Despertar para a governança corporativa nas subsidiárias integrais é condição para dar estabilidade e continuidade aos negócios da controladora e da controlada, pois os objetivos das sociedades não podem estar subjugados aos interesses pessoais deste ou daquele agente.
A atribuição de critérios e princípios de governança é fundamental para dar transparência à gestão e às operações das controladas. Os conflitos entre agentes ou conflitos de agência no tipo multiorganizacional tendem a ser mais intensos, sendo indispensável dar tratamento adequado para situações-problema, de forma prévia e antecedente, aproveitando-se de momentos em que a cooperação mostra-se mais acentuada.
Os agentes, em uma organização complexa que envolve uma ou mais subsidiárias e o poder de controle em questões societárias, estão encartados em cada estatuto ou contrato social das respectivas sociedades de ações ou de pessoas, em pactos parassociais e influentes externos, destacando-se os acionistas ou sócios, de igual participação, majoritários ou minoritários, a diretoria geral e executiva, o conselho de administração, o conselho fiscal, a assembleia geral, a auditoria interna e a independente, entre outros coparticipantes em contratos específicos de participação e ou de colaboração.
Para efeito desta reflexão entende-se por subsidiária integral determinada empresa na qual todas as suas ações pertencem a outra, que a controla[i] (LSA, art. 251 e 252). O controle é exercido pelo titular de direitos de sócio (pessoa física ou jurídica) que lhe assegure, de modo permanente, a maioria dos votos nas deliberações da assembleia geral somados ao poder de eleger a maioria dos administradores da companhia, porém tal poder deve ser, de fato, utilizado para dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia (LSA, art. 116).[ii]
Em uma das primeiras oportunidades nesta coluna[iii], evidenciou-se a importância do instrumento vinculativo, contrato ou estatuto social, como documento fundamental para balizar a superação de momentos difíceis. Ressaltou-se, de igual forma, a importância da existência de acordos parassociais e os cuidados a serem tomados na elaboração dos conteúdos, cujo raciocínio também se aplica para o estabelecimento de um plano de governança sob medida e eficiente, idealizado para o tipo específico de organização.
Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa — IBGC, a Governança corporativa “é o sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais partes interessadas”.[iv]
Lembre-se que os valores e princípios que envolvem o sistema de governança devem ser implantados na sociedade controladora, pois a subsidiária é um espelho daquela. Problema maior advém quando os interesses da controlada confrontam ou tendem a se sobrepor aos interesses da controladora. É aqui que, na prática, deve-se primar pela propagação dos efeitos do sistema de governança para todas as sociedades controladas, a partir de uma base de integração subministrada pela controladora, que assume, invariavelmente, os contornos de uma holding.
É este aspecto o ponto fulcral. Todas as ações e deliberações sensíveis das sociedades controladas devem ser objeto de deliberação primária na sociedade controladora. Tome-se, por exemplo, a Assembleia Geral Ordinária de apresentação e aprovação de contas do administrador em uma determinada sociedade anônima, aberta ou fechada. Nesta hipótese, a sociedade controladora, que detém a totalidade das ações da controlada (por isso, subsidiária integral), deve deliberar previamente, em conformidade com o estatuto ou contrato social dela própria, como votará na AGO da controlada, documentando o processo decisório e as decisões de modo particularizado e expresso, evitando-se nulidades.
Como visto, os temas mais intrigantes das subsidiárias possuem íntima relação com a forma com que a subsidiária é gerenciada/administrada, pois o poder-dever do administrador deverá estar sempre orientado pelas diretrizes da sociedade controladora, prevenindo quanto aos atos desviantes, cuja consequência é a atribuição de responsabilidade pessoal.
A atenção deve ser redobrada quando a diretoria das subsidiárias é formada por apenas parte dos sócios quotistas ou acionistas da controladora e lhes falte um prévio acordo ou código de conduta de origem. Este cenário certamente levará a um ambiente desagregador e de desconfiança, nada, portanto, favorável aos negócios, hipótese em que se deve atentar para a contínua incorporação de boas práticas de governança corporativa, para dar atendimento a princípios básicos e recomendações objetivas.
