A busca pelo bem - estar humano: há espaço para o desenvolvimento sustentável?

22/08/2015

Por Ana Cristina Bacega De Bastiani, Mayara Pellenz e Sérgio Ricardo Fernandes de Aquino - 22/08/2015

No decorrer do tempo, observa-se, com (duvidoso) entusiasmo, quais os caminhos percorridos pela civilização humana a fim de desenvolver técnicas e instrumentos para obter melhorias significativas em sua vida, com o fim de alcançar o bem-estar. No entanto, o que se vai demonstrar é que o progresso atingido pela sociedade trilhou um caminho de devastação dos recursos naturais, além de gerar muitas desigualdades sociais e situações de exclusão. Diante do desvio civilizatório que hoje é observado, indaga-se: as benesses do progresso potencializam o bem-estar do ser humano?

Num primeiro momento, entende-se que sim, haja vista que os benefícios e comodidades proporcionadas pelo progresso possibilitam uma sensação de bem-estar, qual seja, a vida humana melhora a partir das novas técnicas e instrumentos descobertos ou aperfeiçoados com o tempo.

Deve-se, portanto, observar se que a evolução que o homem almeja está trazendo além do bem-estar, um cenário alarmante. É preciso entender como este progresso sonhado é alcançado e qual é o real custo do bem-estar, porque, diante de uma (in)sustentabilidade[4], existe o sacrifício de alguns seres humanos, não humanos e do mundo natural.

A principal característica do progresso humano é o egoísmo. Essa situação de individualismo exacerbado cega ações humanas. O bem-estar é um objetivo de todos, mas não é a todos que ele se estende. Para que alguns possuam melhores condições de vida, muitas pessoas são levadas a condições de vida degradantes, que vão desde as relações de trabalho, até situações de assédio e de indignidade, quando se refere às guerras e as calamidades naturais, como a falta de água, por exemplo. Veja-se que as condições de bem-estar são desfrutadas por uma parcela insignificante da população ao invés de serem desfrutadas por todos os seres vivos.

Na caminhada rumo ao futuro, busca-se o desenvolvimento includente, e não o progresso a qualquer preço. Utiliza-se dos ensinamentos de Dupas para delimitar o conceito de progresso[5], bem como dos ensinamentos de Sachs para abordar o significado de desenvolvimento[6].

Os reflexos do progresso

O progresso é o sentido da existência humana. Desde o início da civilização, o ser humano busca meios de aprimorar suas formas de vida. Contudo, ao mesmo tempo em que o progresso traz benefícios à vida, traz consigo situações que preocupam e fazem o ser humano questionar o real sentido de sua incansável busca.

O progresso é fruto dos anseios e ações humanas. Entretanto as “[...] ações humanas estão extinguindo rapidamente a variedade da vida animal e vegetal na Terra. O aquecimento global provocado pela emanação de gases está acontecendo com rapidez superior à condição de colocá-lo novamente sob controle[7]”.

Na Era Moderna[8], marcada pelo paradigma mecanicista, o progresso fora impulsionado, mas desprovido de valores. Ao mesmo tempo em que surgiram inovações interessantes à vida humana, houve a degradação ambiental, voraz e intensa. O processo de degradação claramente se intensificou durante o século XVIII com a Revolução Industrial e a intensificação dos processos de industrialização e produção em grande escala.

De acordo com Mont’Alverne e Rangel, este impacto ecológico gerado pelo sistema econômico no século XXI é o resultado do paradigma estabelecido desde o século XVI ao século XVIII, chamado mecanicista[9]. O primeiro fundamento do mecanicismo se criou por meio do método indutivo de Francis Bacon, em que:

[...] la ciencia, que antes intentaba compreender el orden y poseía propósitos de integración, comenzó a utilizar el conocimento para fines de control y dominación de la natureza. […] El segundo fundamento del mecanicismo de produjo com el método analítico cartesiano. Este método adoptó um enfoque reduccionista de la ciencia, a través de la creencia de que los fenómenos podrían ser entendidos a partir de la fragmentación a sus partes constituyentes[10].

Ainda que tais métodos tenham contribuído muito ao progresso, a visão fragmentada[11] do mundo tem gerado muitos dos problemas universais. Na visão de Dupas, a Revolução Industrial trouxe consigo a ideia de que o progresso estava associado ao desenvolvimento econômico. A liberdade, ideia consagrada nesta época, trouxe a concepção de que quanto mais as pessoas fossem livres mais haveria progresso. Este marco indubitavelmente conduziu a pessoa humana a um caminho de evolução desvirtuado.

Dupas ainda acrescenta que no período compreendido entre a segunda metade do século XVIII e o final do século XIX o progresso vigorou no ocidente e juntamente a isso vão surgindo concepções de justiça social e sabedoria popular. Já havia se instaurado a ideia de que o progresso ocorre por meio do engenho humano.

No século XX teve vez o conhecimento e a tecnologia que fomentaram os grandes conflitos do século, pois ao mesmo tempo em que estes elementos contribuíram para a melhoria da vida, também contribuíram para aumentar as possibilidades de destruição das técnicas já alcançadas.

Não existe um marco unânime a respeito do momento em que se transita para o período da Pós-Modernidade[12]. No entanto, trata-se do período vivido contemporaneamente: um momento de inconstâncias e incertezas.

O período vivido hodiernamente é o momento em que mais se desfrutam os benefícios do progresso. Todavia, há uma maior conscientização, a partir do conhecimento, de que a forma adotada de progresso pode trazer, além de posturas consumistas, (diante da variedade de produtos disponibilizados) exclusão e subdesenvolvimento, além de graves riscos à manutenção de uma vida com dignidade às gerações futuras. Para Bauman, a vida líquida é uma vida de consumo, que projeta o mundo e todos os seus fragmentos animados e inanimados como objetos de consumo, objetos que perdem a utilidade (e, portanto, o viço, a atração, o poder de sedução e o valor) enquanto são usados[13].

