Subjetividade objetiva  

10/06/2018

 

O método científico foi desenvolvido com base em algumas premissas básicas, como a observação dos fenômenos, a experimentação e a reprodutibilidade dessa mesma experimentação por terceiros, reprodutibilidade a qual conferiria objetividade à ciência. Assim, o método científico se baseia na possibilidade de repetição de uma experiência em qualquer lugar, por qualquer pessoa; lastreia-se, portanto, na objetividade, que deveria ser independente do sujeito, da pessoa do cientista, de modo que a ciência não seja meramente subjetiva, vinculada à subjetividade.

O método científico está ligado à bifurcação cartesiana que sustenta haver dois mundos ontologicamente distintos, o da subjetividade, o mundo qualitativo, e o da objetividade, o mundo quantitativo, independentes um do outro. Contudo, com a nova física, notadamente após o princípio da incerteza, essa noção de objetividade ficou prejudicada, porque no mundo da máxima precisão não existe propriamente uma objetividade, uma vez que o sujeito integra uma unidade ontológica com o objeto durante a observação quântica, significando que não existe objetividade desvinculada do sujeito. E considerando que o mundo está em constante movimento, sem falar no caráter meramente probabilístico das medições quânticas, pelo que o resultado somente é duplicável pela proximidade estatística, é impossível repetir qualquer operação quântica, demonstrando a verdade do que já havia sido constatado por Heráclito, “ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio”, ainda que essa verdade seja apenas material, pela possibilidade de repetição no âmbito da unidade mental ou ideal.

Em última análise, destarte, a objetividade científica materialista se tornou um mito que não pode ser comprovado. Ressalte-se que uso, nesse momento, a palavra “mito” em termos pejorativos, porque o mito original era uma visão científica de mundo. Nesse sentido negativo também o darwinismo é um mito, porque não provadas suas principais hipóteses (não houve tempo para uma evolução aleatória e não há espécies intermediárias), como são a psicanálise e as supostas descobertas de Freud. Sobre o último ponto, estou lendo “Jung e a Construção da Psicologia Moderna – O Sonho de uma Ciência”, de Sonu Shamdasani, que aborda a formação da psicologia desde seus princípios filosóficos até as divergências entre os primeiros teóricos, demonstrando que uma lenda se formou em torno de Freud, o que implicou no abandono da realidade, superestimando o trabalho do chamado pai da psicanálise, em detrimento da verdade histórica e da melhor ciência.

Se a objetividade é um mito, o que resta é a subjetividade, objeto de estudo da psicologia, cabendo à Ciência, portanto, a busca da subjetividade objetiva. Por esse motivo, minha pesquisa tem como título do primeiro capítulo “O conceito de ciência”, com a declaração de que “Ciência é conhecimento de Deus”, seguida da imediata citação do primeiro capítulo do Evangelho de João, pela associação dos conceitos Logos, Verbo, Razão e Deus.

A Ciência está, pois, diretamente ligada à Teologia, à Metafísica, como já havia reconhecido o primeiro grande cientista ocidental, Aristóteles. O capítulo “O conceito de ciência” é desenvolvido sustentando a unidade física do mundo, segundo a proposta de David Bohm, sendo exigida na Ciência também uma unidade filosófica e psíquica. E daí passa-se à importância da questão da consciência, ligada à psique e à subjetividade, como fundamento do conhecimento científico, importância que também é sustentada por Jung, ao dizer a psicologia é o assunto íntimo de qualquer ciência, e que apenas por meio da psicologia os demais ramos do conhecimento científico podem alcançar sua plenitude. Não é por acaso que no Templo de Apolo, em Delfos, constava a expressão “Conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo”.

Explica-se, portanto, a dificuldade de compreensão da profundidade do meu trabalho, porque ele se inicia negando a autoridade científica contemporânea, declarando que a academia, em seus fundamentos, é cega, está apenas tateando a Verdade, na medida em que Direito, Física e Religião são uma só realidade científica. A fala de Jesus continua atual “Ai de vós, legistas, porque tomastes a chave da ciência! Vós mesmos não entrastes e impedistes os que queriam entrar!” (Lc 11, 25).

A filosofia e a ciência ocidentais chegaram ao seu limite, e por isso é necessária uma revisão geral dos conceitos, iniciando-se pela própria definição do que seja Ciência, que deve ser vinculada à correta subjetividade, ao conhecimento do único Sujeito, Deus, a Uniplurissubjetividade que inclui todas as subjetividades, a unidade da consciência que permite alcançar a subjetividade objetiva.

Os principais e melhores momentos da vida são subjetivos, não podem ser repetidos, porque representam acontecimentos únicos. A origem da vida não é reproduzível, a concepção de qualquer um de nós e nosso nascimento não são repetíveis, os bons momentos e os maus momentos, quando realmente aprendemos e amadurecemos, são os que têm a máxima importância na vida das pessoas e não são reproduzíveis, não são “científicos”. Mesmo o instante da descoberta científica ocorre dentro do investigador, é um momento único, e subjetivo.

