O IMPACTO DA LEI N.º 13.467/17 NAS NEGOCIAÇÕES COLETIVAS DE TRABALHO

20/08/2019

A partir de 11de novembro de 2017, passou a vigorar no ordenamento jurídico brasileiro a Lei n.º 13.467, alterando mais de uma centena de artigos da Consolidação das Leis do Trabalho, trazendo novas previsões no direito material, processual e previdenciário. Porém, o objeto aqui é analisar as alterações nas negociações coletivas de trabalho diante da nova era do direito disruptivo, efetivando na prática o reconhecimento esculpido no inciso XXVI do artigo 7º da Carta Magna, valorizando as negociações e trazendo segurança jurídica aos envolvidos.

Com o avanço da sociedade e da tecnologia, deve se levar em conta o impacto gerado nas relações pessoais e interpessoais, pois essas passaram a sofrer diversas transformações em suas essências, modificando a dinâmica da vida em da sociedade nos mais diversos setores. Isso, consequentemente, altera o modo da fala, dos costumes, do comportamento, da dinâmica e, em especial, alterou-se exponencialmente a relação entre empregado e empregador em um curto período de tempo, modificando a concepção do mundo moderno.

Tais mudanças ocorrem quase que diariamente em uma velocidade impressionante e vai se moldando de acordo com as necessidades humanas que se balizam no tempo e no espaço afetando o contexto social. Com isso, há o uso da tecnologia aplicada no âmbito empresarial-administrativo, mostrando-se cada vez mais apto a receber as inovações do Direito 4.0, onde os valores básicos passam a ser redefinidos conforme a mutação nas relações impactadas pelo acesso a informação, dando novos contornos na dinâmica laboral.

Tendo essas considerações no âmbito social como ponto de partida, surge a necessidade de novos mecanismos pelos quais atividades humanas tendem a acelerar naturalmente e, por vezes, modificadas significativamente para que as tais relações possam acompanhar o desenvolvimento, criando-se, assim, uma nova perspectiva nas relações trabalhistas.

Sendo uma das relações mais intensas do mundo jurídico, a relação entre capital e mão-de-obra gera intensos conflitos sociais, pois a troca que há em tal relação está estritamente ligada a fatores que tendem a influenciar  a sociedade como um todo, bem como na economia de um modo geral, havendo conflitos que jamais se cessarão, razão essa pela qual se busca mecanismos de equilíbrio. Portanto, face à Lei n.º 13.467 de 2017, o diálogo e a autocomposição se tornam as mais nobres ferramentas de pacificação nos dias de hoje.

Fato é que o empregador, por si só, possui naturalmente a característica de ser coletivo, pois, ao mesmo tempo em que ele desempenha a função socioeconômica e político-empresarial administrativa, há nele a aptidão de causar impactos sociais de forma ampla e direta com força para modificar as relações estruturais no núcleo social; lado outro, o empregado é um ser individual que necessita de proteção, ocorrendo na prática a junção da classe trabalhadora na formação dos sindicatos, para assim se igualarem com os seres coletivos empresariais. Nesse sentido, há um abismo na disparidade de forças entre os seres da relação, fundamento pelo qual o Direito Coletivo do Trabalho vem em grande escala como medida protetiva na relação de trabalho, equilibrando jurídica e politicamente as desigualdades.

Diante disso, surge no ramo jurídico coletivo a função social das negociações coletivas, visando equilibrar a relação desequilibrada onde há, de um lado, o ser coletivo empresarial e, de outro, o ser coletivo obreiro, representados na maior parte por sindicatos dos trabalhadores em primeira instância como sendo os protagonistas constitucionais para representar a categoria na formação das negociações coletivas.

