Um novo nome para o Sistema Econômico e a concorrência como fator de equilíbrio – Por João Carlos Adalberto Zolandeck

07/09/2017

A reflexão sobre um novo nome para designar o sistema econômico cujos meios de produção estão alocados na propriedade privada decorre da ideia de Galbraith, lançada na obra a economia das fraudes inocentes. Ao lado desse pensamento, caberá uma ponderação feita por Zingales ao tratar da concorrência na obra um capitalismo para o povo.

Sabe-se que a lógica econômica gira em torno do comportamento, do consumo, cuja estrutura envolve as pessoas (necessidades e desejos), a empresa (bens e serviços), o preço e a renda.

No aspecto político, independentemente da teoria econômica adotada pelo leitor, mais para a esquerda - Marxismo, centro esquerda - Institucionalismo, centro - Keynes, direita - Economia Neoclássica e Nova Economia Institucional / NEI ou mais para a direita - Escola Austríaca, se é que podemos adotar esse critério, quer-se aqui ponderar sobre o pensamento de Galbraith, ao afirmar que o consumidor não estaria de fato no centro do poder econômico.

Galbraith diz que o sistema econômico praticado em países economicamente adiantados, salvo exceções, confere o mais alto poder econômico àqueles que dominam as indústrias, aos proprietários de terras e aos que controlam os recursos financeiros, atribuindo destaque aos administradores e não aos donos do capital.

Diz que o termo capitalismo estava desgastado e foi substituído por sistema de mercado. Como causas da mudança de terminologia, esclarece que, na Europa, a palavra capitalismo evocava o poder da propriedade e a magnitude da submissão dos trabalhadores, sugerindo revolução.

Afirma que, nos Estados Unidos, no século XIX, a conotação era diferente, mas negativa igualmente. Significava exploração nos preços e nos custos. Havia percepção de monopólio ou quase monopólico, e traz como exemplos John D. Rockefeller (petróleo), Carnegie (aço), Duke (tabaco), Ferrovia e Bancos (J. P. Morgan).

Destaca, ainda, a entrada em vigor da Lei Sherman Antitruste, que visava prevenir e punir atitudes monopolistas; o aparente perigo de falência geral em Wall Street, diante da retração da liquidez do mercado, onde o capitalismo foi colocado em xeque e interpretado como explorador; a implantação do Fed (Federal Reserve System) em 1913 como força controladora da comunidade financeira e a Comissão Federal de Comércio, também com atribuições de regulação; a quebra da bolsa (crash) em 1929; a grande depressão que durou 10 longos anos, e como consequência a fragilização do capitalismo, a regulação, controles legais e judiciais para os primeiros anos do século XX.

A partir daí discorre sobre o pacto econômico e social _ New Deal (Roosevelt) e sobre a busca de uma nova designação para o sistema econômico aqui estudado, acabando por concluir por um nome sem passado: sistema de mercado.

O Autor refere a importância histórica dos mercados desde a cunhagem das moedas (Lídios) no século VIII A.C. Em todos os países, inclusive na União Soviética, os mercados desempenham um papel importante.

Segundo o autor, para o estudo convencional da economia defende-se a soberania do consumidor como matriz do sistema econômico, diante do poder de decidir sobre o que deveria ser produzido, comprado e vendido. Indaga-se: a empresa estaria subordinada?

Ao mesmo tempo, revela a força por detrás da manipulação do consumidor em decorrência da publicidade e dos apelos pela mídia dirigida, segundo ele, uma agressão ao mercado e ao capitalismo. Essa realidade seria decorrente do aumento do poder da empresa e de sua capacidade para influenciar e controlar o consumidor, além de afetar a concorrência, com o emprego de práticas voltadas ao monopólio e oligopólio.

Para o mercado não há pessoas ou firmas dominantes, pois o mercado é impessoal, como diz o autor, uma fraude não de todo inocente, pois se  submete a manipulações especializadas e abrangentes. Essa é a fraude.

Em decorrência desses postulados e outros fundamentos, Galbraith  dá outro nome ao sistema econômico: sistema empresarial.  A sua posição decorre da presunção de que a empresa moderna se constitui de uma força dominante na economia atual, sobretudo nos Estados Unidos, mas a referência leniente ao mercado ainda parece melhor.

