Medicina defensiva pode ser considerada um conjunto de medidas adotadas pelo médico para evitar eventual omissã e responsabilização ética, civil e criminal.
É muito comum, por exemplo, o profissional solicitar vários exames para confirmar um diagnóstico.
Vive-se a Síndrome de Ulisses[1] (ou cascata diagnóstica[2]) em que se faz um exame e depois faz outro seguido por mais um e assim sucessivamente.
Segundo Bobbio, medicina defensiva significa:
prescrever exames não para investigar um diagnóstico ou para identificar o tratamento mais eficaz, mas para se prevenir de eventuais desforras judiciais. Assim, os pacientes são submetidos a uma quantidade de exames nem sempre úteis para sua saúde, mas indispensáveis para a tranquilidade do médico.[3]
Tudo isso trouxe várias consequências, tais como: 1) aumento dos gastos para o paciente, para as operadoras e para o SUS; 2) elevação do tempo para obtenção do diagnóstico e realização dos procedimentos; 3) aumento da comercialização de aparelhos e produtos médicos; 4) desconfiança; 5) burocratismo.
Em razão disso, há forte movimento para alterar a prática médica desenvolvida nos últimos anos, com a finalidade de evitar desperdício de tempo e de dinheiro.
Ou seja, é preciso reconhecer também que há pouca previsibilidade de alguns diagnósticos e que há dificuldade para escolher indicadores e métricas de avaliação de resultados e ainda é difícil compatibilizar satisfação/expectativa.
O uso indiscriminado da medicina defensiva acabou trazendo novos riscos: o excesso de diagnóstico e o excesso de prescrição[4].
A posição do médico, realmente, não é fácil. De um lado, ele precisa se prevenir contra eventual acusação de negligência ou imperícia. De outro lado, muitas vezes são solicitados exames e procedimentos desnecessários.
De qualquer forma, é importante, portanto, a adoção de novas perspectivas na prática médica.
Uma alternativa é a Saúde Baseada em Valor, em que se dá mais atenção ao paciente, com ampliação da prática do cuidado, prestigiando o sentido humanista e considerando as individualidades da pessoa e também o custo da intervenção médica.
A questão realmente não é fácil de resolver.
Contudo, uma atuação médica séria e responsável é aquela que evita desperdícios, preserva a confiança, observa o progresso das ciências e compartilha decisões com o paciente. Tudo isso também evita a responsabilização pessoal e promove a qualidade do trabalho e da Medicina.
Notas e Referências
[1] BOBBIO, Marco. New risks of contemporary medicine: overdiagnosis and overprescription (palestra). Instituto de Ensino e Pesquisa Sírio Libanês, São Paulo/SP, 11 Out 2019.
[2] BOBBIO, Marco. New risks of contemporary medicine: overdiagnosis and overprescription (palestra). Instituto de Ensino e Pesquisa Sírio Libanês, São Paulo/SP, 11 Out 2019.
[3] BOBBIO, Marco. Medicina demais: o uso excessivo pode ser nocivo à saúde. Barueri: Manole, 2020, p. 24.
[4] BOBBIO, Marco. New risks of contemporary medicine: overdiagnosis and overprescription (palestra). Instituto de Ensino e Pesquisa Sírio Libanês, São Paulo/SP, 11 Out 2019.
Imagem Ilustrativa do Post: HPV Vaccination in Sao Paulo Brazil March 2014 // Foto de: Pan American Health Organization PAHO // Sem alterações
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