Novas regras para o controle do investimento mínimo em saúde – Por Clenio Jair Schulze

13/02/2017

O financiamento da saúde pública deve ser um dos principais objetivos dos gestores públicos.

Isto porque a Constituição Federal estabelece que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios devem efetuar investimentos em saúde, observando percentuais mínimos (art. 198, §§ 2º e 3º). Trata-se de um grande desafio, principalmente em tempos de crise e de dificuldades financeiras.

E um dos principais fiscalizadores do cumprimento dos aludidos dispositivos constitucionais é o Ministério Público (Federal e dos Estados).

Desta forma, o Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP editou a Recomendação 48 (de 13/12/2016, publicada no DOU em 1º/02/2017)[1], fixando “parâmetros para a atuação do Ministério Público no controle do dever de gasto mínimo em saúde”.

O aludido diploma normativo estabelece, resumidamente, as seguintes diretrizes:

a) “inclusão do tema ‘Financiamento Constitucional do Direito à Saúde’ no ingresso vestibular da carreira, nos cursos de formação e atualização dos membros do Ministério Público, bem como para a priorização da temática no planejamento estratégico das unidades”;

b) “Os membros do Ministério Público com atribuições para atuação na Saúde e no Patrimônio Público devem realizar ações coordenadas para evitar e reprimir quaisquer desvios e retrocessos quantitativos ou qualitativos no piso de custeio do direito à saúde, acompanhando sua execução orçamentário-financeira e respectiva prestação de contas, por meio da avaliação dos instrumentos de gestão e de planejamento na saúde (Plano Plurianual - PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO, Lei Orçamentária Anual - LOA, Plano de Saúde, Programação Anual de Saúde - PAS, Relatório Quadrimestral, o Relatório Anual de Gestão - RAG), dentre outros”[2];

c) “recomendar dos Chefes de Executivo que a gestão do fundo de saúde seja de responsabilidade exclusiva do titular do Ministério ou Secretaria de Saúde, para impedir a multiplicidade de ordenadores de despesas da saúde, a centralização e o controle operacional dos recursos vinculados à saúde pelo Ministério ou pela Secretaria da Fazenda, bem como o remanejamento das transferências fundo-a-fundo do SUS para a conta única do tesouro do ente, conforme o art. 198, inciso I, da CF e os artigos 9° e 32, §2º, da Lei n.º 8080/90”[3];

d) “recomendar aos gestores que o pactuado na Comissão Intergestores Tripartite – CIT e aprovado pelo Conselho Nacional de Saúde - CNS é obrigatório, ainda que excedente ao patamar contábil de gasto mínimo em ASPS, até porque o piso constitucional de custeio da saúde deve comportar a dilatação do limite de empenho – fixado inicialmente no estrito valor mínimo contábil – para que abranja necessariamente o custeio das obrigações de financiamento prévia e formalmente pactuadas na citada Comissão, sob pena de lesão ao pacto federativo, ao princípio da boa-fé objetiva e à responsabilidade solidária no custeio das ações e serviços públicos de saúde”[4];

e) “avaliar possível responsabilização dos entes federados que descumprirem o rateio pactuado na Comissão Intergestores Tripartite e aprovado pelo CNS, na forma do art. 17, §1º, da LC n.º 141/2012 e do art. 198, §3º, inciso II, da Constituição Federal, ainda que as despesas ali assumidas, eventualmente, sejam superiores ao piso do ente, para que não haja descentralização da execução de programas sem suficiente sustentabilidade financeira ao longo da sua consecução”[5];

f) “recomendar a disponibilização de indicadores para a avaliação da qualidade das ações e serviços públicos de saúde, que deverão ser submetidos à apreciação dos respectivos Conselhos de Saúde, prevista no art. 43, §1º, da LC n.º 141/2012”[6];

g) “recomendar, no âmbito de cada ente da Federação, que o gestor do SUS disponibilize ao Conselho de Saúde, com prioridade para os representantes dos usuários e dos trabalhadores da saúde, programa permanente de educação na saúde para qualificar sua atuação na formulação de estratégias e assegurar efetivo controle social da execução da política de saúde, em conformidade com o §2° do art. 1º da Lei n.º 8.142/1990 e o art. 44 da LC n.º 141/2012”[7];

h) “recomendar que os chefes do Executivo, que nos termos do art. 48, I, da Lei de Responsabilidade Fiscal, promovam o incentivo à participação popular e realizem, com ampla divulgação prévia, de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos”[8];

i) recomendar “a afixação de aviso informativo, em local visível na sede do Poder Executivo, referente ao recebimento de recursos financeiros federais, pelo período mínimo de 30 (trinta) dias, contados da data de seu efetivo recebimento, de modo a assegurar à comunidade, destinatária dos recursos, a ciência quanto ao seu recebimento”[9].

