O direito à saúde no Novo Regime Fiscal – Por Clenio Jair Schulze

19/12/2016

A Emenda Constitucional 95 (de 15 de dezembro de 2016) instituiu o Novo Regime Fiscal – também chamado de ajuste fiscal. Na prática, quais são as consequências deste arranjo constitucional relativamente ao direito à saúde?

Em primeiro lugar, há rigorosa limitação aos gastos públicos. Significa que os Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) e os entes públicos federais não poderão gastar cifra maior do que o despendido no ano anterior[1].

Assim, não haverá, em princípio, aumento real no orçamento[2]. Tal limitação valerá para os próximos vinte anos.

É a demonstração inequívoca de que vivemos na sociedade de austeridade, caracterizado por: (1) contenção de despesas estatais; (2) privatização; (3) aumento de tributos; (4) redução de salários[3]. Tal modelo já foi adotado nos países europeus após a crise de 2008. Ou seja, divulga-se a ideia de que “não há alternativa” para solucionar a crise, pois apenas a restrição aos direitos – inclusive os sociais – é que permitirá resolver o problema financeiro do Estado[4].

É verdade que o Brasil precisa de um choque de gestão para reduzir os excessos de gastos inúteis e ineficazes da máquina pública.

De outro lado, com o Novo Regime Fiscal, não se sabe como ficará a saúde pública nos próximos anos, especialmente se considerado o atual cenário calamitoso (fechamento de hospitais, ausência de profissionais, de leitos, etc).

Em segundo lugar, a história do Brasil permite concluir que a criogenia fiscal não vai durar muito tempo. Basta um novo governo para aprovar uma nova Emenda Constitucional e alterar o Regime Fiscal ora instituído. Além disso, o art. 108 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias estabelece que o Presidente da República poderá propor lei complementar para alterar o método de correção dos gastos públicos, mas isso somente a partir de 2027!

Em terceiro lugar, muitos agentes públicos sem capacidade técnica e sem criatividade vão prejudicar ainda mais a população. É que o congelamento dos gastos em saúde será o argumento perfeito para gestores destituídos de qualidade no trato da coisa pública. Invocarão a crise do Estado como escudo para se defender da inépcia, da inapetência e da falta trato com a administração. Neste aspecto, é importante lembrar que durante a bonança qualquer um sabe gerir, mas na dificuldade apenas os bons é que se sobressaem.

Como se observa, trata-se de uma nova era na gestão e caberá à população o principal desafio de votar em pessoas qualificadas para desempenhar a transformação necessária no sistema público de saúde.

O Novo Regime Fiscal é uma oportunidade de ouro para transformar a gestão na saúde pública brasileira. Se há escassez de recursos é preciso eficiência e eficácia no gasto e na realização de despesas. É o momento ideal para mudanças. Aventuras não são desejadas.

Apenas o planejamento adequado e a execução célere das políticas permitirão avanço na saúde pública brasileira.

Desta forma, a despeito da aparente redução orçamentária, o presente texto tem o propósito de superar a reclamação e a discordância contra a mudança constitucional e convocar todos a exigir dos governantes políticas públicas mais adequadas, mais transparentes, mais eficientes e que possam concretizar adequadamente o direito à saúde.


Notas e Referências:

[1] "Art. 107. Ficam estabelecidos, para cada exercício, limites individualizados para as despesas primárias:

[...]

§ 1º Cada um dos limites a que se refere o caput deste artigo equivalerá:

I - para o exercício de 2017, à despesa primária paga no exercício de 2016, incluídos os restos a pagar pagos e demais operações que afetam o resultado primário, corrigida em 7,2% (sete inteiros e dois décimos por cento); e

II - para os exercícios posteriores, ao valor do limite referente ao exercício imediatamente anterior, corrigido pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, publicado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, ou de outro índice que vier a substituí-lo, para o período de doze meses encerrado em junho do exercício anterior a que se refere a lei orçamentária.

[2] Para a saúde aplica-se a seguinte regra do ADCT:

"Art. 110. Na vigência do Novo Regime Fiscal, as aplicações mínimas em ações e serviços públicos de saúde e em manutenção e desenvolvimento do ensino equivalerão:

I - no exercício de 2017, às aplicações mínimas calculadas nos termos do inciso I do § 2º do art. 198 e do caput do art. 212, da Constituição Federal; e

II - nos exercícios posteriores, aos valores calculados para as aplicações mínimas do exercício imediatamente anterior, corrigidos na forma estabelecida pelo inciso II do § 1º do art. 107 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias."

[3] SCHULZE, Clenio Jair. O direito à saúde na sociedade de austeridade. In Empório do Direito. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/o-direito-a-saude-na-sociedade-de-austeridade-por-clenio-jair-schulze/. Acesso em 18 dez 2016.

[4] SCHULZE, Clenio Jair. O direito à saúde na sociedade de austeridade. In Empório do Direito. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/o-direito-a-saude-na-sociedade-de-austeridade-por-clenio-jair-schulze/. Acesso em 18 dez 2016.


 

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