1 - CONTINUO INDIGNADO, MAS SEM SABER O QUE PENSAR E O QUE FAZER.
De uma coisa eu não tenho dúvida: deve existir um modelo de sociedade menos ruim que a sociedade capitalista.
Ela é fundada em valores deletérios: competição, individualismo, consumismo, alienação, ganância e cobiça desmedida.
O capitalismo, pela injustiça social que proporciona, pode ser visto como um grande genocida diário, se considerarmos a fome e guerras em todos os continentes da Terra.
De uma coisa tenho certeza: se não conseguirmos domar ou mudar o capitalismo, em menos de um século, não haverá vida sobre o nosso planeta.
Reconheço que as minhas ideias radicais e, até mesmo revolucionárias, estão longe de poderem ser viabilizadas, de poderem ser efetivamente aplicadas, sequer a médio prazo.
Ademais, o contato próximo com mortes de entes queridos tem despertado em mim uma perspectiva mais humanista. Como criador de cães, presenciei a morte de mais de 120 destes amigos incondicionais, muitos falecendo em meus braços. Perdi alguns bons amigos humanos e, principalmente, perdi meu pai e uma das minhas filhas. Tudo isso “quebra” a gente.
Nunca valorizei tanto a vida como agora, quando ela está para se expirar. Nós só damos valor às coisas quando elas já se foram ou estão se acabando ...
Desta forma, ficamos no dilema: qual o nosso horizonte utópico? Como melhorar a sociedade sem sacrificar vidas preciosas? Como não mudar a sociedade e assistir ao sacrifício de vidas preciosas? Como assistir impassível à morte de tantas crianças em razão dos bombardeios militares ou tentativa de asilo de refugiados?
Será possível um “marxismo humanista”? Frei Beto, Gyorgy Lukacs e Paulo Freire, (https://youtu.be/MF9-tZMwqjE), dentre outros, entendem possível esta compatibilização.
A crise é minha, mas compartilho com vocês. É importante provocar reflexões e fazer constantes autocríticas durante as nossas vidas.
A crise é sinal de mudanças, é sinal de avanços. Dialeticamente, a crise é o questionamento do “velho” e a expectativa do “novo”. O “novo” deve ser considerado como algo “bom”, até prova em contrário. Nada a conservar. Tudo há de “cambiar”, como está dito na bela música “Cambia, todo cambia”, cantada por Mercedes Sosa: “cambia el modo de pensar ...”
Importa salientar, entretanto, que os nossos melhores valores e princípios não mudam. Eles sequer são nossos. Eles são frutos do processo civilizatório, eles são fruto das lutas sociais ao longo de nossa história. Eles também são frutos de mudanças e transformações sociais, são históricos e, algum dia, serão substituídos por algo ainda melhor ...
Por ora, há pouco a fazer e muito a pensar. De outra coisa eu tenho certeza: não podemos nos conformar com estas mazelas humanas.
Como disse o saudoso “Betinho, o irmão do Henfil”: estaremos perdidos se ao menos não nos indignarmos com tantas injustiças em nossa sociedade. Ao menos, que haja indignação !!!
2 - O ACORDO DE COOPERAÇÃO PREMIADA (delação premiada), COMO QUALQUER OUTRO MEIO DE DEFESA, NÃO CRIA IMUNIDADE PENAL OU CIVIL PARA O DELATOR, AINDA QUE HOMOLOGADA JUDICIALMENTE.
Lula perde processo e deve pagar R$ 225 mil à defesa do ex-senador Delcídio. Ação cível, com pedido de indenização por dano moral pelo ex-presidente Lula.
Pela decisão do juiz paulista, o delator pode ofender a honra de outras pessoas livremente (sic) ... O juiz afirmou que a homologação judicial do acordo de cooperação premiada mostra a licitude das declarações do delator (sic) !!!
Preliminarmente, importante notar que a homologação judicial de acordos de cooperação premiada (delação premiada) está restrita ao exame de formalidades legais, segundo dispõe expressamente parágrafo oitavo do quarto da lei n.12.850/13, vale dizer, o poder judiciário não valora o que foi dito pelo delator, até porque a partir da delação é que começará a investigação. Ela, por si só, não é suficiente sequer para lastrear um juízo condenatório, conforme dispõe a citada lei especial.
