#86 - IRDR – A decisão de suspensão dos processos não comporta a concessão oficiosa de tutelas de urgência pelo Relator

02/11/2020

  Coluna Garantismo Processual / Coordenadores Eduardo José da Fonseca Costa e Antonio Carvalho

 

 

 

 

Porque a força e a estabilidade das instituições dependem de sua vigência na mente das pessoas.

Manuel Castells.

 

– I –

Em artigo recentemente publicado[1] as Prof.ªs. Fernanda Medina Pantoja e Sofia Temer defendem a “excepcionalidade e a necessidade” de o Des. Relator, na mesma oportunidade em que determina a suspensão dos processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitam no Estado ou na região (=Tribunais de Justiça ou Tribunais Regionais Federais), a depender da hipótese, também, conceda, de ofício, uma espécie de tutela de urgência geral (=efeito erga omnes) com o fito de resguardar eventuais direitos discutidos nos processos paralisados.

Justificam esse posicionamento considerando que “para além das hipóteses em que a suspensão não é considerada adequada, pode haver situações em que apenas a suspensão das ações não seja suficiente para elidir a profusão de entendimentos contraditórios. Afinal, a controvérsia jurídica objeto do IRDR pode ser verificada em decisões liminares, concedidas em sede de tutela de urgência pelos juízos em que tramitam os processos repetitivos e pelos próprios órgãos fracionários do tribunal, notadamente porque a lei reserva, àqueles que são partes nos processos suspensos, a obtenção de tutelas de urgência para resguardar direito que se encontre sob risco iminente (art. 982, § 2º). Assim, ainda que se paralise o transcurso dos processos em que se discute a mesma questão, é possível que continuem a ser requeridas e concedidas liminares, com interpretações indesejavelmente conflitantes sobre a questão que será futuramente decidida em caráter vinculante”.

Trazem para ilustrar a tese a situação instaurada em decorrência da pandemia (COVID-19) e os impactos supostamente gerados nos contratos de prestação de serviços educacionais (=demandas revisionais).

Para as juristas, “parece insuficiente a instauração de um IRDR para pacificar a matéria, mediante a adoção de uma interpretação coerente, ponderada e asseguradora das posições das partes, caso não seja liminarmente fixada uma tese provisória para ser aplicada enquanto o incidente está em tramitação. Isso porque, a se manter a possibilidade de decisão liminar acerca dos valores das mensalidades, sem qualquer tratamento isonômico ou previsível, é possível que se agrave o sério problema enfrentado pelos alunos e igualmente pelas escolas e universidades, cuja situação econômico-financeira atual é também periclitante, ameaçando a própria manutenção da prestação do serviço educacional”.

Sustentam que “havendo situação de excepcional urgência - caracterizada pelo risco de prejuízos irreversíveis, caso se aguarde a inclusão em pauta do IRDR perante o órgão competente para realizar a análise da admissibilidade do incidente -, pensamos ser possível admitir a concessão da tutela provisória pelo próprio relator, ad referendum do colegiado competente”, evocando, para tanto, uma “aproximação” do incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) com a natureza objetiva dos “processos de controle de constitucionalidade”.

Articulam, em última análise, a possibilidade de o Relator, ao admitir o incidente e determinar, cautelarmente, a suspensão dos processos na origem até que sobrevenha solução meritória (=norma-tese), também possa, independentemente de requerimento específico de tutela de urgência por parte dos legitimados (CPC, art. 977, II e II) conceder, monocraticamente, nos termos do CPC, art. 300, tutela provisória (=antecipatória) fixando “uma interpretação provisória sobre a questão de direito controvertida”.

Com as devidas venias, ousamos discordar da tese lançada.

 

– II –

O IRDR é cabível na hipótese de haver, simultaneamente, a efetiva repetição de processos que contenham controvérsias sobre a mesma questão unicamente de direito que implique em risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica (CPC, art. 976)[2]. Possuem legitimidade disjuntiva e concorrente para suscitar o incidente perante o Presidente do Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal, (i) o juízo da causa ou Relator, nos recursos ou ações originárias processadas naqueles Tribunais, (ii) as partes envolvidas no litígio com pretenso efeito multiplicador, o Ministério Público e a Defensoria Pública (CPC, art. 977).

