O porquê da prescrição penal – Por Paulo Silas Taporosky Filho

30/07/2017

A prescrição figura no Código Penal como sendo uma das causas de extinção da punibilidade, estando prevista enquanto tal no artigo 107, inciso IV. A regulação de como e em que hipóteses tal instituto se aplica está presente nos artigos que seguem, do 109 ao 119 do Código Penal

Rogério Greco conceitua a prescrição como sendo “o instituto jurídico mediante o qual o Estado, por não ter tido capacidade de fazer valer o seu direito de punir em determinado espaço de tempo previsto pela lei, faz com que ocorra a extinção da punibilidade[1].

Mas qual seria a razão para a existência da figura da prescrição penal? Qual é o fator que lhe dá o embasamento justificante? O que e para que é a prescrição?

A prescrição ocorre em face do decurso de tempo, de modo que há a perda do poder de punir do Estado, ocasionando a extinção da punibilidade. Os motivos que dão ensejo ao instituto da prescrição são de política criminal. Algumas teorias apresentadas pela doutrina buscam explicitar tais razões, podendo se apontar aqui resumidamente[2]:

  • Esquecimento da infração: com o passar do tempo, deixa de existir a necessidade do ius puniendi em decorrência do esquecimento da sociedade para com aquela lembrança do fato tido como delituoso;
  • Expiação moral: o tempo mata. Mata no sentido de causar aflição, tormento e angústia. Nesse sentido, o longo tempo em que passa o indivíduo na expectativa de ser ver processado ou condenado pela prática de um fato tido como criminoso, já acaba sendo uma forma de punição, não havendo mais a necessidade daquela pena formalmente prevista;
  • Emenda/Psicológica: tudo flui. As coisas mudam. Assim também para com a pessoa que praticou no passado um fato tido como delituoso. O comportamento das pessoas muda com o passar do tempo. Aqui se presume que essa mudança ocorra para “melhor”, “regenerando” o indivíduo, de modo que diante de uma personalidade diferente que outrora, eventual pena acabaria se tratando de medida inútil;
  • Dispersão da prova: as provas se perdem com o decorrer do tempo, assim como todas as coisas. Lembranças são esquecidas, coisas são perdidas, lugares mudam. Assim sendo, o julgamento de um caso cujos fatos supostamente teria se dado há muito, tratar-se-ia de um julgamento injusto;

Para René Ariel Dotti, ao tecer noções gerais acerca da prescrição:

O tempo é um fenômeno relevantíssimo para se determinar a aplicação da lei penal e que opera não somente para o efeito de se extinguir a punibilidade [...], mas também para muitos outros efeitos. A prescrição é uma das formas de extinção da punibilidade pelo decurso do tempo. A passagem do tempo apaga a lembrança dos fatos fazendo com que o crime caia no esquecimento de maneira a cessar o alarma e o desiquilíbrio social por ele causado.[3]

Tem-se assim a questão de o fator tempo apagar determinas coisas. Não as lembranças dessas ou o próprio fenômeno ‘acontecimento’ que se fez presente num determinado espaço-tempo. Não se diz de ignorar eventos passados. Mas no aspecto jurídico, adota-se tal entendimento. Assim é e merece ser. Conforme aponta a doutrina, brevemente acima mencionada de modo resumido, os fatores justificantes são vários, podendo interpretá-los enquanto tal com base num único fator, ou lidos em conjunto.

Imagine-se os efeitos e consequências que se teria num cenário hipotético onde inexistisse a figura da prescrição? Para ilustrar com um exemplo, tem-se Jean Valjean, personagem literário de Victor Hugo presente em “Os Miseráveis”. Jean Valejan é perseguido implacavelmente pelo Estado durante toda a obra, independentemente do tempo que já tenha se passado desde quando do seu “crime”. Na obra é possível vislumbrar, fazendo-se um aparato reflexivo, a incongruência de um sistema em que a prescrição não se faz presente.

São tais as razões dentre possíveis outras, de política criminal, que justificam a figura da prescrição penal.


Notas e Referências:

[1] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral. 16ª Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2014. p. 733

[2] Com base no resumo presente em NUCCI, Guilherme de Souza. Dicionário Jurídico: penal, processo penal e execução penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.

[3] DOTTI, René Ariel. Curso de Direito Penal: parte geral. 5ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013


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