Coluna Direito e Arte / Coordenadora Taysa Matos
Num primeiro momento pode parecer estranho relacionar a pesquisa científica ao Doutorado, comparar doutorandos aos atletas que disputam os primeiros lugares no pódio nos esportes em uma Olimpíada, mas não é, temos muito em comum, senão vejamos.
Os atletas assim como os doutorandos se preparam durante anos para realizar seu sonho, seja atingir o auge de uma modalidade esportiva com uma medalha de ouro no peito ou um título acadêmico de Doutor. No Brasil, educação e esportes não são valorizados, incentivados e o simples fato de conseguir ir a uma Olimpíada ou entrar num programa de Doutorado seja em instituição pública ou privada já é uma vitória. Lembro que não sabia se ria ou chorava de alegria quando vi meu nome na lista de aprovados da PUCRS.
Quem está de fora vê os resultados, no caso da academia, nossos artigos publicados em revistas, livros, organização de eventos, participação em grupos de trabalhos, grupos de pesquisa científica relacionado ao tema estudado e finalmente a tese. Nas Olimpíadas quando os atletas conseguem a tão sonhada medalha, seja ela de bronze, prata ou ouro tornam-se os melhores em suas categorias e deve ser comemorado, mas os bastidores dessas vitórias só atletas e doutorandos sabem.
Até chegar à vitória o caminho é árduo, muitos treinos, abdicação de saídas, dedicação exclusiva ao seu sonho, muitas vezes, ficando a família e os amigos sem o devido espaço em nossas vidas.
As dores físicas fazem parte da rotina de um atleta, os tombos, machucados, joelhos que muitas vezes não suportam o desgaste de tanto impacto em cima deles, e surgem lesões, cirurgias, fisioterapias, e o atleta convive diariamente com dores físicas e emocionais. Doutorandos têm que publicar artigos, revisar periódicos, participar de eventos nacionais e internacionais, falar de sua pesquisa constantemente e muitas vezes sofrer com a falta de incentivo a pesquisa, ter artigos científicos reprovados ou não consegue cumprir com todos os prazos devido as atividades laborais que desenvolve para sobreviver. Não se vive de pesquisa no Brasil, no máximo, se sobrevive.
Como o Deus, Atlas que segura os céus e todo o peso do mundo em suas costas, assim são os favoritos ou não de uma Olimpíada, têm em seus ombros toda a responsabilidade de representar seu país com o apoio de uma vitória ou a frustração de uma derrota. Doutorandos muitas vezes representam o único integrante de uma família que conseguiu ter destaque na Universidade, são os sonhos de pais se realizando, é a contribuição de uma pesquisa que pode fazer a diferença na vida do doutorando e da comunidade científica e ter essa responsabilidade pesa sobre os ombros de qualquer mortal.
Quando Simone Biles desistiu de competir após a prova do salto, durante a disputa das finais por equipe da ginástica artística alegando sua saúde mental foi que as pessoas começaram a discutir a respeito da saúde mental dos atletas. Muitos apoiaram a decisão da ginasta e da comissão técnica que a acompanha, mas não faltaram ofensas disfarçadas de opinião a esta decisão. Segundo os críticos, Simone Biles deveria ter sido mais responsável e profissional e continuado a competir independente do que estava sentindo. O subprocurador-geral do estado do Texas, Aaron Reitz, chegou a escrever e publicar um texto na internet chamando-a de vergonha nacional, egoísta e infantil.
Todas as vitórias de Simone Biles foram apagadas, porque Aaron Reitz não teve empatia ou soube compreender um dos momentos mais difíceis da atleta, o de desistir de seus sonhos e o preço que irá pagar por isso. Assim, é na pesquisa científica, às vezes pode-se ser uma excelente pesquisadora, professora, publicar em revistas conceituadas, publicar livros e não defender a tese, pelos mais variados motivos e a saúde mental dos pesquisadores no Brasil deve ser motivo de preocupação.
O que estes críticos de internet não entendem é que a saúde mental é essencial para qualquer pessoa realizar um bom trabalho nos esportes ou no Doutorado. Como ser a melhor do mundo ou produzir um trabalho que seja relevante se você está em conflito consigo mesmo (a), quando você não sabe o porquê de ter iniciado esta trajetória, quando seu primeiro pensamento antes de levantar todos os dias é em desistir, nada mais faz sentido, a trajetória é contestada em sua memória, você se sente um impostor (a) que não é digno (a) de estar ali representando seu país, ou pesquisando entre os melhores.
Simones Biles ensinou que é possível desistir, que o atleta tem esse direito ou de adiar seus sonhos, quando sua saúde mental está fragilizada. Somos humanos e isso quer dizer que também temos fraquezas, medo, ansiedade, tristeza e que apesar dos treinos, de tudo que foi realizado até aquele momento a mente pode simplesmente não resistir a tanta pressão. No final, Simone Biles competiu na trave e conseguiu o bronze com uma apresentação belíssima. Essa medalha de bronze equivale a um ouro, porque o maior desafio é vencer a si mesma, e nisso ela já é vitoriosa.
E o doutorando pode desistir? Acredito que sim. Se a saúde mental do pesquisador (a) estiver debilitada e o que era para trazer conhecimento e satisfação e contribuir com a pesquisa e a ciência causar mais dor e sofrimento, quando a realização de um sonho torna-se um pesadelo é possível mudar de sonho, desistir para sobreviver, buscar outras alternativas em que o processo possa ser concluído.
Outra alternativa é fazer como a atleta holandesa de atletismo, Sifan Hassan, que tropeçou em Edina Jebitok do Quênia, caiu, levantou-se rapidamente e ante os olhares atônitos do mundo todo conseguiu vencer em primeiro lugar a bateria das eliminatórias dos 1.500 metros do atletismo feminino.
Seja qual for a decisão que o atleta ou doutorando tomar, que ela seja consciente que sua saúde mental é importante, que não é frescura, que ninguém sabe suas dores. Você pode escolher desistir e está tudo bem ou pode escolher levantar e continuar desde que preservando sua saúde mental.
E como diz minha orientadora Continuemos...
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