Reformatio in pejus – Por Paulo Silas Taporosky Filho

16/07/2017

A reformatio in pejus é um fenômeno processual que se faz presente quando após o julgamento de determinado recurso, o resultado dessa nova decisão acaba sendo pior que aquela da qual se recorreu. Nucci, visando conceituar a questão de forma mais direta, diz que “é a reforma da decisão em prejuízo do réu[1].

Gustavo Badaró explica que “o princípio da personalidade dos recursos determina que o recurso somente poderá beneficiar a parte que recorreu”, de modo que “segundo a proibição de reformatio in pejus, quem recorreu não pode ter sua situação agravada no julgamento do recurso[2].

No processo penal, dada toda a sua especificidade e os seus princípios próprios que regem a condução dos procedimentos, quando ocorre o recurso exclusivo da defesa, a eventual reforma do decisório jamais deve se dar de um modo que o pleito recursal acabe sendo prejudicial ao recorrente. Daí que se fala em proibição da reformatio in pejus no campo do processo penal, quando o julgamento do recurso decorrer de pleito em tal sentido apenas da defesa.

Há de se ressaltar também que a reforma para melhorar a situação do acusado é sempre permitida (reformatio in mellius), de modo que mesmo quando for o caso de inexistência de determinado pedido expresso pela defesa em seu pleito recursal, ou ainda na hipótese de recurso exclusivo da acusação, poderá ocorrer o reconhecimento de ofício quando do julgamento de situação que enseje em reforma benéfica ao acusado.

Pode-se, portanto, assim dizer: quando acusação e defesa recorrem, possível o acolhimento de quaisquer dos pleitos; quando o recurso for exclusivo da acusação, o pleito poderá ser acolhido, sendo aqui possível a reformatio in mellius a favor do acusado; quando apenas a defesa recorrer, em hipótese alguma poderá haver reformatio in pejus contra o acusado.

Necessário se faz ainda apontar para outro fenômeno que decorre desse, a saber, a reformatio in pejus indireta. Essa forma mais específica da reformatio in pejus, de igual modo, resta vedada no âmbito processual penal.

Aury Lopes Jr. fornece um bom exemplo da reformatio in pejus indireta:

o juiz condena o réu a uma pena de 4 anos de reclusão por determinado delito. Em grau recursal, o tribunal, acolhendo a apelação da defesa, anula a sentença por ter-se baseado em prova ilícita, determinando o desentranhamento e a repetição do ato. Na nova sentença, o réu é condenado a uma pena de 5 anos de reclusão.

Trata-se de uma reformatio in pejus indireta, que conduzirá a nova nulidade da sentença. É indireta porque a piora na situação do réu não foi causada, diretamente, pelo tribunal, julgando o recurso. Mas, sem dúvida, o tratamento mais grave foi efeito do acolhimento do recurso da defesa.[3]

Tem-se assim que em situação onde a sentença da qual se recorreu (exclusivamente a defesa) for anulada mediante recurso, a nova decisão que será dada não poderia impor reprimenda maior que aquela que foi anulada, pois tal fato constituiria prejuízo para o acusado, de modo que aí se faria presente a reformatio in pejus indireta. Sendo também vedada esse tipo de reforma, a nova sentença estaria limitada em sua eventual reprimenda conforme aquela decisão anterior que foi anulada. Não se poderia, nesse novo decisório, aplicar uma pena maior que aquela de outrora – mesmo que a anterior não surta mais quaisquer efeitos, vez que anulada.

Questão ainda mais interessante com relação ao tema aqui brevemente exposto, diz respeito às situações envolvendo o Tribunal do Júri, pois há ali presente o regramento da soberania dos vereditos (artigo 5º, XXXVIII, “c” da Constituição Federal). Em tal situação, na hipótese de anulação via recurso de uma decisão dada pelo Tribunal do Júri, a vedação ao reformatio in pejus continua valendo?

Deixo esse ponto mais específico para ser abordado por aqui numa próxima oportunidade. Até lá!


Notas e Referências:

[1] NUCCI, Guilherme de Souza. Dicionário Jurídico: penal, processo penal e execução penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p. 272

[2] BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo Penal. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014. p. 605

[3] LOPES JR. Aury. Direito Processual Penal. 9ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 1.175


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