Por Iuri Victor Romero Machado - 06/07/2015
Introdução
Diuturnamente, os órgãos policiais Brasil afora realizam prisões, buscas e – eventualmente – apreensões nos domicílios de inúmeras pessoas, sobretudo (para não dizer exclusivamente) daqueles que são os alvos de sempre do sistema penal. Ocorre que, usualmente, essas ações policiais dão-se sem autorização judicial ou contato visual prévio com situação que possa ser definida como infração penal, o que inclusive justificaria a intervenção repressiva do Estado, independentemente de um mandado. Não raro, a relativização do direito fundamental à inviolabilidade domiciliar escora-se em denúncias anônimas ou suspeitas vazias quanto à prática de infrações penais. Entretanto, mesmo nessas condições, a jurisprudência brasileira tem se mostrado resistente em reconhecer a ilegalidade das prisões efetivadas ou a nulidade das provas obtidas.
Se assim é, por certo estamos diante de práticas abusivas ou ilegais, que devem ser reprimidas e não incentivadas, sob pena de o próprio Estado se converter em criminoso. Têm-se, portanto, situações quotidianas que desafiam profunda e contínua reflexão, a respeito da dimensão significante do direito à inviolabilidade domiciliar e do porquê de sua importância fundamental no que diz de uma existência digna em sociedade.
Não por acaso, o direito em questão se materializa sob a forma de garantia positivada em diversas legislações, mostrando-se assaz relevante seu estudo à luz da doutrina e jurisprudência estrangeiras. Afinal, em sendo a inviolabilidade domiciliar um direito consagrado por grande parte do mundo ocidental, imprescindível que se verifique como tem sido resguardada.
Importante desde já ressaltar que não existe qualquer controle estatístico quanto ao número de pessoas que têm sua intimidade invadida por conta dessas práticas, estejam elas cometendo ou não infrações penais, sendo imensuráveis os diversos prejuízos – inclusive morais – que sofrem em razão desses abusos. Aliás, diz-se de uma realidade clandestina, que jamais é ou será retratada nos autos que documentam a persecução penal.
Diante dessa realidade, numa sociedade que clama por cercear a liberdade dos outros (ninguém se vê como alvo do Estado Policial), as garantias constitucionais – como a que se debate – devem ser sempre resgatadas, em discurso e em ação. Afinal, apresentam-se como instrumentos essenciais de contenção do poder punitivo, os quais devem ser efetivados pelo Poder Judiciário em sua função máxima de dar concretude às garantias constitucionais que tem o cidadão frente a desvios e abusos de poder.
Posto isso, pontua-se que o presente estudo tem por escopo enriquecer o debate acerca dos limites que conformam um processo penal que se pretenda democrático, voltando-se especificamente à necessidade de se conferir efetividade à garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar, seja no que diz respeito a prisões, seja no concernente à produção de provas. Nesse sentido, algumas abordagens específicas serão úteis, especialmente para elidir argumentos rasos com os quais se procura convalidar a devassa da intimidade do cidadão a partir de ações abusivas ou ilegais – o que se verifica, por exemplo, a partir dos argumentos prontos relacionados aos crimes permanentes. Pondera-se, por fim, que, face à extensão protetiva do direito fundamental de que se trata, somente nas hipóteses de flagrante próprio pode ser a garantia relativizada independentemente de autorização judicial.
1. O Direito à Inviolabilidade enquanto Direito Fundamental nas Legislações Ocidentais
O direito à inviolabilidade domiciliar, como um dos mais elementares do ser humano, é assegurado pelas mais diversas legislações do mundo ocidental, fazendo-se presente tanto nas Convenções de Direitos Humanos, quanto nas Constituições ou nas legislações infraconstitucionais.
Essa marcada presença decorre da reconhecida necessidade de se preservar a intimidade e o direito à propriedade que se estende a todos os indivíduos, eis que “uma sociedade sadia, civil, que tenha decoro, deve garantir ao indivíduo […] um oásis, um refúgio contra a indiscrição alheia, um recinto pessoal, um lugar inviolável que constitua a sua cidadela”[3]. Não por outra razão, ainda em 1886, assim afirmou a Suprema Corte Americana: “Our law holds the property of every man so sacred, that no man can set his foot upon his neighbour's close without his leave”[4]. E, mesmo antes, Lord Chatam proferiu seu famoso discurso perante o Parlamento inglês, destacando que:
O homem mais pobre desafia em sua casa todas as forças da Coroa, sua cabana pode ser muito frágil, seu teto pode tremer, o vento pode soprar entre as portas mal ajustadas, a tormenta pode nela penetrar, mas o Rei da Inglaterra não pode nela entrar[5].
Construída essa moldura introdutória – que bem desvela à máxima atenção reservada à inviolabilidade domiciliar –, cumpre pontuar que, no âmbito de proteção internacional, encontram-se referências ao direito no art. 12 da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1947; no art. 17 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966; no art. 8.1 da Convenção Europeia de Direitos do Homem; e no art. 11 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica).
Enquanto direito fundamental positivado nas Constituições, expressa-se pelos arts. 10.1 e 13 da alemã (Lei Fundamental); emendas 3 e 4 da americana; arts. 18 e 19 da argentina; art. 25.1 da boliviana; arts. 5º, incs. X e XI da brasileira; art. 19.5 da chilena; art. 15 da colombiana; art. 23 da costa riquenha; art. 56 da cubana; art. 66.22 da equatoriana; arts. 18.1 e 18.2 da espanhola; art. 14 da italiana; art. 16 da mexicana; arts. 2.7 e 2.9 da peruana; arts. 34.1 e 34.2 da portuguesa; art. 11 da uruguaiana; arts. 59 e 62 da venezuelana[6]; dentre inúmeras outras.
Voltando os olhos à legislação infraconstitucional brasileira, verificamos proteção à inviolabilidade domiciliar nos artigos 150 do Código Penal; 245, 246, 248, 283 e 293 do Código de Processo Penal e 70 a 78 do Código Civil/2002.
A difundida proteção garantida ao direito, revela-o, portanto, como manifestação básica da liberdade civil, sem a qual o ser humano não poderia exercer sua privatividade de forma plena, sem a qual não poderia, enfim, afirmar-se como indivíduo diante da sociedade e do Estado.
2. Conceito de Domicílio
Antes de adentrar os fundamentos da inviolabilidade domiciliar e as hipóteses em que pode ser afastada, faz-se necessário compreender o que se entende por domicílio, qual seu conceito e delimitação. Afinal, para os diversos âmbitos do direito (penal, civil, administrativo, etc.) há uma conceituação, a qual, via de regra, é mais limitada que a firmada por nossa Constituição Federal (CR/88), em seu artigo 5º, XI[7].
Posto isso, cabe ressaltar, de início, que a proteção assegurada pela Constituição não se limita a casa[8] ou domicílio em seus sentidos estritos.
A proteção constitucional tem abrangência jurídica mais ampla, para equipará-la (a casa) à habitação (individual ou coletiva), isto é, a qualquer espaço que não seja aberto ao público, independentemente do ânimo de residência ou moradia definitiva de seu titular, pois conforme leciona Castanho de Carvalho, deixar a proteção unicamente ao domicílio (civil) seria equivalente a deixar sem proteção as demais projeções da vida privada[9][10].
Em sendo uma projeção espacial do indivíduo, todo local que seja delimitado e separado, que se faça exclusivo em relação a terceiros encontra-se sob a proteção constitucional. Tucci, após afirmar que o conceito deve ser interpretado de forma elástica, cita Pitombo (1999) para apresentar os seguintes exemplos: habitação definitiva ou moradia transitória; casa própria alugada ou cedida; dependências de casa; qualquer compartimento habitado; aposento ocupado de habitação coletiva; estabelecimentos comerciais e industriais, fechados ao público; local de atividade profissional, fechado ao público; barco, trailer, cabine de trem, navio e barraca de acampamento; áreas comuns de condomínio, vertical ou horizontal[11].
Nesse sentido, Mendes cita como exemplo o julgado no MS-MC 23.595, do Supremo Tribunal Federal (STF), no qual afirmou que a proteção constitucional visa “a) qualquer compartimento habitado, b) qualquer aposento ocupado de habitação coletiva, c) qualquer compartimento privado onde alguém exerce profissão ou atividade”[12][13]. Trata-se de entendimento que é pacífico no STF, conforme se extrai, dentre outros julgados, do HC 93.050-6-RJ[14].