O estilo de vida humana individualista ainda vivido nos dias atuais incentiva o consumismo. O progresso parece ter entrado na mente das pessoas como algo bom, que traz objetos melhores e que facilitam a vida além de “incluir” pessoas a espaços sociais por conta de valores estéticos. Bauman entende que:

[...] a luta pela singularidade agora se tornou o principal motor da produção e do consumo de massa. Mas, para colocar o anseio por singularidade a serviço do mercado do consumo de massa (e vice-versa), uma economia de consumo também deve ser uma economia de objetos de envelhecimento rápido, de obsolescência quase instantânea e veloz rotatividade. E assim, também de excesso e desperdício. A singularidade agora é marcada e medida entre “o novo” e “o ultrapassado” ou entre as mercadorias de hoje e as de ontem[14].

Será que verdadeiramente busca-se a superação do antropocentrismo? Todos querem melhores condições de vida, mas poucos estão dispostos a estender ou partilhar suas conquistas com os demais. Isso é evidente em relação aos problemas ecológicos. Há uma crise ambiental e social vivida em função do estilo de vida adotado ao longo da história, e agravado pela maneira egoísta de viver os dias atuais. Não se dissocia a ideia de progresso, crescimento econômico e acumulação de bens.

No cotejo dessas ideias, o sentido desvirtuado da evolução humana não está no desenvolvimento, mas, sim, no progresso que proporciona benefícios individuais sem observar, com mais atenção, os impactos sociais e ambientais, sejam positivos ou negativos. Todos querem uma vida boa, mas dificilmente as pessoas estão dispostas a renunciarem prazeres presentes em virtude de uma possível preservação de uma boa vida para os demais.

A partir do momento em que o progresso fora associado à ideia de desenvolvimento econômico, os fins parecem ter justificado os meios utilizados para atingi-lo. Desde então, o fato econômico desponta como o “senhor” do progresso. Tudo parece ter um valor de mercado. Isso levou a um caminho de exploração dos recursos naturais e sociais que não levam a humanidade ao desenvolvimento e sim, apenas ao progresso.

O progresso sempre esteve associado a ideia de que o futuro seria melhor do que o presente pois teria mais evolução, conhecimento e mais técnicas ou objetos para aperfeiçoar as condições de vida da humanidade. No entanto a ideia é refletir e questionar se este progresso, que não leva necessariamente ao desenvolvimento, torna-se condição para a existência de um futuro melhor.

Tem-se observado cada vez mais atitudes individualistas e irresponsáveis que colocam em xeque a existência de um futuro nestas condições. Portanto, é imperativo que o ser humano pare um pouco este seu anseio egoísta e frenético por progresso e analise se as condições (econômicas, sociais, ambientais, éticas) que estão sendo impostas neste caminho são acertadas e se vão trazer desenvolvimento ou ainda mais problemas.

O caminho a ser traçado para que a humanidade se desenvolva ainda é longo, pois é preciso despir-se de objetivos individuais para um olhar mais amplo e que traga melhorias sociais. Para que se atinja um Desenvolvimento Sustentável[15], então, o trajeto a ser percorrido é ainda mais longo, já que além das implicações sociais presentes é preciso tomar precauções em relação a preservação de boas condições de vida para gerações futuras, o que torna o desafio ainda maior.

Sobre individualismo e bem-estar

A humanidade busca, historicamente, por melhorias em suas condições de vida. Para que essa situação se torne possível, os seres humanos desenvolveram seu conhecimento e a partir dele novas técnicas e instrumentos que acabam de certa forma condicionando sua própria vida. Isso ocorre visto que uma vez que entra em contato com novos instrumentos ou técnicas o homem apenas deixará de ser condicionado por este no momento em que algo melhor ou mais facilitador da vida seja produzido.

Todavia, existem muitas razões no presente para a humanidade acreditar que o progresso, junto a tantos benefícios, tem trazido consigo muitos problemas no presente e possa intensifica-los em relação ao futuro. Uma justificativa seria o modo de vida levado pelo ser humano. Até onde o Homem é capaz de suportar e controlar o progresso? Será ele capaz de dominar tudo aquilo que criou e que cada vez mais condiciona sua existência?

A ideia de que o avanço tecnológico e científico pode levar a avanços formidáveis é relevante, mas deve ser analisada com prudência. A humanidade deve ter cautela em relação às formas que avança para que o caminho não culmine em catástrofes. É preciso abandonar a ideia de que o progresso é uma via de mão única. O momento presente abre uma infinidade de possibilidades futuras. Muitas ações podem trazer efetivas melhorias e muitas posturas podem e devem ser evitadas.

Nessa linha de pensamento, se faz importante ter cuidado ao seguir com o progresso, pois é certo que está nas mãos do homem como conduzi-lo. Neste caminho para a evolução, o homem não pode esquecer que são as suas ações no presente que vão conduzir o futuro da humanidade.

O objetivo de bem-estar é tão claro que está configurado pela proteção jurídica de alguns elementos constituintes da qualidade de vida, bem como por numerosos protocolos de intenções que objetivam o resguardo do bem-estar humano, bem como de uma melhoria da qualidade de vida e a proteção e realização de uma vida saudável e com dignidade a toda humanidade[16].

A busca pelo acúmulo de bens leva as indústrias a fabricar produtos cada vez mais descartáveis, mas que o ser humano os adquire, pois precisa conservar valores estéticos. Os produtos degradam-se cada vez com mais rapidez, fazendo com que tenham que sempre ser produzidos produtos melhores com mais intensidade.

Os anteriores perdem seu valor e o consumismo tem aumentado e fomentado este modelo de desenvolvimento capitalista adotado. Essa intensa produção extrai do mundo natural suas matérias primas cada vez com mais intensidade e irresponsabilidade, o que gera os graves riscos de catástrofes naturais, a cada dia que passa, mais reais.

