Por Ellen Rodrigues - 18/07/2016
Nos anos seguintes à publicação do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/1990), a realidade brasileira evidenciou que a questão da infância e da adolescência não era judicante, mas sim social. Pois, se o discurso protetivo que sustentava o diploma não o caracterizava como punitivo, mas sim humanista – tendo como pilares a “proteção integral” e as garantias fundamentais – os desdobramentos verificados no país – ao final da ditadura militar e início da nova etapa democrática – demonstraram o quão distante esta Lei estava das práticas judiciais e policiais destinadas aos adolescentes brasileiros que efetivamente eram alcançados pelo sistema de Justiça Juvenil.
No bojo das mudanças que afetaram sensivelmente a percepção dos brasileiros acerca dos princípios insculpidos no ECA, destaca-se o tema dos direitos humanos. Como pontua Coimbra (2000), os direitos humanos foram concebidos, ao longo da história, como sinônimos de direitos inalienáveis da essência do homem. No entanto, tais direitos sempre estiveram reservados às elites, que determinam quais direitos devem ser garantidos e para quem. No Brasil, tal afirmação se faz sentir mais plenamente pelo fato de que – mesmo depois da redemocratização, da Constituição de 1988 e do ECA – os seres humanos pertencentes às classes menos favorecidas, que sempre estiveram fora desses direitos, foram mantidos à margem e seus comportamentos continuaram servindo de contraste aos padrões dominantes.
No entanto, diferentemente dessa visão que preponderou no pós-Constituição de 1988, a singularidade das lutas pelos direitos humanos no contexto da redemocratização do país consistia em, justamente, procurar romper com esse viés classista que historicamente esteve presente nas sociedades burguesas[1]. Por isso, a grandeza daquelas manifestações residia no fato de elas terem “rechaçado os movimentos tradicionalmente instituídos e politizado o cotidiano nos locais de trabalho e de moradia, inventando novas formas de fazer política”, permitindo que “novos personagens entrassem em cena”, como “novos sujeitos políticos” que, “no cotidiano, lutavam por melhores condições de vida, trabalho, salário, moradia, alimentação, educação, saúde e pela democratização da sociedade” (COIMBRA, 2000, p. 143).
Assim, os grupos que lutavam por direitos humanos no Brasil, naquela conjuntura autoritária, defendiam-nos, realmente, a favor de todos os cidadãos e
[...] ao resgatarem criticamente as várias experiências de oposição nos anos 60 e 70, fizeram emergir nos bairros e, logo a seguir, nas fábricas, “novas políticas” que substituíram as tradicionalmente utilizadas. Em cima, principalmente, das crises da Igreja, das esquerdas e do sindicalismo – que a ditadura acirrou e aprofundou – surgiu uma série de movimentos sociais produzindo novos caminhos. Estes, por sua vez, forjaram práticas ligadas à “teologia da libertação”, repensaram certas leituras do marxismo, a oposição armada à ditadura e o movimento sindical. Emergiram, desses novos movimentos sociais, dessas novas práticas, outros “rostos”, outras “fisionomias” dos direitos humanos. Vários grupos surgiram como importantes trincheiras contra as violências cometidas e a impunidade vigente [...] (COIMBRA, 2000, p. 143).
Como destaca Batista, V. (2013), na saída da ditadura, em meio a essa ambiência de lutas sociais, o país viveu um “hiato democrático”, que foi corroborado pela promessa de redemocratização com inclusão social. Infelizmente, como assinala a autora, nos anos seguintes, boa parte da sociedade brasileira – assolada por uma série de transformações[2] econômicas, políticas e sociais e, também, pelo aumento da violência – foi perdendo essa capacidade crítica e incorporando, pouco a pouco, os novos discursos autoritários, remodelados a partir do tema da segurança pública. Tais discursos, substituindo a Doutrina de Segurança Nacional, atualizaram uma série de estratégias em torno dos “inimigos públicos” brasileiros, agora identificados a partir dos criminosos comuns, principalmente aqueles envolvidos com o comércio varejista de drogas, notadamente representados pelos mesmos grupos já marginalizados:
Na transição da ditadura para a “democracia” (1978-1988), com o deslocamento do inimigo interno para o criminoso comum, com o auxílio luxuoso da mídia, permitiu-se que se mantivesse intacta a estrutura de controle social, com mais e mais investimentos na “luta contra o crime”. E, o que é pior, com as campanhas maciças de pânico social, permitiu-se um avanço sem precedentes na internalização do autoritarismo. Podemos afirmar sem medo de errar que a ideologia do extermínio é hoje muito mais massiva e introjetada do que nos anos imediatamente posteriores ao fim da ditadura (BATISTA, V. 2013, p. 2, grifo nosso).
