Requisito do concurso de agentes: Lição 20

05/08/2015

Por Marcelo Pertille - 05/08/2015

Lição 20

Olá, amigos do Empório do Direito! Na semana passada terminamos o estudo da culpabilidade e, por consequência, a análise dos substratos que compõem o conceito analítico de crime. Hoje daremos sequência ao tema teoria geral do crime com o seu último tópico: concurso de pessoas.

Concurso de pessoas

O concurso de pessoas deve ser visto como a união de esforços entre dois ou mais agentes para a produção de determinado resultado delitivo. Ganha importância no Direito Penal a medida que sua constatação provoca reflexos decisivos na quantificação das penas, já que a pluralidade de agentes pode servir como agravante, qualificadora, circunstância especial de aumento, e, conforme o caso, ser utilizada até como circunstancia judicial. Ademais, identificada a origem do resultado criminoso e os agentes que lhe deram causa torna-se possível infligir reprimendas proporcionais à culpabilidade de cada um.

O primeiro requisito para a existência do instituto, repisa-se, é a pluralidade de pessoas envolvidas na empreitada criminosa. Em que pese a grande maioria das condutas típicas poderem ser executadas apenas por uma pessoa, é possível que em determinadas situações dois ou mais agentes unam esforços para a consecução do resultado. A doutrina identifica esses crimes como unissubjetivos, também tidos como infrações de concurso eventual. Logo, são esses que interessam ao estudo do concurso de agentes, pois se a exigência legal é no sentido de que um só agente basta para a consumação, conhecer as teorias que fundamentam o concurso de pessoas torna-se indispensável para constatar a ocorrência do instituto. Em sentido contrário, os crimes plurissubjetivos (aqueles de concurso necessário) tem a pluralidade de agentes como elemento objetivo do tipo. Exemplo é o crime de associação criminosa, quando é necessário que três ou mais pessoas unam-se para o fim específico de cometer crimes. Logo, havendo menos de três envolvidos, torna-se atípica a conduta no que se refere ao art. 288 do Código Penal. Em síntese, nos crimes plurissubjetivos o concurso de pessoas é condição de existência, pois é elemento que integra a descrição típica, ao passo que nos delitos unissubjetivos constitui tema importante para definir os exatos termos da punição.

CESPE/AGU - Ao crime plurissubjetivo aplica-se a norma de extensão do art. 29 do Código Penal, que dispõe sobre o concurso de pessoas, sendo esta exemplo de norma de adequação típica mediata. ERRADO

O vínculo subjetivo apresenta-se como segundo requisito e revela a vontade dos agentes no sentido de unir esforços para a produção de determinado resultado. Logo, não basta para a constatação do concurso de pessoas a pluralidade de causadores de um evento típico, sendo essencial que todos estejam cientes da colaboração que promovem entre si. Caso o agente, não conhecendo a conduta de terceiro, acabe cooperando com a vontade deste, ocorrerá a denominada autoria colateral, que, importante frisar, não é espécie de concurso de pessoas por evidenciar ausência de vínculo subjetivo.

CESPE/TJ-SE - Em se tratando de autoria colateral, não existe concurso de pessoas. CORRETO

FCC/DPE-CE - há autoria colateral quando os concorrentes se comportam para o mesmo fim, conhecendo a conduta alheia. ERRADO

A autoria colateral, bom que se diga, não deve ser confundida com a autoria incerta. Na primeira é possível identificar qual resultado provocou cada conduta, o que determina que cada agente deva, por consequência do art. 13 do Código Penal, responder por aquilo a que deu causa. Ilustra-se com o exemplo de dois homens que, desconhecendo cada um a conduta do outro, disparam no mesmo instante com arma de fogo contra um desafeto em comum. Um deles acerta a mão da vítima, enquanto o outro é o provocador da lesão mortal. Apenas este deve responder pelo crime consumado, devendo o outro ser responsabilizado pela forma tentada da conduta, já que não deu causa à morte. Na autoria incerta, entretanto, não é possível individualizar o resultado que cada conduta proporcionou, sendo necessário, como decorrência da aplicação do princípio do in dubio pro reo, que ambos respondam pela forma mais branda. Utilizando-se o exemplo acima, ambos deveriam responder pela modalidade tentada do homicídio, mesmo que o resultado morte tenha se operado.

Como terceiro requisito aparece a relevância causal das condutas quanto ao resultado. Ou seja, é fundamental que as ações ou omissões tenham efetivamente colaborado para o evento criminoso. Ainda que o art. 29 do Código Penal estabeleça que a responsabilização penal deva incidir sobre quem “de qualquer modo” concorrer para o crime, tem-se que a participação a ser investigada não pode ser inofensiva a ponto de se mostrar irrelevante para o resultado.

