UM INQUÉRIO POLICIAL CONSTRANGEDOR!!!

26/11/2019

Entendemos ser um grande equívoco, sob o aspecto técnico, a requisição deste inquérito policial à Polícia Federal. Politicamente esta requisição é um desastre e demonstra um certo desespero.

Conforme se vê da notícia abaixo, o Ministério Público Federal, através de sua PGR, requisitou a instauração de inquérito policial à Polícia Federal. Este inquérito teria como objetivo apurar a conduta do porteiro do “Condomínio Vivendas da Barra” por ter prestado depoimento à polícia civil do E.R.J.

Em tal oportunidade o porteiro disse que, a pedido de um partícipe dos homicídios da vereadora Marielle e seu motorista Anderson, ligou para a casa 58 e que a voz do “seu Jair” teria autorizado a entrada desta pessoa. Matéria amplamente noticiada pela imprensa.

No referido ofício de requisição do inquérito policial, a P.G.R. teria sugerido as seguintes condutas delituosas: falsidade testemunhal, denunciação caluniosa e obstrução de justiça (sic).

No meu entendimento, são muitos os equívocos do Ministério Público Federal. Vamos a eles de forma tópica.

Antes, porém, uma advertência. Tais crimes só admitem a forma dolosa e, no caso presente, não há qualquer indício de que o porteiro possa ter agido dolosamente !!!

1) O crime de falsidade testemunhal somente pode ser investigado quando o juiz, ao apreciar as provas produzidas no processo, entender que o depoimento não é verdadeiro, conforme dispõe o art. 211 do Cod. Proc. Penal.

Uma investigação antes deste momento processual importaria colocar em dúvida uma prova que ainda será valorada pelo juiz, em confronto com as demais provas existentes naquele processo.

Assim, descabe questionar prematuramente uma prova que será valorada quando o juiz julgar o mérito de uma futura pretensão punitiva estatal.
Ademais, naquele processo, a testemunha pode se retratar e ficar impune.

2) A atribuição da Polícia Federal está ligada à competência da Justiça Federal, prevista na Constituição da República.

Pelo que dispõem os vários incisos do art.109 da Constituição, a competência da Justiça Federal tem como critério o bem jurídico tutelado pela norma penal incriminadora e não a qualidade do sujeito passivo da conduta supostamente delituosa.

Importante notar, que, no caso concreto, nada tem a ver com o exercício do cargo de presidente da república. Aliás, na época do homicídio, o atual presidente era deputado federal. Cuida-se de uma "questão" particular do atual presidente.

Julgamos descabidas algumas interpretações absolutamente elásticas, que têm o objetivo de ampliar a competência da Justiça Federal, que é “especial” em face da competência da Justiça Estadual.

3) Por outro lado, os crimes de denunciação caluniosa e o tal delito de “obstrução de justiça” (sic) são infrações penais contra a administração da justiça, no caso, da justiça do Estado do Rio de Janeiro.

4) Por derradeiro, pode parecer à opinião pública que se deseja prejudicar uma investigação que está sendo realizada pela polícia estadual, usando a Polícia Federal para constranger uma testemunha, mormente quando tal polícia é vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança.

Relevante notar que todos, neste caso, estão submetidos hierarquicamente ao Presidente da República, interessado na investigação (Ministro da Justiça, Polícia Federal, etc).

5) Finalmente, se nos afigura um total absurdo jurídico falar-se, no caso do depoimento do porteiro, de algum crime contra a segurança nacional!!!

Ainda há muitos saudosistas da ditadura militar em nosso país ... É uma piada pensar que este depoimento possa colocar em risco a segurança do país.

O Brasil não se confunde com a pessoa de seu controvertido presidente !!!

Incriminar um presidente da república não é crime contra a segurança nacional, podendo ser até um dever para os bons cidadãos. Mesmo quando falsa tal incriminação, a segurança de um país não é minimamente afetada.

Como disse, por várias vezes, o Ministro Marco Aurélio Mello do S.T.F., em tempo de crise, é de todo rigor o respeito à ordem jurídica.

A mais relevante atribuição constitucional do Ministério Público é justamente a de pugnar pela correta aplicação das leis e lutar pelo Estado Democrático de Direito.

Como se sabe, mas anda meio esquecido, o Ministério Público deve apenas servidão às nossas leis e não ao governante da ocasião ...

 

 

Vejam também:

https://www.brasil247.com/…/pf-vai-investigar-se-porteiro-c…

https://www.diariodocentrodomundo.com.br/…/procuradoria-pe…/

 

Imagem Ilustrativa do Post: policial // Foto de: cocoparisienne // Sem alterações

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