“O Direito vai só até a página 2.”

22/03/2017

Por Fabrício Reis Costa - 22/03/2017

A frase do título é de meu grande amigo Guilherme Lopes que bem definiu o que se está vivendo no país nestes últimos meses.

A condução coercitiva do blogueiro Eduardo Guimarães ocorrida nesta terça-feira (21) é mais uma prova de que a frase que intitula este breve texto é muitíssimo verdadeira e contemporânea. Em decisão ilegal, o juiz de piso (frise-se), queridinho de alguns, Sérgio Moro determinou “a apreensão de quaisquer documentos, mídias, HDs, laptops, pen drives, arquivos eletrônicos de qualquer espécie, arquivos eletrônicos pertencentes aos sistemas e endereços eletrônicos utilizados pelos investigados [sic], agendas manuscritas ou eletrônicas, aparelhos celulares, bem como outras provas encontradas  relacionadas aos crimes de violação de sigilo funcional e obstrução à investigação policial” na residência de Eduardo, com sua consequente condução coercitiva à sede da Polícia Federal em São Paulo, na Lapa.

Em verdade, o que o juiz de piso Sergio Moro investiga é uma suposta violação de sigilo funcional. Este delito está previsto no artigo 325 de nosso Código Penal, inserido no capítulo I do Título XI do Código Penal. Compilação de dispositivos e títulos a parte, trata-se de um crime contra a administração pública, praticado por funcionário público. Ora, na matemática elementar do Direito Penal, ao que consta, estamos diante de um crime próprio e, portanto, sem qualquer relação com Eduardo Guimarães.

Para entender melhor, o blogueiro é o titular do Blog da Cidadania, famoso por ser justo em suas ponderações sobre a midiática e pirotécnica “operação Lava Jato”, criticando as diversas ações ilegais que lá tem ocorrido. Não parece ser a toa que o aqui já tão citado juiz de piso esteja perseguindo Guimarães, tratando-o como investigado e não como testemunha que de fato é no caso em tela, agindo em dissonância de preceitos constitucionais que garantem a liberdade para que a mídia constitua um Estado legitimamente democrático.

Mais a fundo, sob o pretexto de se investigar um ato ilícito por parte do funcionário público que praticou a violação de sigilo funcional, a decisão do magistrado violou a Carta Magna do país. Se bem que analisando os episódios que permeiam esta operação, não foi a primeira vez que a Constituição da República foi deixada de lado para satisfação do ego ou das vontades políticas de determinados atores do jogo.

Outro ponto que merece análise, ainda que breve, é a seletividade com a qual os agentes envolvidos na dita “operação Lava Jato” são tratados. Vazamentos ocorrem a torto e a direito, dia após dia, para todos os lados possíveis. No entanto, há uma visível e severa diferenciação no tratamento de cada um desses agentes. De um lado, o nobre Jornal Nacional e outros famosos jornais e jornalistas com seus chamados “furos de reportagem”; de outro, veículos de menor expressão com ditos “vazamentos” que são tratados como se fossem crimes contra a pátria pelo juiz Moro.

Ora, não se trata de partidarismo. Trata-se de aplicação correta da lei de forma justa para que a chamada “febre persecutória”, termo cunhado pelo advogado Roberto Tardelli, não atinja tais proporções para que amanhã ou depois qualquer juiz de primeiro grau, com apoio de um Ministério Público também midiático, esteja batendo à sua porta com o nascer do sol para justificar vontades pessoais e matar a sede popular de supostas punições por meio de reiteradas ilegalidades.


Fabrício Reis Costa. . Fabrício Reis Costa é Advogado em São Paulo, com atuação no âmbito criminal. Formado na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo - USP - Largo São Francisco. ..


Imagem Ilustrativa do Post: Frente Contra la Imposición // Foto de: MaloMalverde // Sem alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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