Na linguagem do IBGC há que se alinhar os “interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor econômico de longo prazo da organização, facilitando seu acesso a recursos e contribuindo para a qualidade da gestão da organização, sua longevidade e o bem comum”.
Há carência de estudos sobre governança aplicada a participações societárias ou governança de subsidiárias, segundo pesquisas realizadas no sistema Scientific Periodicals Eletronic Library (Speel), revelando-se fundamental a compreensão das relações estabelecidas entre a holding e suas controladas. É neste contexto que caberá à sociedade-mãe estabelecer mecanismos e instrumentos de monitoramento, sempre de modo particularizado, objetivando-se criar um modelo de base relacional que permita a identificação de fatores críticos e a mitigação dos possíveis conflitos de agência, a partir de uma estrutura de controle que contemple políticas, diretrizes e orientações estratégicas.[v]
Conclui-se com a perspectiva de contribuir para com o aprimoramento dos sistemas de governança, aplicáveis às relações em cuja estrutura agregue-se uma subsidiária integral ou um conjunto de subsidiárias. A cooperação entre os agentes certamente encontrará espaço no modelo que proponha o alinhamento entre os critérios de monitoramento cientificamente aceitos e balizadores do comportamento dos agentes, as boas práticas e os incentivos, em cujo conteúdo é possível estimular a mudança comportamental e cultural da organização, a ponto de surgirem barreiras naturais preventivas ao abuso do poder de controle e ao desmoronamento das relações, repercutindo sobremaneira em externalidades positivas, pois uma organização não se esvazia em si, mas, ao contrário e por excelência, diferencia-se pelo exemplo.
Notas e Referências
[i]Art. 251. A companhia pode ser constituída, mediante escritura pública, tendo como único acionista sociedade brasileira.
§1º A sociedade que subscrever em bens o capital de subsidiária integral deverá aprovar o laudo de avaliação de que trata o artigo 8º, respondendo nos termos do § 6º do artigo 8º e do artigo 10 e seu parágrafo único.
§2º A companhia pode ser convertida em subsidiária integral mediante aquisição, por sociedade brasileira, de todas as suas ações, ou nos termos do artigo 252.
Art. 252. A incorporação de todas as ações do capital social ao patrimônio de outra companhia brasileira, para convertê-la em subsidiária integral, será submetida à deliberação da assembleia-geral das duas companhias mediante protocolo e justificação, nos termos dos artigos 224 e 225.
[ii]Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa, natural ou jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que:
a) é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, a maioria dos votos nas deliberações da assembleia-geral e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia; e
b) usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia.
Parágrafo único. O acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender.
Art. 116-A. O acionista controlador da companhia aberta e os acionistas, ou grupo de acionistas, que elegerem membro do conselho de administração ou membro do conselho fiscal, deverão informar imediatamente as modificações em sua posição acionária na companhia à Comissão de Valores Mobiliários e às Bolsas de Valores ou entidades do mercado de balcão organizado nas quais os valores mobiliários de emissão da companhia estejam admitidos à negociação, nas condições e na forma determinadas pela Comissão de Valores Mobiliários.
[iii]ZOLANDECK, João Carlos Adalberto. A empresa, o ato constitutivo e os cuidados na origem para superação de momentos difíceis. Disponível em: <https://emporiododireito.com.br/leitura/a-empresa-o-ato-constitutivo-e-os-cuidados-na-origem-para-superacao-de-momentos-dificeis-por-joao-carlos-adalberto-zolandeck.>Acesso em: 28 out. 2019
[iv] IBGC. Disponível em: <https://www.ibgc.org.br/conhecimento/governanca-corporativa.>Acesso em: 28 out. 2019.
[v] PASSAGLIA Luiz Fernando e ROCHA-PINTO Sandra Regina da. Governança de participação societária: Fatores críticos para a redução do conflito de agência entre holding e controladas Disponível em: <file:///C:/Users/joaocarlos/Downloads/3417-13626-2-PB.pdf.>Acesso em: 28 out. 2019.
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