Tal entendimento não diverge daquele construído em relação aos incisos 1 e 2 do art. 8º da Convenção Europeia de Direitos do Homem[15] (CEDH) pelo Tribunal Europeu de Direitos do Homem (TEDH), para o qual seria muito restritivo limitar a noção de “círculo íntimo” aos modos escolhidos por cada pessoa para viver à sua maneira, excluindo o mundo alheio desse âmbito. Assim, para o referido tribunal, deve-se entender por vida privada o direito que tem a pessoa de estabelecer e desenvolver relações com outros seres humanos[16], consignando que não há distinção relevante, para fins de proteção constitucional, entre as palavras casa e domicílio:
30. As regards the word “home”, appearing in the English text of Article 8 (art. 8), the Court observes that in certain Contracting States, notably Germany (see paragraph 18 above), it has been accepted as extending to business premises. Such an interpretation is, moreover, fully consonant with the French text, since the word “domicile” has a broader connotation than the word “home” and may extend, to a professional person's office.
In this context also, it may not always be possible to draw precise distinctions, since activities which are related to a profession or business may well be conducted from a person's private residence and activities which are not related may well be carried on in an officer or commercial premises. A narrow interpretation of the words “home” and “domicile” could therefore give rise to the same risk of inequality of treatment as a narrow interpretation of the notion of “private life” (see paragraph 29 above).
31. More generally, to interpret the words “private life” and “home” as including certain professional or business activities or premisses would be consonant with the essential object and purpose of article 8 (art. 8), namely to protect the individual against arbitrary interference by the public authorities (see, for example, the Marckx v. Belgium judgment of 13 June 1979, Series A no. 31, p.15, para. 31). Such an interpretation would not unduly hamper the Contracting States, for they would retain their entitlement to “interfere” to the extent permitted by paragraph 2 of article 8 (art. 8-2); that entitlement might well be more far-reaching where professional or business activities or premises were involved than would otherwise be the case[17].
A partir do exposto, pode-se, em síntese, entender como inviolável qualquer âmbito da vida privada que seja delimitado, que não tenha seu acesso liberado ao público. Isso justamente porque a proteção ao domicílio é instrumental: visa proteger a pessoa e não o local em si.
3. Objeto Jurídico do Direito a Inviolabilidade Domiciliar
No que diz respeito aos fundamentos da garantia da inviolabilidade domiciliar, é entendimento corrente na doutrina que se apresenta como “dimanação da proteção da intimidade e da vida privada”[18]. A isso se refere Navas Sánchez, ao afirmar que “su finalidad primordial sería la de proteger el domicilio en cuanto éste es una mera proyección de la libertad y autonomía y seguridad de la persona”[19].
Ou seja, a garantia à inviolabilidade domiciliar visa à proteção de uma esfera particular da vida[20], dentro da qual se desenvolve, sem interferências externas, a plena intimidade da pessoa (o direito de “gozar da tranquilidade da vida íntima”[21]), estando ligado ao desenvolvimento integral do ser humano[22].
Por intimidade há de se entender, com Costa Jr., a necessidade humana de encontrar, no recolhimento, a paz e o equilíbrio que nos são retirados pelo acelerado ritmo da vida moderna[23]. O autor explica que existem duas esferas de proteção da personalidade: a individual e a privada, sendo que todo direito que se destina à proteção da individualidade serve à proteção da personalidade na esfera pública; por outro lado, a proteção da privatividade[24] se destina ao desenvolvimento à margem da sociedade[25].
Quanto à privatividade, imperioso ressaltar que possui um núcleo que deveria ser inatingível, imune a agressões, que não se justificariam ainda que calcadas no interesse coletivo. Ou seja, nem mesmo a prevenção e o controle de crimes poderiam legitimar violações à privatividade, na medida em que a proteção dos direitos da personalidade é dever do Estado. Nesse sentido, Cupello afirma que não é lícito ao Estado interferir na esfera pessoal ao ponto de subordiná-la inteiramente, sob pena de caracterização do “totalitarismo”, pois tendo como objetivo a valorização da pessoa humana, ao Estado é obrigatório proporcionar mecanismos capazes de levar à realização pessoal[26]. Não por outra razão, ao elaborar a “teoria dos dois níveis”, o Tribunal Constitucional Alemão (TCA) estabeleceu diferenças entre o “simples âmbito privado” e o “âmbito intangível da vida privada”. Para o TCA, enquanto naquele se admite a utilização dos meios de prova – a análise de sua validade – a partir da ponderação entre os interesses de persecução e do acusado, neste o interesse geral de persecução jamais justificará qualquer interferência[27]. Como bem destaca Miranda, a obtenção de provas para uma persecução penal encontra limites constitucionais expressos no que se entende por vida privada, não sendo permitidas buscas que se traduzam numa abusiva intromissão nesse âmbito ao mesmo tempo exclusivo e excludente[28].
Com efeito, “a ideia de pessoa é fundamental tanto no domínio da Ética como no campo do Direito”[29] e o recesso do lar é indispensável ao desenvolvimento humano.
Nos primeiros pronunciamentos sobre o tema, o Tribunal Constitucional Espanhol (TCE) deixou claro que a moradia é o local onde a pessoa pode desenvolver sua intimidade e vida privada à margem das convenções sociais, consignando que:
La inviolabilidad del domicilio constituye un autentico derecho fundamental de la persona estabelecido, según hemos dicho, para garantizar el ámbito de privacidad de ésta dentro del espacio limitado que la própria persona elige y que tiene que caracterizarse precisamente por quedar exento o inmune a las invasiones o agressiones exteriores de outras personas o de la autoridad pública. Como se ha dicho acertadamente, el domicilio inviolable es un espacio en el cual el indivíduo vive sin estar sujeto necesariamente a los usos y convenciones sociales y ejerce su libertad más íntima. Por ello, a través de este derecho no sólo es objeto de protección el espacio físico en sí mismo considerado, sino lo que en él hay de emanación de la persona y de esfera privada de ella. Interpretada en este sentido, la regla de la inviolabilidad del domicilio es de contenido amplio e impone una extensa serie de garantias y de facultades, en las que se compreenden las de vedar todas clases de invasiones […] (STC 22/1984).
De modo similar, os magistrados Jaeger e Hohmann-Dennhardt formularam voto em julgado do TCA considerando que os arts. 1º e 20º da Lei Fundamental não podem ser objeto de intervenção, “pues el desarrollo de la personalidad requiere de espacios reservados […] la vivienda privada sirve al indivíduo como el último refugio […] Ella (la vivienda particular) es, por lo tanto, como lugar medio para preservar la dignidad humana”[30]. Conforme esclarece Muñoz Conde, o argumento principal dos magistrados desenvolve-se no sentido de que a dignidade da pessoa humana protege o núcleo de configuração da vida privada e que, por consequência, todos têm direito a tranquilidade de suas casas[31].
Por sua vez, a Suprema Corte Americana consignou em recente decisão que quando se trata de questões concernentes a 4ª emenda “the home is first among equals. At the Amendment's 'very core' stands 'the right of a man to retreat into his own home and there be free from unreasonable governmental intrusion”[32].
Percebe-se, então, que o cidadão tem direito e, mais que isso, necessita da vida privada como forma de proteção de sua dignidade. Sem ela, o ser humano restaria alijado de uma parcela significativa de suas possibilidades de desenvolvimento pessoal, o que é causa certa de déficits de personalidade.
3.1 Dupla Proteção?
Consoante acima afirmado, o direito à inviolabilidade domiciliar tem caráter instrumental em relação à dignidade da pessoa humana e à privatividade. Assim sendo, imperioso questionar se o direito já estaria protegido pela CR/88 em seu artigo 5º, X[33] e se, consequentemente, o inciso XI seria um reforço do mesmo.
A situação que se expõe pela divisão que se opera nos citados incisos da Constituição brasileira foi objeto de reflexão por parte de Navas Sanchéz (2011), a qual questionou a autonomia do direito na Constituição Espanhola para concluir que a clivagem termina por privar a inviolabilidade domiciliar de uma verdadeira autonomia, tornando-a uma concretização da intimidade no âmbito domiciliar[34]. A autora cita a doutrina de Biglino Campos, para o qual essa separação
consiste en reducir, en cierta medida, la sustantividad de la inviolabilidad de domicilio, al atribuir al artículo 18.2 de la Constituición un cierto papel instrumental en relación a la intimidad. Es posible que las garantías institucionales puedan cumplir tareas de este tipo. Pero, sin embargo, una función de tales características parece incompatible com la própria naturaleza de los derechos fundamentales, que no deben tener outro bien jurídico protegido que el pueda deducirse de sus próprios elementos[35].