Para Batista, V. (2013, p. 3), esse “retrocesso ou regressão das utopias democráticas que acalentávamos na saída da ditadura” teve efeitos perturbadores, que culminaram no enfraquecimento de importantes conquistas. No âmbito infanto-juvenil, a implantação de projetos consagrados na Constituição de 1988 e no ECA não garantiu os desdobramentos que se lhe eram essenciais. No mesmo sentido, foram rechaçadas as inovações legislativas no âmbito penal, incluídas pela reforma de 1984 (Lei 7209/1984)[3] e pela Lei de Execuções Penais (Lei 7210/1984).
Como resposta simbólica às críticas das elites quanto ao aumento da violência e aos novos direitos e garantias previstos para os presos adultos e adolescentes, foi editada a Lei de Crimes Hediondos (Lei 8072/1990). Tal Lei representou um dos maiores retrocessos do período, pois vedava a progressão de regime; a concessão de liberdade provisória; o livramento condicional e, entre outros expedientes, aumentava, desproporcionalmente, a pena de vários crimes já previstos no Código Penal, além de instituir a delação premiada. A partir da Lei 8072/90 teve início uma programação criminalizante[4] que iria ser amplamente alimentada nos anos seguintes por leis penais simbólicas e violadoras de direitos e garantias fundamentais.
Esse incremento punitivo se relaciona, também, com a competente campanha que associava, com apoio dos meios de comunicação de massa, o aumento da violência ao fim da ditadura militar. Desde então, o crime “tornou-se o tema nacional preferido pela mídia, pelos políticos. As elites fizeram da criminalidade sua principal trincheira de luta, em especial, nos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo”. As campanhas defendiam o autoarmamento da população, os linchamentos, o policiamento ostensivo nas ruas, apoiando-se no slogan de que “onde falta polícia sobram criminosos” (COIMBRA, 2000, p. 143).
Esses discursos – veiculados num momento crucial de mudanças na sociedade brasileira, em que os movimentos sociais, legitimados como interlocutores do Estado, tentavam reformar as polícias acostumadas ao arbítrio do regime militar – tinham por objetivo desarticular as lutas em favor dos direitos humanos, que passaram a ser percebidos como “privilégios de bandidos” (CALDEIRA, 1991, p. 162).
1. As dificuldades quanto à afirmação dos direitos humanos no Brasil e seus reflexos sobre o ECA
A partir do momento em que os direitos humanos no Brasil foram associados aos presos – adolescentes e adultos – que se amontoavam nas piores condições nas instituições superlotadas, sendo vítimas constantes de torturas e toda sorte de maus-tratos, verificou-se uma reação extremamente vigorosa por parte de diferentes setores da população, que – alimentada pelos discursos a favor da segurança pública e pelas campanhas midiáticas sensacionalistas e tendenciosas – passou a apresentar novas formas de subjetivação acerca de direitos, da justiça, do crime e da violência (BIRMAN, 2013). Segundo Caldeira (1991, p. 162), as rejeições acerca dos direitos humanos se dirigiam, inicialmente, às chamadas "regalias para bandidos", mas posteriormente repercutiram contra a ideia de direitos humanos de um modo geral.
A insatisfação quanto aos direitos concedidos pela legislação aos presos, terminou por ascender uma série de críticas em relação ao ECA, que foram hiperdimensionadas pelos meios de comunicação de massa, que produziram campanhas maciças acerca da periculosidade infanto-juvenil, sobretudo em face dos adolescentes pobres inscritos no tráfico de drogas (BATISTA, V. 2013; BATISTA, N., 2012; FEFFERMANN, 2009; COIMBRA, 2001).
Um dos episódios que contribuíram para essa reprodução ampliada, pela mídia de massa, da periculosidade da juventude popular foram os eventos ocorridos nas praias do Rio de Janeiro, no início dos anos 1990, que, sob a ampla cobertura sensacionalista, ficaram conhecidos como “arrastões”. Segundo Batista, V. (2003b), o medo dos “arrastões”, reforçou os pensamentos excludentes de uma elite que já achava que os pobres não deviam frequentar a orla, porque sujam e atrapalham a paisagem.
As respostas a essa intolerância para com esses meninos e meninas – que estavam tanto nas ruas como nas praias do Rio de Janeiro – não tardaram. Em junho de 1993, oito garotos, com idade entre 11 e 19 anos, que dormiam na Praça da Igreja da Candelária, no centro do Rio de Janeiro, foram executados por homens encapuzados, mais tarde, identificados como policiais militares. No episódio, que ficou conhecido como a “Chacina da Candelária”, além das vítimas fatais, dezenas de pessoas – a maioria crianças e adolescentes pobres que costumavam dormir no local – foram alvejadas pelos policiais. No mesmo ano, outro massacre ocorreu no Rio de Janeiro e ficou conhecido como a “Chacina de Vigário Geral”, que aconteceu na madrugada de 29 de agosto de 1993 na favela de Vigário Geral, localizada na zona norte do Rio de Janeiro e contou com vinte e uma execuções (COIMBRA, 2001).