Este modo capitalista de progresso vivido atualmente ainda encontra-se acompanhado de uma exploração e dominação da natureza. Bens são produzidos para tornarem-se obsoletos rapidamente, tudo para movimentar o mercado econômico. Isso faz com que se utilizem o mundo natural para sua produção. Os produtos, desta forma, logo são descartados e novos mais modernos produzidos, e uma pequena parcela da população é quem tem acesso a estes bens. Estes sujeitos são tratados como sujeito-objeto, em que sua utilidade está em produzir os bens que não estarão a seu acesso, mas que chegarão ao alcance de alguns e lhes trarão uma maior sensação de bem-estar.

O modo de produção capitalista vem acompanhado do progresso técnico e científico e de uma maior exploração e dominação da Natureza. O que é importante neste progresso técnico-científico é a redefinição de valores, pois muitos bens e confortos encontram-se disponíveis, no entanto, mal distribuídos, gerando situações de exclusão. Diante dessa situação o ser humano encontra-se diante de um problema ético do qual a Sustentabilidade[17] preocupa-se.

É diante das maiores possibilidades de consumo que os seres humanos vão ficando cada vez mais gananciosos e egoístas. Destaca-se que, apesar do ser humano ter se libertado para perseguir seus objetivos de vida e buscar a felicidade[18], atualmente novas necessidades são apresentadas no contexto social. O ser humano é levado a crer que, a cada dia, possui maiores necessidades. No entanto, não são novas necessidades que se apresentam, e sim vontades de possuir produtos que parecem ser essenciais, mas que até pouco tempo não eram necessidades. Este fato resultou numa crise em todos os segmentos da Sociedade. Para Dupas:

"Nada impede que reconheçamos e desejemos maior progresso e, ao mesmo tempo, constatemos que obtê-lo não melhora necessariamente a qualidade de vida para a maioria das pessoas. As sociedades são mais felizes que há dez anos porque temos telefone celular ou internet e, agora, tela de plasma? Ainda que reste a delicada tarefa de conceituar felicidade, certamente o senso comum diz que não, embora seja inegável que certos confortos aumentaram. Como seres humanos, éramos os mesmos sem esses aparatos, quando ninguém ainda os tinha"[19].

Por muito tempo, o ser humano canaliza seus esforços e suas ações em razão das suas próprias vontades e necessidades. A preocupação com a própria vida, os próprios desejos e anseios passou a ocupar todo o tempo e energia do ser humano. A busca pelo bem-estar atinge os anseios de todos os sujeitos. E é isso que a busca pelo desenvolvimento parece ter desvirtuado. Os seres humanos ao desenvolver novas técnicas ou produtos parecem entender que o bem-estar depende da aquisição destes bens cada vez mais obsoletos e possuidores da mágica da inclusão[20].

Percebe-se como o progresso trouxe inúmeros benefícios à vida humana. No entanto, é preciso estar ciente dos riscos que ele gera ao social, ao meio ambiente e as catástrofes que uma evolução irresponsável pode causar. O que se deseja do progresso é a obtenção de um futuro melhor, partindo-se se condições inferiores para a obtenção de melhorias.

O presente serve de alicerce para que este futuro melhor possa ocorrer e por isso é que se demonstra essencial o estabelecimento de diretrizes seguras em direção a este futuro desejado, porém incerto. O mundo é a totalidade dos esforços da raça humana, desta forma, as políticas de desenvolvimento adotado em uma parte do globo interferem diretamente no futuro dos demais integrantes do planeta.

É um momento da história em que muito se desfruta dos benefícios trazidos pelo progresso. São inegáveis os confortos proporcionados à vida humana. No entanto, embora já se tenha a consciência da interdependência de todas as formas de vida e de todas as ações humanas, ainda vive-se de maneira antropocêntrica, egocêntrica e consumista. Ainda o que impera é o bem-estar pessoal. O progresso trouxe esta sensação de bem-estar, mas potencializou este modo de viver egoísta. Essa situação gera exclusão aos que não tem acesso aos benefícios do progresso. E dessa forma não é possível falar em desenvolvimento sustentável.

Para que o Desenvolvimento Sustentável ocorra é preciso que especialmente as condições ambientais, sociais e éticas sejam respeitadas. No entanto, é possível perceber que é a lógica econômica que ainda comanda este movimento. Por esse motivo, demonstra-se a importância de se ter um desenvolvimento preocupado com estas questões para que seja possível viver uma boa vida no momento presente e ter esperanças de que estas condições de uma vida com dignidade possam adquirir uma perspectiva inter e intrageracional.

Para Sachs, dois grandes problemas foram herdados do século XX (apesar de seu progresso técnico e científico): “o desemprego em massa e as desigualdades crescentes[21]”. Por este motivo, existe a necessidade de repensar este modelo de desenvolvimento adotado e recuperar os valores essenciais, o sentido da vida e colocar em prática nas novas formas de solidariedade social. Para enfrentar estes problemas urge a necessidade de uma reaproximação entre ética, economia[22] e política.

Há uma clara relação de exploração do mundo natural e do capital humano, especialmente de países subdesenvolvidos, nesta corrida frenética por progresso. Altas taxas de desemprego, muitos empregos informais, más condições de trabalho e baixos salários são exemplos da exploração do capital humano em países subdesenvolvidos, e que diminuem as capacidades humanas por buscar melhores condições de vida e realizar escolhas que possam lhes atribuir maiores liberdades[23].

Por esse motivo, todos os países, especialmente aqueles que ainda não atingiram um nível básico de desenvolvimento, necessitam entrar em um caminho sustentável e que aproveite de forma responsável os recursos que cada país tem a oferecer. Nestes Estados em desenvolvimento a riqueza está concentrada nas mãos de poucos, enquanto que uma parcela significativa da população busca sobrevivência trabalhando na informalidade. Muitos países do mundo vivem com este problema do “crescimento sem emprego[24].

