Talvez uma das mais difíceis formas de conceituação da Sustentabilidade esteja na sua dimensão política. É mais simples visualizar o que é a Sustentabilidade na perspectiva jurídica, social, ambiental e econômica, no entanto, os diferentes níveis de articulação, o objeto, as finalidades e os mecanismos de viabilidade acerca da Sustentabilidade no seu significado político causa mais um mal-estar civilizatório em detrimento das esperanças de funcionamento territorial dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, por exemplo.
Toda adjetivação “verde” não parece sintetizar a matriz de significalidade ecológica da Sustentabilidade, especialmente nas estratégias políticas. Aliás, em vários de meus textos, o leitor e a leitora já perceberam que essa tônica posta na critica de tudo que se expressa como “verde” são apenas simulacros sobre a aceitação da Sustentabilidade como vetor de desenvolvimento e aperfeiçoamento das vidas no século XXI.
Parece que a reivindicação do “verde”, mesmo nos movimentos sociais, não consegue alterar as estruturas postas pela Modernidade e Pós-Modernidade sem que haja uma consequência direta na qual inviabiliza a ocorrência de seus programas e objetivos. Na verdade, e retomando a tradição Marxista, a ideologia[1] política verde sintetiza uma falsa crença da realidade e permite o seu uso para atender interesses diversos em face do sentido ecológico da Sustentabilidade.
Todos os argumentos que já expus são retomados para impulsionar alternativas cuja a pretensão é modificar as consciências e atitudes em prol do nosso Planeta Terra, dos ecossistemas que o compõem e da rede vital entre seres e ambientes os quais permite a simbiose necessária para a manutenção equilibrada das vidas.
Finitude do mundo natural, maior conexão de proximidade entre o Homem e a Natureza, os limites do crescimento econômico, a adoção de energias mais limpas e renováveis, a inspiração biocêntrica para tornar as relações humanas mais iguais e fraternas, o aumento da espiritualidade e sensibilidade provocadas pela união entre os seres vivos, a adoção de uma ética na qual considere a Terra como esse superorganismo vivo e, portanto, um “ser-próprio” – hipótese Gaia de Lovelock, por exemplo -, o movimento do Ecofeminismo, entre outros. Infelizmente, o pensamento político verde atomiza todas essas possibilidades como ideologias para manter determinados status – especialmente de partidos mais conservadores[2] - sem que haja sucesso na implementação de suas políticas como alternativas aos interesses vigentes.
A confusão já se inicia, em termos teóricos, entre Ecologismo e Ambientalismo. Qualquer pensamento político sério, comprometido com a Sustentabilidade, jamais deverá colocar ambas palavras numa “bacia semântica”, considera-las sinônimas. Essa atitude demonstra, ao se relembrar Dobson, num grave erro intelectual[3].
Nesse caso, o Ecologismo propugna uma verdadeira reviravolta de valores e atitudes em torno da relação entre o Home e a Natureza. A prevalência da cosmovisão europeia - de matriz antropocêntrica e racionalista em autores como Descartes, Bacon e Newton – já não é suficiente para mitigar os efeitos globalizatórios de uma crise ambiental[4]. Já o Ambientalismo ou Meioambientalismo traça uma perspectiva mais instrumental, ou seja, é possível diminuir os efeitos dessa intensa degradação aplicando os conhecimentos existentes e sem que haja qualquer mudança mais radical na dimensão dos valores existentes[5]. Em outras palavras, é mais fácil, sob o ângulo político, ser um liberal ou social a partir do Ambientalismo do que o Ecologismo[6].
Na verdade, ambas ideologias trazem perigosos excessos capaz de prejudicar uma visão mais equilibrada daquilo que sugere a dimensão ecológica da Sustentabilidade. É preciso ser franco: o compromisso da Sustentabilidade, não obstante todos os seus esforços, é assegurar, minimamente, uma vida digna para todos os seres. Essa é uma tarefa difícil, principalmente na seara humana, devidos às diferentes semânticas culturais e sociais que ocorrem nos territórios do mundo. Por esse motivo, segundo enfatizei no inicio deste texto, pensar num conceito operacional para a Sustentabilidade na sua dimensão política significa ir além das controvérsias ideológicas postas pelos partidos e movimentos verdes.
