Vamos falar de princípios: a sua relevância no direito do trabalho – Por Guilherme de Luca

23/05/2017

Coordenador: Ricardo Calcini 

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa tem como objetivo geral a análise da aplicação dos princípios no direito do trabalho nos dias atuais, em especial na relação contratual laboral.

Dentre os objetivos específicos, destacam-se a análise dos seguintes princípios: princípio da proteção, princípio do In Dúbio Pro Operario, princípio da norma mais favorável, princípio da irrenunciabilidade de Direitos Trabalhistas, princípio da condição mais benéfica, princípio da continuidade das relações de emprego, princípio da irrenunciabilidade e o princípio da primazia da realidade.

Com isso, a análise parte-se do seguinte problema. Há aplicação dos princípios no direito do trabalho nos dias atuais?

Segundo as bases lógicas de investigação, trata-se de pesquisa desenvolvida pelo método dedutivo, consistente no raciocínio de apresentação dos problemas, já destacados; formulação de hipótese, qual seja, que os princípios exercem função essencial e fundamental na aplicação das normas trabalhistas no contrato de trabalho.

No que diz respeito à abordagem do problema, trata-se de pesquisa qualitativa. Quanto ao objetivo geral, a pesquisa é exploratória, por se voltar à busca da interligação dos problemas suscitados, tornando-os explícitos com a análise sistemática de informações em face da realidade social.

O que diz respeito aos procedimentos técnicos que foram adotados, prevaleceu a pesquisa bibliográfica e documental, com base, principalmente, em livros, teses, artigos, legislação (Constitucional, infraconstitucional, súmulas e orientações jurisprudenciais), jurisprudências, sites, notícias e informações obtidas em fóruns e eventos.

Quanto ao referencial teórico, destaca-se, primeiramente, a utilização de diversas dissertações de mestrado, assim como teses de doutorados, revistas científica e periódicos qualificados. Utilizou-se também a doutrina nacional e estrangeira, assim como legislações e jurisprudências.

Definição jurídica de princípios

O estudo dos princípios remete a ideia de início, causa primeira ou até mesmo base para alguma coisa.

A palavra “carrega consigo a força do significado de proposição fundamental. E é nessa acepção que ela foi incorporada por distintas formas de produção cultural dos seres humanos, inclusive o Direito[1]”.

No âmbito jurídico, há uma análise dos institutos, normas e princípios, que se fundamentam em modelos de conduta e organização, correspondendo a fenômenos que poderiam ser designados como dever ser[2].

A partir desta ideia de organização trazida por Kelsen, têm-se os princípios, a função fundamental de entender o cenário jurídico, aplicando-se como diretrizes essenciais.

(...) para a ciência do Direito os princípios conceituam-se como proposições fundamentais que informam a compreensão do fenômeno jurídico. São diretrizes centrais que se inferem de um sistema jurídico e que, após inferidas, a ele se reportam, informando-o[3].

Se não bastasse, os princípios no âmbito trabalhista relacionam-se inclusive com a ideia de justiça, ora que “são os princípios a razão de ser da justiça do trabalho, não por ser imparcial, mas por ser justa, e que garante, de forma sublime, a igualdade ficta entre empregador e empregado, apesar da disparidade econômica[4]”.

No direito brasileiro, a Constituição da República, na redação do artigo 1º, traz os fundamentos do Estado Democrático, garantindo exercício dos Direitos Fundamentais na esfera de cumprimento de um verdadeiro Estado Democrático de Direito:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V - o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição[5].

Evidente que a dignidade da pessoa humana encontra-se amplamente positivada no atual ordenamento jurídico.

Ademais, a Constituição Brasileira o prevê como importante fundamento, visto que é por meio do trabalho que o ser humano é capaz de garantir suas condições básicas para a sua subsistência, além de movimentar a economia por meio do dinheiro empregado e decorrente do salário, devendo ser respeitada as condições mínimas de segurança contra transformações abusivas e que os posam os colocar em risco.

