Um fantasma bate à nossa porta

03/05/2017

Por Ney Bello - 03/05/2017

O mundo tornou-se um lugar estranho! O Brasil tornou-se um lugar estranho! Ou talvez sempre tenha sido assim e, de tempos em tempos, Hades saia do subterrâneo esquecido para rondar a terra e espalhar o mal.

Já não falo nem mesmo do inusitado fato de um neonazista palestrar em um clube hebraico. Falo do que causa maior estranheza: fazê-lo sob aplausos, sobretudo quando diz que foi pai de uma mulher porque fraquejou ou ao dizer que negros quilombolas não servem nem para reproduzir.

Logo ali - no clube da comunidade religiosa de um povo que sofreu ações de extermínio exatamente por pensamentos e discursos como esse - a violenta intolerância pôde ser ouvida... e aplaudida!

Parece muito estranho que o neonazista brasileiro, sem cultura e sem história, tenha sido chamado de mito e aplaudido naquela sala. Vale lembrar que Goebbels também o foi, mas que lição podemos tomar desse fato?

Negros comparados a animais e pesados em arrobas da mesma maneira que judeus considerados lixo e escória - há não mais que 80 anos. Agora a fala se reproduz no Brasil sob aplausos.... e na Hebraica!

O que isso pode significar?

Um judeu que aplaude um discurso xenófobo e racista não tem cultura, não conhece a história, não faz ideia de seu próprio passado e não tem noção do que lhe acontecerá no futuro, acaso o discurso do orador torne-se hegemônico!

A manada ignorante segue o discurso do ódio não porque entenda a sua estrutura, mas porque não se vê inserido entre os odiados e se acha integrante do grupo superior, que se permite odiar.

Mais que isso: jovens egoístas seguem se imaginando melhores e desejando exterminar todos os que lhe ocupam espaços desejáveis, elegendo culpados de seu próprio infortúnio, sempre sem enxergar o presente, desconhecendo o passado e produzindo um futuro que, acaso advenha, só trará mais destruição para eles próprios.

Vivemos o desmoronamento da política e o discurso contra a corrupção traz nele embutido duas falácias que custarão caro à liberdade, à igualdade e à modernidade!

Primeiro, a ideia de que não há mais política e de que o espaço de controle social deve ser ocupado por outros jogadores do xadrez. Depois,  a certeza de que todos os outros males são menores que a corrupção.

Nessa ode terrível, o racista, o sexista, o intolerante ou o homicida de desiguais - e é isso que se prega na ideia Nazi - são melhores que os acusados de corrupção!

Logo, seria melhor ter no comando da sociedade aquele que quer subjugar negros e mulheres, prender homossexuais, não aceita as diferenças, aposta na violência e na indústria das armas e na supressão da igualdade moderna pela só razão de nunca ter sido posto à prova com verbas públicas.

O que o cego e ignorante social crê sem pensar é que é melhor exercer o ódio ao outro do que defender a permanência da igualdade, da liberdade e da tolerância. Todos os artigos do Código Penal valem menos do que a corrupção não provada, mas investigada. E no vácuo da política, aceita-se a intolerância e a supressão da liberdade.

Mas quem nos deu apenas a opção entre o político corrupto e o nazista contemporâneo?

E por qual razão, na contemporaneidade, o ódio ao outro voltou a ser uma opção?

A velha frase nordestina - que calha bem como antítese da exclusão social que se embute no discurso Nazi - talvez explique: "em tempo de farinha pouca meu pirão primeiro".

O atávico egoísmo que emerge da crise nos faz mesquinhos, nos cega e nos reduz a animais! Talvez menos que isso: animais não escravizam outros animais...

O avanço de um passado esquecido merece combate enérgico. O que paira sobre nossas vidas com uma oratória pobre, sem cultura, grotesca e risível traz em si uma patologia que animaliza, reduz, oprime e envergonha-nos para todo sempre como representantes da raça humana!


Ney Bello. . Ney Bello é escritor - Academia Maranhense de Letras. Desembargador Federal. . . .


Imagem Ilustrativa do Post: 2013_12_29_2_42_61025 // Foto de: justin lincoln // Sem alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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