Por Kátia Debarba Machado – 14/05/2017
1. INTRODUÇÃO
A Constituição Federal de 1988 foi a primeira Constituição brasileira que consagrou o direito fundamental à saúde, sendo que as constituições anteriores somente faziam referências a essa garantia. O direito a saúde tem uma perspectiva de proteção ampla, pois integra os princípios da universalidade e da igualdade. Assim, o legislador pautou o direito à saúde em capítulo próprio destacando cada elemento que compõe esse âmbito de proteção[1]. No entanto, um dos principais assuntos de debate no direito constitucional é a efetivação dos direitos fundamentas, pautado na nossa carta magna.
A legislação federal definiu as características para a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), por meio das Leis 8080/90[2] e 8142/90[3]. Mesmo assim, ainda nos dias de hoje verifica-se que há dificuldade de atender todas as demandas sociais.
O direito a saúde está pautado na Constituição Federal, em seu artigo 6º[4], porém o próprio legislador reafirma o direito a saúde no artigo 196[5] como direito de todos e dever do estado de promover essa garantia.
Em análise o disposto na nossa carta magna, verifica-se que a saúde é direito de todos, abrangendo assim, tanto as garantias individuais como as coletivas, promovendo acesso igualitário para aqueles que fazem uso do sistema único de saúde (SUS).
Neste sentido Gilmar Mendes comenta: “o artigo trata de um direito social, consubstanciado tão somente em norma programática.” (MENDES, 2012, p. 696). Sendo a norma incapaz de produzir efeito imediato, ou seja, ela apenas dá a direção que deverão ser observada pelo poder público. Demonstrando também que o estado tem o dever de dar essa garantia a seus cidadãos, através de políticas sociais e econômicas, visando assim o bem-estar social de todos, principalmente no que diz respeito à redução de doenças por meio de programas de prevenção. Além do mais, o disposto no artigo 2º, §1º da lei nº 8080/90[6] (Lei Orgânica da Saúde) está em consonância com o artigo 196 da Constituição Federal:
Percebe-se então, que a lei orgânica de saúde reafirma que a saúde é um direito fundamental e que deve ser protegido, bem como é dever do Estado garantir esse acesso igualitário e universal para todos os cidadãos, sendo assim catalogado como o direito fundamental. Salienta-se, no entanto, que os recursos públicos são finitos e as demandas infinitas, existindo nesse caso a necessidade de se concretizar o direito a saúde por meio de eficientes políticas publica, sendo desenvolvidas pelo Ministério da Saúde e repassadas para os estados, para que estes as coloquem em práticas.
2. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA CONSTITUIÇÃO
Os direitos fundamentais são aqueles reconhecidos internamente em um país, bem como, os reconhecidos internacionalmente por meio dos tratados e convenções. Nossa Constituição[7] dá essa garantia dos direitos fundamentais bem como o cumprimento dessas políticas sociais, entretanto sua efetivação não acontece como o legislador previa, ou seja, as políticas criadas pelo Ministério da saúde não consegue atingir os cidadãos de forma igualitária, diante desse problema existem muitas demandas pedindo para que os direitos fundamentais do cidadão sejam efetivados, garantindo assim, o mínimo existencial para uma vida digna.
Assim, no mesmo sentido entende Pedro Lenza que: A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (LENZA, 2012, p.1077)
Podemos chegar ao entendimento de que a saúde é pressuposto indispensável para a vida do cidadão, portanto não se pode imaginar uma vida de qualidade sem saúde. Por isso o cidadão deve buscar seus direitos junta ao estado, por meio de processos administrativos ou mesmo pelo poder judiciário, portanto, cabe a esfera pública observar os princípios constitucionais, respeitando assim, a previsão orçamentária destinada à saúde.
2.1 A DIGNIDADE HUMANA E O DIREITO A SAÚDE
Com base nos ensinamentos de Ingo Sarlet o direito a saúde se inclui nos direitos fundamentais sob dois pontos específicos, o direito de prestação e de defesa. (SARLET, 2007). O direito de defesa consiste na proteção da saúde na proteção da saúde, por meio de políticas que disponibilizem garantia e a manutenção da saúde. Já o direito de prestação diz respeito às atividades realizadas para assegurar o gozo do direito, inclusive no que diz respeito aos materiais e serviços, prestados ao titular dos direitos fundamentais.