Instaurado mediante requerimento dos legitimados, o IRDR será processado e a sua admissibilidade analisada pelo órgão colegiado competente para julgá-lo (CPC, art. 981). Uma vez constatada a presença dos requisitos legais (=efetiva repetição de processos que versam sobre a mesma questão de direito processual ou material que impliquem em risco à igualdade e à segurança jurídica), caberá ao Des. Relator, após a regular admissão do incidente procedimental, determinar a suspensão dos processos em curso, individuais ou coletivo, que tramitem no Estado ou na região, conforme tenha ocorrido a instauração perante TJ´s ou TRF´s., requisitando informações aos órgãos em cujos juízos tramitam processos no quais se discute a questão objeto do IRDR, intimando, por fim, o Ministério Público para manifestação na qualidade de custos legis (CPC, art. 982).

Inicialmente podemos constatar que a legislação de regência estabelece nitidamente que ao Des. Relator caberá, demonstrando fundamentadamente a existência dos pressupostos, determinar a suspensão do trâmite dos processos já instaurados no âmbito da competência (=territorial) do respectivo Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal.

Não há chancela legislativa (=lei ordinária de espectro nacional), autorizando ou permitindo a concessão oficiosa de tutelas provisórias de urgência antecipatória, com efeito geral e abstrato, potencialmente dotada de eficácia vinculante. Ao revés disso, ao Relator, no âmbito do IRDR, não lhe é dado qualquer poder de tutela provisória[3] para além da “suspensão dos processos individuais e coletivos” que tramitam perante a circunscrição do seu respectivo Tribunal[4].

Com efeito, nos arts. 976 usque 987 do CPC, não há uma disposição legal que atribua aos regimentos internos dos TJ´s ou TRF´s a faculdade de disciplinar a concessão de poderes ao Relator para tutelas provisórias, seja de cunho cautelar, seja de cunho antecipatório. A própria decisão de suspensão que detém natureza eminentemente cautelar está disposta no CPC. Fora isso, o código autoriza, única e exclusivamente, que o regimento interno dos Tribunais locais possa tão-somente indicar o órgão (=colegiado) para julgamento do IRDR (CPC, art. 978 c.c. art. 981).

Assim, os poderes do Relator, no que pertine ao IRDR, estão legalmente limitados a promover a suspensão dos processos em trâmite nos estritos contornos da circunscrição judiciária dos respectivos Tribunais, bem como a requisição de informações aos órgãos em cujos juízos tramitam os processos no bojo dos quais se discutem o objeto do incidente e a intimação do MP cuja atribuição está afeta àquela jurisdição.

Refutamos o argumento de que o procedimento do IRDR se aproxima ou se assemelha àquele regramento especifico dado às ações de controle abstrato concentrado de constitucionalidade (ADI/ADC e ADPF), respectivamente previstos nas Leis 9.868/99 e 9.882/99.

Em primeiro lugar, às ações de controle abstrato concreto de constitucionalidade há expressas disposições legais a respeito dos poderes do Min. Relator, seja no que concerne às suspensões dos andamentos dos processos nas instâncias ordinárias, sejam no que diz respeito tanto à apreciação e deferimento de tutelas provisórias, com efeito erga omnes e eficácia vinculante (ad referendum) quanto ao julgamento de mérito pelo órgão pleno do STF (CF, art. 102, § 2º).

Em segundo lugar, não há norma constitucional ou infraconstitucional que determine a extensão (=aplicação) subsidiária dos procedimentos de controle concentrado abstrato de constitucionalidade ao IRDR, tampouco delegação legislativa ordinária para que RI dos TJ´s ou TRF´s possam vir a estabelecer qualquer extensão no âmbito dos poderes conferidos ao Des. Relator, máxime em relação à concessão de tutelas antecipatórias para fixação de “uma interpretação provisória sobre a questão de direito controvertida” levada no bojo do IRDR pendente de julgamento.

Em terceiro e último lugar, admitido o IRDR e havendo necessidade de concessão de tutelas de urgência, essas se darão justamente nos processos sobrestados na origem, conforme dispõe o art. 982, § 2º do CPC[5]. E isso nos parece óbvio, pois a cada situação concreta e devidamente instruída com a prova necessária é que o juízo da causa, mediante requerimento da parte interessada, terá condições de, em sede de cognição precária, deliberar acerca da concessão ou não de provimentos urgentes, evitando-se, com isso, possíveis danos ou perecimento do direito em discussão.

