Os direitos fundamentais podem ser aplicados na perspectiva horizontal, quando a relação jurídica reúne apenas particulares (sem a participação direta do Estado).
No direito sanitário também é possível falar-se em eficácia horizontal (externa ou contra terceiros), principalmente na pandemia da Covid-19, que trouxe uma série de deveres e obrigações para as pessoas.
Ou seja, há situações concretas que permitem a exigência de práticas de condutas, como o uso de máscara (nos termos do artigo 3º, inciso III-A, da Lei 13.979/2020) ou a vacinação obrigatória – não compulsória (conforme decidiu o STF na ADI 6.586, Relatada pelo Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 17/12/2020).
No mesmo sentido é a posição de Bahia:
Mas, considerando o que se disse sobre a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, se o risco é concreto, palpável, inegável, e há séria expectativa de ser encampado pela Administração Pública, surgiu para o particular a capacidade de efetivamente se antecipar ao prejuízo iminente (disseminação do coronavírus), e adotar de logo medidas contra outros particulares. Figuras jurídicas assemelhadas já existem no direito penal (legítima defesa) e no direito civil (atos de defesa ou desforço para a proteção da posse, ou a exceção do contrato não cumprido). No caso do condomínio edilício, as medidas adotadas coletivamente terão de se valer da previsão geral de que “é dever do condômino não prejudicar a saúde dos demais” (art. 1.336, IV, do Código Civil brasileiro).[1]
O controle da limitação do ato de particular poderá ser promovido pelo Poder Judiciário (artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição da República Federativa do Brasil). E o parâmetro de análise pode ser assim delineado:
Fará uso o particular, assim, da ponderação, colocando o direito que pretende assegurar (saúde em ambiente de vizinhança) diante do direito de terceiro, com ele conflitante. Avaliar-se-á se o meio escolhido é adequado e necessário, para então buscar saber se o grau de importância supera do grau de prejuízo do direito de terceiro violado. Arrisca-se o particular a uma apreciação posterior desvantajosa por parte do Poder Judiciário, mas terá agido de plenamente lícito em caso contrário.[2]
Portanto, diante da situação de calamidade deflagrada pela Covid-19, os particulares também estão legitimados a adotar medidas contra terceiros tendentes a minimizar os efeitos da pandemia.
E isto está assegurado em razão do arcabouço normativo que caracteriza o direito sanitário, especialmente o artigo 196 (e seguintes) da Constituição da República Federativa do Brasil.
Notas e Referências
[1] BAHIA, Saulo José Casali. Pandemia, Relações Privadas e Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais: O Caso dos Condomínios Edilícios. In: Direitos e deveres fundamentais em tempos de coronavírus. Org. BAHIA, Saulo José Casali. São Paulo: Editora Iasp, 2020, p. 264.
[2] BAHIA, Saulo José Casali. Pandemia, Relações Privadas e Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais: O Caso dos Condomínios Edilícios. In: Direitos e deveres fundamentais em tempos de coronavírus. Org. BAHIA, Saulo José Casali. São Paulo: Editora Iasp, 2020, p. 264
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