A questão também foi analisada por Silva Jr. (2008), para quem o constituinte achou por bem ressaltar a vida privada para não confundi-la com a inviolabilidade domiciliar, pois enquanto aquela diz respeito à proteção da vida pessoal e familiar, esta é ligada ao aspecto físico do ambiente familiar ou profissional[36]. Mais à frente, o autor deixa claro seu entendimento no sentido de que a inviolabilidade do domicílio se trata de desdobramento do direito à intimidade, na medida em que a garantia constitucional resguarda não o proprietário, mas o morador, o que denota a preocupação com as pessoas que se utilizam do espaço[37].
Ante tais constatações, faz-se necessário afirmar, juntamente com Castanho de Carvalho, que, em princípio, a inviolabilidade da privatividade prevista no inciso X do art. 5º da CR/88 é muito abstrata[38]. Desse modo, o inciso XI do mesmo artigo, além de ser um reforço da tutela à privatividade assegurada pelo inciso X – na medida em que ressalta a impossibilidade da pessoa ser alvo de interferências arbitrárias em seu lar –, termina por expressar os contornos de limitação do direito, ao estabelecer as hipóteses em que poderá ser relativizado (por meio da expressão “salvo em caso de”).
Nesse contexto, imprescindível que as normas veiculadas pelos incisos sejam lidas/interpretadas em conjunto, eis que evidente seu nexo. Afinal, inegável que o desenvolvimento e as manifestações da vida íntima/privada se dão, em regra, num âmbito fechado à sociedade.
4. O Script da Invasão ao Domicílio
Como se sabe, a CR/88 previu a situação de flagrante delito dentre as hipóteses de relativização da garantia à inviolabilidade domiciliar. Porém, embora inserida como hipótese de exceção a uma garantia fundamental, fato é que a situação de flagrante continua sendo interpretada de forma elástica, de modo a servir de salvo-conduto a antigos abusos e ilegalidades de práticas policiais que reportam a período anterior à CR/88, quando ainda em pleno vigor o art. 241 do Código de Processo Penal (CPP) – que autorizava buscas domiciliares independentemente de mandado judicial, desde que realizadas por Delegado de Policia.
Ou seja, mesmo a promulgação da carta cidadã não foi suficiente a impedir que os órgãos policiais mantivessem antigas práticas, em violação sistemática ao direito fundamental à inviolabilidade domiciliar. Sob o manto da situação de flagrante – nem sempre real –, ignora-se que “a entrada de órgãos estatais mediante uso da força num domicílio e a busca nele realizada significa, em regra, uma grave intervenção na esfera de vida pessoal do atingido”[39].
Com efeito, os órgãos policiais de todo Brasil têm se valido das mesmas justificativas de outrora para arrebentar as portas das casas brasileiras, mas, principalmente, das casas pobres, pois raramente se observa a mesma truculência ou empenho em bairros nobres – não obstante se saiba que seus moradores também cometem infrações penais das mais variadas espécies[40]. Veja-se que os exemplos citados por Rosivaldo Toscano Jr., Juiz de Direito no Estado do Rio Grande do Norte, são os mesmos que ocorrem no Paraná, onde “o script era, quase que invariavelmente, o mesmo: a polícia dizia que recebeu denúncia anônima de que determinada pessoa estava praticando algum crime. Dirigiam-se ao local e visualizavam o cidadão entrar ou sair de casa, geralmente correndo”[41]. Mas o quotidiano forense é pródigo em situações que enriquecem o referido “script”, sempre enunciadas pelos agentes policiais, que por estas narrativas tentam conferir legitimidade a suas práticas: populares informaram que ocorria tráfico na casa; abordamos usuário em local X e ele informou que comprou o entorpecente em tal casa[42]; dentre inúmeros outros relatos, invariavelmente semelhantes.
O ponto comum observável na maioria esmagadora das situações expostas está no fato de que os policiais não veem a ocorrência do tráfico, tampouco armas ou o produtos de roubo, eles apenas afirmam que tiveram conhecimento – foram informados – e que, portanto, acreditam saber que na casa alvo da intervenção se perpetra algum ilícito penal, o que julgam suficiente a justificar toda sorte de truculências.
Seguindo este “script” – que se afirma como verdadeiro clichê –, os policiais invadem inúmeras casas, devassam com a privatividade de um incalculável número de cidadãos, arrebentando com direitos elementares das populações mais pobres e, nas hipóteses em que encontram o “flagrante”, o Poder Judiciário tem validado a prisão e a prova, especialmente a partir de argumentos que se escoram na suposta permanência da prática ensejadora do “flagrante” [43].
De tal modo, Ministério Público e Poder Judiciário apoderam-se do discurso utilitarista que se constrói na fantasiosa luta “do bem contra o mal e dos homens de bem contra os marginais”[44][45], segundo o qual “pela ótica da eficiência se sustentaria a legalidade do flagrante obtido após a entrada ilegal em uma casa”[46].
Ignora-se que a casa é a emanação da pessoa e de sua privatividade; que a inviolabilidade domiciliar veda qualquer espécie de invasão (particular ou da Administração Pública); que “a intervenção decorrente de uma busca só deve ocorrer se antes uma instância neutra, revestida de independência judicial, tiver examinado se estão presentes os pressupostos para tanto legalmente previstos”[47].
Constata-se, então, a fragilidade dos argumentos utilizados para a relativização de garantias fundamentais – como é o caso da inviolabilidade domiciliar –, o que escancara a política seletiva do sistema penal e explica os motivos de muitos brasileiros ainda não terem superado a condição de subcidadãos, os quais anseiam por um Estado Social, mas só conhecem o Estado Policial/violador de suas liberdades mais básicas[48].
4.1 Por Que é Necessário um Mandado Judicial?
Ante a importância singular do direito (fundamental) à inviolabilidade domiciliar, sua relativização exige situações claras e atestadas ou uma ordem judicial, com “exigencias jurídico-constitucionales estrictas”, que não se imponha, segundo Ambos, como uma “desobediencia consciente o un burdo desconocimiento de los requisitos de la obligacion de orden judicial”[49], pois seria “intolerable para la comunidad jurídica y su idea del derecho, si la protección del domicilio asegurada constitucionalmente mediante el control judicial pudiera ser siempre dejada sem efecto arbitrariamente, sin que esto aparejase consecuencia alguna”[50].
Com efeito, qualquer limitação aos direitos fundamentais está vinculada a pressupostos estritos, pois os poderes públicos não podem atuar de forma livre, ignorando o poder expansivo do Estado Policial, para o qual alerta Zaffaroni[51]. Como bem pontua Pacelli de Oliveira, as garantias processuais são exigências de controle ao exercício do Poder Público, principalmente porque o status hierárquico do Estado enseja diversas violações de direitos fundamentais, além de causar desigualdades processuais[52]. Cabe ainda relembrar que a inviolabilidade domiciliar está intimamente ligada não só a prisões em flagrante, mas também a buscas e apreensões que, via de regra, se dão no bojo da investigação, momento em que inexiste contraditório.
Posto isso, frise-se que qualquer restrição a um direito fundamental deve ser entendida como a exceção de uma exceção (“limite do limite”, segundo Cabezudo Bajo[53]). Com o objetivo de garantir sua conformidade constitucional, deve encontrar-se legalmente prevista, bem como deve perseguir um fim constitucionalmente legítimo[54].
Assim sendo, é de se concluir que a violação de domicílio, enquanto intervenção estatal, requer expressa autorização judicial, em decisão devidamente motivada[55]. Isso porque ao Poder Judiciário cabe garantir de forma imediata à eficácia dos direitos fundamentais, a partir de um juízo de ponderação aplicado ao caso concreto[56], sendo que é na fundamentação que se verificam quais as circunstâncias e normas consideradas pelo Juiz em sua decisão, que também há de observar a proporcionalidade das medidas que veicula.
Com efeito, existe uma tensa relação entre o interesse de uma administração judiciária funcional, que, de um lado, seja capaz de esclarecer os fatos criminosos, mas que, por outro, seja eficaz em garantir os direitos fundamentais do cidadão suspeito ou acusado. Nesse “fio de navalha”, o sacrifício de direitos fundamentais deve ser sempre sopesado pelo Juiz, pois a busca pela defesa social é adstrita a uma “escrupulosa regra moral”[57]. Como já dito, “por isso, por princípio, a intervenção decorrente de uma busca só deve ocorrer se antes uma instituição neutra, revestida de independência judicial, tiver examinado se estão presentes os pressupostos para tanto legalmente previstos”[58].