Como se observa, a Recomendação 48 do CNMP estabelece uma vasta lista de atribuições destinadas aos membros do Ministério Público com o propósito específico de controlar e fiscalizar a atuação dos gestores em saúde pública.

Espera-se, com o novo regramento, que a maior transparência e a efetividade na concretização do direito à saúde sejam a marca dos atores envolvidos no tema, principalmente para evitar a judicialização desnecessária e permitir que a fiscalização ocorra diretamente na via extrajudicial, deixando ao Poder Judiciário apenas as demandas indispensáveis à apreciação dos magistrados brasileiros.


Notas e Referências:

[1] CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Recomendação 48, de 13/12/2016, DOU 1º/02/2017. Sugere parâmetros para a atuação do Ministério Público no controle do dever de gasto mínimo em saúde. Art. 1º. Disponível em http://www.cnmp.mp.br/portal/component/normas/norma/4717?catid=400. Acesso em 11/02/2017.

[2] CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Recomendação 48, de 13/12/2016, DOU 1º/02/2017. Sugere parâmetros para a atuação do Ministério Público no controle do dever de gasto mínimo em saúde. Art. 3º. Disponível em http://www.cnmp.mp.br/portal/component/normas/norma/4717?catid=400. Acesso em 11/02/2017.

[3] CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Recomendação 48, de 13/12/2016, DOU 1º/02/2017. Sugere parâmetros para a atuação do Ministério Público no controle do dever de gasto mínimo em saúde. Art. 4º, inciso VI. Disponível em http://www.cnmp.mp.br/portal/component/normas/norma/4717?catid=400. Acesso em 11/02/2017.

[4] CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Recomendação 48, de 13/12/2016, DOU 1º/02/2017. Sugere parâmetros para a atuação do Ministério Público no controle do dever de gasto mínimo em saúde. Art. 4º, inciso XIII. Disponível em http://www.cnmp.mp.br/portal/component/normas/norma/4717?catid=400. Acesso em 11/02/2017.

[5] CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Recomendação 48, de 13/12/2016, DOU 1º/02/2017. Sugere parâmetros para a atuação do Ministério Público no controle do dever de gasto mínimo em saúde. Art. 4º, inciso XIV. Disponível em http://www.cnmp.mp.br/portal/component/normas/norma/4717?catid=400. Acesso em 11/02/2017.

[6] CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Recomendação 48, de 13/12/2016, DOU 1º/02/2017. Sugere parâmetros para a atuação do Ministério Público no controle do dever de gasto mínimo em saúde. Art. 4º, inciso XX. Disponível em http://www.cnmp.mp.br/portal/component/normas/norma/4717?catid=400. Acesso em 11/02/2017.

[7] CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Recomendação 48, de 13/12/2016, DOU 1º/02/2017. Sugere parâmetros para a atuação do Ministério Público no controle do dever de gasto mínimo em saúde. Art. 4º, inciso XXI. Disponível em http://www.cnmp.mp.br/portal/component/normas/norma/4717?catid=400. Acesso em 11/02/2017.

[8] CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Recomendação 48, de 13/12/2016, DOU 1º/02/2017. Sugere parâmetros para a atuação do Ministério Público no controle do dever de gasto mínimo em saúde. Art. 4º, inciso XXIV. Disponível em http://www.cnmp.mp.br/portal/component/normas/norma/4717?catid=400. Acesso em 11/02/2017.

[9] CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Recomendação 48, de 13/12/2016, DOU 1º/02/2017. Sugere parâmetros para a atuação do Ministério Público no controle do dever de gasto mínimo em saúde. Art. 4º, inciso XXVII. Disponível em http://www.cnmp.mp.br/portal/component/normas/norma/4717?catid=400. Acesso em 11/02/2017.


 

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