Realidade virtual: ciberbullying e seus elementos caracterizadores (Parte 2) – Por Jonathan Cardoso Régis e Djonatan Batista de Lima

12/12/2016

Leia também a Parte 1 e a Parte 3

Na última semana (clique aqui), falou-se acerca do Ciberbulliyng e suas peculiaridades, transpassando ainda quanto a aspectos relacionados a violência e ao bulliyng em si.

Hoje, busca-se destacar brevemente o perfil das vítimas, assim como também daqueles que, covardemente, agem atrás de um teclado, seja este de computador ou smartphone, aterrorizando psicologicamente os mais frágeis, aliada a conivência daqueles que constatam, pactuam com tal comportamento e permanecem inertes ou omissos a esse comportamento.

O Perfil das vítimas

As vítimas costumam possuir as mesmas características diferenciadoras dos pares, ou seja, como as vítimas do bullying sofrem por apresentarem algum aspecto que os destaca dentre os demais, sendo este, o motivo das agressões, como asseveram Kairi Talves e Rita Nunes[1]:

O ciberbullying pode incluir a discriminação das crianças que são percebidas como “diferentes”, como as pertencentes a grupos étnicos minoritários, as pessoas LGBT, as crianças obesas, ou as crianças com deficiências. De acordo com o relatório do Centro de Investigação Innocenti da UNICEF (IRC), o ciberbullying é uma das mais graves violações dos direitos das crianças que ocorre nos ambientes online. Tais violações incluem violência e violação da privacidade e podem ter um impacto importante nas crianças, devido à sua anonimidade, e à sua capacidade para invadir, a qualquer hora do dia ou da noite, as casas e outros locais seguros em que as crianças se encontram (UNICEF IRC, 2011).

Ainda, é possível observar a ocorrência do ciberbullying em desfavor daqueles que não apresentam quaisquer elementos diferenciadores dos demais, e, nestes casos, não coexistem elementos que possam “justificar” a perversidade dos ataques – mesmo que injustificável qualquer perversidade. Quando ocorrem os ataques, é imensamente difícil apagar os resultados destes, pois, a partir do compartilhamento as imagens, fotos e mensagens podem estar em qualquer computador que obteve acesso ao conteúdo[2].

As consequências do ciberbullying podem ser imoderadamente mais devastadoras que a forma física presencial, e se relaciona com as principais características próprias dos atos: 1- o anonimato; 2- um público infinito; 3- predomínio do assédio sexual e perseguição homofóbica; 4- o caráter de permanência da manifestação[3].

Para Kairi Talves e Rita Nunes[4]: 

Análises relativas ao papel das características psicológicas sugerem que as dificuldades psicológicas estão associadas, tanto com bullying online e vitimização, procura de sensações fortes e ostracismo com vitimização. As crianças e jovens envolvidos em bullying online mostram uma mais elevada vulnerabilidade psicológica do que aqueles que não se envolvem neste tipo de bullying.

A dificuldade das vítimas do ciberbullying em denunciar seus agressores é compreensível, já que, seus sentimentos mais íntimos são tocados frente as perversidades, humilhações e difamações expostas na rede mundial de computadores a todos os internautas. Assim, muitas vítimas acabam se tornando um ciberbullie, e a maioria destes buscam uma forma de reagir aos maus-tratos ou revidá-los, e no caso do ciberbullying a conversão é bastante predominante, ocasionada pelo anonimato das redes[5].

Somente para reafirmar, as consequências psicológicas e sintomáticas são as mesmas que ocorrem no bullying, todavia, com um elemento potencializador e perseguidor obtido com a internet.

Quem são os agressores?

Os agressores – ciberbullie – assumem este papel no mundo virtual, e, a ausência física não oportuniza a conscientização das consequências dos seus atos, aumentando indiscriminadamente a potencialidade e constância das agressões.

Kairi Talves e Rita Nunes[6] afirmam: 

Como o ciberbullying é mais secreto do que o bullying tradicional, os perpetradores não estão sempre conscientes dos efeitos imediatos que o seu comportamento exerce sobre a vítima. Como resultado, os ciberbullies podem experienciar menos empatia e entender os seus atos como menos danosos do que aqueles que exercem bullying no sentido tradicional.

