O Superior Tribunal de Justiça – STJ tem um importante precedente em relação à possibilidade de devolução de valores decorrentes da revogação da liminar. Trata-se do Tema Repetitivo 692, que prevê o seguinte:
"A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago".[1]
A decisão se refere ao direito previdenciário e ao direito assistencial, contudo, é razoável admitir também sua aplicação no direito da saúde, com base nos seguintes fundamentos:
1º) o direito previdenciário, o direito assistencial e o direito da saúde são tratados igualmente no texto da Constituição (“Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”)[2];
2º) o Supremo Tribunal Federal – STF entendeu que este assunto é de natureza infraconstitucional e não reconheceu a repercussão geral no Tema 799 (“A questão acerca da devolução de valores recebidos em virtude de concessão de antecipação de tutela posteriormente revogada tem natureza infraconstitucional e a ela atribuem-se os efeitos da ausência de repercussão geral, nos termos do precedente fixado no RE 584.608, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJe 13/3/2009”[3]);
3º) a decisão do STJ vai ao encontro do artigo 302 do Código de Processo Civil (“Art. 302. Independentemente da reparação por dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, se: I - a sentença lhe for desfavorável;”[4]);
4º) é necessário estabelecer algum risco na judicialização, sob pena de fomento ao ajuizamento inconsequente de ações judiciais;
5º) a penhora, o sequestro ou o bloqueio de 30% do salário, dos proventos ou do benefício previdenciário mostra-se razoável e não viola a dignidade da pessoa humana.
Neste contexto, não há limitação jurídica para aplicação do Tema 692 na judicialização da saúde.
Trata-se de interpretação que se compatibiliza com a legislação vigente e com o Tema 692 do STJ.
Notas e referências
[1] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Tema 692. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?novaConsulta=true&tipo_pesquisa=T&cod_tema_inicial=692&cod_tema_final=692. Acesso em: 05 Nov. 2023.
[2] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 05 Nov. 2023.
[3] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Tema 799 - Possibilidade da devolução de valores recebidos em virtude de tutela antecipada posteriormente revogada. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=4330792&numeroProcesso=722421&classeProcesso=ARE&numeroTema=799. Acesso em: 05 Nov. 2023.
[4] BRASIL. Lei 13.105 de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 05 Nov. 2023.
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