Para que haja desenvolvimento e não apenas progresso é imperativa uma mudança de consciência e direção. Claramente, a humanidade vive uma crise mais duradoura no início deste século XXI. Enquanto algumas pessoas detém todos os benefícios do desenvolvimento, outras são excluídas deste processo. O ser humano precisa repensar sua trajetória. O Planeta, bem como a humanidade, vivem esta crise. Por consequência, o ser encontra-se diante da necessidade de redimensionar seu paradigma individualista que vigorou por tanto tempo e ainda está muito fortemente arraigado, haja vista que esta postura gera muito consumismo, egoísmo e exclusões.

Os recursos trazidos pelo progresso, para além do individualismo, devem estar ao acesso de todos.  O desenvolvimento só ocorre se seus benefícios estiverem acessíveis a todos que fazem parte deste processo. Para isso, a consciência humana sobre suas responsabilidades nos efeitos causados por suas ações é fundamental.  Neste contexto da importância de se tomar outro rumo surge então a necessidade dos países pautarem-se em um desenvolvimento embasado por critérios sustentáveis.

Para o desenvolvimento de uma economia sustentável há muitos interesses em jogo, mas um deles se refere à construção de um conceito de ambiente como “um potencial produtivo sustentável; isto é, materializar o pensamento complexo numa nova racionalidade social que integre os processos ecológicos, tecnológicos e culturais, para gerar um desenvolvimento alternativo[25]”.

Este projeto de desenvolvimento objetiva, além de erradicar a pobreza, suprir necessidades básicas da população e melhorar a qualidade de vida destas populações aproveitando de forma responsável os recursos naturais e humanos de cada região, além de inovação tecnológica que demonstra ser um recurso importante para isto, pois a via para a mudança necessária pode estar na própria ciência e tecnologia[26].

E é neste ponto que importa dizer que o progresso conduzido na maior parte do tempo e dos locais ainda não é desenvolvimento; menos ainda desenvolvimento sustentável, pois não se desfruta de forma responsável todos os seus recursos.

Na busca por um desenvolvimento sustentável o princípio da equidade é essencial, pois se apresenta como uma questão de solidariedade intergeracional, firmando um compromisso ético com as gerações futuras no que toca a uma preocupação com “uma repartição mais justa dos custos da degradação e contaminação ambiental, uma melhor avaliação do acervo de recursos dentro das contas nacionais e uma melhor distribuição de renda[27].

O padrão econômico em que tudo tem um valor de mercado, portanto, deve ser repensado e tomar outros rumos na busca por um desenvolvimento que estime valores que estão esquecidos por muito. Exige-se uma transformação no próprio conhecimento para a construção de uma nova economia e uma maior consciência no campo de ação política que demonstram ser as grandes mudanças necessárias deste novo tempo.

O Desenvolvimento Sustentável[28] se trata de um projeto político e social que introduz uma participação democrática e direta das comunidades na utilização e transformação dos seus recursos naturais. Neste sentido, há valores humanos e processos ecológicos que não são passíveis de redução ao padrão de medida de mercado e por isso devem ser valorizadas da forma que merecem.

Não é possível que o Direito, a partir desse cenário, se torne silente não cumpra com a sua função social ao não ampliar, democraticamente, condições de uma vida digna para todos. Entretanto, nenhuma vida humana se perpetua no tempo sem a presença de uma parceira indispensável à própria definição de Desenvolvimento Sustentável: a Natureza. É na sua concepção de ser próprio que aparece outro sujeito capaz de determinar os limites, os cuidados e as responsabilidade morais humanas perante a sua Irmã, ou, ainda, a Mãe Generosa a qual acolhe, abriga e potencializa vida em abundância para todos os seres que a habitam[29].

A formulação de um Direito à Sustentabilidade, cujos objetivos precisam compreender essa nova postura cooperativa entre sujeitos, e não entre sujeito e objeto, não desenvolverá qualquer perspectiva de desenvolvimento para a promoção de um bem comum[30] sem que haja essa aproximação e reconhecimento. Os efeitos de um antropocentrismo alargado[31], previsto na nossa Constituição Federal para a preservação do meio ambiente, exclui o próprio mundo natural daquilo que faz para permitir a continuidade da vida para todos. Por esse motivo, os caminhos constitucionais efetivados pelo Equador, por exemplo, insistem numa perspectiva Biocêntrica[32] a fim de esclarecer essa parceria vital à manutenção de condições mínimas ao conviver terrestre.

Além desses argumentos, é possível perceber que países em desenvolvimento compartilham as suas dificuldades de se propor uma vida digna comum a todos, tais como a concentração de riqueza nas mãos de poucos, muitos trabalhadores na informalidade, um crescimento sem emprego e excludente. Sachs[33] tenta demonstrar que os países também devem enxergar que possuem potencialidades para reverter este quadro e que isto deve ocorrer de dentro do próprio país.

Desta forma, devem-se compor estratégias para que haja um desenvolvimento sustentável e includente a partir do aproveitamento dos recursos naturais e humanos que os países em desenvolvimento possuem, priorizando estratégias de geração e manutenção de emprego decente para todos, além de políticas públicas de inclusão e que proporcionem a realização de direitos, especialmente das pessoas que estão à margem das benesses do progresso.

Diante disso, cabe a cada país a estratégia para atingir um desenvolvimento sustentável. Mas estratégias que priorizem seus recursos humanos internos e respeitem as singularidades. A geração de empregos formais é essencial neste caminho para um desenvolvimento sustentável e includente.

O respeito e incentivo à cidadania também se mostra relevante, pois a cidadania requer um maior direito de participação na tomada de decisões em questões que possam afetar a coletividade. O sentido da cidadania está em sua capacidade de inventar novas estratégias de poder e, portanto, construir uma nova racionalidade social baseada no respeito, na responsabilidade e revalorização de alguns sentidos da vida esquecidos pela racionalidade capitalista.