A História é toda feita de eventos únicos, o Dilúvio, o Êxodo, a Ressurreição de Cristo, a Revolução Francesa, o assassinato de Francisco Ferdinando, o 11 de setembro, incluindo aqueles ligados ao desenvolvimento científico, as descobertas de Galileu, Newton e Einstein, ligadas às respectivas subjetividades, que se mostraram, em maior ou menor grau, até certo ponto, objetivas, quando o mundo subjetivo de determinadas pessoas se tornou compartilhado, e objetivo.

A objetividade científica meramente matemática, portanto, além de ser falsa, ignora os eventos mais relevantes das vidas das pessoas, e retirou o sentido da vida humana. Assim, a objetividade só existe porque há subjetividade.

Passando à subjetividade, portanto, a questão fundamental é definir qual a correta subjetividade, a que não é solipsista, que não representa um niilismo, ou seja, a subjetividade que pode ser compartilhada em sentido coletivo. Essa subjetividade é a dos bons sujeitos, dos grandes líderes da humanidade, que tiveram comportamento exemplar, ainda que em determinado campo da vida, que pode ser reproduzido. A subjetividade objetiva, destarte, se refere aos exemplos de humanidade que devem ser seguidos, especialmente o de Jesus Cristo, porque é a manifestação objetiva da própria humanidade, o único que atingiu a plenitude humana, de forma objetiva, independentemente do tempo ou do espaço, Jesus Cristo é a própria humanidade em pessoa, em unidade humana, psíquica, lógica, histórica, física e normativa.

A subjetividade objetiva se refere à cosmovisão inclusiva de um grande sujeito, de alguém que reflete o único Sujeito na vida comunitária, está vinculada à visão daquele que é autenticamente imagem e semelhança de Deus, o Logos, o que encarna o Espírito humano em sua vida cotidiana, porque sua ordem interna é superior à aparente desordem externa do mundo, sua cosmovisão é adequada ao cosmos, à verdadeira ordem externa, que para ele é também interna.

A verdadeira ordem é encontrada pelo sujeito em suas ideias e pensamentos, inicialmente porque ele crê na existência da ordem, ele presume uma ordem que seja ao mesmo tempo interna e externa, na qual ele esteja incluído, como Jesus chegou a dizer: “Eu e o Pai somos um”. Para ver essa ordem é preciso, antes, nela crer, é necessário crer para ver, o que ocorre com os grandes cientistas, que creem, a partir do que já conhecem, e então descobrem, veem aquilo em que já acreditavam. “Pois sem fé é impossível agradar (a Deus); e quem se aproxima de Deus tem de acreditar que Ele existe e recompensa aqueles que O procuram” (Hb 11, 6).

A objetividade decorre da visão de sujeitos que creem na Razão, no Logos, em Deus, que se unem ao Sujeito, em Espírito e Verdade, integrando sua Uniplurissubjetividade, a partir do Caminho, o método científico, Jesus Cristo: “Eu lhes dei a glória que me deste para que sejam um, como nós somos um: Eu neles e tu em mim, para que sejam perfeitos na unidade e para que o mundo reconheça que me enviaste e os amaste como amaste a mim” (Jo 17, 22-23).

O mundo vive um tempo de carência de líderes, porque falta ordem mental nas pessoas, e sem ordem interna não haverá ordem externa. Um grande líder tem a mente organizada, com ideias coerentes interna e externamente, sabe explicar suas ideias, até certo ponto, e relacioná-las aos fenômenos do mundo compartilhados psiquicamente com os demais, e sabe agir segundo essa ordem, o que vale tanto para as lideranças políticas, como para as acadêmicas ou religiosas.

Contudo, atualmente as pessoas não têm a quem seguir, porque a ciência tem uma ordem diversa da religião, quando essa separação não existe, e por isso a ordem interna dos religiosos, dos cientistas e dos políticos é, na verdade, uma desordem. As pessoas, como os cientistas, muitas vezes não aceitam uma “ordem externa”, porque são desobedientes, não querem ser humildes para seguir a Vontade do Pai, a Razão, o Logos, mas atendem ao próprio egoísmo, caindo no pecado original, a vaidade. Os cientistas dizem uma coisa, os religiosos outra e os políticos mal sabem o que dizem, porque seu discurso é para agradar (enganar) os eleitores, lamentavelmente, como regra quase absoluta.

Portanto, a Ciência carece de uma revolução copernicana, para entender a realidade segundo a qual a objetividade está no sujeito, que é religioso, cientista e coerente com suas ideias, ou que ao menos seja religioso e coerente com as ideias da religião que professa ou cientista e coerente com os dados científicos. Por absurdo que possa parecer, é a partir da subjetividade que se chega à objetividade.

Só há ordem objetiva quando existe ordem subjetiva, quando sujeitos com autoridade moral, religiosa e científica são seguidos porque expressam boas ideias e as manifestam em suas vidas, são pessoas com boas ideias e as põem em prática solidariamente, pelo que são boas pessoas, como Jesus Cristo, líder religioso, científico e político, que verdadeiramente alcançou a objetividade, em sua subjetividade objetiva, preparando o Reino de Deus, que somente será atingido quando as pessoas aqui, agora, objetivamente, em todos os momentos de todos os dias, seguirem seu exemplo e viverem essa subjetividade objetiva, neste mundo, quando, então, o Reino será tornado real, será realizado ou objetivado.

 

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