Esses episódios – que podem ser compreendidos como parte de uma onda de reações contra as políticas em favor dos direitos das crianças e adolescentes, dos presos e das comunidades carentes em geral – embora tenham ocorrido na cidade do Rio de Janeiro, ganharam repercussão nacional, permitindo que o real e o simbólico invertessem suas posições. Assim, as balas, que atingiram as crianças e adolescentes da Candelária e as famílias pobres de Vigário Geral, alcançaram também as políticas públicas de direitos humanos e as lideranças democráticas das instituições policiais. Consequentemente, cresceram as demandas por mais controle sobre a população tida como insolente e perigosa, o que contribuiu para o aumento da despolitização da discussão sobre a questão criminal e sobre os direitos humanos do contingente alvo dos processos históricos de criminalização.
Episódios envolvendo a morte de crianças, adolescentes, homens e mulheres pobres passaram a ser naturalizados por boa parte da população e, amplamente manipulados pela mídia, terminaram por reforçar os apelos das classes privilegiadas por mais segurança:
Trata-se de criar novas ordens privadas – já que uma ordem global não parece ser mais exequível – onde seja possível manter os privilégios de classe. Assim, a segurança, com o significado em parte adquirido na campanha contra os direitos humanos, parece servir como emblema básico para que as camadas médias (não só nos seus níveis mais altos, mas também nos mais baixos) abandonem o espaço público que antes ocupavam nas cidades para viver nos seus condomínios privados, nas suas ruas fechadas por correntes, nos seus shopping centers em que se barra a entrada de pessoas com "má aparência", nas suas linhas privadas de ônibus (entre os condomínios e os shoppings; entre as casas e as escolas particulares), na privacidade de suas salas de vídeo, sempre guardadas por altos muros, equipamentos eletrônicos e, se possível, por vigilância privada. Tentam, assim, voltar a se sentir seguras, em espaços limpos da intervenção dos "outros". Se não é possível o mesmo grau de exclusão que existia antes, que pelo menos se criem espaços protegidos de exclusão, onde os iguais se sintam seguros (CALDEIRA, 1991, p. 172-173, grifo nosso).
Em 1995, em meio a esse panorama de críticas aos direitos humanos – e, ao mesmo tempo, de chacinas, de balas perdidas, de linchamentos e de assassinatos de crianças, adolescentes, homossexuais, líderes sindicais e pobres suspeitos de crime – o governo brasileiro lançou o Plano Nacional de Direitos Humanos, como resposta às pressões internacionais diante das sistemáticas violações de direitos verificadas no país. Como destaca Coimbra (2000), o referido plano representou uma “carta de boas intenções”, que longe de promover efetivas rupturas, revelou, ainda mais, o paradoxo democrático brasileiro, qual seja: a reafirmação das propostas de defesa dos direitos humanos, no âmbito formal, diante da manutenção de um modelo que, na prática, marginaliza e violenta, cada vez mais, imensas parcelas da população.
No que tange à infância e à juventude, a permanência dessa lógica excludente, incrementada pelas medidas de caráter repressivo, impediu a construção de estratégias capazes de garantir sua inscrição no espaço social nos termos propostos pelo ECA e pela Constituição de 1988. Apesar da criação de importantes programas[5], não foram erigidas redes de ancoragem que propiciassem a transformação do quadro social relativo à infância e adolescência pobres. Uma chave para compreender tais direcionamentos relaciona-se à percepção de que – embora a seletividade das práticas policiais, judiciais e das demais agências de controle social no âmbito infanto-juvenil tenham sido traços marcantes na construção social do nosso modelo de Justiça Juvenil – essa lógica incorporada à realidade brasileira, nos anos 1990, deve ser interpretada, também, a partir das transformações inerentes ao projeto neoliberal que se fortaleceu entre nós, nesse período.
Tal projeto, segundo Wacquant (2012), requer não apenas a reafirmação das prerrogativas do Capital e a promoção do mercado, mas também a articulação de quatro lógicas institucionais: i) a desregulamentação econômica; ii) a delegação, retração e recomposição das políticas de assistência social; iii) a expansão do aparato penal; iv) e a alegoria cultural da responsabilidade individual.
Discorrer sobre os diferentes processos que tornaram possível o fortalecimento do modelo neoliberal entre nós fugiriam aos limites deste estudo, por ora, pretende-se demonstrar como dois desses elementos mencionados por Wacquant (2012) – quais sejam: “a expansão do aparato penal” e “a delegação, retração e recomposição das políticas de assistência social” – afetaram as práticas da Justiça Juvenil e propostas humanistas insculpidas no ECA nos anos seguintes à edição.
Nas últimas décadas, “expansão do aparato penal” em face dos adolescentes e jovens, especialmente os negros e pobres, pôde ser sentida através dos sensíveis aumentos quanto às medidas de privação de liberdade, o que inflamou o quadro caótico de superlotação, já existente à época do SAM e da FEBEM. Além do incremento punitivo, a violenta política-criminal de drogas levada a efeito no país vem produzindo um verdadeiro genocídio da juventude popular brasileira, devidamente endossado pela mídia e naturalizado por boa parte da sociedade (WAISELFISZ, 2015; 2014; 2013; FEFFERMANN, 2006; COIMBRA & NASCIMENTO, 2003; BATISTA, V., 2003a; IPEA, 2003). Nesse sentido, defende-se que a expansão do aparato penal, característica do empreendimento neoliberal, verificada nos últimos anos, em face da juventude popular brasileira, confirma a tese de que as políticas de controle e apartação sociais, agora potencializadas por um aparato policial genocida, continuam representando – mesmo sob a égide do ECA – a viga mestre do sistema de Justiça Juvenil pátrio.