Nesta ótica, os princípios trabalhistas contribuem para a melhor interpretação da norma quanto as relações existentes entre empregador e empregado, tal como o artigo 1º, IV, da Constituição Federal.

Nota-se que os próprios fundamentos da Constituição Federal são exercidos por meio de diversos princípios que norteiam a garantia da aplicabilidade de todo o Direito do Trabalho. Estes princípios se fundamentam na razão da norma jurídica. Ou seja, é a origem, o início do Direito. Os princípios de Direito tem função de apontar a origem da norma jurídica, demonstrando as suas vertentes de proteção e segurança do homem quanto ser social, com base também nos limites que por eles existem.

Eles exercem absoluta importância no ordenamento jurídico, tendo em vista se tratar de normas que possuem determinada abstração, aplicáveis aos casos concretos e possuem até mesmo uma natureza estruturante.

Os princípios podem ser classificado pelo grau de abstração, pela determinabilidade, pelo caráter de fundamentalidade e pela proximidade com o Direito, conforme discorre Canotilho:

a) o grau de abstracção: os princípios são normas com um grau de abstracção relativamente elevado; de modo diverso, as regras possuem uma abstracção relativamente reduzida; b) Grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto: os princípios, por serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretizadoras (do legislador, do juiz), enquanto as regras são susceptíveis de aplicação directa; c) Carácter de fundamentalidade no sistema de fontes de direito: os princípios são normas de natureza estruturante ou com um papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes (ex.: princípios constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (ex.: princípio do Estado de Direito); d) ‘Proximidade da idéia de direito’: os princípios são “standards” juridicamente vinculantes radicados nas exigências de “justiça” (Dworkin) ou na "ideia de direito” (Larenz)[6].

Os princípios possuem um caráter normativo essencial e basilar em todo o ordenamento jurídico, exercendo função informativa e normativa, conforme traduz o artigo 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB): “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito[7]”.

Eles possuem função informativa, normativa e interpretativa na compreensão da dogmática jurídica.  Constituem respaldo para o Direito, valendo-se como fonte inspiradora.

Se não bastasse, os princípios apontam a origem da norma jurídica, evidenciando quais são as vertentes de proteção e segurança do homem, com base também nos limites que por eles existem.

Ante a relevância no Direito do Trabalho, apontam-se os seguintes princípios norteadores e garantidores dos fundamentos e objetivos constitucionais nas relações entre empregador e empregado, decorrentes da Constituição, da CLT, normas infraconstitucionais, súmulas e orientações jurisprudenciais: princípio da proteção, princípio do In Dúbio Pro Operario, princípio da norma mais favorável, princípio da irrenunciabilidade de Direitos Trabalhistas, princípio da condição mais benéfica, princípio da continuidade das relações de emprego, princípio da irrenunciabilidade e o princípio da primazia da realidade.

Primeiramente, inicia-se a análise apontando a conceituação acerca do princípio da “proteção”, ante a sua relevância no direito do trabalho.

À luz deste princípio, busca-se proporcionar uma forma de compensação da superioridade econômica do empregador em relação ao empregado, dando a este último uma posição mais confortável no ordenamento jurídico.  Busca-se “assegurar superioridade jurídica do empregado em razão de sua inferioridade econômica[8]”.

O princípio da norma mais favorável tem aplicação parecida com anterior, cabendo ao legislador a faculdade de levar em consideração que na elaboração das normas jurídicas, sempre deverá dispor no sentido de aperfeiçoar o sistema normativo existente, contribuindo com legislação no favorecimento do trabalhador. Havendo duas ou mais normas que se aplique a determinado caso concreto, utiliza-se aquela que melhor atenda aos interesses do trabalhador, mesmo que não se respeite a hierarquia normativa Constitucional.

Em relação ao princípio da Condição mais Benéfica, também denominado como princípio da cláusula mais vantajosa, dispõe que as vantagens previstas no contrato de trabalho devem ser entendidas como conquistas já adquirida ao trabalhador, não se aceitando modificação para um estado pior.

