O TRATADO DE ITAIPU COMO INSTRUMENTO DE COALIZÃO ENTRE O BRASIL E O PARAGUAI

04/07/2023

O tratado de ITAIPU é um acordo de cooperação internacional entre Brasil e Paraguai que viabilizou a construção e a operação da usina hidrelétrica de Itaipu, localizada na fronteira entre os dois países, mais precisamente no Rio Paraná, desde o Salto de Guairá até a Foz do Rio Iguaçu, pertencente em condomínio a ambas as nações.

Os instrumentos de ratificação foram trocados na cidade de Assunção, capital do Paraguai, na data de 13 de agosto de 1973, e, posteriormente, promulgados no arcabouço jurídico brasileiro mediante o Decreto nº 72.707/1973, sendo considerado um marco na história da cooperação internacional entre países da América Latina.

Em sua essência, conforme disposto no próprio preâmbulo do tratado, a cooperação se dá com base na cordialidade e na fraternidade existente entre os dois países. Nesse sentido, tem-se a tradicional identidade de posicionamento quanto à livre navegação dos rios internacionais da Bacia do Prata, como conduta que demonstram o caráter de solidariedade entre Brasil e Paraguai.

O tratado estabeleceu as bases para a construção da usina, prevendo a divisão da energia produzida entre os dois países de forma equitativa (Decreto nº 72.707/1973, artigo 13), conforme disposto na Ata Final firmada em Foz do Iguaçu, em 22 de junho de 1966. Além disso, o acordo prevê, entre outros fatores, a cooperação técnica entre os dois Estados, visando o desenvolvimento da região onde a usina está localizada.

Para isso, criou-se, em igualdade de direitos e obrigações, uma entidade binacional denominada ITAIPU, constituída pela ELETROBRÁS e pela ANDE, com a mesma participação no capital, sendo regida pelas normas estabelecidas no Tratado e no Estatuto (Decreto nº 72.707/1973, artigo 3º).

Por ser entidade binacional, possui foros nas cidades de Brasília e de Assunção, sendo que cada um dos países, respeitado as disposições do tratado e de seus anexos, aplicará a sua própria legislação de forma subsidiária (Decreto nº 72.707/1973).

Esse entendimento foi retificado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal nas Ações Cíveis Originárias (ACOs) nº 1.904, 1.905 e 1.957, ao considerar que as disposições do Tratado de ITAIPU e seus anexos prevalecem sobre as prescrições das leis brasileiras. Em seu voto, o ministro Marco Aurélio julgou que, em função da “artificial cisão entre hipotéticas Diretorias brasileira e paraguaia [...] não se pode falar na aplicação da legislação pátria sobre atos praticados por uma virtual administração brasileira da entidade” (CONJUR, 2020, n.p.).

O empreendimento de grande porte exigiu investimentos significativos por parte dos governos brasileiro e paraguaio (Decreto nº 72.707/1973, artigo 8º). No entanto, os benefícios gerados pela usina são ainda maiores, uma vez que a energia produzida é suficiente para abastecer cerca de 8,7% da demanda de energia elétrica consumida no Brasil e 86,4%% no Paraguai. Além de ser a líder mundial em produção de energia limpa e renovável, sendo responsável pela produção de mais de 2,9 milhões de gigawatts-hora (GWh) desde o início de sua operação, no ano de 1984 (ITAIPU, 2023-a).

Diante da extensão e da complexidade da obra, um dos fatores de preocupação é quanto aos impactos ao meio-ambiente. Por essa razão, a ITAIPU possui um compromisso de responsabilidade socioambiental incorporado ao planejamento estratégico, comprometendo-se a adotar políticas e práticas que tornem a sua gestão transparente e que contribuam com a melhoria da qualidade de vida das comunidades com as quais se tem contato, ao mesmo tempo que visa a promoção do desenvolvimento regional sustentável (ITAIPU, 2023-b).

