TANATOLÓGICA TRAGÉDIA TRANSGÊNICA

20/07/2018

Coluna O Direito e a Sociedade de Consumo / Coordenador Marcos Catalan

Os avanços na seara da genética permitiram à humanidade detectar, isolar e reproduzir um sem número de genes e, ainda, permitiram o desenvolvimento da habilidade de fundi-los a outros organismos vivos criando seres até então desconhecidos pela perspectiva darwinista.

A mutação da técnica tornou-nos capazes de alterarmos aspectos hereditários ao nível genético.

Ao mesmo tempo, sujeitos aos desígnios da Fortuna – conhecida matriarca da Era da Incerteza –, parece impossível antever, em toda a sua complexidade, (a) que consequências tais práticas provocarão nos genomas receptores – a curto, médio e longo prazos – e em suas gerações futuras, (b) quais serão os efeitos na biologia e fisiologias humana e(ou) animal quando alimentados com transgênicos – o que pode ser objeto de especulação teórica nos mesmíssimos lapsos temporais que colorem o item anterior – ou, ainda, (c) como será a interação entre seres transgênicos e o meio ambiente que inexoravelmente os obrigará.

Aliás, entremeio a tantas tormentosas e turbulentos transtornos teoréticos, sequer sabemos, no mais das vezes, se os produtos ofertados nos supermercados ou restaurantes, bares, lanchonetes, quitandas e feiras orgânicas e, até mesmo – pasme estimado leitor –, farmácias e hospitais contém elementos transgênicos em alguma proporção.

Eis, aqui, explicitados, alguns dos debates trazidos à tona pela temática transgênica. Ao lado de muitos outros – como a sua íntima correlação com intoxicações provocadas pelo consumo, obviamente, indesejado, de agrotóxicos – temas que por algum tempo ocuparam a ordem do dia e que pareciam ter sido cobertos pela poeira do tempo de Chronos.

Por aqui, entretanto, ventos vindos de Brasília noticiam a iminente vulneração de direitos fundamentais – nas searas do consumo e ambiental e, em perspectiva mais ampla e de modo inconteste, da dignidade da pessoa humana e sua indelével força normativa – contida na potencial aprovação do Projeto de Lei Complementar 34/2015 em trâmite no Senado Federal e que visa a eliminar o símbolo de identificação de alimentos com notas transgênicas.

O tímido e diminuto “T”, escondido em vivaz triangulo amarelo, prestes a ser apagado de embalagens nas quais nem sempre chama a atenção do olhar, normalmente, desatento. Quem um dia haveria de imaginá-lo destravando as mãos ao impulsionar o movimento de dedos que tocar o teclado sem se deixarem levar pela torpeza ou pela truculência na construção de um texto que busca gritar ao mundo a necessidade de que não toquem neste “T”, pois, ao informar ele protege, tutela, abriga os que mais dele precisam.

Telas que se não fossem tão tenazmente trágicas, tenderiam a transitar pelos palcos de teratológico teatro.

Ainda movido pelo intraduzível tesão que retesa o corpo, ao mesmo tempo em que, permite escapar algumas das tantas taquicardias neuronais textualmente transcritas neste texto – e que, talvez, exijam futura tradução – sou tentado a afirmar que tal tanatológica tentativa transgressora de transformar em lei algo que não pode, constitucionalmente, sê-lo, traz à tona o transgênico tema aqui tratado.

Tentado, também, no pouco tempo contemplado a atar as palavras neste texto, a transformar em signos símbolos que ao serem significados pelo leitor permitirão a ele entender que na Terra, os transgênicos ocupam, aproximadamente, cem milhões de hectares, estando espalhados por diversos países em terrenos cultivados por cerca de quinze milhões de agricultores.

Tentado, ainda, a aqui transcrever que tais telúricos frutos transgênicos depois de colhidos, separados (ou não) processados, industrializados e consumidos, potencialmente são fonte de patologias. E mesmo que, todavia, muitos dos malefícios a eles atados, em tese, ainda não tenham sido cientificamente comprovados, por outro lado, também inexistem provas irrefutáveis de que o consumo de alimentos transgênicos não possa causar alergias, infertilidade, má-formação congênita, alterações no sistema imunológico, ataquem o coração ou provoquem incontáveis tumores.

E o Direito, que tem feito?

Infelizmente, nada mais que legitimar tais práticas, moldado, uma vez mais, pelo perverso movimento dialética impulsionado pelo Capital. Um bom indício desta assertiva consiste no fato de não termos encontrado uma só decisão nos tribunais brasileiros versando acerca dos potenciais efeitos deletérios provocados pelo consumo de transgênicos.

Violência e perversão que parecem, propositalmente, desprezar (a) o reconhecimento da normatividade dos princípios no Direito pátrio, (b) o correlato dever de levá-los à sério, densificando-os de modo escorreito, (c) a necessidade de pensar sistemicamente o Direito e respeitar a eficácia horizontal de direitos fundamentais lidos aqui em suas dimensões formal, material e prospectiva.

Sem isso, a cada dia revela-se menos otimista o conteúdo que poderá vir a informar a resposta para uma pergunta que não é meramente retórica e que busca saber qual haverá de ser o destino da humanidade quando alguns dos seus vivem como deuses?

 

 

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