A maioria absoluta dos agressores é composta por adolescentes, inexistindo ferramentas de traçar o real perfil de tais personagens devido o anonimato da maioria das agressões. Assim, a identidade do agressor fica oculta para o público. Não raro, as vítimas quando descobrem os reais agressores não denunciam os atos de constrangimento, o que acoberta e alimenta esta engrenagem viciosa que é o ciberbullying[7].

Os autores intimidam suas vítimas através de dois principais instrumentos: computadores e telefones celulares. Por meio da internet, agressores podem enviar mensagens abusivas, obscenas ou difamadoras via e-mail, em sites de relacionamento (como Orkut, Facebook, Twitter) ou utilizando-se de programas de mensagens instantâneas (como MSN e Google Talk)[8]

Existem casos graves em que o e-mail da vítima é invadido pelo agressor, que utiliza o perfil daquela para difamar o perfil invadido, enviar mensagens depreciadoras para amigos como se a vítima fosse responsável pelas “agressões”.

Somado a isso, os agressores, por vezes, participam de fóruns de discussão e livros de visitas virtuais para deixar mensagens depreciativas ou opinar de maneira inconveniente no fito de semear brigas, desordem e desentendimentos entre os participantes, e ainda, chegam a promovem enquetes para eleger as pessoas mais esquisitas[9].

Como visto, os agressores predominantemente se escondem por detrás de falsos perfis e nomes para propagar a violência moral contra as vítimas, causando sofrimento por vezes maior que o bullying escolar, suas características – apesar da dificuldade de traçar um perfil – assemelham-se com os agressores físicos, no entanto, muitos indivíduos que no mundo físico não realizariam a agressão usam a máscara da internet para discriminar e agredir as possíveis vítimas.

A Con(ve)ni(v)ência dos Espectadores e demais envolvidos

O fato de o mundo virtual propiciar um infinito de horizontes, o número de espectadores, consequentemente, é muito amplo. Ainda, através de curtidas, compartilhamentos ou comentários as agressões se multiplicam de maneira irreversível, e, através do ciberespaço, o desequilíbrio é observado de forma bastante acentuada entre vítima e agressor, levado em consideração o anonimato[10].

Gostaríamos de realçar, aqui, que a análise do ciberbullying não deve centrar-se apenas nas vítimas. Nem todas as crianças e jovens envolvidos em bullying são vítimas, alguns são bullies, alguns são ativos e envolvidos espectadores e alguns não estão envolvidos. Um estudo recente desenvolvido na Finlândia (Lindforset al, 2012) mostra diferenças claras entre estar envolvido em ciberbullying e ter a percepção de que é um problema grave. De acordo com este estudo, entre os adolescentes finlandeses, com idades compreendidas entre os 12 e os 18 anos, a prevalência das vítimas de ciberbullying é de 11%, e apenas 2% deles tendem a pensar que se trata de um problema grave e muito perturbador. O estudo de Lindforset al realça a necessidade de prestar mais atenção aos espectadores do ciberbullying. Lindforset al (2012) revelam que testemunhar ciberbullying é a dimensão mais prevalente do ciberbullying e indicaram que um adolescente pode estar exposto ao ciberbullying de várias formas[11].

Uma nova faceta surge para o espectador, isso porque, pode auxiliar na propagação da violência sem ter causado de fato a mesma, quando envia o vídeo ou imagem de constrangimento por sua rede de contatos. O espectador que adota esta perspectiva está em situação de cumplicidade com o agressor, pois, conforme a divulgação, o conteúdo alcança milhares de pessoas em um curto espaço de tempo[12].

Assim, o espectador pode se confundir ou tomar às vezes do agressor. Seu papel é fundamental para a disseminação dos atos de violência, pois a partir de suas atitudes os maus tratos podem tomar proporções inimagináveis.