Pois bem, as negociações coletivas possuem a finalidade de equilibrar as relações  trabalhistas, criando contratos coletivos de trabalho aptos a produzirem efeitos concretos de forma harmônica e equilibrada que respeita a autonomia de vontade das partes, pois atende de efetivamente as especificidades e peculiaridades entre os acordantes. Portanto, a negociação coletiva é uma ferramenta essencial de pacificação social, atendendo o pactuado que gira em torno dos interesses coletivos.

A principal mensagem que a Reforma Trabalhista trouxe no contexto das convenções e dos acordos coletivos, foi a valorização na essência que gerou uma grande importância para com os tratados, classificando-os como negócio jurídico, além da maior concretude ao princípio da intervenção mínima do Estado face à autonomia da vontade coletiva, conforme o parágrafo 3º do artigo 8º da Lei 13.467/17. Desse modo, a intenção é restringir maiores interpretações judiciais, condicionando a simples verificação quanto às normas dos acordos ou convenções coletivas, visando segurança jurídica às partes.

Com a entrada em vigor da Reforma Trabalhista, deu-se início a uma nova era no mundo trabalhista, certificando a prevalência do negociado sobre o legislado, ou seja, as convenções e os acordos coletivos, instrumentos das negociações entre empregadores e empregados, terão prevalência sobre a Lei nos casos em que as negociações versarem dentro do rol permitido do artigo 611-A, desde que respeitados assuntos quanto jornada de trabalho e seus limites constitucionais; banco de horas; intervalo intrajornada respeitando o limite mínimo de 30 minutos; adesão ao programa seguro-emprego; plano de cargos, salários, funções e suas identificações; regulamentos empresariais; representante dos trabalhadores no local de trabalho; teletrabalho, regime de sobreaviso e trabalho intermitente; remuneração conforme a produtividade; gorjetas e remuneração por desempenho individual; modalidades de registro de trabalho; compensações; enquadramento do grau de insalubridade; prorrogação da jornada de trabalho em ambientes insalubres sem que haja licença prévia das autoridades como o Ministério do Trabalho; prêmios de incentivos em bens ou serviços e participação nos lucros ou resultados da empresa.

No contexto social vigente, a prevalência do negociado sobre o legislado deve se ater aos princípios e garantias constitucionais para não jogar a sorte os direitos conquistados em uma mesa de negociação, havendo limites expressos dos direitos a serem negociados, estando as vedações no artigo 611-B da mesma Consolidação. Ao fazer uma breve análise deste artigo, pode chegar á conclusão de que o legislador se preocupou com a possível ocorrência de inconstitucionalidade dos acordos e convenções coletivas, de modo a constar um rol taxativo de direitos que não suportam serem objetos das negociações coletivas, constituindo objeto ilícito das negociações coletivas, tais como as normas de identificação profissional, inclusive as anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social; seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário; valor dos depósitos mensais e da indenização rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço; salário mínimo; valor nominal do décimo terceiro salário; remuneração do trabalho noturno superior à do diurno; proteção do salário na forma da lei; salário-família; repouso semanal remunerado; remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50%; número de dias de férias devidas ao empregado; gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal; licença-maternidade com a duração mínima de cento e vinte dias; licença-paternidade nos termos fixados em lei; proteção do mercado de trabalho da mulher mediante incentivos específicos, nos termos da lei; aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei; normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho; adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas; aposentadoria; seguro contra acidentes de trabalho a cargo do empregador; ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho; proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência; proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos; medidas de proteção legal de crianças e adolescentes; igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso; liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho; direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender; definição legal sobre os serviços ou atividades essenciais e disposições legais sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade em caso de greve; tributos e outros créditos de terceiros, além das disposições previstas nos artigos. 373-A, 390, 392, 392-A, 394, 394-A, 395, 396 e 400 desta Consolidação.

Embora haja previsão na Constituição Federal, nos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias e em leis esparsas, tais direitos não foram modificados ou suprimidos pela Lei n.º 13.467/17. Assim, o artigo 611-B da CLT vem para reafirmar a indisponibilidade de serem objetos nas negociações coletivas, além de enfatizar a ideia de que a prevalência do negociado sobre o legislado não é absoluto.