A educação também demonstra ser um caminho. Cada Estado, ao proporcionar uma boa educação a seus cidadãos está contribuindo para a formação de indivíduos mais conscientes e livres, pois é inegável que a educação abre mentes e caminhos e pode formar atores sociais mais participativos e influentes por possuírem maior capacidade crítica. É assim que pode ocorrer um desenvolvimento e sustentável: com ações e estratégias que priorizam um desenvolvimento responsável e de respeito aos indivíduos que participam diretamente deste processo.

No momento em que isso ocorre a humanidade está aceitando a coisificação humana, em que apenas há uma preocupação com aqueles que estão próximos. Fica muito fácil desfrutar dos melhoramentos da vida sem se preocupar como eles foram atingidos. Há uma responsabilidade humana nisso.

A busca pelo progresso, bem como seu desfrute fazem parte da vida humana. Mas para que haja desenvolvimento existe um problema ético a ser enfrentado, que se trata desta relação entre os esforços para produzir os bens que geram comodidades e ao mesmo tempo exclusão e o desfrute destas melhorias, que claramente não se estende a todos.


Notas e Referências:

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ZAMBAM, Neuro José. Amartya Sen: liberdade, justiça e desenvolvimento sustentável. Passo Fundo: IMED, 2012.

[1] Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade Meridional. Bolsista CAPES. Pós-Graduada em Direito Processual Civil pela Faculdade Anhanguera de Passo Fundo. Advogada. E-mail:cristi.bd@hotmail.com.

[2] Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade Meridional. Pós-Graduada em Direito Penal e Processual Penal pela Faculdade Meridional. Advogada. E-mail:maypellenz@hotmail.com.

[3] Doutor e Mestre em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu – Mestrado – em Direito do Complexo de Ensino Superior Meridional – IMED. Professor do Curso de Direito da Faculdade Meridional – IMED. Pesquisador da Faculdade Meridional. Coordenador do Grupo de Pesquisa: Ética, Cidadania e Sustentabilidade. Membro do Grupo de Pesquisa: “Modernidade, Pós-Modernidade e Pensamento Complexo”, "Multiculturalismo e Pluralismo Jurídico" e "Transnacionalismo e circulação de modelos jurídicos". Líder do Centro Brasileiro de Pesquisa sobre Amartya Sen: interfaces com direito, políticas de desenvolvimento e democracia. Membro associado do Conselho Nacional de Pós-Graduação em Direito – CONPEDI e da Associação Brasileira do Ensino de Direito - ABEDI. E-mail: sergiorfaquino@gmail.com

[4] “Sugere-se ao(à) leitor(a) uma provocação, na qual possibilitará (ou não) uma progressiva caminhada para “fora da caverna” da qual Platão demonstrou na sua obra “A República”: Existe sustentabilidade nas ações humanas? Dito de outro modo: Compreende-se o que é sustentabilidade a fim de se garantir o desenvolvimento das presentes e futuras gerações? A resposta é clara (e sonora): Não. Os documentos internacionais que têm insistido na “preservação ambiental” não abandonaram suas posturas utilitárias e antropocêntricas diante da Natureza”. AQUINO, Sérgio Ricardo Fernandes de. O direito em busca de sua humanidade: diálogos errantes. Curitiba: CRV, 2014, p. 31.

[5] Para Dupas, o progresso é uma ideia-força que influencia a humanidade em toda sua trajetória. É ele que sustenta a evolução e é essencial para o desenvolvimento dos povos, pois o progresso é uma marcha para frente, em que se parte de uma condição menos boa para uma melhor.  Presume-se que tudo o que for realizado posteriormente será melhor que o anterior. A ideia de progresso, portanto, parte desta premissa.

[6] Sachs explica que a reflexão sobre o desenvolvimento como entendido hoje iniciou-se por volta dos anos 40 do século passado. Todavia, desde os anos 70 é dispensada uma atenção especial no que concerne a questões ambientais e sociais e isso tem levado a uma reconceitualização do desenvolvimento, com vistas a um desenvolvimento preocupado com a não degradação ambiental e a inclusão social – que deve atender a um imperativo ético de solidariedade e responsabilidade para gerações presentes e futuras. Para este autor apenas as soluções que “promovam o crescimento econômico com impactos positivos em termos sociais e ambientais, merecem a denominação desenvolvimento” (SACHS, 2006, p. 36). A redefinição do conceito sustentabilidade social é importante nesta questão e a distribuição da riqueza desequilibrada se mostra um problema a ser enfrentado. SACHS, Ignacy. Desenvolvimento includente, sustentável sustentado. São Paulo: Garamond, 2006, p. 36.

[7] DUPAS, Gilberto. O mito do progresso. São Paulo: UNESP, 2006, p. 12

[8] Dupas esclarece que “a modernidade teria se iniciado com a revolução industrial e as inovações tecnológicas que, no mais das vezes, são profundamente identificadas com a ideia de progresso”. DUPAS, Gilberto. O mito do progresso, p. 113.

[9] MONT’ALVERNE, Tarin Cristiano Frota; RANGEL, Helano Marcio Vieira. El planeta tierra como sujeto de dignidad y de deretchos: un legado andino para la Constitución de UNASUR y para la humanidad. In: CADERMATORI, Daniela Mesquita Leutchuk; MORAES, Germana de Oliveira; CESAR, Raquel Coelho Lenz; CADERMATORI, Sérgio Urquhart. A construção jurídica da UNASUL. Florianópolis: Editora da UFSC; Fundação Boiteux, 2011, p. 327-344, p. 329.

