A competência dos TC’s para julgar a legalidade dos atos de admissão de pessoal

03/12/2022

Dentre as competências que a Constituição Federal reserva aos TC’s encontra-se a de apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a legalidade das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório (art. 71, III, CF).

 

A competência constitucional dos TC’s para fiscalizar e apreciar a legalidade do registro dos atos de admissão de pessoal tem a previsão legal no art. 71, III, da CF. Tomando-se como exemplo o Tribunal de Contas do Estado do Piauí, que é o mais antigo Tribunal de Contas estadual do Brasil, a sua competência para fiscalizar e apreciar a legalidade do registro dos atos de admissão de pessoal se encontra nos seguintes dispositivos (Art. 86, III, a, da Constituição do Estado do Piauí, Lei Orgânica do TCE/PI, Art. 2º, IV, Art. 104, II, do Regimento Interno do TCE/PI, Art. 1º, IV, Art. 82, V, a, Art. 197, I, Art. 316, I, Art. 375, § 3º e a Resolução TCE/PI nº 23, de 06 de outubro de 2016).

 

Esta pesquisa é bibliográfica e explicativa, justifica-se pela extrema importância da competência dos TC’s para julgar a legalidade dos atos de admissão de pessoal.

 

 O Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou procedente recurso extraordinário para definir que decisões dos tribunais de contas não têm caráter meramente opinativo, mas mandamental. O caso tramitou no STF desde 2008 e trata de negativa de registro de nomeação de uma mulher ao cargo de professora de educação infantil de Amaral Ferrador (RS) por conta de decisão do Tribunal de Contas local. Ao examinar os atos administrativos, o órgão de fiscalização observou que a impetrante não atendeu aos requisitos do edital.

 

O TJ/RS considerou que as decisões do Tribunal de Contas são meramente opinativas, cabendo ao Poder Executivo o juízo de valor sobre seu acolhimento ou não. Para o ministro Luiz Edson Fachin, relator do recurso, a Constituição não autoriza a relativização do controle que essas cortes devem submeter aos entes municipais.

 

Os Tribunais de Conta analisam atos inclusive do próprio Poder Legislativo o qual auxilia, têm competência para aplicar aos responsáveis, independentemente do órgão a que se achem vinculados, multa com eficácia de título executivo e contam com autonomia administrativa e financeira. A competência técnica dos Tribunais de Contas dos Estados, ao negar registro de admissão de pessoal, não se subordina à revisão pelo Poder Legislativo respectivo.

 

Por unanimidade, foi julgado procedente o RE 576.920, em que se discutia a natureza do controle externo exercido pelos Tribunais de Contas Estaduais em relação a atos administrativos dos municípios.

 

O recurso (tema 47 de repercussão geral) foi interposto contra decisão do TJ/RS, para o qual a decisão do Tribunal de Contas Estadual que examinou atos administrativos do município de Amaral Ferrador não tem caráter mandamental, apenas opinativo. Foi aprovada a seguinte tese, sugerida pelo ministro Edson Fachin, relator, para fins de repercussão geral: "A competência técnica do Tribunal de Contas do Estado, ao negar registro de admissão de pessoal, não se subordina à revisão pelo Poder Legislativo respectivo".

 

Por ocasião do registro da admissão de pessoal, no caso de provimento originário, os TC’s iniciarão o exame do controle de legalidade pelo ato de nomeação para determinado cargo ou emprego a partir do respectivo edital do concurso público. Os órgãos de instrução dos TC’s, tomando-se, por exemplo, o TCE/PI, a Divisão de Fiscalização de Admissão de Pessoal (DFAD) verificará desde a publicação do edital, fase de inscrição, realização de provas, fases recursais, homologação, ordem de classificação, prazo de validade, nomeação, entre outros requisitos. Essa fiscalização aqui no Estado do Piauí ocorre simultaneamente com a realização do concurso público.

 

De sorte que, publicado o edital de determinado concurso, os TC’s, pela sua unidade técnica ou Divisão, no caso do TCE/PI pela DFAD, pesquisa junto ao Diário Oficial dos Municípios Piauienses, Diário Oficial das Prefeituras Piauienses e demais diários, a publicação do edital do certame e começa desde logo o controle concomitante de legalidade do instrumento convocatório, propondo ou não alteração no instrumento convocatório (através de um quadro de avisos em contato com os gestores dos municípios piauienses e gestores do Estado) e, a partir deste ponto, acompanhará a realização de todas as etapas do concurso. Importante dizer que, verificada alguma impropriedade, a unidade técnica ou divisão (DFAD) acionará o TC para, por exemplo, conceder medida cautelar.