Veja-se, nesse sentido, importante decisão do Tribunal Supremo Espanhol, o qual estabeleceu que:
La restricción de un derecho fundamental tan transcendente como es la inviolabilidad del domicilio, es natural que no pueda adoptarse sinó después de razonar y fundamentar, jurídicamente, la explicación adecuada de tan excepcional medida, pero en función de um mero formalismo rituario, antes al contrario, en orden al mesaje que la resolución debe comportar, porque la lógica jurídica justificativa del acuerdo há de ir dirigida, primero al juez que adopta la resolución, en tranquilidad de la propia conciencia, y en segundo lugar, a la sociedad com objeto de hacerla saber el porqué la invasion domiciliaria y el analisis ponderativo tenido en cuenta a la hora de juzgar proporcionalmente los distintos intereses en juego[59].
Conclui-se, portanto, que ante a importância basal do direito à privatividade, os limites de sua relativização devem ser pauta constante dos debates acadêmicos, de modo que se evite a perpetuação de práticas que o violam sistematicamente, no mais das vezes protagonizadas por órgãos parciais que, com seus abusos, reduzem a Constituição a letra morta. Nesse contexto, imperioso que se exija do Poder Judiciário uma atuação voltada à efetivação de garantias, e não à convalidação de abusos ou ilegalidades a partir de argumentos “prontos ao uso”, os quais, invariavelmente, vão substituindo a necessária fundamentação que leve em conta as circunstâncias do caso concreto e as normas a elas adequadas.
4.2 As Hipóteses de Flagrante Delito
A CR/88 previu expressamente as situações permissivas para o ingresso em domicílio a despeito da existência de autorização judicial ou da vontade de seu titular, dentre as quais se destaca o “flagrante delito”[60], como objeto de análise do estudo ora proposto. De tal modo, deve-se compreender as significações que a expressão veicula especificamente em termos de relativização da garantia à inviolabilidade domiciliar, frisando que as exceções devem ser interpretadas restritivamente.
A prisão em flagrante tem duas funções básicas, quais sejam: interromper o fato criminoso e possibilitar a coleta imediata de provas. Mas isso não basta ao diagnóstico do flagrante delito, sendo imprescindível que as interpretações considerem o disposto no art. 302 do CPP quanto às hipóteses que o caracterizam, sendo quatro as situações nele previstas: 1º) quem está cometendo a infração; 2º) quem acaba de cometê-la; 3º) é perseguido logo após; 4º) é encontrado logo após com instrumentos que o presumam ser autor do fato. A doutrina, quase que pacificamente, entende que a primeira e a segunda tratam do flagrante próprio, a terceira do flagrante impróprio e a quarta, do flagrante presumido. Todavia, conforme lições de Tornaghi, conclui-se que a primeira é a única em que há verdadeiro flagrante, enquanto que nas outras o legislador presume sua existência, o que faz a partir de ficções jurídicas[61].
Consoante antecipado, em se tratando de restrição de direitos personalíssimos, a interpretação deve ser sempre restritiva, eis que, ante a intervenção do Estado, há de preponderar a liberdade das pessoas[62][63]. Sob essa perspectiva – de preponderância das garantias –, a violação domiciliar só poderia ocorrer em casos excepcionais, ou seja, nos casos de flagrante próprio, quando possível verificar diretamente a prática do crime (excluindo-se, portanto, quaisquer das suposições e clichês que constituem as tramas dos referidos “scripts” de flagrante).
Nesse sentido, cita-se o Tribunal Supremo Espanhol estabeleceu, que estabeleceu três requisitos que delimitam o conceito de flagrante: 1º) imediates temporal entre o fenômeno/fato criminoso; 2º) imediates pessoal referida à relação espacial entre a pessoa e o objeto/instrumento do crime; 3º) necessidade urgente de intervenção com o fim de deter o criminoso ou preservar fontes de prova[64].
Desse modo, para que exista flagrante próprio, faz-se necessária uma prova sensorial, em que se perceba uma real prática do fato, pois conforme decidiu o TSE
la palabra flagrante viene del latín flagrans-flagrantis, participio de presente del verbo flagrare, que significa arder o quemar, y se refiere a aquello que está ardiendo o resplandeciendo como fuego o llama, y en este sentido ha pasado a nuestros días, de modo que por delito flagrante en el concepto usual hay que entender aquel que se está cometiendo de manera singularmente ostentosa o escandalosa[65].
A ilustrar o que se expõe, valiosas são as seguintes considerações de Maria Lúcia Karam:
Evidentemente, a situação de flagrância indicada pelas circunstâncias tem que ser constatada pelos agentes do Estado antes de sua entrada no domicílio. Simples informações ou suspeitas de que poderia estar ocorrendo um crime no interior de uma residência, ou de que ali haveria algo de interesse para a investigação de um crime, não autorizam a entrada. Tais elementos autorizam apenas o requerimento de uma ordem judicial para posterior busca na residência[66].
Conclui-se, portanto, que somente o flagrante próprio se subsume a hipótese constitucional de relativização da inviolabilidade domiciliar, constituindo-se em exceção legítima ao direito à privatividade[67].
4.2.1 Crimes permanentes
Como se sabe, existem diversas classificações para os crimes no ordenamento jurídico, sendo que os crimes permanentes são aqueles em que a consumação se prolonga no tempo, perdurando pelo período em que o sujeito ativo mantiver sua atividade (ação ou omissão).
O fato de um crime ser permanente acarreta diversas consequências, dentre as quais pode se destacar: o início do marco prescricional quando da cessação da permanência; mudanças legislativas que aumentem o rigor penal podem ser aplicadas, quando sua vigência ocorra antes de cessação. Percebe-se, então, que a permanência é um instituto genuinamente penal, muito embora o CPP disponha no art. 303 que, quanto aos crimes permanentes, “entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência”.
Destarte, ante tal redação, imperioso questionar se ocorre violação ao direito a inviolabilidade domiciliar quando do ingresso policial, sem mandado judicial e sem uma situação ex ante que justifique a busca, nos casos de crimes permanentes.
4.2.1.1 A posição doutrinária e jurisprudencial
De início, cabe afirmar que redação do art. 303 do CPP tem causado interpretações equivocadas por parte da doutrina e jurisprudência.
Com efeito, parcela significativa da doutrina tem afirmado que nos crimes permanentes, a situação de flagrância é – também – permanente (independentemente da forma como foi diagnosticada), de modo que os órgãos policiais estariam autorizados a proceder a buscas e apreensões, bem como a realizar prisões, independentemente da existência de mandado judicial ou do consentimento do morador. Isso porque, segundo boa parcela da doutrina, o crime permanente se amoldaria sem restrições à situação do art. 302, I do CPP, ou seja, estaria o agente permanentemente praticando o crime. Nesse sentido, Nucci sustenta que “por uma questão de bom senso, cabe prisão em flagrante a qualquer momento. Nem precisa existir o art. 303, pois o art. 302, I, resolve o problema”[68].
Da mesma forma, Flávio Gomes afirma que “uma das hipóteses que a Constituição Federal autoriza ingressar em casa alheia sem ordem de juiz reside justamente no flagrante”[69], declarando ainda que não importa se a droga encontrada seja destinada ao consumo próprio ou ao tráfico, pois em ambas as hipóteses a invasão do domicílio é autorizada.
Apoiados nesses entendimentos ou em outros semelhantes, os Tribunais têm decidido, quase que pacificamente, que “não se pode olvidar que nos casos de flagrante de crimes permanentes, como o tratado no presente writ, é permitido o ingresso na residência do acusado sem ordem judicial, com ou sem o seu consentimento [...]”[70]. Ou que “o tráfico de drogas é delito permanente, podendo a autoridade policial ingressar no interior do domicílio do agente, a qualquer hora do dia ou da noite para fazer cessar a prática criminosa e apreender a substância entorpecente que nele for encontrada”[71].
No âmbito jurisprudencial paranaense, o des. Rogério Kanayama talvez seja aquele que mais discorre sobre o tema, afirmando a dispensabilidade de mandado de busca para adentrar o domicílio em casos tais:
Por outro lado, não se pode confundir a prisão em flagrante do acusado com o flagrante delito de que trata a ressalva do art. 5º, XI, da Constituição:
XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.
