O apagão da água – Por Wagner Carmo

05/02/2017

Tão previsível quanto evitável é o “apagão da água”. Em tom jocoso, porém com caráter de preocupação, apresentamos valores que circundam o tema ligado ao recurso hídrico essencial à humanidade, com a missão de alertar o leitor acerca da problemática que envolve a preservação dos recursos naturais, especialmente a água.

Na historia recente, o Brasil perpassou por uma grave crise energética entre os anos de 1999 e 2001 que, além de oferecer “escuridão”, revelou o agravamento das questões socioeconômicas internas do país; em que empresários flertavam a redução de investimentos sociais e o fortalecimento de um “Estado mínimo” e a sociedade civil pressionava para amenizar as medidas de racionamento energético e, sobretudo, para asseverar a consecução das politicas programáticas da Constituição, a exemplo do art. 225 da Constituição Federal e, o consequente fortalecimento do Estado Democrático.

Os brasileiros, em razão da crise energética, civicamente cumpriram a tarefa-missão de economizar energia elétrica, uma atitude louvável e possível de ser realizada à época. Contudo, suponha que falássemos como falamos agora, na possibilidade de faltar água potável. Não é fato novo, muito menos inusitado a crise da água, entretanto, desconsiderando as preocupações e ações dispensadas por ambientalistas e organismos da sociedade civil, pouco se tem realizado a nível governamental, cite-se a falta de atenção e de investimentos para preservação e recuperação das nascentes, dos córregos, dos rios e dos mananciais.

Felix Guatarri, em “As Três Ecologias”, faz importante reflexão ao remeter a questão da preservação ambiental ao patamar da subsistência da raça humana. O autor francês, com propriedade, foca suas observações para lembrar que a progressiva destruição dos recursos naturais, na proporção em que ora se apresenta, comprometerá a sobrevivência das gerações vindouras.

Nesse diapasão, falar em “apagão da água” é pertinente, por não dizer alarmante, sobretudo quando se descobre que a maior parte da agua existente no globo é impropria para uso humano e, que o Brasil, com toda a politica de gestão para o desserviço à natureza, concentra grande parte dos recursos hídricos potáveis do mundo, seja pelo aquífero Guarani, seja pelo ecossistema da Amazônia.

Amiúde, cientistas, estudiosos e ambientalistas divulgam que no futuro próximo, a disputa pelas “jazidas de água potável” poderão relembrar as guerras do petróleo. Isso faz pensar ser necessária a utilização de uma alfeça para que os brasileiros e os cidadãos da aldeia global, conforme aduz Leonardo Boff, compreendam que acima do lucro e do desenvolvimento encontra-se o “equilíbrio do ecossistema” e, em especial, fixando que a preservação do ecossistema representa a preservação do próprio ser humano.

Sob esta égide, investimentos públicos e privados na consolidação de projetos ambientais, sanitários e de infraestrutura rural e urbana são essenciais para evitar o “apagão da água” e o comprometimento da dignidade da pessoa humana.

O Estado brasileiro deve avaliar, com urgência, o sistema de gestão ambiental dos recursos naturais, destacando políticas públicas relativas aos recursos hídricos que compreendam:

a) ações de produção de água, nestas inclusas medidas de reflorestamento, proteção de nascentes e de áreas com potencial hidrológico;

b) ações de preservação dos mananciais, atentando para o processo sanitário de tratamento do esgoto, despoluição dos rios, ocupações irregulares, inclusive em áreas de preservação permanente;

c) criação de associações ou conselhos representativos da sociedade civil e do Estado para colaboração na administração das bacias hídricas, garantindo aos diversos usuários o direito de gerir, opinar e decidir sobre as ações que envolvam a produção, o armazenamento, a utilização e a tarifa pelo uso da água;

d) revisão da participação do Estado no sistema de serviço de concessões de água e esgoto, pois, no formato atual, o Estado brasileiro é, ao mesmo tempo, responsável pela execução dos serviços (prestador do serviço) e o órgão regulador (fiscal do serviço) -, ou seja, no Brasil, há clara confusão de papeis na gestão da água e do esgoto, resultando, em regra, em prejuízo na prestação do serviço e no planejamento de ações ambientais e estruturais de médio e longo prazo. Sendo o Estado fiscalizador dele mesmo, há uma forte interferência negativa na execução da política e dos serviços públicos de agua e esgoto;

e) estabelecimento de medidas educativas para o uso racional da água;

f) revisão da politica tarifária, considerando aspectos relacionados com o aumento da tarifa, seja pelo modo de utilização ou em razão do período de uso e, ainda, criação de sistema de bonificação pela economia no uso da água;

g) incorporação de aspectos éticos na utilização e distribuição do recurso hídrico.

Os brasileiros, desde o ano de 2012, vivenciam uma nova crise energética, acrescida, agora, pela crise da água. No sistema energético, o Governo Federal conseguiu manter o fornecimento de energia com a utilização de geradores movidos por recursos fosseis e, com a população subsidiando a falta de planejamento do Estado por meio dos pagamentos extras advindos com a politica tarifária de “bandeiras”.

É a falta da água, como o Estado resolverá? Vê-se, pelas incursões sugeridas acima, que o problema do “apagão da água” não se resolverá sem gestão adequada e integrada entre Cidadania, Meio Ambiente, Crescimento/desenvolvimento Urbano-Econômico-Rural; planejamento de médio e longo prazo e revisão da atuação/participação do Estado no processo de prestação de serviço e de fiscalização.


 

Imagem Ilustrativa do Post: water dripping from a tap // Foto de: Krishna Santhanam // Sem alterações

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