 

O controle de legalidade do ato de admissão de provimento originário, o órgão de instrução apenas verificará a legalidade do edital de convocação, nomeação, posse e exercício do candidato aprovado.

 

Pelo registro, o Tribunal de Contas realiza o controle de constitucionalidade e de legalidade desses atos de pessoal. É pacífico no STF que a eficácia desses atos ocorre com o registro. A submissão desses atos ao controle perante o Tribunal de Contas está, portanto, em sintonia com o princípio da legalidade, segurança jurídica e da proteção à confiança, sendo este, decorrente daquele e que podem resultar em colisão com o princípio da legalidade caso esses sofram alteração ou negativa de registro depois de exacerbado lapso temporal, aliás, como é praxe nos TC’s.

 

A vontade materializada pelos TC’s na apreciação dos atos sujeitos a registro é autônoma e não integra a vontade manifestada pela Administração. São dois momentos distintos, vale dizer, são dois atos distintos, autônomos, cada um com seus próprios efeitos.

 

Os Tribunais possuem função precípua de auxiliar o Legislativo, mas não estão a ele subordinado e tampouco exercem papel secundário, por ser a titularidade do controle externo do órgão legislativo. Ademais, não cabe ao Congresso Nacional e a qualquer outro órgão rever as decisões de mérito do Tribunal, por exemplo, alterar o mérito do julgamento da Corte.

 

As decisões dos TC’s são recorríveis ao próprio Tribunal, mediante os recursos previstos em seu Regimento Interno. Todavia, pode o Poder Judiciário pronunciar a nulidade de um julgamento do TC, por inobservância da legalidade. O correto é afirmar que o Tribunal de Contas presta auxílio ao Poder Legislativo no exercício do controle externo, possuindo o Parlamento e o TC competências privativas, sem prejuízo de outras competências e atribuições conjuntas entre os dois órgãos.

 

Os TC’s possuem funções previstas na Constituição Federal, a maioria delas privativa, possuindo autonomia administrativa e financeira, sem subordinação aos Poderes.

 

A competência dos TC’s, essencialmente, consiste no exame da legalidade das admissões decorrentes de cargos e empregos públicos sujeitos a prévio concurso público, cargos efetivos, empregos públicos e contratos por prazo determinado. Não estão sujeitas a tal apreciação, para fins de registro, as nomeações para cargos comissionados.

 

A relevância do controle externo no que tange ao registro dos atos de pessoal. Trata-se de uma função que tem por objetivo preservar o princípio geral da legalidade que obriga toda a atuação da Administração, como de resto a preservação do patrimônio público. O melhor entendimento à luz do princípio da legalidade e da segurança jurídica é atribuir aos atos sujeitos a registro a natureza de ato simples, ou seja, eles se aperfeiçoam a partir de sua publicação pela Administração.

 

 

Notas e Referências

 

BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 29 de nov. de 2022.

BRASIL. Constituição do Estado do Piauí. Disponível em: < http://legislacao.pi.gov.br/legislacao/default/ato/14853>. Acesso em: 29 de nov. de 2022.

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Disponível em: <https://portal.tcu.gov.br/inicio/>. Acesso em: 29 de nov. de 2022.

BRASIL. Tribunal de Contas do Estado do Piauí. Disponível em: <https://www.tce.pi.gov.br/>. Acesso em: 29 de nov. de 2022.

DUTRA, Micaela Dominguez. O Tribunal de Contas e o Verbete n. 347 da Súmula de Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Direito Público, Ano V, n. 20 (Mar-Abr. 2008). p. 190-200.

STF. RE 576920. Tribunais de Contas x Municípios. Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=2592117>. Acesso em: 29 de nov. de 2022.

TCE/PI. Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado do Piauí. Disponível em: <https://www.tce.pi.gov.br/wp-content/uploads/2021/07/LOTCE.-atualizada-2021.pdf>. Acesso em: 29 de nov. 2022.

TCE/PI. Regimento Interno do Tribunal de Contas do Estado do Piauí. Disponível em: <https://www.tce.pi.gov.br/wp-content/uploads/2022/01/REGIMENTO_INTERNO_WORD-atualizado-ate-05-01-2022-.pdf>. Acesso em: 29 de nov. de 2022.

 

 

 

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