Tudo caminhava bem na vida de Adrian Doria. Vida financeira estável e bem-sucedida, casamento feliz e com filhos, carreira profissional a todo vapor, com reconhecimento internacional, boas amizades, saúde impecável, ou seja, todo sonho de vida para qualquer ser humano. Não devemos olvidar que Oscar Wilder preconizava que “Viver é a coisa mais rara do mundo, a maioria das pessoas apenas existe”. Adrian Doria não só existia, como vivia.
O enredo da película Contratempo, longa-metragem espanhol de altíssima qualidade, traz várias e várias surpresas para quem o assiste. Em contratempo não vale querer acertar o desenrolar da história no início ou no meio do filme, pois, com certeza, você errará o final. Filme de final surpreendente e impactante.
Adrian Doria como já exposto tinha uma vida perfeita e tudo caminhava bem, até que um dia…
Apesar da fama, da carreira profissional bem-sucedida e de ser “chefe de família”, o caráter de Adrian Doria mostrava rusgas e fissuras inconciliáveis com a ética, a moralidade e os bons princípios da sociedade trivial e conservadora. Adrian mantinha relacionamento extraconjugal com sua fotógrafa Laura Vidal, que também era casada. Os dois se encontravam de forma contumaz e sempre “escapavam” de suas rotinas para ficarem juntos em viagens criadas e negócios exaustivos de fins de semanas. Em uma dessas “escapadinhas” e quando tudo parecia que iria acabar bem, indo cada qual de volta para seu lar empós um final de semana de trabalho intenso, se envolvem em acidente de carro e a partir dali tudo vira de cabeça para baixo e culmina com o take inicial do filme onde Adrian aparece no chão com a cabeça machucada e Laura morta no banheiro.
Primeiro suspeito do crime: Adrian Doria. Motivação: queima de arquivo para não ter seu caso descoberto. Resultado: Processo contra ele no tribunal.
Adrian contrata a mais afamada advogada de defesa do país e passa a tecer com ela as linhas e as tessituras do caso.
Contratempo traz as figuras do homicídio, do perjúrio e da falsa identidade.
Laura foi encontrada morta. Por quem? Como? Motivação? Não foi suicídio, muito menos morte natural, logo só pode ter sido homicídio.
Apesar de a legislação brasileira não ter a figura do perjúrio, a legislação americana e várias outras ao redor do mundo, tipificam o crime de perjúrio, consistente no ato de ser proibido ao acusado mentir. O Brasil adota constitucionalmente o principio do nemo tenetur se detegere, ou seja, ninguém é obrigado a construir provas contra si mesmo. O Brasil só contempla a mentira no crime de falso testemunho, deixando, portanto, o acusado livre para elucubrar a sua versão do crime a ele imputado.
Por fim, Contratempo traz o crime de falsa identidade, que nada tem a ver com o crime de falsidade ideológica. O art. 307 do Código Penal traz a seguinte redação: “Art. 307 - Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.”
Fica a dica de que no filme vocês irão se deparar com alguém se passando por alguém. Mas quem? Por quem?
Contratempo quebra todos os paradigmas e rótulos de que só filmes estadunidenses merecem ser vistos e indicados. Cinema espanhol conquista todos os nossos encômios e panegíricos por essa belíssima filmagem e por outras incursões na sétima arte.
CONTRATIEMPO. Direção: Oriol Paulo. Elenco: Mário Casas, Bárbara Lennie, José Coronado, Ana Wagener, Francesc Orella, et al. COR, ESP, 2016, Suspense Policial, DVD, 106 min.
Imagem Ilustrativa do Post: The darkest hour is just before the dawn. // Foto de: Sundaram Ramaswamy // Sem alterações
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