Na Pós-Modernidade[1], onde vivencia-se a quarta revolução industrial no que se refere a implementação tecnológica, altera-se completamente a percepção sobre tudo, especialmente a preocupação ambiental no que tange o resguardo global da Sustentabilidade[2] em sua essência.
Nessa lógica, destaca-se que essa preocupação decorre justamente da confecção de riscos iminentes que a modernidade tardia proporcionou, como bem nos lembra de forma acertada o sociólogo Ulrich Beck[3].
Não podemos nos tornar reféns de nossa trajetória histórica acerca das más escolhas que fizemos. Precisa-se encarar o momento presente com lucidez necessária para se encontrar o que torna a comunhão vital entre os seres um imperativo categórico a fim de permitir o desenvolvimento das vidas, pouco importando se forem do “norte” ou do “sul”. A Sustentabilidade, em sua dimensão plural de significados, é uma categoria aberta na qual busca, permanentemente, a vida sadia, segura e plena em sua existência. Dentre as maiores preocupação da Sustentabilidade está as alterações climáticas.
Conforme Trennepohl[4]: “esse cenário aparentemente caótico das alterações climáticas [...] não diz mais respeito a cidades ou países; diz respeito ao planeta. Definitivamente , o mundo ficou plano e as fronteiras mais próximas”.
A partir dessa assertiva, note-se que as agendas globais convergem com o discurso da Sustentabilidade global, haja vista que atualmente tornou-se claro que os danos ambientais irrompem Estados Nacionais, tendo um caráter transnacional, muito embora alguns Estados mantenham o posicionamento de “meu país em primeiro lugar”.
As mudanças climáticas sinalizam a postura de uma solidariedade sincrônica e diacrônica que ainda parece obscuro à maioria dos países. Não há mais tempo para debates ou previsões[5] que impedem o reconhecimento de uma situação calamitosa e exigem uma tomada de consciência além dos interesses dos Estados nacionais. Quais são hoje os mecanismos criados para se formar esse vínculo no qual mitigue os efeitos causados pelas mudanças climáticas?
Nesta linha, é preciso destacar que a globalização[6], além de expandir a visão de mundo da Economia e do fluxo econômico internacional, também surge como difusora do debate em prol de diversos temas, sobretudo o da Sustentabilidade – que abarca para além do tema fauna e flora, regendo toda a vida humana e inclusive não humana existente no planeta.
Passou-se a perceber que, muito embora viável os acordos e tratados internacionais acerca da Sustentabilidade e seus temas que derivam de suas dimensões, esses não geram força coercitiva eficaz a compelir um Estado a realmente aderir a um pacto efetivo pela Sustentabilidade Global.
Ademais, já pontua-se que, mesmo com a aderência desses Estados aos objetivos acordos, a exemplo do Acordo de Paris, ainda a irreversibilidade do dano ambiental é quase inequívoca. Além das providências a serem tomadas na esfera internacional, fala-se inclusive em litigância climática para uma real busca pela efetivação do Direito à Sustentabilidade.
Wedy[7] acerca da temática, traz relevante estudo sobre o tema, inclusive com recente obra específica sobre o assunto, destacando que os novos litígios com objeto ambiental, buscam suprir omissões estatais acerca da efetivação do Direito à Sustentabilidade.
Ressalte-se: essa última expressão – Direito à Sustentabilidade – deve ser o fenômeno que guia toda produção, interpretação e aplicação da legislação, especialmente ambiental e urbanística. Não basta um Direito Ambiental, mas um fenômeno – Sustentabilidade – que na sua dimensão plural esteja presente no controle econômico, na difusão educacional, nos novos sentidos de prestação da tutela jurisdicional, no aperfeiçoamento das liberdades humanas, no reconhecimento do ser humano inserido na cadeia vital terrestre e sua comunhão, ou melhor, sua dependência física, química, biológica com os demais seres que habitam o mundo.
Diante desse quadro, constata-se que determinados países tem aderido a um constitucionalismo verde, abarcando um Direito Fundamental ao Meio Ambiente que garante abrangência significativamente ampla, inclusive no que tange às Mudanças Climáticas.
Ademais, os acordos e tratados internacionais entre os países referente ao tema ambiental deveriam se sobressair igualmente em sua efetividade, não como uma mera perspectiva de realização e aderência dos objetivos globais como tem se notado, mas com um real comprometimento com o nosso lar, a terra.
A litigância climática denota a criação de um espaço maior para a sua ocorrência. É claro que, como seu dever – segundo a redação do artigo 225 da nossa Constituição -, o Estado precisa assegurar a sadia manutenção das vidas. Por esse motivo, menciona-se sempre a necessidade das Cidades Sustentáveis (artigo 2º, I da Lei 10257/2001) e a exigência legal para a sua viabilidade. Desde as cidades, percebe-se os efeitos da mudança climática e como se deve acionar o Poder Judiciário sempre que essas condições ameaçarem o existir plural.
