Prescrição médica não é título executivo extrajudicial

06/11/2018

 

O valor da prescrição médica é um dos grandes pontos de discussão na Judicialização da Saúde.

Em evento sobre Judicialização de Saúde Suplementar promovido no Superior Tribunal de Justiça[1], o Ministro Villas Boas Cueva afirmou que a prescrição médica não é título executivo extrajudicial.

Tal observação é importante porque é comum encontrar magistrados que conferem valor absoluto ao conteúdo da prescrição médica, ao fundamento de que não possuem formação na área da saúde e que por isso não poderia negar uma liminar de um pedido formulado com base em uma receita médica.

Contudo, esta percepção não se mostra a mais adequada quando a discussão envolve tecnologias em saúde (medicamentos, próteses, órteses, etc) não incorporados no SUS ou no rol de procedimento da ANS. Por várias razões:

1) Os títulos extrajudiciais (cheque, nota promissória, duplicata, etc) dependem de lei, o que não se verifica no caso da prescrição médica[2];

2) É alto o índice de prescrições médicas inadequadas. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS): “As estimativas apontam para que, a nível global, mais de metade de todos os medicamentos sejam prescritos, dispensados ou vendidos inapropriadamente e metade de todos os doentes não tomem a sua medicação como prescrito”[3];

3) Se o documento – prescrição médica – pode ser facilmente contestado, não se mostra razoável conferir ao mesmo instrumento exigibilidade imediata;

4) A Lei 8080/90, no art. 19-Q, §2º, incisos I e II, exige que a tecnologia em saúde tenha “evidências científicas sobre a eficácia, a acurácia, a efetividade e a segurança”, bem como exista “avaliação econômica comparativa dos benefícios e dos custos em relação às tecnologias já incorporadas”;

5) O Superior Tribunal de Justiça fixou requisitos mais rigorosos no julgamento do Recurso Especial 1.657.156 (com recurso repetitivo).

Observa-se, assim, que não se deve conferir verdade absoluta às prescrições médicas quando se tratar de tecnologias ainda não incorporadas no sistema público e no sistema suplementar, sob pena de desequilíbrio no planejamento, na organização e nas políticas de saúde.

 

 

Notas e Referências

[1] CUEVA, Villas Bôas. Palestra no seminário: A Saúde Suplementar na Visão do STJ. 24 Out. 2018. Disponível em http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noticias/Not%C3%ADcias/STJ-promove-em-outubro-semin%C3%A1rio-sobre-sa%C3%BAde-suplementar. Acesso em: 02 Nov. 2018.

[2] O Código de Processo Civil dispõe que:

Art. 784.  São títulos executivos extrajudiciais:

I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque;

II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor;

III - o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas;

IV - o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, pela Advocacia Pública, pelos advogados dos transatores ou por conciliador ou mediador credenciado por tribunal;

V - o contrato garantido por hipoteca, penhor, anticrese ou outro direito real de garantia e aquele garantido por caução;

VI - o contrato de seguro de vida em caso de morte;

VII - o crédito decorrente de foro e laudêmio;

VIII - o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio;

IX - a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, correspondente aos créditos inscritos na forma da lei;

X - o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas;

XI - a certidão expedida por serventia notarial ou de registro relativa a valores de emolumentos e demais despesas devidas pelos atos por ela praticados, fixados nas tabelas estabelecidas em lei;

XII - todos os demais títulos aos quais, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva.

[3] ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Relatório Mundial de Saúde, p. 69. Disponível em http://www.who.int/whr/2010/whr10_pt.pdf. Acesso em: 02 Nov. 2018.

 

Imagem Ilustrativa do Post: Computer business // Foto de: free-photos // Sem alterações

Disponível em: https://pixabay.com/en/computer-business-typing-keyboard-1149148/

Licença de uso: https://pixabay.com/en/service/terms/#usage

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

Sugestões de leitura