O que dizer aos juízes sobre a arbitragem individual trabalhista? - Por Pedro de Souza Gomes Milioni

24/10/2017

Coordenador: Ricardo Calcini

Tão logo foi aprovada a lei nº 13.467 de 2017 (reforma trabalhista), notadamente o artigo 507-A da CLT, marquei uma reunião com um advogado amigo especializado em arbitragem nas áreas cível/empresarial. Meu intuito, à época, era de coletar maiores informações sobre o tema, recentíssimo na área trabalhista, especificamente quanto a alguns aspectos práticos. Sem dúvida depois daquele encontro percebi que o ponto central para que a arbitragem “sobreviva” na seara laboral é o Judiciário, ou melhor, que através do diálogo o Judiciário trabalhista compreenda com clareza a grandeza e a responsabilidade de seu papel institucional[1].

A arbitragem jamais concorrerá com a Justiça do Trabalho, assim como jamais houve qualquer concorrência entre a arbitragem e a Justiça Comum. A Justiça do Trabalho, brava, resistente e competente, continuará a desempenhar seu importantíssimo papel no julgamento da massa de processos, pois apenas uma minoria bem selecionada poderá se socorrer da arbitragem.

Num primeiro momento talvez existam fraudes de toda a espécie, mas, para combatê-las, existe o Ministério Público do Trabalho, a OAB (se houver a participação de advogados) e o próprio Judiciário. Vale dizer, o fato de pessoas inescrupulosas descumprirem a lei não é argumento jurídico válido para que a lei não seja aplicada. Lembro que em juízo, sob o olhar atendo do juiz togado, também existem muitas fraudes, infelizmente.

É preciso perceber que a chegada da arbitragem individual racionaliza e atualiza ainda que tardiamente o sistema processual trabalhista, que hoje, em modelo ultrapassado, direciona automaticamente todos os conflitos laborais exclusivamente ao Poder Judiciário que, há muito, se mostra assoberbado.

Ora, não é crível que em pleno século XXI somente o Judiciário trabalhista possa resolver, com a devida segurança jurídica, todo e qualquer conflito entre capital e trabalho.

Pela leitura dos parágrafos anteriores é fácil deduzir que, na minha visão, o art. 507-A da CLT é constitucional, pois a opção das partes para que o conflito seja dirimido através da arbitragem é o que garante que o princípio constitucional do acesso à justiça seja mantido incólume, pois, conforme exposto, as partes optaram por não ter o seu litígio solucionado pelo Estado.[2]

Entendo, ainda, que jamais houve qualquer limitação constitucional à arbitragem individual trabalhista. A limitação, anterior a reforma, se dava pelos termos do art. 1º da lei 9.307 de 1996, ao permitir seu cabimento apenas quanto a direitos disponíveis.

Logo, removido o impedimento legal, infraconstitucional, pois agora a lei expressamente autoriza a opção pela arbitragem, a via alternativa se mostra perfeitamente adequada aos termos do ordenamento jurídico brasileiro.

Vejo também, como constitucionalmente razoável, o critério adotado para definir em que tipo de contrato de trabalho poderá ser instituída a opção da arbitragem.

Na verdade, nenhum critério, baseado exclusivamente em termos de valor da remuneração, seria perfeito e livre de críticas. Contudo, não creio (aí falo com base no senso comum) que o valor previsto em lei seja típico ou que represente o valor percebido pela massa de trabalhadores brasileiros. Quero dizer com isso que o valor fixado em lei, por si só, já representa um “corte” sensível nos possíveis “clientes” da arbitragem.

É preciso consignar, ainda, que a eficácia prática da arbitragem no âmbito trabalhista depende, literamente, do apoio e da consciência do Judiciário, não apenas no respeito à lei e à autonomia da vontade, mas também por competir ao judiciário o deferimento de tutelas de urgência e a execução das sentenças arbitrais, por exemplo. Ou seja, um Judiciário desconectado com a realidade, talvez até mesmo preconceituoso, poderá simplesmente fulminar um relevante mecanismo de resolução de conflitos à disposição da sociedade.

Vale aqui repetir o que disse a Ministra Nancy Andrighi em recente palestra no STJ: “Especificamente em relação à arbitragem, respeitar a autonomia da vontade das partes equivale a honrar a autoridade do árbitro a quem as partes confiaram a resolução da controvérsia, tratando-o de acordo com o estabelecido na nossa lei de arbitragem = o árbitro é juiz de fato e de direito e, como tal suas decisões devem ser acatadas.”[3]

Enfim, acredito que a arbitragem, se pudesse, diria ao juízes trabalhistas: nós precisamos de vocês!


[1] Ressalto, em respeito ao leitor, que o presente artigo foi escrito em linguagem e tamanho condizente com o meio de comunicação em que será publicado. Assim, por razões óbvias, é claro que o tema é complexo e demanda uma série de questionamentos teóricos e práticos que não serão aqui abordados.

[2] Didier Jr., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 17 ed. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2015. p. 170.

[3] http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI265959,11049-Arbitragem+Para+ministra+Nancy+Judiciario+deve+zelar+por+autonomia+da

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