Em síntese, Galbraith esclarece que o termo capitalismo na Economia Americana significava exploração nos preços e custos. Discorre e traz exemplos de monopólio ou quase monopólio, para concluir com o novo nome do sistema: Sistema de Mercado, nome vago, sem preconceitos, portanto, aceito.

Fala sobre regulação e sobre a criação do Fed. Percorre pelo Crash (quebra), pelos 10 anos de depressão, e pelo novo pacto econômico social (New Deal).

Impõe críticas ao sistema de mercado diante das manipulações a que se sujeita, essa é a fraude segundo o autor, que afeta a soberania do consumidor, que é a base do sistema de mercado, por lhe reconhecer soberania, mas essa é uma realidade apenas aparente.  Finaliza com a ideia de que há outra força dominante, sobretudo nos Estados Unidos, e a designa, como já mencionado, de sistema empresarial.

Desse modo, Galbraith dá um novo nome ao sistema econômico que tem sua base na iniciativa privada, colocando a empresa no centro[1].

Tem-se percebido, não apenas nos Estados Unidos, mas também no Brasil, algumas empresas muito próximas do poder, o que traz consequencias gravíssimas ao mercado e à concorrência por caracterizar o chamado capitalismo de compadrio, expressão usada por Zingales.

A concorrência é a palavra chave para o equilíbrio do sistema econômico de mercado, com o que também concordou Galbraith, que chega a afirmar que é mito pensar em dois setores (público e privado), diante estreita e predatória relação entre a empresa, grandes corporações e o poder público[2].

Nesse ponto, segundo Zingales, um sistema competitivo de livre mercado possibilita três situações: a concorrência limita a possibilidade de lucros extraordinários, portanto, limita a desigualdade de renda; a concorrência garante acesso facilitado à inovação; a concorrência cria pressão para eficiência, facilitando a meritocracia; a concorrência também proporciona aos consumidores a liberdade de escolha.

Tais pressupostos não são análogos em uma economia socialista ou em uma economia em que o autor chama de capitalismo de compadrio. Tanto no sistema de economia socialista, como no sistema capitalista de compadrio os negócios controlam o processo político, acabando com a concorrência e diminuindo a liberdade. Sem concorrência, a vida econômica se torna injusta, favorecendo aqueles bem relacionados e próximos do poder[3].

No artigo dessa coluna publicado em 17/08/2017, sustentou-se que a economia brasileira é caracterizada como uma economia de mercado em decorrência do disposto no artigo 170 da Constituição da República. É a livre iniciativa que define uma economia de mercado, e a livre concorrência dá sustentação à economia.

Todavia, para além da concorrência, o funcionamento do mercado liberal, como diz Paula Forgione, gera disfunções, falhas e externalidades negativas, razão pela qual a economia de mercado também deve ter uma pauta voltada à proteção dos direitos sociais dos trabalhadores e dos direitos dos consumidores. São rearranjos do direito emprestados ao mercado a partir do status das partes, agrupando-se, portanto, as interações segundo os sujeitos da relação contratual[4].

Assim, parte-se do pressuposto de que todo o sistema econômico, em sua estrutura, suas variações e complexidade não é perfeito. Um sistema de mercado onde funcionem os mecanismos de proteção dos direitos sociais, e os contratos segundo os seus sujeitos, com ênfase na salvaguarda da concorrência favorecerá o desenvolvimento, desafiando a empresa a adotar práticas de integridade e o consumidor a aguçar sua racionalidade em prol do bem comum.


Notas e Referências:

[1] GALBRAITH, John Kenneth. A economia das fraudes inocentes: verdades para o nosso tempo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004, p. 18-25.

[2] GALBRAITH, John Kenneth. A economia das fraudes inocentes: verdades para o nosso tempo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004, p. 25;52.

[3] ZINGALES, Luigi. Um capitalismo para o povo: reencontrando a chave da prosperidade. São Paulo: Bei Comunicações, 2015, p. 24-25.

[4] FORGIONI, Paula A. Contratos empresariais: teoria geral e aplicação. 2ª. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 41-44.


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