A "delação premiada" equivale, de certa forma, com o que se convencionou intitular de "chamada de corréu", com o desvalor de ser ela incentivada por um "prêmio", ou seja, benefício na futura e eventual pena. Assim, a incriminação do corréu não é desinteressada, pois traz vantagem para o delator. O delator tem interesse pessoal em fazer a incriminação ao corréu.
Evidentemente, não cabe aqui o aprofundamento de questões jurídicas, pois o nosso público é heterogêneo. Desta forma, tais questões serão examinadas de forma mais superficial e didática.
Sempre entendi que o direito à ampla defesa não autoriza os réus a caluniarem ou a praticarem crimes contra outras pessoas. A defesa deve ser exercida dentro da lei. Os réus podem ficar em silêncio e não têm o dever jurídico de dizer a verdade. Entretanto, ao mentirem, não podem praticar crimes, como ofender a honra de terceiras pessoas.
Por outro lado, o acordo de cooperação premiada (delação premiada) não cria qualquer tipo de imunidade penal para o delator. Se ele afirmar falsamente que alguém praticou um crime, poderá ser processado por calúnia.
Entretanto, o crime de calúnia só terá sido praticado se o delator tiver ciência de que não falou a verdade. Neste caso, poderá demonstrar a atipicidade de sua conduta, através da chamada "exceção da verdade". Sendo falsa a sua narrativa, poderá demonstrar que não sabia de tal falsidade (ausência de dolo). Se o fato for verdadeiro, não cometeu calúnia ou não obrou com dolo, será absolvido.
Evidentemente que, neste outro processo, o ônus da prova é do querelante. A dúvida levará à absolvição do querelado (delator).
Tudo isso vale para o processo civil, que tenha por objeto um pedido de indenização por dano moral, com fulcro no que disse o delator em uma investigação ou processo penal. Até porque, o ilícito civil é mais “amplo” do que o ilícito penal, que está balizado pelo tipo (descrição da conduta na norma penal).
No caso concreto, cuidava-se de uma ação cível de indenização por dano moral. Caberia ao ex-presidente Lula provar que o ex-senador Delcídio mentiu ao incriminá-lo. Entretanto, o juiz paulista procedeu a julgamento antecipado, impedindo que o autor da ação de indenização (Lula) pudesse provar o que alegou na sua petição inicial, decidindo que a prova dos fatos não seria relevante, porque o réu (Delcídio) não teria praticado ato ilícito, pois estaria "amparado" por sua delação premiada, já homologada.
Como professor de Direito Processual, entendo que esta decisão é absolutamente equivocada. A chamada delação premiada não permite o "vale tudo". O delator não fica imune se caluniar, injuriar ou difamar alguém, seja no aspecto penal, seja no aspecto cível.
Julgo que o magistrado paulista, para evitar decisão conflitante com futura decisão no processo penal, poderia, por analogia, suspender o processo cível, com base no artigo 315 do novo Cod.Proc.Civil, que dispõe:
“Se o reconhecimento do mérito depender de verificação de fato delituoso, o juiz pode determinar a suspensão do processo até que se pronuncie a justiça criminal.” (os parágrafos deste artigo disciplinam apenas o prazo da eventual suspensão).
Não se afastaria a possibilidade de suspensão do processo, através do qual o ex-presidente Lula pedia indenização por dano moral, pela aplicação da regra do art.313, inc.V, letra “a” do Cod.Proc.Civil de 2015.
Entendo que o magistrado de São Bernardo do Campo, indevidamente, dispensou a produção de prova pelas partes, a partir de uma tese jurídica inaceitável, qual seja, que a “delação premiada” cria uma “zona de imunidade cível e penal”, permitindo, indiretamente, que o delator possa ofender a honra de quem quer seja, sem qualquer consequência jurídica.
Notas e Referências:
http://www.conjur.com.br/…/lula-perde-processo-pagar-225-mi…
http://s.conjur.com.br/…/lula-perde-processo-pagar-225-mil.…
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