Não se trata, contudo, de elaborar um discurso universalista na qual impõe formas de conduta a serem adotadas, indistintamente, como soluções ambientais às misérias da insustentabilidade. Ao contrário, é somente a partir das relações territoriais que se visualiza, com maior precisão, o que pode ou não ser considerado, descrito, entendido e praticado como Sustentabilidade.
Apesar das respostas indicadas pelo Ambientalismo serem, num primeiro momento, mais satisfatórias aos problemas mundiais enfrentados em cada região da Terra, não significa que sua instrumentalidade racional seja o único horizonte possível de reverter ou mitigar os efeitos desastrosos deste incontrolável desejo por uma econômica com crescimento infinito e, ainda, confundida como indicador de progresso. Toda ideologia, mesmo “verde”, tem uma falsa crença da realidade. Por esse motivo, não altera nosso modus vivendi, mas apenas reinventa velhas ideias com uma estrutura, uma forma nova capaz de seduzir as pessoas ou, ainda, fazem com que todos acreditem nas suas promessas de uma vida melhor.
A ideologia do pensamento político “verde”, sob o ângulo do Ecologismo, pode trazer serias preocupações aos espaços democráticos. Na medida em que se reivindica a radical mudança de postura na relação do Homem com a Terra, nem sempre a Democracia pode representar a efetividade dessa pretensão. É muito fácil, especialmente quando se deseja prescrever condutas – em busca de uma “deontologia verde” – perceber que os espaços e diálogos democráticos são insatisfatórios para a concretização desse objetivo os quais podem aparecer nos programas e estatutos desses partidos políticos “verdes”. O autoritarismos, nesse caso, resolveria a controvérsia sem maiores desavenças.
Os excessos do Ambientalismo e Ecologismo, como se percebe, torna impraticável qualquer programa político dito “verde”. As distopias são muito evidentes para se deixar seduzir por discursos, por simulacros, os quais não conseguem traduzir a busca por esse meio termo, pelo equilíbrio na qual é a intenção da Sustentabilidade. Nesse caso, a Sustentabilidade continua “sem cara”, “sem território”, “sem identidade e identificação”. Essa sua aparência de um ente metafísico, puramente ideológico, dificulta, mais e mais, a viabilidade de seus compromissos expostos pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável – ODS.
É somente a partir do esclarecimento dado por aquilo que é fundamental à Sustentabilidade na sua face desenhada pelo Ecologismo – mesmo que se precise questionar os seus valores – que as estratégias políticas apresentadas pelos instrumentos do Ambientalismo desenvolverão novas utopias democráticas, reais, possíveis para se ter a coragem de criar o desejável à comunidade viva da Terra, desde o momento presente e sua perpetuação ao futuro. Nessa epifania, Ética e Política serão indissociáveis e indispensáveis para se eliminar as ações ideológicas, moralistas do Ecologismo e Ambientalismo como fundamentos de um simulacro à política partidária “verde”.
Notas e Referências
[1] STOPPINO, Mario. Ideologia. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCI, Nicola, PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. Tradução de Carmen C. Varriale, Gaetano Lo Mônaco, João Ferreira, Luís Guerreiro Pinto Cacais e Renzo Dini. 13. ed. Brasília: Editora da UnB, 2010, v. 1, p. 585.
[2] DOBSON, Andrew. Pensamiento político verde: una nueva ideología para el siglo XXI. Traducción de José Pedro Tosaus. Barcelona: Paidós Ibérica, 1997, p. 54.
[3] DOBSON, Andrew. Pensamiento político verde: una nueva ideología para el siglo XXI. p. 21.
[4] SAAVEDRA, Fernando Jaime Estenssoro. Medio ambiente e ideología: la discusión pública en Chile, 1992-2002. Santiago: Ariadna/Universidad de Santiago de Chile – USACH, 2009, p. 89.
[5] DOBSON, Andrew. Pensamiento político verde: una nueva ideología para el siglo XXI. p. 22.
[6] SAAVEDRA, Fernando Jaime Estenssoro. Medio ambiente e ideología: la discusión pública en Chile, 1992-2002. p. 90.
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