 de dezembro de 1998. O artigo 67 da Convenção Americana estipula que as sentenças da Corte devem ser prontamente cumpridas pelo Estado e de forma integral.

Além disso, o artigo 68.1 da Convenção Americana estipula que os Estados Membros se comprometem a cumprir a decisão da Corte Interamericana em todos os casos em que sejam partes. Portanto, os Estados devem assegurar internamente a implementação do disposto pela Corte Interamericana em suas decisões.

Tal como diz a Corte Interamericana de Direitos Humanos “a obrigação de cumprir o disposto nas sentenças do Tribunal [Corte Interamericana de Direitos Humanos] corresponde a um princípio básico do Direito Internacional, respaldada pela jurisprudência internacional, segundo a qual os Estados devem cumprir com as suas obrigações decorrentes de tratados internacionais  de boa fé  (pacta sunt servanda) e, como tem assinalado esta Corte e o disposto no artigo 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, aqueles não podem, por razões internas, deixar de assumir a responsabilidade internacional já estabelecida. As obrigações convencionais dos Estados Membros vinculam a todos os poderes e órgãos do Estado.”

Viomundo – O que pode acontecer se o país não acatar as determinações da Corte?

Pablo Gutiérrez – Uma vez pronunciada a sentença condenatória, a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem poderes inerentes às funções jurisdicionais. Uma delas é a supervisão do cumprimento das suas decisões.

Essa atribuição inclui o dever do Estado de informar à Corte Interamericana sobre as medidas adotadas para o cumprimento do que ela ordenou em suas sentenças.

A informação adequada ao Tribunal sobre como cada um dos pontos determinados é fundamental para avaliar a situação do cumprimento da sentença no seu conjunto. Também, e em caso de persistência do não cumprimento por parte do Estado Membro, essa informação constará dos relatórios anuais da Organização dos Estados Americanos (OEA) sobre os ditos descumprimentos.

É importante ter em mente que é cada vez mais forte a vinculação dos sistemas internacionais de direitos humanos com aqueles que têm como objeto atingir os sistemas comunitários ou de integração, principalmente econômicos.

Um exemplo é a União Europeia. A condição para integrá-la é que os novos países adotem o denominado Tratado de Direitos Humanos Europeu, o Tratado de Roma.

Um exemplo de cumprimento por parte do Brasil de sentenças da Corte Interamericana de Direitos Humanos é o caso Escher y otros vs. Brasil. A resolução, de 19 de junho de 2012, determinou o pleno cumprimento pelo Brasil da sentença da Corte Interamericana, ditada em 6 de julho de 2009.

[5] A respeito, veja-se que o Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu a resolução 54/2017 do Tribunal de Justiça Militar Paulista, o qual permitia que policiais militares pudessem alterar a cena de crimes.

CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de. Termo circunstanciado deve ser lavrado pelo delegado, e não pela PM ou PRF. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2015-set-29/academia-policia-termo-circunstanciado-lavrado-delegado. Acesso em 30 ago. 2017.

ROSA, Alexandre Morais da. Guia Compacto do Processo Penal: conforme a teoria dos jogos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2013.


Iuri Victor Romero Machado. Iuri Victor Romero Machado é Advogado Criminal. Professor de processo penal. Especialista em Direito e Processo Penal. Pesquisador do Grupo Modernas Tendências do Sistemas Criminal. . .


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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