Isso porque, a primeira define-se como uma medida de autodefesa da sociedade, consubstanciada na privação da liberdade de locomoção daquele que é surpreendido em situação de flagrância, a ser executada independentemente de prévia autorização judicial (CF, art. 5º, LXI). Já o segundo compreende uma característica do próprio delito, é a infração que está “queimando”, que está sendo cometida ou acabou de acontecer, que autoriza a prisão do agente mesmo sem autorização judicial em virtude da certeza visual do crime.
Assim, a apreensão das drogas na residência do acusado revela a “certeza visual” mencionada acima. E a materialidade e a autoria do crime estão, por conseguinte, plenamente comprovadas como se verá a seguir.
Daí porque, entendo, a ação policial foi legal. A Constituição Federal não fala em prisão em flagrante, mas em flagrante delito, ou seja, a prisão do agente, naquele momento, não alterava a situação[72].
No mesmo sentido, observe-se, também, no STJ: HC 227.460/PA, HC 116.901/SP, HC 222.173/DF, HC 183.110/SP, HC 174.375/SP; pelo STF: RHC 91.189/PR, HC 84.772.
Apesar de difundido, os entendimentos expostos partem de uma concepção parcial do próprio conceito de flagrante (aquilo que arde), desconsiderando que, mesmo em casos de crimes permanentes, meras denúncias anônimas – se é que de fato existem – ou simples suspeitas não suprem a necessidade de constatação prévia da prática de infração penal por parte dos agentes do Estado, que é a única hipótese em que se autoriza a violação de domicílio. Afinal, a certeza visual jamais pode ser “revelada”: ou ela existe – e é certeza – ou não[73].
4.2.1.2 Flagrante posto x flagrante pressuposto
Cumpre recordar que se por um lado a titularidade de um direito não é salvo-conduto para a prática impune de infrações penais, por outro hipóteses de relativização a direitos fundamentais não podem ser elastecidos ao ponto de salvaguardar abusos e ilegalidades por parte do Estado, especialmente no que concerne à intervenções drásticas, como é o caso do aprisionamento em flagrante[74].
De tal modo, não é pelo fato de se estar diante de um crime permanente que se devem tolerar abusos que buscam justificativas na necessidade de se interromper a prática da infração penal. O fato de o art. 303 do CPP autorizar a prisão em flagrante nos crimes permanentes enquanto não cessada a infração não pode ser interpretada sem restrições, de forma assistemática, ao ponto de justificar intervenções aleatórias, calcadas em simples suspeitas ou denúncias anônimas. Semelhante abertura à discricionariedade de agentes policiais termina por fomentar ilegalidades e abusos irreparáveis, pois conforme esclarece Rosa, a situação de flagrância “deve ser posta e não pressuposta/imaginada”[75].
Frente a tais possibilidades de abuso, os Estados Unidos da América adotam a doutrina da plain view, que condiciona a realização de buscas independentemente de mandado judicial à observância rigorosa de determinados requisitos. Diga-se, inclusive, que segundo a Suprema Corte da Florida, a referida doutrina não pode ser usada “to launch unbridled searches and indiscriminate seizures nor to extend general exploratory search made solely to find evidence of defendant's guilt”[76]. Seus requisitos são:
As the general rule, objects in the “plain view” of an officer who has the right to be in the position to have that view are subject to seizure without a warrant. It is usually applied where a police officer is not searching for evidence against the accused, but nonetheless inadvertely comes across an incriminating object. Thus, the following elements must be present before the doctrine may be applied: a) a prior valid intention based on the valid warrantless arrest in which the police are legally present in the pursuit of their official duties; b) the evidence was inadvertently discovered by the police who have the right to be where they are; c) the evidence must be immediately apparent; and d) “plain view” justified were seizure of evidence without further search[77].
A doutrina da plain view, como se percebe, guarda semelhanças com o posicionamento adotado pelo TSE, e pode ser perfeitamente incorporada por nossos Tribunais, na exigência de evidências prévias, anteriores à devassa domiciliar que vise ao aprisionamento em flagrante e realização de buscas. Sob pena de se estabelecerem “loterias”, não se pode admitir que abuso ou ilegalidade anteriores sejam convalidadas a partir de descobertas fortuitas – ou perversamente preparadas. Como bem ressalta Pacelli de Oliveira, “a prova produzida durante a situação de flagrante deve ser sempre valorada, desde que e quando não houver uma conduta ilícita anterior por parte de quem esteja a produzir a aludida prova”[78]. Portanto, não é licito que os órgãos policiais procedam a buscas com base em meras suspeitas ou denúncias anônimas (pseudoconhecimentos).
Com efeito, flagrante – propriamente dito – nada mais é que a certeza visual do crime, o que não tem sequer uma mínima correspondência com convicção íntima de policiais.
5. STC 341/1993 do Tribunal Constitucional Espanhol como Precedente a Nortear Doutrina e Jurisprudência Brasileiras
Em 18 de novembro de 1993, o pleno do TCE julgou um conjunto de recursos e ações de inconstitucionalidade que questionavam a constitucionalidade de diversos artigos da Lei Orgânica de Proteção da Segurança Cidadã (Ley Orgânica 1/1992, de 21 de fevereiro). Dentre os artigos questionados, estava o 21.2[79], que possibilitava a entrada em domicilio sem mandado judicial quando ali em curso um delito de drogas (requisito material), e quando os policiais tivessem um “'conocimiento fundado' que lleve a la constancia' de la realizacion de un delito y que sea precisa una 'intervención urgente'”[80] (requisitos objetivos).
Segundo os recorrentes, o referido artigo ensejava uma desnaturalizada ampliação do delito flagrante, afetando o sentido da autorização constitucional (art. 18.2), pois impossível equiparar delito flagrante a mero “conhecimento fundado” do fato, uma vez que tal conhecimento (por mais fundado que seja) não é flagrante. O parlamento de las Ilas Baleares (suscitante da inconstitucionalidade) alegou que ante a ausência de um conceito de flagrância estabelecido pelo constituinte, suas significações hão de vincular-se à linguagem, à possibilidade de sua percepção sensorial, interpretando-se o conceito de maneira restritiva (na medida em que constitui fundamento para suspensão de direito fundamental); alegou, também, que o legislador ordinário extrapolou suas funções na medida em que não interpretou o conceito constitucional de flagrante, senão que lhe deu uma extensão desmensurada. A junta General del Principado de Asturias (suscitante da inconstitucionalidade) alegou que o conceito de flagrante deve ser extraído da própria Constituição, sendo objeto de uma interpretação restritiva, na medida em que excepciona direitos fundamentais; ademais, afirmou que as expressões “conhecimento fundado” e “que leve à certeza” são por demais vagas e antiéticas. A sección Decimoquinta de la Audiencia Provincial de Madrid (suscitante da inconstitucionalidade) afirmou que o artigo violava o princípio da lex certa ou lex strita pois é “una norma indeterminada, vaga, incierta e imprecisa, y que más que proporcionar seguridad al ciudadano genera una grave inseguridad jurídica”[81], não podendo portanto limitar ou restringir um direito fundamental.
O TCE identificou três questões que se relacionavam em todas as alegações de inconstitucionalidade do artigo[82]: 1º) possibilidade de o legislador levar adiante uma definição de conceito constitucional de flagrância; 2º) a adequação ou não da norma com o conceito de flagrante constitucional; 3º) a possibilidade ou não de que a norma só valha para determinados delitos.
Quanto à primeira, o TCE consignou ser possível delimitar a noção de flagrante constitucional, uma vez que conexo ao direito fundamental relativo e limitado, que pode ceder em determinadas hipóteses taxativas (consentimento do titular, decisão judicial e flagrante delito); que o legislador atua na função que lhe corresponde, de refletir e formalizar na norma um conceito presente, ainda que não definido na Constituição; e que “esta labor legislativa puede estimarse necesaria a fin de proporcionar a los titulares del derecho y a los agentes de la autoridad una identificación segura de las hipótesis de la cual será legítima la entrada forzosa en domicilio por delito flagrante”[83].
Quanto à segunda, o TCE afirmou que é consolidada a imagem de flagrância como sendo a situação fática em que o delinquente é surpreendido, visto diretamente no momento em que pratica o ato ou em circunstâncias imediatas da prática do ato, e
si el lenguaje constitucional ha de seguir siendo significativo -y ello es premisa firme de toda interpretación- no cabe sino reconocer que estas connotaciones de flagrancia (evidencia do delito y urgencia de la intervención policial) estan presentes en el concepto inscrito no art. 18.2[84].