Para Jaime Rodrigues-Arana o interesse público fundamental reside na elaboração de um modelo de poder público onde os cidadãos desfrutem do livre exercício de seus direitos, ou seja, a administração pública deve ser coerente e harmônica com o estado social e democrático de direito, pois é ele quem estimula e promove os direitos fundamentais da pessoa. (MUÑOZ, 2010, p. 62).
A preservação do interesse público deveria prevalecer na gestão pública, mas isso não vem acontecendo, o que acaba prevalecendo é o gerencialismo e o mercantilismo típicos do setor privado. Ou seja, para se ter direito a um serviço de saúde básico de qualidade é necessário que o cidadão pague pelo serviço. Sendo neste caso, violado um princípio fundamental da nossa Constituição “que são direitos sociais a saúde”, porém em alguns casos concretos somente se tem esse direito social por meio de pagamento a iniciativa privada.
3. CONCLUSÃO
Diante deste breve esboço, conclui-se que a saúde é o bem mais valioso e fundamental para o ser humano, devendo ser garantido pelo Estado, pois está prevista em nossa Constituição. Esse direito é universal devendo ser garantido por meio de políticas públicas e de forma preventiva, abrangendo toda a sociedade de forma rápida, continua e eficaz.
Neste sentido ainda, se observa que o direito a saúde deve cumprir com os princípios da dignidade da pessoa humana, no que tange a igualdade e universalidade. Diante desses argumentos cabe ao poder público garantir uma administração pautada no interesse público de toda sociedade. Não restam dúvidas que o Poder Judiciário possa intervir nas demandas de saúde, devendo ele analisar cada caso concreto, atento que os recursos do Estado são finitos enquanto as demandas são infinitas.
A judicialização da saúde necessita ser analisada diante do orçamento destinado a saúde no país, deve haver a solidariedade entre os entes públicos, ou seja, deve-se ter uma responsabilidade mutuas entre eles.
É necessário que toda sociedade busque seus direitos, por meio de seus representantes políticos, ou seja, cada um deve analisar todos os atos de seus representantes, pois eles estão lá para nos representar de forma digna. Assim, fica nos a reflexão: Será que eu recebo a saúde que tenho direito?
Notas e Referências:
[1] Artigo 196 à 200 da Constituição Federal de 1988.
[2] Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências.
[3] Dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências.
[4] Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
[5] Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
[6] Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
[7] Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em: 10 de maio de 2017.
BRASIL, Lei nº 8.080 de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8080.htm Acesso em 10 de maio de 2017.
BRASIL, Lei nº 8.142 de 28 de dezembro de 1990. Dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8142.htm . Acesso em: 10 de maio de 2017.
Cebes – Centro Brasileiro de Estudos da Saúde. Disponível em: http://www.cebes.org.br. Acesso em: 10 de maio de 2017.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 16. ed. Sao Paulo: Editora Saraiva, 2012.
RODRIGUEZ-ARANA MUÑOZ, Jaime. El interes general como categoria central de la actuacion de lãs Administraciones Publicas. In: BACELLAR FILHO, Romeu Felipe; HACHEM, Daniel Wunder (coord.). Direito Administrativo e interesse publico: estudos em homenagem ao professor Celso Antonio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 33-63.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.
Kátia Debarba Machado é formada em Direito pela Faculdade Dom Bosco. Pós-Graduação pela em ”Direito Contemporâneo” pela Escola Brasileira de Direito Aplicado Ltda. – Curso Luiz Carlos. Atualmente cursando Pós-Graduação em “Estado Democrático de Direito” na Fundação Escola do Ministério Público do Paraná (FEMPAR). Atualmente estagiária de pós-graduação no gabinete da 1ª Promotoria da Vara de Execuções Penais de Curitiba. Currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K8325751P9.
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