Já a lógica da “responsabilização individual” destaca-se, principalmente, no âmbito das famílias das classes populares. Ao serem chamadas, formalmente[6], para tomarem parte na “proteção integral” dos filhos, as famílias pobres tiveram suas precariedades ainda mais destacadas. Assim, o envolvimento das crianças e adolescentes pobres com o crime continuou sendo concebido como culpa individual dos mesmos, e também de seus pais. Diferentemente das propostas isonômicas insculpidas no ECA, as políticas tendentes à proteção especial e assistência à infância e à juventude pobres não foram acionadas a partir de uma perspectiva igualitária. Nesse sentido, no contexto neoliberal verificado no Brasil, nas últimas décadas, a responsabilização das famílias, pelo fracasso em evitar o envolvimento do contingente infanto-juvenil com o crime, aparece como outra grande permanência. Consequentemente, assim como as crianças, adolescentes e jovens pobres, suas famílias são, cada vez mais, alvos de criminalização.
A proposta formal do ECA era interromper esse processo histórico de criminalização das famílias, que sempre esteve legitimado pela chamada desestruturação familiar e/ou “situação irregular”. Para tanto, o Estatuto reconhece o direito de crianças e adolescentes permanecerem com suas famílias, independente de suas condições materiais, destacando que a pobreza como problema estrutural que não constitui motivo suficiente para a perda ou suspensão do poder familiar (art. 23[7]). No entanto, como destacam Coimbra e Ayres (2010, p. 66), novos discursos, como o da violência doméstica e do envolvimento com entorpecentes, passam a ocupar esse lugar, antes atribuído à pobreza ou à irregularidade, constituindo um competente aparato de criminalização das famílias pobres[8].
A partir de seus atributos individuais, e não mais sociais, as famílias continuam apontadas como núcleos de periculosidade, ensejadores de inúmeras formas de criminalização, que produziram efeitos desastrosos. Pois, ratificaram as posições defendidas nos “modelos sociopolítico-econômico dominantes”, que, se isentando da responsabilidade quanto às fragilidades desses núcleos familiares, centram-se na depreciação individual de seus membros (COIMBRA & AYRES, 2010, p. 66-67).
Segundo as autoras destacadas, tanto no panorama anterior, de “situação irregular”, quanto no atual, de “proteção integral”, os discursos/práticas veiculados no judiciário sobre o tema não questionam os problemas familiares a partir de perspectivas sociais, no sentido de compreendê-los como “fios de políticas públicas”, mas se limitam apenas a responsabilizar e culpabilizar, majoritariamente, as famílias pobres pela dita incompetência no desempenho de suas funções. Deste modo, “sustentam o eixo central do modelo neoliberal, o individualismo” e, longe de serem “neutros ou apolíticos, reafirmam a política vigente” (COIMBRA & AYRES, 2010, p. 66).
Apesar desse dantesco quadro, no âmbito formal, as famílias passaram a representar, nas últimas décadas, o elemento central das políticas de assistência social, com destaque para a Lei 8742/1993 (LOAS)[9] (ALENCAR, 2008). No entanto, diante do cenário sociopolítico-econômico vigente nos anos 1990, embora a família estivesse presente como alvo privilegiado dos programas sociais, sua incorporação[10] se deu partir de discursos e práticas conservadoras, que ignoraram a precariedade social vivenciada pela maior parte dos núcleos familiares brasileiros. O Estado, desobrigando-se de suas funções sociais, transferiu a essas famílias responsabilidades que se lhes eram inexigíveis a partir de sua realidade:
Essas condições revelam, pois, a perversidade de uma condição social que tende a se agravar em virtude da natureza das reformas em curso no país no âmbito dos direitos sociais. A máxima do Estado mínimo expressa-se no caso brasileiro através da restrição dos fundos para o financiamento de políticas públicas. Opera-se, na verdade, a privatização/filantropização da assistência social em uma lógica na qual o Estado paulatinamente se desobriga da responsabilidade [...]. Privados dos direitos garantidos por lei [...], emergem homens, mulheres, jovens e crianças destituídos do trabalho, da cidadania, fixando-se no limiar da ordem e da desordem. Em outros termos, suas existências são desenhadas em negativo[11], não são trabalhadores, não têm acesso à proteção dos direitos sociais garantidos pelo Estado e não tem qualificações para o trabalho (ALENCAR, 2008, p. 76).