No entanto, não se pode simplesmente acreditar que o Poder Judiciário seja o único mecanismo na qual assegura o poder de exigência para um Planeta limpo e seguro; para que haja a viabilidade do Direito à Sustentabilidade. A mudança climática é fenômeno transnacional e, por esse motivo, precisa-se de outros espaços jurisdicionais mais amplos que aqueles dentro das linhas territoriais do Estado-nação.
Nesse caso, o referido Direito à Sustentabilidade se consolida como um efetivo Direito Humano Fundamental para as presentes, como para as futuras gerações, cujas exigências por um Planeta vivo mais saudável se inicia pela litigância no Estado nacional, mas demanda, ainda, maior cooperação entre os povos por ser um fenômeno comum que prejudica o desenvolvimento sadio das vidas não humanas e humanas.
A fim de esclarecer ao leitor sobre quais objetos seriam possíveis trazer em eventual litígio climático, note-se por paradigma um caso no México, cuja determinação judicial obrigou-se a ter sistema de controle de poluição em todos os veículos.
No presente caso mexicano noticiado pela Folha de São Paulo[8], inclusive restringiu-se parcialmente a circulação de carros às quartas-feiras, tudo em decorrência de estudos onde constatou-se alterações na camada de ozônio e possibilidades de reverter riscos gravíssimos de poluição atmosférica – prejudicial a saúde e a vida humana.
Veja-se que a partir dessas constatações foi possível identificar a relevância das pesquisas científicas como fundamental para apurar impasses de tamanha gravidade, bem como permitiu chegar a conclusões acerca das ações humanas que favorecem a aceleração dos efeitos causados pela mudança climática.
O Governo Brasileiro, nesse panorama, precisa entender que: 1) a Pesquisa Científica nunca deixará de ser fundamental, 2) o Meio Ambiente e todo o Ecossistema de Vida são fundamentais em si mesmo e, sobretudo, para a existência da concepção de vida que conhecemos. Nesse prisma, o cuidado com o nosso lar deveria ser irrestrito e o Desenvolvimento Sustentável coerente e aplicável a fim de que alcance-se a almejada Sustentabilidade.
Notas e Referências
[1] A pós modernidade é, por isso, como um movimento intelectual, a critica da modernidade, a consciência da necessidade de emergência de uma outra visão de mundo, a consciência do fim das filosofias da história e da quebra de grandes metanarrativas, demandando novos arranjos que sejam capaz de ir além dos horizontes fixados pelos discursos da modernidade. BITTAR, Eduardo C. B. O Direito na pós-modernidade: reflexões frankfurtianas. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2009, p. 146.
[2] Neste sentido ‘’Sustentabilidade’’ é, em termos ecológicos, tudo o que a Terra faz para que um ecossistema não decaia e se arruíne. Esta diligência implica que a Terra e os biomas tenham condições não apenas para conservar-se assim como são, mas também que possam prosperar fortalecer-se e evoluir. ’’ BOFF, Leonardo. Sustentabilidade: o que é – o que não é. 4° ed. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2015. p. 31.
[3] [...] na modernidade tardia, a produção social de riqueza é acompanhada sistematicamente pela produção social de riscos. BECK, Ulrich. Sociedade de risco: rumo a outra modernidade. Tradução de Sebastião Nascimento. São Paulo: Editora 34, 2011. p. 23
[4] TRENNEPOHL, Terence. Direito Ambiental Empresarial. 2° Ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 35.
[5] “[...] Nos anos 1960 não tínhamos nenhuma consciência de que habitávamos um planeta vivo cujas necessidades estão em conflito com as nossas. É fácil demais fazer suposições sobre o futuro quando todos imaginamos que a vida está muito parecida com a de hoje, salvo alguns poucos detalhes interessantes ou desagradáveis”. LOVELOCK, James. Gaia: alerta final. Tradução de Jesus de Paula Assis e Vera Paula Assis. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2010, p. 47.
[6] Globalização é normalmente associada a processos econômicos, como a circulação de capitais, a ampliação dos mercados ou integração produtiva em escala mundial. Mas descreve também fenômenos da esfera social, como a criação e expansão de instituições supranacionais, a universalização de padrões culturais e o equacionamento de questões concernentes à totalidade do planeta (meio ambiente, desarmamento nuclear, crescimento populacional, direitos humanos etc.) Assim, o termo tem designado a crescente transnacionalização das relações econômicas, sociais, políticas e culturais que ocorrem no mundo. VIEIRA, Liszt. Cidadania e Globalização. 6. ed. Rio de Janeiro: Record, 2002. p. 72-73.
[7] WEDY, Gabriel. Litigância climática, Acordo de Paris e a solidariedade no Brasil. CONJUR. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2018-nov-03/ambiente-juridico-litigancia-climatica-acordo-paris-solidariedade-brasil. Acesso em: 11 jun. 2019.
[8] PORTELLA, Anna. Mexicanos entram na Justiça por direito a ar limpo e vencem. FOLHA DE SÃO PAULO. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2019/06/mexicanos-entram-na-justica-por-direito-a-ar-limpo-e-vencem.shtml. Acesso em: 12 jun. 2019.
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