[10] MONT’ALVERNE, Tarin Cristiano Frota; RANGEL, Helano Marcio Vieira. El planeta tierra como sujeto de dignidad y de deretchos: un legado andino para la Constitución de UNASUR y para la humanidad. In: CADERMATORI, Daniela Mesquita Leutchuk; MORAES, Germana de Oliveira; CESAR, Raquel Coelho Lenz; CADERMATORI, Sérgio Urquhart. A construção jurídica da UNASUL. p. 327-344, p. 329.

[11] Hodiernamente esta visão fragmentada do mundo vem perdendo espaço com o entendimento da interdependência de todas as formas de vida e do real entendimento de que uma ação pode refletir na vida das demais pessoas ou espécies, mesmo que estejam geograficamente distantes.

[12] A pós-modernidade é constatada a partir de mudanças da cultura, filosofia e sociologia. Para sua instituição observa-se um período de transição de valores, costumes das instituições, de hábitos sociais dentre tantas outras situações. Muito se especula sobre a pós-modernidade, no entanto, na realidade sabe-se pouco sobre ela. A única certeza deste período é o que não há certezas, pois esta era traz junto consigo uma infinitude de instabilidades. BITTAR, Eduardo C.B. O direito na pós-modernidade. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

[13] BAUMAN, Zygmunt. Vida Líquida. Tradução de Carlos Alberto Medeiros. 2.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009, p. 16-17.

[14] BAUMAN, Zygmunt. Vida Líquida. p. 36.

[15] No relatório elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) nesse ano intitulado o caminho para a dignidade até 2030: a erradicação da pobreza, a transformação de todas as vidas e a proteção do planeta, observa-se os 17 (dezessete) Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável: ODS1. Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares; ODS2. Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição, e promover a agricultura sustentável; ODS3. Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades;  ODS4. Garantir educação inclusiva e equitativa de qualidade, e promover oportunidades de aprendizado ao longo da vida para todos; ODS5. Alcançar igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas; ODS6. Garantir disponibilidade e manejo sustentável da água e saneamento para todos; ODS7. Garantir acesso à energia barata, confiável, sustentável e moderna para todos; ODS8. Promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo, e trabalho decente para todos; ODS9. Construir infraestrutura resiliente, promover a industrialização inclusiva e sustentável, e fomentar a inovação; ODS10. Reduzir a desigualdade entre os países e dentro deles; ODS11. Tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis; ODS12. Assegurar padrões de consumo e produção sustentáveis; ODS13. Tomar medidas urgentes para combater a mudança do clima e seus impactos; ODS14. Conservar e promover o uso sustentável dos oceanos, mares e recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável; ODS15. Proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater à desertificação, bem como deter e reverter a degradação do solo e a perda de biodiversidade; ODS16. Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis; ODS17. Fortalecer os mecanismos de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável. Disponível em: http://www.pnud.org.br/Noticia.aspx?id=4009. Acesso em 10 de agosto de 2015.

[16] A Organização das Nações Unidas demonstra este olhar especial com o desenvolvimento humano e mundano. Por ser uma organização tão importante como é, relevante sua contribuição com as preocupações da crise planetária que se estabelece. Diante disso estabeleceu, ainda no ano 2000, oito objetivos do milênio, que devem ser atingidos por todos os países do mundo até o ano de 2015. No Brasil, estes oito objetivos são chamados de “oito jeitos de mudar o mundo”. Os oito objetivos são: “1 – Acabar com a fome e a miséria; 2 – Educação básica de qualidade para todos; 3 – Igualdade entre sexos e valorização da mulher; 4 – Reduzir a mortalidade infantil; 5 – Melhorar a saúde das gestantes; - Combater a AIDS, a malária e outras doenças; 7 – Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente; 8 – Todo mundo trabalhando pelo desenvolvimento”. Disponível em: www.objetivosdomilenio.org.br. Acesso em 10 de agosto de 2015. Dentre os oito objetivos do milênio, o objetivo “sete” se refere a “qualidade de vida e respeito ao meio ambiente”. Trata-se de um dos objetivos mais complexos e de difícil realização, pois exige um amontoado de ações e precauções com as medidas a serem tomada pelos países. Envolve, como se sabe, a realização de uma série de direitos e responsabilidades humanas e estatais para a persecução deste objetivo. Tratam-se, como o intitulado, de objetivos. São uma série de intenções que colocam aos países de todo o mundo o imperativo de buscar soluções aos problemas apresentados relacionados ao desenvolvimento sustentável e a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos de todo o mundo. A própria Constituição Federal Brasileira, em seu artigo 225, caput, traz um direito fundamental ao meio ambiente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida das pessoas. A lei maior do Estado brasileiro demonstra expressamente a preocupação com a qualidade de vida das pessoas integrantes de seu Estado. Ou seja, a qualidade de vida demonstra ser um objetivo a ser perseguido. Esta preocupação com a previsão a um resguardo de bem-estar é respeitável, pois demonstra que a qualidade de vida é importante para a pessoa humana e o Estado ou órgãos de relevância internacional reconhecem expressamente o objetivado por um desenvolvimento, que deve ser sustentável.

[17] Para Boff: “Sustentabilidade é toda ação destinada a manter as condições energéticas, informacionais, fisíco-quimícas que sustentam todos os seres vivos, especialmente a Terra viva, a comunidade de vida e a vida humana, visando sua continuidade e ainda atender as necessidades da geração presente e das futuras, de tal forma que o capital natural seja mantido e enriquecido em sua capacidade de regeneração, reprodução e coevolução”. BOFF, Leonardo. Sustentabilidade: o que é – o que não é. Petrópolis, (RJ): Vozes, 2012, p. 107.