No que tange à Justiça Juvenil, ao pronunciar a elevação do papel da família quanto à “proteção integral” das crianças e adolescentes[12], o Estado brasileiro não estabeleceu, paralelamente, um modelo residual de políticas públicas para que tal ideal pudesse ser levado a cabo pelas famílias das classes populares. De tal sorte, a despeito do ideário protetivo isonômico propugnado pela Constituição de 1988 e pelo ECA, às crianças e aos adolescentes, pertencentes às classes populares, o aparato policial-judicial continuou a chegar mais rápido. Segundo Mioto,
[...] essa situação coloca em evidência o problema da permeabilidade dos limites das famílias, da sua vida privada em relação aos órgãos do Estado e de seus representantes. [...] Mais complicado se torna quando se observa que a permeabilidade dos limites de privacidade familiar é diretamente proporcional à sua vulnerabilidade social. As famílias pobres, “desestruturadas”, são mais facilmente visitadas por um assistente social, para verificar suspeitas de violência, educação inadequada. As famílias consideradas “normais” conseguem defender com mais facilidade a sua privacidade, esconder com mais sucesso as suas violências e buscar alternativas de soluções sem publicização (MIOTO, 2008, p.50).
Além das famílias, a lógica da “responsabilização individual”, reforçada pelos discursos neoliberais, alcançou a adolescência e contribuiu para o incremento das sanções privativas de liberdade. Contrariando o paradigma de “proteção integral” e ignorando a situação de vulnerabilidade social dos adolescentes e jovens pobres quanto ao processo de criminalização histórico a que são submetidos, as demandas por punições severas se mostraram cada vez mais frequentes (SANTOS, 2000). Apoiados em teorias ultrapassadas – que insistiam na associação entre pobreza e criminalidade (BATISTA, 2003a) – e ignorando os modernos projetos de responsabilização – baseados nos mecanismos de diversion e programas alternativos de resolução de conflito – os agentes de poder priorizaram as sanções privativas de liberdade (internação), mesmo contando com um leque diversificado de medidas socioeducativas. Ademais, afastando-se da moderna pesquisa criminológica - que aponta o comportamento delinquente como um fenômeno episódico, que faz parte do processo de desenvolvimento dos adolescentes e tende a desaparecer na idade adulta (DÜNKEL, 2011) – as infrações praticadas por adolescentes foram, cada vez mais, reprimidas pelo aparato policial-judicial e hiperbolizadas pela mídia de massa, sendo percebidas como incapacidade individual de adaptação aos padrões de comportamento desejáveis.
No ano de 2002, o levantamento realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) apontou as irregularidades na execução das medidas socioeducativas. O referido relatório destacou que, passados doze anos da edição do ECA, muitos adolescentes conviviam diariamente com o não-cumprimento das determinações específicas para a medida de internação e também com a violação de direitos, como saúde, educação, assistência jurídica, entre outros. A superlotação das instituições foi apontada como o principal indicador do descompasso entre a prática e os princípios propugnados pelo Estatuto, que estabelece a privação de liberdade como último recurso (ultima ratio). Foram registrados casos de superlotação em todos os estados da federação, com destaque para a Paraíba, cujo índice de lotação atingiu a marca de 285%; a Bahia, com índices de 194%; o Maranhão, com lotação de 166%; o Distrito Federal, com 157% e o Acre, com 129% de lotação (IPEA, 2003).
A referida pesquisa apontava, ainda, que, aos adolescentes privados de liberdade, não eram oferecidas condições adequadas de aprendizagem, tampouco lazer, cultura e desenvolvimento. As oficinas ministradas, em geral, tinham caráter profissionalizante e eram voltadas a atividades que não despertavam interesse dos adolescentes. Também foi verificada a escassez de espaços para o desenvolvimento de atividades esportivas e de convivência, bem como o péssimo estado de manutenção e higiene de algumas unidades, cujas condições de atendimento foram consideradas subumanas[13]. Foram identificadas, também, unidades dotadas de isolamentos[14], prática terminantemente vedada pelo ECA (IPEA, 2003).
Outro aspecto que confirmava o caráter precipuamente punitivo da medida de internação era a precariedade das atividades de educação nos centros socioeducativos. Além de problemas quanto ao espaço físico, as salas improvisadas apresentavam deficiência de iluminação e ventilação, o que contribuiu para que 42% das instituições fossem consideradas inadequadas para as atividades escolares. Em grande parte dos estabelecimentos pesquisados, a grade curricular era a mesma do ensino da rede regular, ignorando as condições distintas a que os referidos adolescentes estavam sujeitos: “o tempo de aula é reduzido – em muitas unidades as aulas não duram mais que duas horas –, as atividades são mais restritas, as atividades de leitura são praticamente inexistentes, não há recursos audiovisuais” (IPEA, 2003, p. 39).
