Moda, Funk, Direito, Revolução – Por Léo Rosa de Andrade

03/02/2016

Desde que os marxistas se convenceram e convenceram muita gente de que as transformações sociais se resumem à superação do capitalismo e de que ela ocorreria necessariamente em decorrência de suas “contradições internas”, as demais formas de avanços da vida em Sociedade foram desconsideradas.

Pessoalmente, creio que Marx tem razão em muitas coisas, não que acredito, como pensam seus seguidores (ou os de Lênin), que alguém vá administrar a História a ponto de produzir o momento e a circunstância dos acontecimentos revolucionários.

Ademais, a resignação com o mundo não decorre apenas da propriedade dos bens de produção. O enquadramento ideológico e a reprodução dos costumes restringem tanto as imaginações que nem se questiona a vida, muito menos a propriedade privada.

Em Jovem Guarda – Moda, Música e Juventude (Maíra Zimmermann, Estação das Letras) a autora nos faz entender como a briga por cabelos compridos e minissaia transformaram completamente a hierarquia familiar.

A Jovem Guarda libertou os homens da rígida estampa do masculino patriarcal, permitindo-lhes uma moda alegre e colorida, e levou as mulheres a desobedecer os pais, impondo à família a nudez das pernas pudonorosamente escondidas. Os trajes de rapazes e moças se aproximaram como jamais se imaginaria.

O feminismo e a superação do machismo devem um tanto à Beatlemania, à Jovem Guarda, a Woodstock etc. Os movimentos culturais de moda, música, arte etc dos anos 1960\70 diluíram as conformações de masculino e feminino que vigoravam. Rebeldias sem causas que revolucionaram a vida privada e, logo, a pública.

Edito Danilo Cymrot (FSP, 13jun12): “O funk não é caso de polícia. No entanto, é assim que os bailes funk, confinados nas periferias e favelas, têm sido encarados pelo poder público e por grande parte da mídia. Sob vários pretextos, chegaram a ser, na prática, proibidos a partir da segunda metade da década de 1990.

Apenas em 2009 foi aprovada lei que reconhece o funk como movimento de caráter popular e veda ações discriminatórias por parte do Estado.  A Lei não é respeitada. Em nome da ordem, as UPPs criam conflitos.  Os MCs são acusados de compor músicas que fazem apologia ao crime, taxadas de "proibidões".

Resultado trágico dessa política: assassinatos de ídolos do funk. Principais suspeitos: policiais militares. Não só a origem social dos ídolos torna essas mortes invisíveis, como costuma-se responsabilizar a própria vítima por seu destino”.

Edito Bruna Fantti (FSP, 08jul15): “Os versos exaltam brigas entre traficantes rivais, incentivam o consumo de drogas, sexo com menores e mortes de policiais. Para a polícia, trata-se de apologia ao crime organizado. Já o juiz Marcos Augusto Peixoto, Rio, classificou os funks chamados de "proibidões" como manifestação artística.

‘Tal proibicionismo se volta contra as músicas que nada mais fazem do que retratar o cotidiano das favelas. Os proibidões são uma forma de arte. Trata-se de expressão cultural, que deve ser respeitada e debatida, gostemos ou não’”.

O magistrado refere Chico Buarque, Michel Foucault, Bertold Brecht e filmes cesurados, como Último Tango em Paris e Laranja Mecânica; critica a conduta policial: “Uma tentativa de pacificação dos discursos dos excluídos”; considera que as UPPs são “um programa que só faz tampar o sol com uma peneira cravada de tiros”.

O “proibidão” conta o que acontece na periferia. E há o “ostentação”: revela o desejo de consumo dos pobres; nisso, igualam-se aos consumistas ricos. Muitos ricos ostentam consumo oriundo de injusta vantagem social; muitos pobres ostentam consumo derivado de renda ilegal. Injustiça versus ilegalidade.

Permeando a coisa toda, esse “endeusamento" de rótulos comerciais representa uma extraordinária vitória ideológica do capitalismo (André Singer, FSP16fev13). Sim, e aí está o busílis da violência urbana brasileira: ela é legítima vontade das classes excluídas de participar dos prazeres capitalistas. Isso é revolucionário.


 

Imagem Ilustrativa do Post: Grafitti Art - Bahamas // Foto de: Tom Hannigan // Sem alterações

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