Para isso, criou-se a Coordenadoria de Responsabilidade Socioambiental e o Comitê Gestor de Responsabilidade Socioambiental, os quais ficam responsáveis pelo acompanhamento e a orientação dos projetos realizados, entre outras funções.

No Brasil, as ações socioambientais se concentram na área de influência do reservatório, englobando várias cidades da região Oeste do estado do Paraná. Por sua vez, no Paraguai, a atuação tem abrangência nacional (ITAIPU, 2023-b).

Essa preocupação se estende à cadeia de suprimentos, uma vez que parte das contratações é realizada levando em consideração requisitos de sustentabilidade, com a finalidade de mitigar riscos sociais, ambientais e econômicos referentes à aquisição de materiais ou à prestação de serviços. No ano de 2021, 14% dos contratos pactuados pela ITAIPU cumpriram com tais requisitos, o que representa um total de US$ 40,11 milhões (ITAIPU, 2022, p. 61).

Em março de 2018, a ITAIPU, em parceria com o Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas (UNDESA), lançou o projeto Soluções Sustentáveis em Água e Energia, constituindo uma aliança internacional com a finalidade de promover boas práticas que contribuam com a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável que integram a Agenda 2030 das Nações Unidas (ITAIPU, 2020).

Destaca-se, ainda, com base nos indicadores publicados em 2022, a importância financeira da ITAIPU para o desenvolvimento local. Em 2021, a empresa pública binacional repassou, a título de royalties, para o governo brasileiro, o valor de US$ 201,5 milhões.

Desse montante, aproximadamente 65% foram destinados, direta e indiretamente, aos municípios afetados pelo reservatório. Dos 35% restantes, 25% foram destinados aos estados e 10% para o Ministério do Desenvolvimento Regional, o Ministério de Minas e Energia e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (ITAIPU, 2022, p. 57).

Ante o exposto, nota-se que o tratado de ITAIPU é um exemplo de como o direito internacional pode ser utilizado para promover a cooperação entre os países. Ademais, vislumbra-se que se trata de uma fundamental ferramenta para o enfrentamento de problemas que transpassam os limites territoriais de cada país, além de ser um importante instrumento para a soma de forças a fim de alcançar objetivos que sejam comuns a mais de um Estado.

 

Notas e referências 

BRASIL. Decreto nº 72.707, de 28 de agosto de 1973. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/antigos/d72707.htm>. Acesso em: 10 de jun. de 2023. 

CONJUR. Tratado de Itaipu Prevalece sobre a Legislação Brasileira, decide STF. Consultor Jurídico, 2020. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2020-set-08/tratado-itaipu-prevalece-legislacao-brasileira-decide-stf#:~:text=O%20Tratado%20de%20Itaipu%20%C3%A9,energ%C3%A9tico%20ao%20Brasil%20at%C3%A9%202023>. Acesso em: 12 de jun. de 2023. 

ITAIPU Binacional. Caderno de Indicadores: margem brasileira, 2021. 2022. Disponível em: <https://www.itaipu.gov.br/sites/default/files/af_df/CI_ITAIPU_2021_DIGITAL.pdf>. Acesso em: 10 de jun. de 2023. 

ITAIPU Binacional. Geração. 2023-a. Disponível em: <https://www.itaipu.gov.br/energia/geracao>. Acesso em: 11 de jun. de 2023.

ITAIPU Binacional. Geração. 2023-b. Disponível em: <https://www.itaipu.gov.br/responsabilidade/gestao>. Acesso em: 11 de jun. de 2023.

ITAIPU Binacional. Itaipu Binacional e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030: relatório de síntese. Dirección de Coordinación Ejecutiva, Directoria de Coordenação. Central Hidrelétrica de Itaipu: Itaipu Binacional, 2020. Disponível em: <https://www.itaipu.gov.br/responsabilidade-social/agenda-2030>. Acesso em: 11 de jun. de 2023.

 

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