Também foi identificada a manutenção da lógica medicalizante[15], que permanece orientada pelo paradigma criminológico-positivista. Os adolescentes, em sua imensa maioria pobres, chegavam às unidades socioeducativas com a saúde comprometida, em razão das condições adversas em que viviam. No entanto os diagnósticos dos especialistas, via de regra, apontavam para problemas quanto à saúde mental, dermatologia, DSTs e drogadição. A pesquisa destacou o excesso de medicação a que eram submetidos os internos em algumas unidades. Embora a prescrição desses medicamentos somente possa ser feita por profissionais médicos, foi verificado que em apenas 38% das unidades esta regra era respeitada. Em muitas instituições, os medicamentos eram referenciados por auxiliares de enfermagem e até mesmo pelos monitores socioeducativos. Nesse sentido, de acordo com o IPEA, em alguns estados, a questão da saúde foi considerada o ponto mais delicado dos atendimentos destinados aos adolescentes privados de liberdade (IPEA, 2003, p. 48).
O descaso para com as políticas voltadas especificamente à reestruturação do aparato de Justiça Juvenil e à adequação das instituições de atendimento aparece como outra grande permanência. Até o ano de 2002 existiam poucas Varas da Infância e Juventude funcionando em conformidade com o ECA, sendo ainda mais escassas no interior. Os Conselhos Tutelares, por seu turno, careciam de estrutura e capacitação. No que tange à assistência jurídica, verificou-se que em 64% das unidades do país havia disponibilidade de advogados para acompanhamento jurídico. No entanto, essa disponibilidade era relativa, sendo comuns os relatos de advogados que, ao serem designados apenas para comparecimento em audiências, tomavam conhecimento do processo poucas horas antes de seu início. Pois, além do acompanhamento dos processos dos adolescentes, tais profissionais eram também responsáveis pelas questões jurídicas da instituição. Já a Defensoria Pública estava presente em apenas 25% das unidades. Considerando-se que a maioria dos adolescentes, por serem pobres, não tinham condições de arcar com advogados, dependendo, assim, da Defensoria Pública, esse registro foi considerado extremamente preocupante. Finalmente, quanto ao apoio aos egressos, foi verificado que a maioria das unidades não possuíam qualquer tipo de trabalho relacionado a este contingente (IPEA, 2003).
Considerações finais
A par de todas essas considerações, tem-se que, apesar de o ECA, eufemisticamente, atribuir às medidas socioeducativas natureza diversa de pena, elas representam, na prática, a as características do modelo punitivo destinado aos adultos. Nesse sentido, não é possível afirmar que, a partir da edição do Estatuto, a Justiça Juvenil brasileira estaria caracterizada como um “modelo garantista”.
Pois, na medida em que o Estado – constitucionalmente comprometido com a “proteção integral” das crianças e dos adolescentes – não foi capaz de promover políticas afirmativas que garantissem a assistência social dos mesmos e de suas famílias e os meninos e meninas, sujeitos às medidas de privação de liberdade, permaneceram em condições subumanas, entre grades, cadeados e isolamentos, numa flagrante violação a todos os princípios e garantias que norteiam os direitos da criança e do adolescente, não há que se falar em “modelo garantista”.
Assim, a despeito das reformas e avanços legislativos implementados pela Lei 8069/1990, a dinâmica produzida pelo sistema de Justiça Juvenil brasileiro, em meio a rupturas e permanências, continuou obedecendo às premissas do “modelo tutelar”, quais sejam: institucionalização e apartação social do contingente infanto-juvenil tido como perigoso e indesejável às classes mais favorecidas da sociedade, marcadas pela sistemática violação de seus direitos e de todos os princípios que orientam o Direito Infanto-Juvenil e o Direito Penal no Estado democrático de Direito.
“as leis não bastam”. “Os lírios não nascem da lei”[16].
Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases)[17]
Notas e Referências:
[1] Os movimentos a favor dos direitos humanos, no contexto da redemocratização, afirmavam a necessidade de conceber tais direitos para além das construções classistas, a fim de garantir e “afirmá-los enquanto diferentes modos de sensibilidade, diferentes modos de viver, existir, pensar, perceber, sentir; enfim, diferentes modos e jeitos de ser e estar neste mundo” (COIMBRA, 2000, p. 142). Como destaca Caldeira (1991), a luta por direitos humanos nesse período adquiriu significados inclusivos e plurais na medida em que se associava a diferentes práticas sociais, o que representava uma novidade na história e uma ampliação da abrangência das propostas de direitos dos cidadãos na sociedade brasileira.
[2] Tais transformações se relacionam com a nova ordem mundial que começou a afetar a realidade brasileira: o neoliberalismo, com seus corolários de globalização; livre mercado e livre comércio; privatizações e, principalmente, Estado mínimo no âmbito social e Estado máximo no âmbito penal, devidamente legitimados pelo paradigma da insegurança social (COIMBRA, 2000; COIMBRA & NASCIMENTO, 2012; BIRMAN, 2012;2013).