O quarto requisito é a unidade de fato, também chamada de unidade de infração, que evidencia que para existir concurso de agentes é essencial que todos os envolvidos conjuguem esforços para a prática do mesmo delito. Esse requisito é consequência da adoção pelo Código Penal da teoria monista (unitária), art. 29, onde está disposto que todos que de qualquer forma colaborarem para o crime devem responder por ele, na medida da sua culpabilidade. Por isso, ainda que um evento criminoso tenha diversos autores, todos responderão pelo mesmo delito, eis que por conta da teoria monista a infração penal é um acontecimento único e indivisível. Logo, assim como aquele que desfere os disparos mortais, quem cede a arma, ciente do intento homicida do primeiro, deve também sofrer os reflexos do crime de homicídio, não havendo, por conta da teoria monista, distinção típica entre autor e partícipe.

MPE-SP/Promotor de Justiça - Ao tratar do concurso de pessoas, o Código Penal adotou como principal a teoria monista ou unitária. CORRETO

IADES/TER-PA - A teoria adotada pelo CPB referente ao concurso de pessoas é a monística, admitindo-se a exceção pluralista à teoria monista. CORRETO

FUNIVERSA/PC-DF - Segundo a teoria monista ou unitária, a cada participante corresponde uma conduta própria, um elemento psicológico próprio e um resultado igualmente particular. ERRADO

ACAFE/PC-SC - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime, incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. CORRETO

De outro ponto, importante saber que, ao lado da monista as teorias dualista e a pluralista também destinam-se a tratar sobre o concurso de pessoas. A dualista prevê que devem haver crimes distintos para aqueles considerados autores e os chamados partícipes. Já a pluralista trabalha com a necessidade de tantos crimes quanto o número de causadores do resultado típico. Evidencia que na medida em que cada pessoa colabora para o crime sob uma perspectiva psicológica diferente, deve a tipicidade ser determinada de maneira autônoma e individualizada. Em que pese esta teoria ser bastante criticada pelo fato de não se poder considerar autônomas as condutas que convergem para um mesmo resultado, o Código Penal tem exemplos pontuais de sua adoção. É o que se vê nos crimes de corrupção passiva e ativa, quando embora os agentes concorram para o mesmo fato, lhes são atribuídas tipicidades distintas (arts. 317 e 333). Na bigamia também, pois a forma do parágrafo primeiro do art. 235 prevê crime distinto para aquele que não sendo casado contrai casamento com pessoa já casada. O aborto também serve como exemplo quando nas figuras dos arts. 124 e 126 do Código Penal ficam estabelecidos crimes autônomos para aquela que consentir que lhe seja provocado aborto e para quem promove o aborto consentido. No delito de falso testemunho ou falsa perícia a mesma situação ocorre quando o Código Penal prevê que para a testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete que fizer afirmação falsa, negar ou calar a verdade em processo judicial, administrativo, inquérito policial ou juízo arbitral serão aplicadas as penas do art. 342, sendo que para quem oferece ou promete dinheiro ou qualquer vantagem a tais pessoas, com os fins antes descritos, será responsabilizado pelo tipo do art. 343 do Código Penal.

MPE-SP/Promotor de Justiça - O Código Penal, no que diz respeito ao concurso de pessoas, adotou também em alguns casos as chamadas exceções pluralísticas à teoria unitária. CORRETO

FGV/PROCEMPA - O Código Penal adotou a Teoria Monista sobre concurso de agentes sem exceção, devendo todos os participantes responder pelo mesmo crime. ERRADO

Como último requisito, a doutrina aponta a necessidade de existência de fato punível. Ou seja, é indispensável que o fato criminoso tenha repercussão penal, tipicidade, pois se passar a ser irrelevante penal essa situação se estenderá a todos os envolvidos, inviabilizando qualquer possibilidade de concurso.

MPE-SP/Promotor de Justiça - Os requisitos do concurso de pessoas, em regra, são: pluralidade de condutas, relevância causal de cada uma das ações, liame subjetivo entre os agentes e identidade de fato. CORRETO

FUNIVERSA/PC-DF - São requisitos do concurso de pessoas a pluralidade de participantes e de condutas, a relevância causal de cada conduta, o vínculo subjetivo entre os participantes e a identidade de infração penal. CORRETO

Trabalhados os requisitos do concurso de agentes, encerramos assim mais uma lição. Na próxima semana focaremos esforços no conceito de autor, fundamental para a compreensão do tema.

Grande abraço e bons estudos!


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Marcelo Pertille é Especialista em Direito Processual Penal e Direito Público pela Universidade do Vale do Itajaí, Advogado e Professor de Direito Penal de cursos de graduação em Direito e da Escola do Ministério Público de Santa Catarina.

   


Imagem Ilustrativa do Post: Exekution (Exécution)... // Foto de: Yann Caradec  // Sem alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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