Os pais também têm um papel fundamental para a prevenção dos atos de ciberbullying, pois a partir da observação do comportamento dos filhos podem identificar fatores de risco como horas que usa o computador por dia, suas reações frente a máquina como xingar, chorar, gargalhar, esconderem a tela do computador, se evitam ir à escola. As pessoas submetidas ao ciberbullying sofrem com níveis elevados de ansiedade e insegurança e as reações são intensas, por isso os pais devem sempre que achar preciso procurar ajuda[13].

Já a escola, em geral o corpo administrativo, por sua natureza, deve conscientizar os alunos quanto o contexto de suas culturas e da diversidade de valores presentes na sociedade, indisponibilizando o surgimento das agressões que por vezes possuem um cunho discriminatório.

A disseminação no ambiente escolar da diversidade é papel da escola, assim deve fornecer os conteúdos para preparar os jovens para as mudanças da sociedade. Orientação como: não fornecer senhas de contas de e-mail, números de cartão de crédito, documentos, telefones e endereços são determinantes, pois todas estas informações auxiliam na proximidade do ciberbullie com a intimidade da vítima. A conscientização dos atos criminosos da mesma maneira deve estar presente, identificando que o anonimato e a menoridade não os ausentam de pena[14].

Desta feita, nota-se que o conjunto de esforços pode apresentar um desfecho menos cruel para a sociedade, uma vez que, se pais, educadores, vítimas, agressores e/ou meros espectadores sejam dotados de lucidez das nefastas sequelas que o ciberbullying proporciona, bem como prevenir e proteger tais atos (por mais futurística, ou melhor, utópica que possa parecer a proposição), quiçá a tipificação como crime seja dispensada, já que há propostas tramitando junto ao Congresso Nacional visando a criminalização da conduta.

Por hoje é só!

Na próxima semana, buscaremos destacar alguns aspectos a realidade acerca do ciberbullying, expondo brevemente em números estudos e pesquisas relacionadas ao tema em questão.

Até lá!


Notas e Referências:

[1] TALVES, Kairi e NUNES, Rita. Ciberbullying – Ameaça aos Direitos e ao Bem-Estar das Crianças. University Press ofEstonia, 2015. p. 229. Disponível em: <http://crean-home.net/site/assets/files/1134/crean-portuguese.pdf#page=228>. Acesso em: 20 ago. 2016.

[2] SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Bullying: Mentes perigosas nas escolas. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010, p. 129-130.

[3] SCHARIFF, Shaheen. Ciberbullying: Questões e soluções para a escola, a sala de aula e a família. Tradução Joice Elias Costa; Revisão Técnica CleoFante. Porto Alegre: Artmed, 2011, p. 63.

[4] TALVES e NUNES. Ciberbullying – Ameaça aos Direitos e ao Bem-Estar das Crianças. 2015, p. 237.

[5] SILVA. Bullying: Mentes perigosas nas escolas. 2010, p. 133-134.

[6] TALVES e NUNES. Ciberbullying – Ameaça aos Direitos e ao Bem-Estar das Crianças. 2015, p. 231.

[7] SILVA. Bullying: Mentes perigosas nas escolas. 2010, p. 130.

[8] AZEVEDO, MIRANDA, MANHÃES e SOUZA. O Ciberbullying e suas Relações com as Estruturas Psíquicas. 2012, p. 247.

[9] SILVA. Bullying: Mentes perigosas nas escolas. 2010, p. 128.

[10] SCHARIFF, Shaheen, Ciberbullying: Questões e soluções para a escola, a sala de aula e a família. 2011. p. 63.

[11] TALVES e NUNES. Ciberbullying – Ameaça aos Direitos e ao Bem-Estar das Crianças. 2015, p. 234-235.

[12] FERRO, Carlos Audemaro Calheiros. Ciberbullying: do Troll ao Criminoso. Repositório Institucional Tiradentes, 2016. p. 07. Disponível em: <http://openrit.grupotiradentes.com/xmlui/bitstream/handle/set/1645/CIBERBULLYING%20TCC%20CARLOS%20AUDEMARO%20FINAL.pdf?sequence=1>. Acesso em: 21 ago. 2016.

[13] SILVA. Bullying: Mentes perigosas nas escolas. 2010, p. 137-138

[14] SILVA. Bullying: Mentes perigosas nas escolas. 2010, p. 139.


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