O princípio da continuidade da relação de emprego demonstra que o contrato de trabalho terá validade por tempo indeterminado, havendo uma continuidade nesta relação laboral.

O princípio da irrenunciabilidade de Direitos Trabalhistas dispõe que o trabalhador jamais poderá dispor de seus direitos trabalhistas. Todavia, a sua efetivação não é absoluta, tendo em vista que em juízo, no caso de eventual audiência, o trabalhador poderá transigir ou renunciar determinados direitos trabalhistas por meio de um acordo, desde que a indisponibilidade não seja absoluta.

O princípio da primazia da realidade diz que o contrato de trabalho deve ser firmado mediante a realidade e não sobre um prisma fraudulento.

Conclusões

Diante destas breves considerações, nota-se que os princípios estão relacionados aos regramentos básicos que regulam as bases de todo o ordenamento jurídico, exercendo função informativa e normativa, conforme traduz os artigos 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), 126 do Código de Processo Civil de 1973 e 8º da CLT.

Muito embora eles possam se alterar ao longo dos anos, os princípios possuem função estabilizadora, evitando a ocorrência de mudanças bruscas que causem impacto negativo no ordenamento jurídico objetivo.

Os princípios sempre possuíram bases na Dignidade da Pessoa Humana, no caso aplicado nas relações laborais, além da promoção do homem, a efetividade do Direito, constituindo um liame de respeito e proteção as necessidades básicas do ser humano.

Na esfera do Direito do Trabalho, tal princípio exerce a função garantidora e protecionista dos demais princípios que dele se originam.

Assim, ao falar na proteção às garantias trabalhistas, remete-se também à promoção da dignidade humana. A partir da Constituição Federal findou-se a ideia de equilíbrio entre as partes participantes de uma relação de trabalho, diferente do que acontece, ante a evidente desigualdade. “Os princípios regulam e dão equilíbrio à relação de emprego, garantindo igualdade ficta entre às partes[9]”.

A aplicação e efetivação da Dignidade da pessoa humana corroboram para que o ser humano seja visto a partir do eixo principal do universo jurídico. Assim, as relações de trabalho não podem ser tratadas como um simples contrato de natureza civil.

Assim, a partir do texto Constitucional, emerge-se a necessidade de existir princípios próprios no âmbito trabalhista para que se preserve um dos fundamentos da Constituição da República que é o do trabalho.


Notas e Referências:

[1] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 14. ed. São Paulo: LTr, 2015, p. 189.

[2] KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1987, p. 96.

[3] DELGADO, Maurício Godinho. op. cit. p. 191-192.

[4] LITHOLDO, Viviane Patrícia Scucuglia. Os Princípios do Direito do Trabalho: Diretrizes Para uma Decisão Justa e Dinâmica. 2012. 129 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Centro Universitário Eurípedes de Marília, Marília, 2012, p. 53.

[5] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 20 out. 2015.

[6] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 7. ed., Coimbra: Almedina, 2008, p. 1145-1146.

[7] BRASIL. Decreto-lei n. 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm>. Acesso em: 15 nov. 2015.

[8] FOLCH, Alejandro Gallart. Derecho espanõl del trabajo.Barcelona:Labor,1936, p. 16.

[9] LITHOLDO, Viviane Patrícia Scucuglia. op. cit., p. 56.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 20 mai. 2017.

______. Decreto-lei n. 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm>. Acesso em: 20 mai. 2017.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 7. ed., Coimbra: Almedina, 2008.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 14. ed. São Paulo: LTr, 2015.

FOLCH, Alejandro Gallart. Derecho espanõl del trabajo.Barcelona:Labor,1936.

KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1987.

LITHOLDO, Viviane Patrícia Scucuglia. Os Princípios do Direito do Trabalho: Diretrizes Para uma Decisão Justa e Dinâmica. 2012. 129 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Centro Universitário Eurípedes de Marília, Marília, 2012.

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 25.ed. São Paulo: Atlas, 2011.

PEREIRA, Leone. Direito do Trabalho. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.


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