Considerando a população adulta, em 1994, os católicos somavam 75%; hoje, 57%. Os evangélicos, em 1994, estavam com 14% dos crentes; atualmente, 28%. Espíritas eram, em 1994, em 4%; hoje são 3% (Datafolha).
Para a Presidência da República, e considerando os preconceitos circulantes entre os brasileiros, apenas 13% votariam num ateu; 84%, num negro; 57%, numa mulher; 32%, num homossexual (André Petry – Veja – CNT/Sensus).
Somos, conforme os dados acima, 2/3 homofóbicos, 3/5 machistas, 1/5 racistas. É muito preconceito. Mas a questão religiosa nos é a mais cara: 9/10 da população repudiam o descrente da divindade cristã.
Os evangélicos avançam sobre os católicos. Evangélicos e católicos são mais ou menos a mesma coisa, mas não são exatamente iguais. Os católicos nasceram donos do poder. Os evangélicos militam por espaços de poder.
Evangélicos fazem política com profissão de fé religiosa. Elegem-se sob compromisso religioso. Atuam nas diversas esferas políticas como prosélitos de sua fé. Obram no mundo com bastante coerência entre a palavra e o ato. Exemplo:
“O vereador [...], que é pastor evangélico, denunciou a marca de sabão Omo ao MPF, alegando que a publicidade veiculada na semana do Dia das Crianças, que estimula a liberdade de brincar, representa uma ‘guerra contra a família brasileira’.
Atacada por correntes conservadoras, a propaganda propõe aos pais um ‘recall’ das brincadeiras que reforçam clichês de gênero. Para o vereador, a publicidade feriu o ECA” (Editado, Dagmara Spautz, DC).
A internet está prenhe de dados informando que os evangélicos crescem nos parlamentos de todos os níveis: municipal, estadual, federal. Eles encasquetam-se com duas ideias: a favor da Bíblia, contra as políticas de gênero.
Para restabelecer o que consideram a “moral” e os “bons costumes” dignos de serem restabelecidos, pregam, aconselham, imprecam, militam, protestam, censuram, processam, legislam. Diatribes fundadas na “palavra do senhor”.
Dados a si como intérpretes das Escrituras – de fato, as Escrituras dizem barbaridades –, exigem pudor sexual de toda ordem. Seja: não defendem um código de rigor moral para os praticantes de suas crenças, mas para todos.
O fundamentalismo reacionário despreza denominadores de convivência social. Seus “pastores” instam o furor popular, restabelecendo a intolerância religiosa vencida pelo processo civilizatório tisnado pelo laicismo iluminista.
Os brasileiros ilustrados não estão atentando o suficiente para esse fenômeno que se alastra e se afirma no País. Preocupam-se com o efeito Bolsonaro; desatentam do medievalismo redivivo que a crendice popular recepciona.
Felizmente, há reservas de lucidez no Supremo Tribunal Federal. Conforme O Globo (Renata Mariz, Carolina Brígido, editado): “A controvérsia em torno da ‘ideologia de gênero’ ganhou novo e importante capítulo nos tribunais.
Decisão ainda inédita do Ministro Luís Roberto Barroso suspendeu lei de Paranaguá (PR) que proíbe informações sobre gênero e orientação sexual nas escolas mantidas pelo município e até mesmo a utilização de tais termos.
A decisão em caráter liminar representa uma vitória da Procuradoria Geral da República que protocolou [diversas] ações na Corte contra leis municipais que vetam conteúdos relacionados à sexualidade e gênero nas escolas.
Para Barroso, ‘Não tratar de gênero e de orientação sexual não suprime o gênero e a orientação sexual da experiência humana, apenas contribui para a desinformação [...], para a perpetuação de estigmas e do sofrimento que deles decorre.
Tratar de tais temas significa ajudar a compreender a sexualidade e proteger contra a discriminação e a violência. Impedir a alusão aos termos gênero e orientação sexual significa conferir invisibilidade a tais questões’”.
O ministro tem a escola como um local próprio para que estigmas sejam rompidos. Para ele, omitir-se e não ensinar a respeito da diversidade replica a discriminação e contribui para a consolidação às crianças homo e trans.
As escolas brasileiras, que sempre foram um aparelho ideológico do cristianismo, só muito recentemente obtiveram espaço para discutir e promover valores mais diversificados, mais contemporâneos, mais arejados.
Religiosos julgam com a Palavra, compilação de suspeitosa autoria e intempestiva vigência. Elejo o julgamento do STF, ou o juízo de Albert Einstein: “a Bíblia é uma coleção de lendas honradas, mas ainda assim primitivas”.
Imagem Ilustrativa do Post: Lavagem das Escadarias da Igreja do Bonfim - 2011 // Foto de: Prefeitura de Olinda // Sem alterações
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