Por Jose Luis Bolzan de Morais - 19/04/2016
Neste dia de ressaca democrática - daquelas das más lembranças, pois o que assistimos ontem não nos isenta da dor de cabeça do dia seguinte às más bebidas e aos excessos - não vamos tratar deste espetáculo do absurdo. Apesar de termos algumas certezas sobre tudo isso, ainda somos impactados pela crise institucional pela qual passamos. É preciso um distanciamento para tentar dar conta de tudo isso. Mas, para pior provavelmente, teremos outros desdobramentos.
Por isso, sem "fugir da raia", deixamos para a próxima coluna voltarmos a estes tempos de "poderes selvagens", como tratamos na anterior.
Preferimos trazer a notícia da realização da IX Reunião Estado & Constituição que se iniciam hoje na Universidade de Sevilla e seguem a partir de quarta-feira na Universidade de Roma - La Sapienza. Isso porque nelas trataremos destes mesmos temas que nos afligem, tentando construir pontes que nos permitam compreender um pouco mais isto tudo que vem acontecendo, do que o Brasil é uma experiência traumática, mas não se constitui como a única e exclusiva expressão.
Aqui e agora estamos, com o conjunto de membros desta rede internacional de pesquisa, buscando enfrentar algumas das dificuldades mais prementes, enfrentando os "desafios actuales del estado constitucional", como indica o título destas jornadas inauguradas em Sevilla/ES nesta segunda, 18/4/2016.
E, a proposta se confirma desde a inauguração desta reunião, quando o Professor Catedrático Emérito da Faculdade de Direito da Universidade de Sevilla Antonio Enrique Pérez Luño, em sua fala inaugural, vem chamar a atenção para três problemas fundamentais que põem atenção ao constitucionalismo contemporâneo - corrupção, migrações/refugiados e terrorismo - pondo em destaque as formas de atuação deste e das instituições - em especial o "juiz constitucional" - quando confrontadas com tais temáticas. Interroga, assim, a posição dos direitos fundamentais e o problema de sua concretização e das garantias no enfrentamento destas situações.
Com isso, desde logo, pode-se entrever que os dramas que nos afligem, em maior ou menor medida, são os mesmos. Nos indagamos diante dos mesmos problemas que, por muitos aspectos, colocam interrogantes à tradição do constitucionalismo, assim como às próprias constituições que pretendem "organizar o poder e assegurar as liberdades", como sugerido por N. Mateucci.
Vivemos, assim, tempos difíceis. Tempos de crise, como tenho insistido. Uma(s) crise(s) que nos confronta(m) com o inusitado e, por isso mesmo, nos põem diante do temor pela "morte" dos modelos nos quais fomos formados e do que isso pode significar para a continuidade do projeto nunca implementado e sempre em construção do nomeado Estado de Direito.
Em tempos de ruptura de monopólios - inclusive da pretensa exclusividade normativa - as dificuldades se acentuam, sobretudo por carecermos de respostas e , muitas vezes, pela falta de criatividade na criação de fórmulas aptas ao enfrentamento da(s) crise(s) ou, ainda, por sermos confrontados e colonizados por estratégias que questionam as tradicionais, muitas vezes apenas pretensas, conquistas peculiares do Estado Constitucional.
A crise da regulação e da efetivação das garantias - e sua transformação em tempos de direito global (que contrasta as formas jurídicas tradicionais, por exemplo, com standards ou indicadores) - sugere a necessidade de forjarmos estas novas "pontes " compreensivas, o que não significa, por óbvio a concordância com as rupturas experimentaras nos dias que vivemos.
Um pouco e por tudo isso é que nos dedicaremos nestes dias a pensar o papel do Estado Constitucional, a situação dos direitos humanos, a atuação da justiça constitucional, a afetação das garantias constitucionais, a espetacularização do processo, o emergencialismo penal, a atuação do poder econômico, o confronto da diferença sob o enfoque das migrações, enfim o presente e o futuro do constitucionalismo e do Estado Constitucional.
Isso tudo pode ajudar não apenas a nos confortar diante do espetáculo triste que vivenciamos nestes dias, mas a nos preparar para a disputa diante das sobras de um projeto nunca concretizado.
De Sevilla partimos para Roma. Lá focaremos a emergência - não apenas como " inauguração " como também como "urgência " - do comum, dos bens comuns, tomando - literalmente - a água como experiência característica de uma nova era dos direitos a demandar um novo approach teórico-prático, ao lado da retomada e aprofundamento de nossos três eixos temáticos permanentes - constituição e economia, constituição e globalizações, constituição e diferença.
Longe do Brasil, estaremos perto.
Afinal, os dramas nos unem!
. José Luis Bolzan de Morais é Mestre em Ciências Jurídicas PUC/RJ. Doutor em Direito do Estado UFSC/Université de Montpellier I (França). Pós-doutoramento Universidade de Coimbra/PT. Professor do PPGD-UNISINSO. Procurador do Estado do Rio Grande do Sul. Pesquisador Produtividade CNPQ.. .
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