O futuro não é mais como era antigamente. A temporalização da constituição de 1988 na ótica do Direito & Rock

19/05/2015

Por Germano Schwartz - 19/05/2015

Em 1986, a Legião Urbana era um dos grupos mais relevantes do cenário BRock, expressão utilizada por Nelson Motta para designar o rock brasileiro da década de 80 do século passado. Renato Russo ainda não era o líder messiânico de uma juventude sedenta por mudanças. Tais mudanças, basicamente, diziam respeito à volta da democracia por meio de uma nova Constituição. A Constituição de 1988.

O álbum Dois foi um marco para a banda de Renato Russo. Vendeu mais de um milhão de cópias e trazia um sem número de hits. Muitas dessas músicas embalaram os sonhos de mudanças na sociedade brasileira, razão pela qual o rock do Brasil dos anos 80 do século passado ainda é tão importante. Ele ainda é lembrado e cantado. A hipótese que defendo em meu livro sobre Direito & Rock é a de que esse estilo musical se torna um fenômeno na medida em que se coaduna com as expectativas normativas do sistema social. Foi o caso do BRock.

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No álbum referido, uma das canções mais marcantes tinha o título de Índios. Em uma licença poética, Renato Russo dizia que o “futuro não é mais como era antigamente”. Veja-se: uma juventude que clamava por maior liberdade de expressão, pelo fim da censura, pelo voto direto, entre outros, já demonstrava que a descrição de futuro dificilmente pode ser apreendida no presente sem uma relação distintiva entre passado e futuro.

Em uma perspectiva de Direito & Rock, a música apresentava a descrição de futuro utilizada por Luhmann. O presente como uma distinção entre passado e futuro. O Capital Inicial, na música “Todos os Lados”, cantava:

Mas eu não quero sentir saudade

De um futuro pela metade

De um futuro que já passou

Uma coincidência. O próprio BRock se desiludiu com o futuro descrito por ele mesmo. E com bastante antecedência, por exemplo, ao Junho de 2013. A Constituição de 1988 era o céu, era a promessa (Engenheiros do Hawaii). Ela foi o espelho de um determinado momento que buscava a transformação do futuro, como procurava o BRock. A Constituição desejou muito e as expectativas que ela lançou perante os demais subsistemas sociais nem sempre foram filtradas de acordo com sua comunicação originária.

Nesse sentido, a expressão possibilidades de futuro é utilizada por Alfons Bora para designar uma orientação futura que coordena cada uma das comunicações no presente. Nesse sentido, desde o ponto de vista do subsistema político, a CF/88 trouxe um norte democrático para sua autorreferência; de outro, sob o ângulo do sistema do Direito, trouxe uma série de inovações que testaram sua capacidade de aprendizado, especialmente em seu efeito cognitivo (Teubner), abordadas pelo BRock.

Luhmann (The Future Cannot Begin: Temporal Structures in Modern Society, 1976) classifica a operação da temporalidade em três modalidades de tempo. A saber:

a) O tempo cronológico, uma sequência de dados em que o futuro abarca tudo aquilo que se realiza no presente.

b) O tempo modal, que utiliza três linguagens temporais (passado, presente e futuro). A comunicação ocorre apenas de modo sequencial.

c) O futuro delimita o campo de observação e resta, sempre, fora do alcance da facticidade.

A partir dessas concepções, torna-se  possível afirmar que o tempo futuro não pode, jamais, iniciar. Ele se constituiu em um objetivo, uma meta. Imanência.  O futuro sempre influencia o presente e suas decisões. Ele é parte de seu conhecimento. Abertura cognitiva tanto para o Direito quanto para a Política, (CF/88) e, claro, para a Arte (BRock). Ideias contrárias a essa esquecem-se do presente, o ponto distintivo entre futuro e passado

O Futuro Jamais Será como Antigamente!


GermanoGermano Schwartz é Diretor Executivo Acadêmico da Escola de Direito das FMU e Coordenador do Mestrado em Direito do Unilasalle. Bolsista Nível 2 em Produtividade e Pesquisa do CNPq. Secretário do Research Committee on Sociology of Law da International Sociological Association. Vice-Presidente da World Complexity Science Academy.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                


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