Que, a partir da noção de flagrante delito, a Constituição não retirou dos órgãos policiais a possibilidade de entrar nos domicílios, senão que a considerou uma hipótese excepcional, em que as circunstâncias em que se mostra o delito justificam uma imediata intervenção; que a norma impugnada mostra uma amplitude e indeterminação incompatível com a Constituição porquanto “conhecimento fundado” e “certeza” não integram um conhecimento ou percepção evidente – vão além do que é essencial ou nuclear para situação de flagrância – e que, por conseguinte, tais termos permitem entrada e buscas domiciliares baseados em “conjecturas o en sospechas que nunca, por sí mismas, bastarían para configurar una situación de flagrancia”[85]; que pelo fato de as expressões serem ambíguas e indeterminadas, conferem ao flagrante um alcance que a Constituição não permite, acrescentando que a interpretação e aplicação legislativa dos conceitos constitucionais definidores dos âmbitos de liberdade é tarefa por demais delicada, em cujo cumprimento não pode o legislador diminuir ou relativizar o rigor dos enunciados constitucionais que estabeleçam garantias, nem mesmo criar margens de incerteza sobre seu modo de afetação, uma vez que “la eficacia en la persecución del delito, cuya legitimidad es incuestionable, no puede imponerse, sin embargo, a costa de los derechos y libertades fundamentales”[86].
Quanto à terceira, afirmou que a Constituição não estabeleceu diferenciações entre os tipos de delito, que ao se apresentarem em estado de flagrância podem ocasionar a busca domiciliar. Pelo contrário, que toda hipótese de flagrante delito, qualquer que seja a infração penal, pode autorizar a entrada forçosa no domicílio por parte dos órgãos policiais; e que, por mais que a Constituição não tenha singularizado hipóteses delitivas para aplicação de um conceito ad hoc de flagrância, não é menos certo que a noção geral de delito flagrante requeira uma prestação jurisdicional sempre atenta às singularidades do caso concreto “y que bien puede el legislador anticipar en sus normas essa precision o concreción, para ilícitos determinados”[87], desde que tal delimitação respeite a garantia disposta no art. 18.2 da Constituição, isto é, o conceito constitucional de flagrante.
Com esses fundamentos, o TCE rechaçou a possibilidade de que a policia possa entrar no domicilio nas hipóteses do art. 21.2 da Lei Orgânica 1/1992, em interpretação que não se vincula à autorização decorrente de efetiva prática de infração penal, mas à necessidade de conhecimento direto/pleno pela polícia quanto à sua ocorrência no local.
Martin Morales, ao estudar a decisão, vai além: afirma que o estado de flagrância não se resume à “certeza”, ou seja, o delito somente é flagrante quando se vê, e que, portanto, mais que “certeza” (a qual pode derivar de qualquer meio), o que se exige é realidade. Não se deve confundir flagrância com o que não é mais que (em grande parte dos casos) uma notícia de crime ou um conhecimento de dados que levem a crer na ocorrência de uma infração penal, por mais fundada que possa parecer essa crença[88].
6. Excurso: Quem não tem Direito à Inviolabilidade
Conforme anteriormente afirmado, a violação do domicílio acontece quase que exclusivamente na casa de pessoas pertencentes aos estratos social e economicamente desfavorecidos da população[89], a clientela por excelência do sistema penal[90]. Por tal motivo, Toscano Jr. (baseado em Damatta) sustenta a existência de três classes de pessoas: o cidadão, o sobrecidadão e o subcidadão[91], explicando que a condição de pessoas é negada aos últimos, o que faz com que sua dignidade não seja mais que uma mera formalidade, possível de ser ignorada sem qualquer dificuldade.
A realidade constatada pelo referido autor demonstra a seletividade de nosso sistema penal, em que os órgãos policiais selecionam os estereótipos, provocando uma distribuição seletiva em torno dos mais vulneráveis (aqueles que raras vezes têm a chance de protestar contra os abusos que sofrem sem serem duramente reprimidos), e o Poder Judiciário legitima a violação das garantias fundamentais (inviolabilidade domiciliar e direito à personalidade) que a todos deveriam proteger. Mas não é só: os apontamentos de Toscano Jr. também atestam que a vigilância, “as práticas de tipo pan-óptico estão limitadas a locais destinados a seres humanos categorizados na coluna dos débitos, declarados inúteis, plena e totalmente 'excluídos'”[92], os quais, por serem os “inimigos”, devem aceitar todo tipo de vigilância, por mais desumana que seja.
Com efeito, o Estado passou a buscar legitimidade na “proteção” contra os perigos à segurança pessoal, adotando a ideologia da neutralização das “ameaças” oriundas das subclasses, do seu potencial inimigo interno, “contra o qual a segurança do Estado promete defender seus súditos com unhas e dentes”[93]. O Estado social passa a ser um Estado vigilante, manipulando discursos de medo e insegurança que se retroalimentam, na medida em que o discurso do medo torna as pessoas inseguras (“o medo alimenta o medo”[94]). Para tanto, vale-se da técnica volkisch[95] (popularesca) e procura “febrilmente por um alvo sobre o qual [os indivíduos] possam descarregar sua ansiedade concentrada”[96], fazendo com que o sofrimento de determinadas (mas não poucas) pessoas seja considerado um preço necessário para o alívio dos desconfortos das outras, que se apresenta como um efeito colateral “aceitável”.
Esse discurso faz com que as garantias fundamentais sejam consideradas um entrave para a segurança, razão pela qual se sustenta que sua violação sistemática é indispensável na luta contra a criminalidade – no combate aos inimigos. Isto é, funda-se no argumento de que a lei garantidora não deve valer para os excluídos, diante dos quais pode se “autossuspender”. Consoante, analisa Bauman, que a lei limita sua preocupação com o excluído, de modo que seja mantido fora de seus limites, declarando que a ele não interessa a proteção legal, ou seja, que “não há lei para ele. A condição de excluído consiste na ausência de uma lei que se aplique a ele”[97]. O sistema preocupa-se em selecionar o “refugo” da sociedade (dita “boa”), em “excluí-lo do arcabouço jurídico em que se conduzem as atividades dos demais e 'neutralizá-lo'”[98].
Percebe-se, então, que a fragilidade social e a insegurança da vida fazem com que se incite à segregação-exclusão[99], fazendo que as “pessoas de bem” demandem a supressão, a liquidação dos supérfluos (refugo humano).
Difunde-se a ilusão de que a segurança urbana aumentará na medida em que forem sancionadas leis punitivas mais severas, que aumente o arbítrio policial e que as garantias sejam relativizadas. Ignora-se que essas garantias são o próprio fundamento de um Estado Democrático de Direito diante de um sistema penal que em realidade opera usurpando direitos e garantias, movido por uma potentia punienda que demanda contenção[100] e que “à medida que o estado de direito cede às pressões do estado de polícia, encapsulado em seu seio, ele perde racionalidade e enfraquece sua função de pacificador social, mas ao mesmo tempo perde nível ético”[101].
Diante de tais constatações, faz-se imperioso que o Poder Judiciário assuma seu papel na efetivação de garantias e limitação ao poder punitivo, sem o que o aparato policial ficará livre para impor-se e suspender os direitos básicos sob um discurso de “ordem”, fazendo com que desapareça o Estado de Direito. Importante lembrar com Bauman que “a ideia de colocar ordem no mundo pela extirpação e a queima de suas impurezas, assim como a convicção de que isso era factível (desde que poder e vontade se mostrassem adequados à tarefa), foi incubada na mente de Hitler [...]”[102].
Conclusão
Conforme se procurou demonstrar no decorrer deste ensaio, o direito à inviolabilidade domiciliar é garantido nas mais diversas legislações do mundo, podendo ser considerado um dos mais importantes do ser humano, na medida em que procura resguardar sua vida íntima, o espaço da vida em que o homem possa desenvolver sua personalidade.
Não por acaso, portanto, trata-se de garantia resguardada por duas normas constitucionais, que buscam tutelar a vida privada como um todo (art. 5º, X) e o direito do homem se isolar do mundo em sua casa (art. 5º, XI). Isso é suficiente a demonstrar a preocupação do constituinte com a privatividade, direito que deve ser interpretado de forma ampla possível, por levar em consideração as necessidades e sentimentos mais importantes do ser humano, imprescindíveis a uma digna existência.
Importante destacar que o vocábulo “casa” – de que se valeu o constituinte brasileiro – há de ser entendido como qualquer espaço que seja exclusivo, que não seja de acesso público liberado. Isso porque o direito não visa proteger o local – espaço físico –, mas o ser humano e sua intimidade, razão pela qual estão sob guarida locais de trabalho, hotéis, albergues, trailers, barracos de lona ou de papel, etc.