[18] “[...] a felicidade também requer bens exteriores, pois é impossível, ou na melhor das hipóteses não é fácil, praticar belas ações sem os instrumentos próprios. Em muitas ações usamos amigos e riquezas e poder político com instrumentos, e há certas coisas cuja falta empana a felicidade – boa estirpe, bons filhos, beleza – pois o homem de má aparência, ou malnascido, ou só no mundo e sem filhos, tem poucas possibilidades de ser feliz, e tê-las-á ainda menores se seus filhos e amigos forem irremediavelmente maus ou se, tendo tido bons filhos e amigos, estes tiverem morrido. [...] a felicidade parece requerer o complemento desta ventura, e é por isto que algumas pessoas identificam a felicidade com a boa sorte, embora outras a identificam com a excelência”. ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Mário da Gama Cury. 3.ed. Brasília: Editora da UNB, 1999, p. 27.

[19] DUPAS, Gilberto. O mito do progresso, p. 14.

[20] Portanto, há dois os tipos de exclusão gerada por esta busca por bem-estar baseado nos novos bens e técnicas proporcionadas pelo progresso: uma delas se trata da exclusão daqueles que trabalham em más condições para proporcionar a existência destes produtos; e a outra forma de exclusão se refere àqueles que não possuem acesso aos bens frutos do progresso, por condições financeiras ou qualquer outra. Esta segunda forma de exclusão é mais observada, pois é sabido que apenas uma parcela pequena da população consegue ter acesso a estes bens de pouca durabilidade, muitas vezes caros e possuidores de altos valores estéticos.

[21] SACHS, Ignacy. Desenvolvimento includente, sustentável sustentado. p. 26.

[22] Sachs lembra Amartya Sen quando se refere que ética e economia devem estar interligadas e explica que hoje a questão da economia se tornou preponderante ao ponto de deixar a ética praticamente esquecida. No entanto estas precisam reaproximar-se, haja vista que o desenvolvimento se distingue do crescimento econômico, pois os objetivos do desenvolvimento vão além da acumulação de riqueza material. O crescimento, assim, é necessário, mas não suficiente para a consecução de uma vida melhor e mais feliz para todos. Igualdade, equidade e solidariedade estão implícitas no conceito de desenvolvimento. Portanto este deve promover igualdade, reduzir diferenças sociais e dar condições de vida mais adequadas àqueles que vivem nas piores condições em vez de acelerar o crescimento econômico, já que este não implica desenvolvimento se não reduzir a pobreza, ampliar o número de empregos e não atenuar as desigualdades. Isso é essencial, pois o desenvolvimento sustentável é muito mais do que a promoção da sustentabilidade ambiental. Refere-se também a sustentabilidade social, ao promover condições mais favoráveis à vivência humana com bem-estar baseada na solidariedade da geração atual para com as gerações futuras.

[23] Amartya Sen explica que a liberdade de poder evitar uma morte prematura é em grande parte incrementada por uma renda maior, “mas ela também depende de muitos outros fatores, em particular da organização social, incluindo saúde pública, a garantia de assistência médica, a natureza da escolarização e da educação, o grau de coesão e harmonia sociais e assim por diante [...] temos razões para estarmos interessados não apenas no tipo de vida que conseguimos levar, mas também na liberdade que realmente temos para escolher entre diferentes estilos e modo de vida”. A liberdade é valiosa, pois nos dá mais oportunidades para buscar nossos objetivos e porque possibilita o próprio processo de escolha, em que se pode por exemplo “ter certeza de que não estamos sendo forçados a algo por causa de restrições impostas por outros”, ou seja, este aspecto se refere a liberdade de poder decidir por si mesmo sobre o que fazer e isso é muito importante. Neste contexto de avaliação, portanto, a vantagem individual é vista a partir da capacidade que cada pessoa possui de fazer coisas em que ela tem razão para valorizar e querer. No que se refere às oportunidades de realização do que valoriza a vantagem de cada pessoa consiste na sua oportunidade real de realizar o que ela valoriza. Neste ponto o foco está na liberdade que uma pessoa tem de fazer isso ou aquilo ou de ser isso ou aquilo. O importante é se somos capazes, se somos livres para determinar o que queremos. Portanto, o conceito de capacidade está ligado com o aspecto da oportunidade de liberdade de escolhas e realizações. SEN, Amartya. A ideia de justiça. Tradução de Denise Bottmann e Ricardo Doninelli Mendes. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p. 261/262.

[24] SACHS, Ignacy. Desenvolvimento includente, sustentável sustentado. p. 115.

[25] LEFF, Enrique. Saber Ambiental: Sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Rio de Janeiro: Vozes, 2001, p. 60.

[26] Que muito serviu para degradar e hoje pode ser um recurso para amenizar os reflexos causados por um desenvolvimento irresponsável.

[27] LEFF, Enrique. Saber Ambiental, p. 76.

[28] “O desenvolvimento sustentável traz implícita a necessidade de escolha de um padrão de vida compatível com os princípios que o fundamentam, juntamente com as necessidades, as demandas, incluídas aquelas que as futuras gerações, e os bens disponíveis. Cabe, nesse sentido, reafirmar novamente os limites específicos de cada instituição para uma estruturação justa e segura das sociedades. A imposição de vontade exclusiva de uma instituição ou grupo, sobrepondo seus mecanismos e interesses, por mais sensatos e bem intencionados que possam ser, afronta uma condição de sustentabilidade na sua origem”. ZAMBAM, Neuro José. Amartya Sen: liberdade, justiça e desenvolvimento sustentável. Passo Fundo: IMED, 2012, p. 141.

[29] En occidente se “promueven” los derechos y las obligaciones. En cambio, en los pueblos indígenas originarios se “vive” en responsabilidad desde la complementación y la reciprocidad. Si partimos de la premisa que todo está interconectado, es interdependiente y está interrelacionado, surge la conciencia del ayni, que implica la conciencia y la convicción de que la primera responsabilidad es con la Madre Tierra y el cosmos, la segunda responsabilidad es con la comunidad, la tercera con la pareja y después la responsabilidad con uno mismo. En el vivir bien no existen las jerarquías sino las responsabilidades naturales complementarias. En esta etapa transitoria, donde se han desequilibrado las relaciones sociales y las relaciones de vida, hay que reconstituir muchos derechos; en el momento en el que se hayan restituído hablaremos sólo de responsabilidades. HUANACUNI, Fernando. Buen vivir/ Vivir bien: Filosofía, políticas, estrategias y experiencias regionales andinas. Peru: CAOI, 2010, p. 50.  

