Plano de saúde virou agência de avaliação de tecnologia?

05/12/2022

A Lei 14.454/2022 criou um sistema dúplice[1] na saúde suplementar, pois determinou que as operadoras de plano de saúde passem a cobrir tratamentos que não estejam no rol da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) desde que tenham eficácia comprovada.

Tal previsão pode enfraquecer institucionalmente a ANS se o mercado optar por acionar diretamente as operadoras na postulação de novos tratamentos (principalmente porque os requisitos para atualização do rol são muito mais robustos, nos termos do artigo 10-D da Lei 9.656/98).

Ou seja, admitir que apenas a eficácia é suficiente para novas coberturas significa criar um rito sumário de incorporação, um fast track que pode ser de pouca qualidade para o sistema de saúde suplementar (e que também vai impactar a saúde pública – SUS).

Além disso, não é crível imaginar que uma operadora de plano de saúde tenha a mesma capacidade técnica da ANS (ou da Conitec, se a comparação envolver a saúde pública) na análise de novas tecnologias em saúde.

Portanto, se for atribuída uma interpretação literal ao artigo 10, §13, I, da Lei 9.656/98 a operadora de plano de saúde tornou-se uma agência de avaliação de tecnologia em saúde. Contudo, não se trata de uma agência completa, porque não poderá fazer avaliação econômica. Não poderá avaliar efetividade, segurança, eficiência, etc. Ou seja, uma agência sem poderes e com limitações que podem inviabilizar operadoras, principalmente as de pequeno porte.

Assim, tudo indica que o preceito normativo mencionado exigirá uma interpretação conforme à Constituição e à legislação, sob pena de violação ao modelo regulatório da saúde suplementar (artigo 199 da constituição), à livre concorrência (artigo 170 da constituição), aos princípios da prevenção e da precaução (artigos 196 e 225 da Constituição) e à sistemática de avaliação de tecnologias em saúde (artigos 196 a 200 da Constituição).

 

Notas e Referências

[1]     Dúplice porque há dois comandos: 1) a Lei 9.656/98 atribui à ANS a elaboração e atualização do Rol de procedimentos e serviços e, 2) a Lei 14.454/2022 atribui à operadora de plano de saúde a cobertura de tratamento com eficácia comprovada à luz da saúde baseada em evidências (sem considerar os outros requisitos, como avaliação econômica, por exemplo).

 

 

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