Ressalta-se, a prevalência do negociado sobre o legislado pode parecer uma “faca de dois gumes”, ficando certos direitos trabalhistas a cargos dos negociadores e seus interesses. Em que pese a lisura dos concordantes, é fundamental trazer para dentro da fase negocial as reais circunstâncias em que vivem, fazendo com que diante da realidade que assola as relações do trabalho, olhem esses pontos com mais cuidado e dedicação na hora de fecharem os acordo, assegurando a real autonomia da vontade coletiva.

Para tanto, ao almejar um resultado justo e equilibrado nas negociações coletivas, o caminho deve se cercar de princípios norteadores, princípios que sustentam as tratativas para que atinjam de fato o melhor dos resultados possível, respeitando as garantias mínimas. Os princípios possuem extrema importância, funcionando como armação no ajuste das normas entre os envolvidos, dando validade ao pactuado  e eficácia jurídica.

Assim, impera o princípio da lealdade contratual, estabelecendo que as negociações coletivas devam se cercar da boa-fé objetiva nas fases pré e pós-contratual, ou seja, boa-fé objetiva para pactuarem e para executarem as cláusulas dos acordos, sendo os princípios com maiores bases, pois com o advento da Reforma Trabalhista, criou-se a figura de que o negociado prevalecerá sobre o legislado.

Por conseguinte, a Lei n.º 13.467/17, levou-se em conta as medidas assecuratórias das negociações coletivas de trabalho, mostrando a efetividade das negociações e o que isso representa na nova era da modernização trabalhista, trazendo a realidade dos empregados e empregadores para dentro do contrato, se moldando e atendendo as necessidades de acordo com as categorias de modo mais abrangente ou restrito no âmbito de uma empresa, pois as negociações coletivas se tornam um mecanismo de pacificação social trabalhista, onde as partes se encontram em pé de igualdade, ou seja, a Reforma Trabalhista garantiu maior segurança jurídica para as partes, pois a prevalência do negociado faz valer plenamente a eficácia da vontade coletiva face a interferência estatal.

Portanto, diante disso se extrai que, estando em situações sociais e econômicas  distintas entre os protagonistas da relação de trabalho, o instrumento coletivo dá igualdade para as partes, em que pese a disposição de direitos trabalhistas serem negociados, o princípio da boa-fé objetiva contidos nas cláusulas dos acordos coletivos vem para garantir a boa negociação, de modo que cumpra sua função social protetiva à classe trabalhadora e resguarde os direitos dos empregadores. Nesse sentido, já previa Georges Scelle em 1927: “Ontem a Lei foi do patrão, hoje a lei do Estado e amanhã lei das partes”.

 

 

Notas e Referências

AGUIAR, Antônio Carlos. Negociação Coletiva de Trabalho, 2ª ed. São Paulo: Saraiva Jur, 2018.______. Reforma Trabalhista Aspectos Jurídicos Relevantes, São Paulo: Quartier Latin, 2017.

ALENCAR, Zilmara. A Face Sindical da Reforma Trabalhista: Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, Brasília: Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar – DIAP, 2017.

AROUCA, José Carlos. Curso Básico de Direito Sindical, Da CLT à Reforma Trabalhista de 2017 (Lei n. 13.467), 6ª ed. São Paulo: editora LTr, 2018.

INÁCIO, José Reginaldo. Sindicalismo e Ética: (re)ação, sanidade e trabalho, Belo Horizonte: Crisálida, 2012.

PETTA, Augusto César; Gestão Sindical, Um sindicalismo atuantes e contemporâneo para os novos desafios do mundo do trabalho e da luta social, São Paulo: Anita Garibaldi, 2013.

SANTOS, Ronaldo Lima dos. Teoria das Normas Coletivas, 3ª ed. São Paulo: LTr, 2014.

 

 

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