[30] "O bem comum pressupõe o respeito pela pessoa humana enquanto tal, com direitos fun­damentais e inalienáveis orientados para o seu desenvolvimento integral. Exige também os dispositivos de bem-estar e segurança social e o desenvolvimento dos vários grupos intermédios, aplicando o princípio da subsidiariedade. Entre tais grupos, destaca-se de forma especial a famí­lia enquanto célula basilar da sociedade. Por fim, o bem comum requer a paz social, isto é, a esta­bilidade e a segurança de uma certa ordem, que não se realiza sem uma atenção particular à justi­ça distributiva, cuja violação gera sempre violên­cia. Toda a sociedade – e, nela, especialmente o Estado – tem obrigação de defender e promover o bem comum.  Nas condições actuais da sociedade mun­dial, onde há tantas desigualdades e são cada vez mais numerosas as pessoas descartadas, privadas dos direitos humanos fundamentais, o princípio do bem comum torna-se imediatamente, como consequência lógica e inevitável, um apelo à so­lidariedade e uma opção preferencial pelos mais pobres. [...] Basta obser­var a realidade para compreender que, hoje, esta opção é uma exigência ética fundamental para a efetiva realização do bem comum". FRANCISCO. Laudato si: sobre o cuidado da casa comum. São Paulo: Paulus/Loyola, 2015, p. 95.

[31] “Nota-se, assim, que a Constituição brasileira não deixa de adotar o antropocentrismo no que concerne ao ambiente. Entretanto, o antropocentrismo é alargado, não se restringindo o ambiente a mera concepção econômica ou de subalternidade direta a interesses humanos. Observa-se, plenamente, contudo, que a autonomia do ambiente, alçada no texto constitucional, é bastante diversa daquela propugnada pela ecologia profunda”. LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e Estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato (orgs). Direito constitucional ambiental brasileiro. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 167.

[32] Se puede avanzar en esa dirección desde diferentes posturas éticas, tanto desde algunas formas de antropocentrismo débil, bajo el pragmatismo, pero en especial desde una perspectiva biocéntrica. Esta última reconoce que la Naturaleza posee valores propios, intrínsecos, que no dependen de las valoraciones o utilidad según el ser humano. Esto implica que la comunidad política, propia de la idea clásica de ciudadanía, se superpone ampliamente con la idea de una comunidad moral. Ideas como la de florestanía permiten incorporar una perspectiva biocéntrica, aunque el caso actual más destacado es la ya mencionada nueva constitución ecuatoriana, donde se reconocen derechos propios en la Naturaleza, la que incluso aparece bajo la concepción alterna de Pachamama [...]. En el caso ecuatoriano coexistirían una ciudadanía ambiental junto a elementos para una nueva meta-ciudadanía ecológica. La postura biocéntrica también sirve como fuente de obligaciones y responsabilidades, tanto frente al resto de la sociedad, como también ante la Naturaleza, y desde allí abordar nuevas estrategias de justicia ambiental.  GUDYNAS, Eduardo. Cidadania ambiental e metacidadanias ecológicas: revisão e alternativas na América Latina. Desenvolvimento e Meio Ambiente, [S.l.], v. 19, dez. 2009, p. 66. ISSN 2176-9109. Disponível em: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs/index.php/made/article/view/13954>. Acesso em: 03 Mai. 2015. doi:10.5380/dma.v19i0.13954.

[33] "À ética imperativa da solidariedade sincrônica com a geração atual somou-se a solidariedade diacrônica com as gerações futuras e, para alguns, o postulado ético da responsabilidade para com o futuro de todas as espécies vivas na Terra". SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2009, p. 49.


 

Sérgio Ricardo Fernandes de Aquino é Mestre e Doutor em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí, Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD) – Mestrado – do Complexo de Ensino Superior Meridional – IMED.  

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ANA CRISTINA (2)

Ana Cristina Bacega Debas: Advogada. Graduada em Direito pela Faculdade Anhanguera de Passo Fundo. Pós-Graduada em Direito Processual Civil pela Faculdade Anhanguera de Passo Fundo. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Direito pela Faculdade Meridional de Passo Fundo - Área de concentração: Direito, Democracia e Sustentabilidade. Linha de pesquisa: Fundamentos Normativos do Direito e da Democracia. Integrante do grupo de pesquisa: Ética, Cidadania e Sustentabilidade e Direitos Culturais e Pluralismo Jurídico. Bolsista CAPES. Professora de Metodologia da Pesquisa de Pós-Graduação em Direito pela Imed. MAYARA

Mayara Pellenz: Advogada. Graduada em Direito pela Universidade de Passo Fundo. Pós-graduada em Direito Penal e Processo Penal na Faculdade Meridional de Passo Fundo e Docente do Curso de Direito na mesma instituição. Atualmente, cursa especialização em Ciências Penais pela UNIDERP  e especialização em Psicologia Jurídica na Faculdade Meridional. Mestranda vinculada ao Programa de Pós Graduação em Direito pela Faculdade Meridional - Área de Concentração: Direito, Democracia e Sustentabilidade e Linha de Pesquisa Fundamentos Normativos da Democracia e da Sustentabilidade. Integrante dos Grupos de Pesquisa: Ética, Cidadania e Sustentabilidade; Direitos Culturais e Pluralismo Jurídico; e Temas Emergentes em Criminologia Crítica. Associada ao Conselho Nacional de Pós-Graduação em Direito CONPEDI.


Imagem Ilustrativa do Post: Aspas de felicidad // Foto de: Eduardo Zárate // Sem alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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