Projeto de Extensão Povos das Águas: uma Análise do Caso da Ilha de Torotama

28/11/2024

 Coluna O Direito e a Sociedade de Consumo / Coordenador Marcos Catalan

Durante a enchente que ocorreu no mês de maio de 2024, a Ilha de Torotama situada aos extremos sul do país, próxima a cidade de Rio Grande/RS, sofreu uma inundação de proporções severas. O episódio também evidenciou os impactos crescentes das mudanças climáticas em regiões vulneráveis e a necessidade de planejamento integrado para enfrentamento de eventos ambientais extremos.

Dessa forma, quando os prognósticos climáticos emitidos nos Boletins da Universidade Federal de Rio Grande – FURG apresentaram/informaram do risco de uma enchente de grandes proporções, através de ações conjuntas coordenadas entre a Corpo de Bombeiros Militar do Rio Grande do Sul - CBMRS e a Defesa Civil do município de Rio Grande iniciou-se a tarefa de retirada tanto de pessoas quanto de animais que residiam no local. Na oportunidade, aproximadamente mil e trezentas pessoas deixaram suas moradias, pois os alertas indicavam que a ilha teria seu território integralmente submerso pelas águas.

Durante o período do alagamento, todavia, restaram penas quinze moradores no local que, em embarcações, promoveram a segurança dos bens e das propriedades das pessoas que no local vivem. O acolhimento dessas populações que deixaram suas residências foi inevitável e majoritariamente promovido por parentes em locais secos ou em abrigos que foram fornecidos.

Como é comum após uma situação tão catastrófica, a comunidade local deparou-se com enormes dificuldades e com a consequente destruição da região. As cheias de maio de 2024 comprometeram as estruturas físicas das casas e equipamentos comunitários, além de gerar graves danos ambientais, como a degradação da vegetação nativa e a alteração dos ecossistemas aquáticos. Isso impactou profundamente a população local, composta quase que unicamente por pescadores artesanais, cuja subsistência depende da pesca tradicional.

O alagamento prolongado destruiu redes de pesca, embarcações e outras ferramentas essenciais para essa atividade, inviabilizando meio central de produção econômica e sustento da comunidade. Além disso, a contaminação das águas pelo lodo e a instabilidade dos habitats naturais afetaram diretamente a biodiversidade local, comprometendo tanto a base alimentar quanto a econômica dos moradores.

O cenário de vulnerabilidade em que se encontravam as comunidades tradicionais que dependem da pesca artesanal e que foi agravado pela enchente, pede uma resposta urgente e eficaz, com ações estruturais que não apenas protejam esses grupos, mas também promovam o fortalecimento e a valorização de suas formas de vida.

Assim, a populações que detêm a pesca artesanal como uma prática essencial para sua subsistência e sua identidade cultural precisam de uma atenção distinta e especializada, ainda mais com o avanço dos impactos das mudanças climáticas. Nesse sentido, ações de proteção e valorização se fazem imprescindíveis, garantindo que essas comunidades possam não apenas sobreviver, mas também preservar suas tradições e garantir seu protagonismo na construção de soluções para seus desafios.

É nesse contexto de imperativa necessidade de atenção e tutela frente à precariedade e à exclusão que surge o projeto de extensão Povos das Águas. Como uma iniciativa crucial para proporcionar atendimento direto a essas populações e coordenado pelos professores da FURG José Ricardo Caetano Costa e Jara Lourenço da Fontoura (IE/FURG), que surge o projeto de extensão Povos das Águas, tendo como objetivo identificar as principais dificuldades dos grupos da região afetados durante os eventos climáticos extremos. No entanto, o projeto visa não só verificar quais são as demandas de recuperação após as enchentes, mas também estabelecer um caminho para a garantia de direitos, especialmente no que tange ao acesso à justiça.

Nesse sentido, com relação ao caso específico da ilha de Torotama, duas saídas de campo já foram promovidas nas datas de nove de agosto e cinco de novembro de 2024. Uma das centralidades da ia ao local foi coletar documentos dos moradores, bem como suas procurações para promover assessoria jurídica no que diz respeito aos financiamentos oferecidos pelos Governos Federal e Estadual, em resposta à enchente de maio. Sendo que até esse momento, os principais financiamentos fornecidos consistem no auxílio reconstrução, promovidos pelo Governos Federal, bem como os auxílios SOS e Volta por Cima viabilizado na esfera do Governo Estadual do Rio Grande do Sul.

Por sua vez, a análise e sistematização dos documentos coletados na ilha de Torotama está sendo promovida na esfera do grupo de terça-feira do Escritório Modelo Assessoria Jurídica – EMAJ/FURG, em que fazem parte os professores Fernando Maldonado e José Ricardo Caetano Costa. Recentemente, inclusive, ambos professores abriram novas turmas de extensão universitária para acompanhar e dar andamento à judicialização de possíveis ações relativas ao caso da ilha de Torotama.

Ainda hoje, mais de um semestre passado desse evento climático extremo, ainda existem vários moradores da ilha de Torotama que não tiveram seus benefícios implementados ou esses foram negados pelas autoridades governamentais. Essas comunidades, frequentemente à margem das políticas públicas enfrentam dificuldades históricas que vão desde a escassez de recursos, de infraestrutura e também de desrespeito aos seus direitos.

Isto posto, o caso da ilha de Torotama, parte integrante do projeto de extensão dos Povos das Águas, serve igualmente para evidenciar a relevância do papel da universidade, enquanto instituição social, voltada a proteção e ao desenvolvimento de grupos e comunidades vulneráveis. O caso em questão demonstra o quão é imprescindível, assim, direcionar esforços para projetos de extensão que reforcem tanto a legitimidade quanto o propósito universitário.

 

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