Não concebemos a ideia de que, antes do exame detido e imprescindível para a fixação de uma norma-caso, seja possível aos juízos na origem, cotejá-la como fundamento de validade (=norma-tese) à luz das especificidades dos casos concretos suspensos, possa o Des. Relator conceder provimentos genéricos e abstratos (=norma-precedente)[6] à míngua do julgamento do mérito relativo à questão levada no bojo do caso-piloto ou procedimento-padrão pelo órgão colegiado competente.

Nessa perspectiva, durante a suspensão dos processos junto às mais diversas comarcas e subseções judiciárias ligadas aos respectivos TJ´s e TRF´s, os eventuais pedidos de tutelas de urgência deverão ser apresentados àqueles juízos naturais de primeiro grau, aos quais é dada competência funcional e material para, analisando o caso concreto, possam conceder ou não o pedido fundado na urgência (=antecipatório/ cautelar). É em cada um dos processos suspensos que se demonstrara os requisitos ou pressupostos ensejadores das medidas de urgência. Na eventualidade de um provimento urgente restar em desacordo com a tese fixada no julgamento do IRDR, novamente, caberá ao juízo de origem, em cada caso concreto, aquilatar a necessidade de revogação ou confirmação da tutela provisória anteriormente deferida (CPC, art. 296 c.c. art. 299).

Em outros termos, a tese da “excepcionalidade e da necessidade” de o Relator conceder tutela de urgência ex officio, no mesmo momento procedimental em que determina a suspensão dos processos perante os juízos naturais, “vai em desencontro com toda a perspectiva constitucional atribuída ao processo e ao dever de fundamentação”, já que se reduz à “elaboração de padrões decisórios que prestigiem apenas a tese jurídica, abstraída do caso concreto subjacente[7], máxime se levarmos em conta de que se trata de um provimento não exauriente sobre “questão(ões)”, a(s) qual(is) uma vez definida(s) pelo órgão colegiado competente demandará, necessariamente, o devido cotejo analítico com a situação especifica posta nos autos suspensos na origem (=solução da lide individual ou coletiva).

A justificativa trazida pelas juristas no sentido de que “a lei processual também atribui ao relator, de modo geral, e observados os requisitos legais, o poder-dever de apreciar monocraticamente o pedido de tutela provisória, em quaisquer recursos e processos de competência originária do tribunal (art. 932, II, do CPC)”, não prescindem de considerações, a nosso ver, essenciais para debilitar o argumento. O dispositivo legal revela que o Des. Relator investido de competência funcional apreciará pedidos de concessão de tutelas de urgência em âmbito recursal ou em processos de competência originária dos Tribunais, mediante pedido expresso formulado(s) pelo(s) legitimado(s).

Desvirtuar a redação do artigo 932, II, do CPC para possibilitar a atuação oficiosa do Relator na concessão de provimentos antecipatórios, é permitir uma tutela jurisdicional que desconsidera o espaço processual regido pela legalidade (=jurisdição sem processo), como adverte Francisco Rabelo Dourado de Andrade[8].

Ora, frente ao conteúdo normativo estatuído no art. 982, I do CPC, não se admite a concessão oficiosa de tutelas provisórias com efeito erga omnes, quer seja em razão da inexistência de previsão legal ou de sua específica delegação às eventuais normas regimentais elaboradas pelos Tribunais, quer seja pelo fato de o CPC estabelecer, a nosso ver corretamente, a competência dos juízos naturais dos feitos suspensos na origem, mediante requerimento, a função jurisdicional para receber e apreciar os pedidos de tutelas provisórias, sejam elas cautelares, sejam antecipatórias (CPC, art. 982, § 2º).

 

– III –

Os fundamentos eficienticistas da jurisdição[9] e a caracterização de situações emergenciais ou excepcionais trazidas pelas autoras, a um só tempo, não encontram amparo legal a justificar a tese esposada, revelando-se impróprios para garantir a pretensão de suspensão da legalidade e, muito menos, legitimam posturas ad hoc não fiscalizáveis[10].

