– Mas por que eu deveria? Sem um argumento muito convincente, não me movo. Se não há uma boa razão, não vejo, não ouço, não falo. Ponho-me como os macacos de Nikko.
– Os três macacos não estão preocupados com isso. Eles estão à procura de paz. Acham que se não vemos, não ouvimos e não falamos sobre o mal alheio, tudo fica bem.
– Pois é do que se trata: se não há uma boa razão que me satisfaça, deixo de saber, não me interessa; definitivamente, não é negócio meu.
– Mas não é disso que falo. Aliás, esses macacos sugerem alienação. Tapam-se. Excluem-se da realidade. E não pensas que faltam falas e atos inteligentes sobre o mundo?
– Estás vendo? Tenho razão. É de se ficar em silêncio e de se manter distância; a maioria fala e comete tolices.
– Tens razão coisa nenhuma. Se não te acercas da ralidade não as sentes. Fechar-te ao mundo? Nada aprendes. E a conversa era outra, falávamos sobre a tua impertinência de sempre perguntar: Por que deveria?, Por que iria?, Por que faria?. Sempre me vens com um: Por que sim?.
– Claro! Exatamente! Insisto: não me movo sem que me mova a lógica.
– Lógica? Lógica é coerência, não é contabilidade de disposição anímica. Acreditas que vais organizar tuas emoções com se faz a um almoxarifado?
– Lá vens tu. Pareces desses azafamados que detratam a burocracia. A vida tem que ter ordem. Não se pode, sem mais, fazer qualquer coisa por qualquer motivo.
– Também penso assim. Mas não é possível ficar à procura de uma razão anterior para os gestos da vida.
– Ao contrário; deve-se, sim, procurar razões. A razão é o agente da atitude, dá-lhe mais certeza, dá uma clara indicação de quando fazer e quando não fazer.
– Uma configuração de panorama futuro? Desconfio que isso dificilmente se confirme. O devir é uma relação da tua vontade com o aleatório do mundo, e isso é o fascinante da existência.
– As pessoas... Olha, as pessoas agora me vêm com isso, de lançarem-se à sorte. Ao mesmo tempo vivem com medo, querem segurança. Como pode? As coisas têm que ser analisadas e programadas.
– Assim me parece... A ponderação... Mas isso não garante nada. Aí está a questão. As angústias vêm daí. Supões que as pessoas têm medo porque lhes falta a segurança possível. Ora, essa segurança que propões é impossível. A incerteza compõe o quadro da vida.
– Errado! Muito errado! Podemos perfeitamente traçar planos.
– Sim... Mas o futuro não tem compromisso com teus projetos. E sempre podemos, nós mesmos, mudar de ideia, não é? Aliás, é bem comum mudarmos de ideia, pois não?
– Minhas ações, desculpa, mas eu as submeto. Eu as condiciono, considerando o momento, as circunstâncias.
– Jamais! A conjuntura é que condiciona os teus atos. Repito, é uma relação: tu opinas, mas, se “navegar é preciso, viver não é preciso”; viver não é exato, mal fazendo um trocadilho com a poesia.
– Poetas estão fora do mundo, fico com minhas cautelas.
– Cautelas que também as tenho, como bússola, não como mapa. Levo-as comigo; carrego-as por aí; não me ponho estacionado nelas. Olha, achei na internet...
– Que é? De que se trata? São úteis?
– Escritos. São poéticos, são de meninas poetas, não vais gostar...
– Ora, não me amoles. Diz lá.
– Então ouve: ‘‘Ah!, fico com o por que não?, é desafio: por que não escutar, olhar, dizer? Por que não fazer? Sou livre para as tentativas. O por que sim? sugere prévio arrependimento’’ (Adriana Alves).
– Não estou para experiências arriscadas.
– O risco compõe o quadro: “Sou toda por que não?, os meus encontros e desencontros jamais serão indicados por um por que sim?. O por que não? é a aventura provocadora da vida” (Karine Gomes Vieira).
– Parece que queres abrir a vida... Eu quero fechar conclusão e cuidar da minha possibilidade.
– Nota como te enganas. Entre o teu fechar-te e o ousar te expor aos tantos possíveis: “Sim, sim: por que não?. Cada por que não? é uma possibilidade. Quero muitas possibilidades” (Maíra Zimmermann).
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