Reforçou-se a importância da existência de mandado judicial para que se possam realizar buscas e apreensões tendo em vista que a relativização de direitos fundamentais deve se conter em limites estritos, sendo que cabe ao julgador realizar a avaliação de cada caso concreto para que possa afirmar que se trata ou não de hipótese de supressão de garantias. Também foi destacado que existe um Estado Policial com tendências expansivas, que constantemente viola direitos fundamentais, razão pela qual não há de se cogitar que o constituinte tenha assumido o risco de deixar a avaliação de cada situação aos órgãos policiais[103], pois a arbitrariedade e abuso de poder dificilmente são reparados.
Restou demonstrado que a outorga constitucional para entrada em domicílio diz respeito ao flagrante próprio, isso porque a própria expressão “flagrante” refere-se àquilo que arde/queima, o que não pode ser estendido às demais hipóteses de flagrância previstas no CPP (que na verdade não o são, como bem demonstrou Tornaghi (1978), permitindo ao aparato policial que viole domicílios e garantias constitucionais sem maiores restrições. Nesse sentido, observe-se que nem mesmo se pode afirmar que a permanência do crime equivalha a um prolongado flagrante próprio (em interpretação distorcida do conceito processual), mantendo-se imprescindível a percepção sensorial, como bem destacado pelo TSE.
Ou seja, a necessidade de percepção sensorial para caracterização da situação de flagrância aplica-se mesmo nas hipóteses de crimes permanentes, uma vez que a outorga constitucional não pode ser retrospectiva, não se podendo admitir que os fins justifiquem os meios. O crime permanente, sobretudo em se tratando daqueles de perigo abstrato (os mais usuais são a posse de arma de fogo ou guarda de entorpecentes) não demandam uma pronta intervenção policial, não havendo risco iminente a direito personalíssimo de qualquer pessoa. Especialmente nesses casos, portanto, é imprescindível que o flagrante seja posto, jamais pressuposto, razão pela qual é de total pertinência que doutrina e jurisprudência passem a adotar a teoria da plain view, que, como se verificou, opera dentro de um perfeito juízo de razoabilidade, evitando ao máximo os corriqueiros abusos policiais.
Importante destacar que, no Brasil, já foram adotadas diversas teorias oriundas do direito estrangeiro, com destaque para as americanas (fruto da árvore envenenada, descoberta inevitável, direito ao silêncio[104], etc.). Dessa forma, plenamente viável que a plain view seja manejada na interpretação e aplicação das regras que compõem nosso ordenamento.
Mostrou-se, ainda, como o TCE resguardou o direito à inviolabilidade domiciliar quando entendeu que o legislador espanhol extrapolou suas funções ao positivar a possibilidade de a polícia realizar buscas independentemente de mandado, caso detivesse um “conhecimento fundado” que levasse a uma “certeza” da prática de tráfico de drogas (crime permanente). Nesse sentido, deixou claro que a hipótese de flagrante constitucional, a autorizar a relativização da garantia à inviolabilidade domiciliar, diz respeito ao flagrante próprio, em que a pessoa é diretamente vista enquanto pratica a infração penal, não podendo o legislador reduzir o alcance de direitos fundamentais de forma dúbia, ao pretexto de garantir eficácia à persecução penal.
Tal precedente, da mesma forma que a plain view, pode ser perfeitamente utilizado como modelo por tribunais brasileiros, na medida em que as hipóteses ali tratadas pelo legislador são idênticas às que ocorrem aqui (com a clara diferença de que o legislador não ousou tanto no Brasil, mas o aparato policial encontra resguardo na jurisprudência).
A partir dos ensinos de Bauman (2007) e Zaffaroni (2007), expôs-se a existência de uma demanda por exclusão das “subclasses”, rotuladas como inimigos/refugos que devem ser sistematicamente neutralizados, colocados à margem do direito, sob o pretexto de que as garantias são um entrave para persecução penal – sobre eles exercida, em regra. Também se consideraram as formas de que se vale o Estado das técnicas popularescas para legitimar a exclusão de inúmeras pessoas, enquanto afirma satisfazer o interesse de poucas, as quais ignoram que o Estado democrático de direito deve manter seu nível ético e que não pode ceder ao estado policial.
Por fim, importante destacar a necessidade de se proceder a uma revisão da jurisprudência pátria, pois é certo que quando a busca da segurança se torna um fim em sim mesma, quando são ignorados direitos básicos aos seres humanos, como o direito à inviolabilidade domiciliar, o Estado não garante segurança, pelo contrário, reforça os temores de um estado vigilante e supressor de direitos.
Com efeito, é da segurança individual (do respeito aos direitos fundamentais) que poderá advir uma segurança social, a qual manterá um processo dialético e justo, pelo qual se reforça o Estado democrático.
Certo é que, em tempos nos quais se demanda exclusão de pessoas e supressão de direitos, cada vez mais necessária se torna a intervenção do Poder Judiciário na contenção do poder policial, no cumprimento de sua função primordial de garantir os direitos fundamentais. Por isso, louváveis decisões como as proferidas pelo então des. Geraldo Prado, na Apelação Criminal nº 2009.050.07372 do e. TJ/RJ, e pelo des. Diógenes Hassan Ribeiro, na Apelação Criminal nº 70058172628 do e. TJ/RS. Decisões as quais resguardaram devidamente o direito à inviolabilidade domiciliar, declarando nulas as provas oriundas das apreensões realizadas pelos policiais sem que houvesse autorização judicial para a entrada em domicílio.
Como destaca Rosa, somente com respeito à “pouco compreendida dignidade da pessoa humana” poder-se-á reconstruir a cidadania brasileira[105].
Este artigo foi publicado originalmente na Revista Justiça e Sistema Criminal, nº 10, periódico do Grupo de Pesquisa Modernas Tendências do Sistema Criminal. Todas as edições da Revista são gratuitas e se encontram disponíveis no www.sistemacriminal.org.
Notas e Referências:
[3] Packard (1967) apud Paulo José da Costa Jr. O direito de estar só: a tutela penal da intimidade. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 19.
[4] Boyd v. United States, 116 U.S. 616, 626 apud Florida v. Jardines, nº 11-564. p.6
[5] SILVA JR., Jr., W. N. da. Curso de direito processual penal: teoria (constitucional) do processo penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2008
[6] ARROYO, S. C. Camara. Inviolabilidad del domicilio. p. 2; ALCALÁ, H. N.. El derecho a la privacidad y a la intimidad em el ordenamiento jurídico chileno. In: Ius et Praxis, vol. 4, num. 2, 1998. p. 94 e ss.
[7] “A casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou durante o dia, por determinação judicial”.
[8] Significante utilizada por nosso Constituinte, a despeito da similitude para fins de proteção conforme se verá.
[9] CASTANHO DE CARVALHO, L. G. G. de. Processo Penal e Constituição: Princípios constitucionais do processo penal. p.89.
[10] De forma semelhante, Gomes Canotilho afirma que domicílio é uma “projecção espacial da própria pessoa... Tendo em conta o sentido constitucional deste direito tem de se entender por domicílio desde logo o local onde se habita, a habitação, seja permanente seja eventual, seja principal ou secundária. Por isso, ele não pode equivaler ao sentido civilístico, que restringe o domicílio à residência habitual (mas certamente incluindo também as habitações precárias, como tendas, roulottes, embarcações), abrangendo também a residência ocasional (como o quarto do hotel) ou ainda os locais de trabalho (escritórios, etc.); dada a sua função constitucional, esta garantia deve estender-se quer ao domicílio voluntário geral quer ao domicílio profissional (Código Civil, arts. 82º e 83º). A proteção do domicílio é também extensível à sede das pessoas colectivas.” CANOTILHO, J. J. G., apud CUPELLO, L. P. De F. Direito Penal e Processual Penal luso-brasileiro. Breves reflexões. p. 97.
[11] TUCCI, R. L. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
[12] MENDES, G. F. Curso de direito constitucional. p. 480.