Tais posturas revelam a “diminuição do espaço público procedimental discursivo e cognitivo e da defesa da celeridade resumida a uma rapidez extremada, que coloca em risco à efetivação dos direitos fundamentais”.[11]

O arcabouço legislativo – p. ex., o CPC e a procedimentalização do IRDR – “só são importantes na medida em que possam ajudar a prever o que os juízes farão[12].

Em outras palavras: a construção da possibilidade oficiosa de concessão de tutelas de urgência na mesma decisão (=capítulo específico) em que se determina a suspensão dos processos pendentes na origem pelo Des. Relator, agrega competência ao que prescreve o art. 982, I do CPC e nega validade e eficácia ao quanto estabelecido no §2º, do art. 982, do mesmo diploma legal, caracterizando ilícito ou arbítrio-usurpação-disfuncional (=abuso de poder) a ensejar o controle “intrapotestativa[13], por meio da interposição de recurso de agravo pelos legitimados/representantes adequados (CPC, art. 977, II e III) a ser apreciado pelo órgão colegiado habilitado do respectivo Tribunal, o qual, ao final, deverá prover o recurso reformando a decisão tomada sem amparo legal.

Destaca-se, por oportuno, que às partes dos processos suspensos perante o juízo natural e que foram atingidas diretamente em suas esferas jurídicas pela tutela provisória concedida monocraticamente pelo Relator, embora detenham interesse processual em impugnar tal decisão, não dispõem de qualquer meio recursal para tanto, restando-lhes, quando muito, o sucedâneo da correição parcial, expediente procedimental de duvidosa constitucionalidade.

Ao fim e ao cabo, qualquer possibilidade de controle de eventual “profusão de entendimentos contraditórios” em demandas potencialmente repetitivas (=de massa) fora do âmbito de incidência previsto nos dispositivos legais sobreditos, não deve ser objeto de atuação corretiva pelo Poder Judiciário, mas, sim, e impreterivelmente de reforma legislativa, domínio constitucionalmente adequado e seguro para a promoção de mudanças legislativas em um Estado Democrático de Direito[14].

Teses para que possam qualificar-se como de lege lata devem considerar em sua construção o ordenamento jurídico posto, sob pena que se transmudarem em de lege ferenda e, como tal, receberem a advertência de seus idealizadores; caso contrário, infelizmente, serão consideradas contra legem e, portanto, não levadas a sério.

 

Notas e Referências

[1] A excepcionalidade (e a necessidade) da tutela de urgência no incidente de resolução de demandas repetitivas. São Paulo. Migalhas. 16 out. 2020. Disponível em https://bit.ly/3kjIcOl.

[2] Nesse sentido, não é possível a instauração de IRDR preventivo, sem a existência de decisões conflitantes, sob pena de impedir o acesso à jurisdição democrático. Sobre o tema, consultar: OLIVEIRA, Alexandre Varela de; MUNDIM, Luís Gustavo Reis. A impossibilidade de padronização decisória preventiva no incidente de resolução de demandas repetitivas. Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPRO. Belo Horizonte, ano 27, n. 106, p. 31-48, abr./jun., 2019.

[3] Há discussão doutrinária acerca da obrigatoriedade ou não da decisão monocrática que determina a suspensão dos processos na origem. Para uns seria uma decorrência lógica da admissão do incidente, resultando da própria dicção legal e, nesse caso, sequer de tutela provisória se trataria. Já para outros, poderá depender da situação fático-jurídica, ou seja, da questão processual ou material objeto do IRDR. Sobre a questão consultar: ROSSI, Júlio César. Incidente de resolução de demandas repetitivas e o novo CPC: das inadequações às inconstitucionalidades. Curitiba: Juruá, 2016.

[4] A decisão de suspensão dos processos deixou em aberto problemas tais como se haverá ou não suspensão do lapso prescricional relativamente às ações obstadas na origem. Para nós a não suspensão da prescrição incorreria em um paradoxo, pois “a admissão do IRDR permite a suspensão das ações pendentes, mas não reconhece a suspensão da prescrição; um incidente idealizado para solucionar ações repetitivas, estimularia a debandada dos sujeitos em ajuizar as suas próprias ações, pois, desse modo, estaria garantida a suspensão da prescrição da pretensão levada a Juízo. A suspensão da prescrição da pretensão é imperativa, notadamente se atentarmos para a hipótese de que: (i) os indivíduos mesmo que detenham pretensão alcançada pela tese jurídica (controvérsia unicamente de direito) em discussão no IRDR, por certo ajuizarão as suas ações individuais ou coletivas, sob pena de prescrição e, (ii) a certeza de que mesmo com a manutenção da previsão de suspensão da prescrição, as partes, por certo, ajuizarão suas ações, no temor de que, após o julgamento do IRDR e pronunciamento da tese, o juiz competente venha a entender e sustentar que a resolução do caso concreto não se compatibiliza com à questão unicamente de direito decidida no bojo do IRDR e que, destarte, a pretensão fora fulminada pela prescrição.” (ROSSI, Op. cit., p. 60).