[3] Segundo Zaffaroni et al. (2006, p. 482-488), a reforma da parte geral do Código Penal de 1940, realizada no ano de 1984 – por uma comissão formada por Francisco Assis Toledo, Miguel Reale Júnior, René Ariel Dotti, entre outros – “constitui prova definitiva da vitalidade daquele Código”, que livre das influências negativas que sofreu à época, como as medidas de segurança e o duplo binário, foi aperfeiçoada por aportes teóricos indisponíveis no anos 1940, como a teoria limitada da culpabilidade; o finalismo; novas interpretações acerca da autoria e participação; entre outros. Além da substituição do critério do duplo binário para aplicação das medidas de segurança, e sua substituição pelo sistema vicariante, o sistema de penas também foi reformado, de modo a estabelecer os regimes fechado, semiaberto e aberto de forma progressiva. Também foram incluídas penas restritivas de direitos como substitutos das privativas de liberdade, em determinados casos (art. 44). No entanto, apesar das inovações, a reforma de 1984 conserva boa parte do CP de 1940, que representou “o sólido terreno” onde se edificaram.
[4] A programação criminalizante aperfeiçoada nessa conjuntura determinou a operação do sistema penal do empreendimento neoliberal “através de uma dualidade discursiva, que distingue os delitos dos consumidores (aos quais correspondem medidas despenalizadoras em sentido amplo) dos delitos grosseiros dos consumidores falhos (aos quais corresponde a máxima privação de liberdade neutralizadora)”. A política criminal relativa a esse segundo grupo foi energicamente acionada a partir da Lei de Crimes Hediondos (8072/1990), seguida pelas leis 8930/1994 (que aumentou o rol dos crimes hediondos, nele incluindo o homicídio qualificado); 9034/199 (que endureceu o entendimento acerca da liberdade provisória e da possibilidade de apelação em liberdade); 9677/1998 (que inclui alguns crimes contra a saúde pública no rol dos crimes hediondos, com finalidades políticas e eleitoreiras). O incremento punitivo foi seguido por outras leis, como a 9807/1999 (que estabeleceu a figura dos “réus colaboradores”); a 10409/2002 (que instituiu a “delação premiada consensual”) e as sucessivas leis que fixaram ou aumentaram a pena dos crimes de perigo abstrato (ZAFFARONI et al., 2006, p. 482-488).
[5] No conjunto de ações desenvolvidas, no âmbito da adolescência e juventude, pelo Executivo federal, a partir da edição do ECA, destacam-se programas voltados à saúde, à violência e ao desemprego. Paralelamente, foram desenvolvidos programas que propunham uma participação mais ativa dos destinatários, que deveriam atuar como protagonistas das atividades. Para a autora, o termo “protagonismo juvenil” vem sendo utilizado no Brasil, desde então, por parte de agentes públicos, de ONG’s e demais instituições de modo pouco crítico, já que não espelha uma relação pautada na ideia de autonomia e capacidade de participação, justamente em razão dos limites impostos pela carência de outras políticas complementares, cuja ausência impossibilita a formação de sujeitos autônomos, sobretudo no âmbito das classes populares. No que tange aos programas de prevenção à violência, o Ministério da Justiça empreendeu, a partir do final da década de 1990, diversos projetos em escolas, na maioria das vezes em parceria com ONG’s. No ano de 2002, existiam 33 programas federais destinados à juventude, grande parte executada sob a transferência de recursos ao executivo municipal ou estadual, ONG’s ou fundações empresariais. O traço comum desses programas era a ausência de uma proposta clara e eficiente, por parte do governo federal, para a população juvenil do país, além da ausência de canais de interlocução com os próprios jovens, que embora destinatários, não eram vistos como parceiros no desenho, implementação e avaliação dos projetos. Traçados, sobretudo, a partir da associação entre adolescência/juventude e problemas, as ações se voltaram para os grupos tidos como os mais caóticos, sob a promessa de minimizar a potencial ameaça que eles representam para a vida social (SPOSITO, 2008, NOVAES, 2008).
[6] Art. 4º do ECA: É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (BRASIL, 1990, grifo nosso).
[7] Art. 23 do ECA: A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar. § 1o Não existindo outro motivo que por si só autorize a decretação da medida, a criança ou o adolescente será mantido em sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em programas oficiais de auxílio. (Incluído pela Lei nº 12.962, de 2014). § 2o A condenação criminal do pai ou da mãe não implicará a destituição do poder familiar, exceto na hipótese de condenação por crime doloso, sujeito à pena de reclusão, contra o próprio filho ou filha. (Incluído pela Lei nº 12.962, de 2014) (BRASIL, 1990, grifo nosso).
[8] Percepção que também foi confirmada por Nascimento e Scheinvar (2010, p. 29-30) quanto aos Conselhos Tutelares. Através de pesquisas e acompanhamentos de estagiários do curso de Psicologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), junto aos Conselhos Tutelares, as autoras verificaram que a maior parte das denúncias que chegam aos conselheiros tutelares referem-se a famílias pobres. Diante dessa clientela, os conselheiros, apegados à sua autoridade e às suas verdades particulares e princípios morais, adotam práticas autoritárias que visam a transferência da responsabilidade pela violação de direitos para pessoa que chega pedindo auxílio, de modo que sua atuação acaba caindo na “culpabilização dos que lá chegam reclamando por seus direitos”.
[9] A assistência social constitui uma das políticas inseridas no âmbito da seguridade social, estando disciplinada pelos arts. 194, 203 e 204 da Constituição (BRASIL, 1998). A Política Nacional de Assistência Social foi aprovada pela Resolução n°15, de 15 de outubro de 2004, do CNAS, que expressa exatamente a materialidade das diretrizes da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, conhecida como a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS). A Norma Operacional Básica do Sistema Único da Assistência Social – NOB/ SUAS foi aprovada pela Resolução nº 130, de 15 de julho de 2005, do CNAS, e visa à implementação e consolidação do SUAS em todo o país (MDS, 2009, p. 6).
[10] A implementação dessas políticas se deu sem debates prévios acerca de suas próprias contradições. Sob a égide de um discurso “politicamente correto”, os programas familiares pautaram-se em princípios moralizadores, cujo paradigma era o modelo familiar dominante, em detrimento de uma valorização real das diferentes famílias existentes no Brasil (ALENCAR, 2008; MIOTO, 2008, p. 44; 2010).
[11] As observações de Alencar (2008) remetem ao conceito de “cidadania negativa”, proposto por Batista, N. (1996). Para Batista, N. (1996, p. 71), a cidadania negativa decorre dos limites impostos pelas práticas políticas para o acesso à cidadania por parte dos setores vulneráveis, ontem escravos, hoje massas marginais urbanas, que só conhecem a cidadania pelo seu avesso.
[12] Art. 227, CF/1988 (BRASIL, 1988) e Art. 4º ECA (BRASIL, 1990).
[13] Em muitas unidades, não havia banheiros suficientes; outras apresentavam infiltrações e escassez de água; outras não permitiam sequer a entrada de luz natural. Os relatos indicavam que alguns adolescentes dormiam em contato com o chão molhado, sem colchões. Muitas unidades funcionavam em prédios adaptados, outras em antigas prisões. Havia, ainda, unidades em que a recepção, as salas da direção e dos técnicos tinham boa aparência e estrutura física. Porém, as áreas destinadas aos alojamentos dos adolescentes e às salas de aula eram precárias e tinham aspecto prisional (IPEA, 2003).
[14] Embora a prática de isolamento já estivesse terminantemente proibida pelo Estatuto à época, gestores de 39% das unidades de internação pesquisadas declararam sua permanência. Esses gestores alegavam “que este espaço é uma forma de proteger os meninos quando sofrem ameaças dos demais e também para contê-los quando agitados”, ou seja, “um mal necessário”. Existiam, ainda, unidades que não possuíam alas de isolamento, mas sim as chamadas “salas de reflexão”, que se destinavam à mesma finalidade. Nos alojamentos, foram encontrados adolescentes que estavam há dias sem sair da cela, por estarem “de castigo” (IPEA, 2003, p. 34).
[15] Reflexões aprofundadas sobre a medicalização dos adolescentes nos centros socioeducativos brasileiros, bem como a incompatibilidade entre a reprodução dessa prática e o ideal de “proteção integral” são objeto de importantes trabalhos nas áreas da Psicologia e do Serviço Social, com destaque para o estudo “Referências técnicas para atuação de psicólogos no âmbito das medidas socioeducativas em unidades de internação”, produzido pelo Conselho Federal de Psicologia (disponível em: http://www.crpsp.org.br/portal/comunicacao/artes-graficas/arquivos/2010-CREPOP-Socioeducativas-UI.pdf) e para a obra “Direitos humanos e medidas socioeducativas uma abordagem jurídico-social”, organizada por Ana Celina Bentes Hamoy (disponível em: http://www.movimentodeemaus.org/data/material/direitos-humanos-e-mse.pdf . Acesso em 20 fev. 2016. Destaca-se, ainda, que, diante da permanência dessa malfadada prática nas instituições socioeducativas, o CONANDA, aprovou, em dezembro de 2015, resolução contra medicalização excessiva de crianças e adolescentes. Ver mais em: http://www.crprs.org.br/comunicacao/noticias/conanda-aprova-resolucao-contra-medicalizacao-excessiva-de-criancas-e-adolescentes-3215. Acesso em 20 fev. 2016.
[16] (ANDRADE, 1988, p. 70-73).
[17] Unidade Socioeducativa de Cariacica/ES, ago. 2013. Fonte: Sindicato dos Agentes Socioeducativos do Iases (Sinases). Disponível em: <http://g1.globo.com/espirito-santo/noticia/2014/07/superlotadas-unidades-de-menores-atendem-77-alem-do-limite-no-es.html> Acesso em: 10 jun. 2015.
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. Ellen Rodrigues é Professora de Direito Penal e Criminologia da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora; Doutora em Direito Penal (UERJ); Mestre em Ciências Sociais (UFJF); Advogada. E-mail: ellen.rodriguesjf@gmail.com . .
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