[5] No mesmo sentido: “A suspensão não alcança os pedidos de tutela de urgência e seus desdobramentos, que deverão ser feitos junto ao órgão jurisdicional que deu origem ao IRDR” (RIBEIRO, Sérgio Luiz de Almeida. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR: o procedimento padrão tupiniquim e suas peculiaridades (breves reflexões). Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 23, n. 92, p. 185-208, out./dez. 2015, p. 203).

[6] MOUSSALLEM, Tárek Mousés; TEIXEIRA JÚNIOR, José Borges. A natureza jurídica do incidente de resolução de demandas repetitivas: um peseudoproblema analiticamente solúvel. Revista de Processo – REPRO. São Paulo, RT, vol. 273. nov./2017. Versão eletrônica.

[7] SOUSA, Lorena Ribeiro de Carvalho. O dever de fundamentação no Código de Processo Civil de 2015. Belo Horizonte: D’Plácido, 2019, p. 67-68 e 71.

[8] Tutela de evidência, teoria da cognição e processualidade democrática. Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 167.

[9] Sobre uma crítica ao viés eficienticista da jurisdição leciona Helena Patrícia Freitas: “O problema é que, sob um discurso voltado à eficiência, busca-se a formação de decisões orientadas por uma racionalidade pragmática, na qual haja aferição do caráter econômico (melhor custo-benefício), a fim de operacionalizar aumento na produtividade, a partir de julgamentos massificados. As garantias processuais constitucionais são vistas, nesse sentido, como entrave, já que o exercício do contraditório e da ampla argumentação demandam um tempo no processo, que não se compatibiliza com a celeridade pretendida. Além disso, a fundamentação das decisões é vista como embaraço para a vazão na tramitação processual” (FREITAS, Helena Patrícia. Eficiência da jurisdição: necessidade de sua (des)construção para efetivação do modelo constitucional de processo. Belo Horizonte: D’Plácido, 2019, p.135).

[10] A atuação do Relator, nesse sentido, criaria um espaço de exceção, já que “assume a condição de soberano não-fiscalizável do sistema, pois tem a possibilidade de, a seu critério, suspender a legalidade sobre aquela situação fática (excepcionando-a) e, mais que isso, tem a obrigação de decidir sobre tal situação em um espaço que ele mesmo ratificou como um espaço legalmente indemarcado, ou seja, ao qual – como soberano – atribuiu um status de exceção para criar sobre ele a norma a seu modo” (CARVALHO, João Carlos Salles de. Pedagogia judicial e processo democrático: a fala processual como exercício de cidadania. Belo Horizonte: D’Plácido, 2018, p.130).

[11] SOUSA, Lorena Ribeiro de Carvalho. Op. cit., p. 63.

[12] HART, H. L. A. O conceito de direito. Trad. Antônio de Oliveira Sette-Câmara. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009, p. 180.

[13] Hipóteses pelas quais o julgador “usurpa competência jurisdicional de que não é titular” e não acatando “procedimento da lei”, cf. COSTA, Eduardo José da Fonseca. Uma breve teoria jurídica do arbítrio. São Paulo. Empório do Direito. 26 out. 2020. Disponível em: https://bit.ly/31KnXBY.

[14] Em sentido próximo, Francisco Rabelo Dourado de Andrade adverte que, “em um Estado que se qualifica como Democrático de Direito, são inconcebíveis todas as perspectivas doutrinárias que acolhem o ativismo judicial nas tutelas de urgência” já que a atuação dos julgadores “deve irrestrita obediência à reserva legal, como referente lógico-jurídico da legitimidade democrática” (Op. cit., p. 158).

 

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