[13] López Menudo, de modo muito didático, identificou círculos concêntricos de proteção domiciliar: “Sintetizando lo expuesto, cabe concluir distinguiendo las distintas situaciones a modo de tres circulos concéntricos. En el más interno se hallaria el domicilio constitucional -no obstante, más amplio que qualquier otro domicilio tradicional- caracterizado por tratarse de un lugar cerrado, afecto a la vida privada y que comporta un ius excludendi alios, incluida la Administración Pública. El círculo intermedio comprendería todo lugar cerrado, ostentando su titutlar un derecho de exclusión de terceros; y el problema consiste en si este derecho es oponible o no frente a la Administración, que es la cuestión que aquí estamos analizando. Por último, el circulo exterior encuentra protegido, como derecho de propriedad, por la ley civil o penal pero al que puede acceder libremente la Administración, pues lo contrario haria a ésta de pero condición que a cualquier particular.” LÓPEZ MENUDO, F. La intervención del juez para la defensa del domicilio y también de la propiedad?. p. 21
[14] Nesse, o rel. Ministro Celso de Mello afirmou que “Para os fins da proteção jurídica que se refere o art. 5º, XI, da Constituição da República, o conceito normativo de 'casa', revela-se abrangente e, por estender-se a qualquer compartimento privado não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade (CP, art. 150, §4º, III), compreende, observada essa específica limitação espacial (área interna não acessível ao público), os escritórios profissionais, inclusive os de contabilidade, 'embora sem conexão com a casa de moradia propriamente dita' (Nelson Hungria). Doutrina. Precedentes” p. 2, HC 93.050-6 RJ, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma. Disponibilizado em: 31/07/2008, dje nº 142)
[15] 8.1. “Everyone has the right to respect for his private and family life, his home and his correspondence.” 8.2. “There shall be no interference by a public authority with the exercise of this right except such as is in accordance with the law and is necessary in a democratic society in the interests of national security, public safety or the economic well-being of the country, for the prevention of disorder or crime, for the protection of health or morals, or for the protection of the rights and freedoms of others.”
[16] “The Court does not consider it possible or necessary to attempt an exhaustive definition of the notion 'private life'. However, it would be too restrictive to limit the notion to an 'inner circle' in which the individual may live his own personal life as he chooses and to exclude therefrom entirely the outside world not encompassed within that circle. Respect for private life must also comprise to a certain degree the right to establish and develop relationships with other human beings.” Niemietz v. Germany judgement, ECHR 1991, § 29.
[17] Niemietz v. Germany judgement, ECHR 1991, § 30 E 31.
[18] CASTANHO DE CARVALHO. Processo Penal e Constituição... p. 89.
[19] NAVAS SÁNCHEZ, M. del M. Inviolabilidad o intimidad domiciliaria? A propósito de la jurisprudencia constitucional sobre el derecho fundamental a la inviolabilidad del comicilio. In Revista de Derecho Político, n. 81, Mayo/Ago. 2011.
[20] Alcalá explica que “las acciones privadas internas están constituidas por los comportamietos o conductas íntimas o inmanentes que principian y concluyen en el sujeto que los realiza, no trascendiendo de este, comprendiendo los hechos o actos realizados en absoluta privacidad o de los que nadie puede percatarse”. Continua o autor fazendo referências a decisões da Corte Suprema Argentina: “La jurisprudencia de la Corte Suprema Argentina ha determinado en los casos 'Bazterrica' (Fallos, 308; 1412) y 'Ponzetti de Balbin' (fallos, 306; 1982), que el Estado debe concretar 'la protección de la privacidad comenzando por no entrometerse en ella, respetando el área de inmunidad de toda persona”. ALCALÁ, H. N. El derecho a la privacidad y a la intimidad en el ordenamiento jurídico chileno. Ius et praxis, vol. 4, núm. 2, 1998.
[21] MENDES. Curso de direito constitucional... p. 480. No mesmo sentido, Leciona José Afonso da Silva que “(...) a Constituição está reconhecendo que o homem tem direito fundamental a um lugar em que, só ou com sua família, gozará de uma esfera jurídica privada e íntima, que terá que ser respeitada como sagrada manifestação da pessoa humana.” SILVA, L.J.A. da. Curso de Direito Constitucional positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
[22] Navas Sánchez explica que o fundamento está diretamente ligado ao âmbito de proteção: “En efecto, en la medida en el fundamento prevalente de este derecho es la libertad y autodeterminación del indivíduo, necessarios a su vez para el libre desarrollo de su personalidad, la delimitacion del domicilio inviolable vendrá dado por su relación com tal noción”. NAVAS SÁNCHEZ, M. del M. Inviolabilidad o intimidad domiciliaria? ...
[23] COSTA JR.., P.J. da. O direito de estar só: tutela penal da intimidade. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
[24] Costa Jr. Explica porque é correto falar privatividade no lugar de privacidade: “a expressão exata, em bom vernáculo, é privatividade, que vem de privativo. E não privacidade, que é péssimo português e bom anglicismo (vem de privacy)”. O direito de estar só... p. 17.
[25] COSTA JR. O direito de estar só... p. 23.
[26] CUPELLO. Direito penal e processual penal... p. 131.
[27] MUÑOZ CONDE, F. Valoración de las grabaciones audiovisuales em el proceso penal. 2. ed. Buenos Aires: Hammurabi, 2007. p. 54.
[28] MIRANDA, J.; MEDEIROS, R. Constituição Portuguesa anotada, Tomo I. Coimbra: Coimbra editora, 2005.
[29] REALE, M. apud Cupello. Direito penal e processual penal... p. 132.
[30] MUÑOZ CONDE, F. Valoración de las grabaciones ... p. 57
[31] MUÑOZ CONDE, F.. Valoración de las grabaciones.... p. 57.
[32] Florida v. Jardines, nº 11-564. p.4. A decisão trata de um caso em que policiais utilizaram um cachorro farejador para descobrir se havia drogas na casa de um suspeito. Após liberarem o cachorro para adentrar na propriedade e demonstrar que havia drogas, os policiais solicitaram um mandado de busca, o qual ao ser cumprido ocasionou na apreensão de quantidades de maconha. Importante destacar que em voto conjunto o Juiz Kagan consignou que a questão em debate era “easy case easy twice over” (p. 5, voto conjunto).
[33] “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
[34] NAVAS SANCHEZ. Inviolabilidad o intimidad domiciliaria?...
[35] BIGLINO CAMPOS (1997) apud Navas Sanchéz. Inviolabilidad o intimidad domiciliaria?...
[36] SILVA JR. Curso de direito processual penal... p. 620 e ss.
[37] SILVA JR.. Curso de direito processual penal... p. 620 e ss.
[38] CASTANHO DE CARVALHO. Processo penal e Constituição … p. 74.
[39] Cinquenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão. p. 686.
[40] Bem lembra Rosa que “embora seja uma prática rotineira a violação da casa de pessoas pobres, porque a polícia não entra assim em moradores das classes ditas altas, não se pode continuar tolerando a arbitrariedade”. ROSA, A. M. da. Tráfico e Flagrante: apreensão da droga sem mandado. Uma prática (in)tolerável?.
[41] TOSCANO JR., R. A inviolabilidade do lar e a dimensão (in)constitucional do flagrante oriundo exclusivamente de denúncia anônima.
[42] Muitas vezes ignorando que a conduta melhor se enquadra em tipos que sequer autorizam o aprisionamento, como é o caso do previsto no art. 28 da lei. 11.343/2006.
[43] Sempre importante destacar que a frieza dos autos passa ao largo da brutalidade com que são realizadas as abordagens, buscas pessoais e domiciliares. Veja-se a sábia reflexão de Zygmunt Bauman, segundo o qual “O que distingue o mal burocraticamente administrado e realizado não é tanto sua banalidade (particularmente se comparado com os males que costumavam assombrar as sociedades antes de se inventarem a burocracia moderna e seu 'gerenciamento científico do trabalho'), mas a sua racionalidade”. BAUMAN, Z. Medo líquido. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p. 85
[44] TOSCANO JR. A inviolabilidade do lar ...
[45] É possível fazer um paralelo com a crítica feita por Coutinho àqueles que defendem o (falacioso) princípio da verdade material: “sem embargo, isto é possível porque se mantém vivo - e mantém-se mesmo! -, no imaginário coletivo, a ameaça do inimigo, do contrário, do invasor, ou quem se prestar a tanto; sem embargo, no limite, cria-se um 'bode expiatório' (em sociedades autoritárias) [...]”. COUTINHO, J. N. M. de. Introdução aos princípios do Direito Processual penal brasileiro. In: Separata ITEC, ano 1, n. 4, jan./mar. 2000.
[46] TOSCANO JR., R. Sobre o fio da navalha: a justiça criminal entre a eficiência e os direitos fundamentais.
[47] Cinquenta anos de Jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal Alemão. p. 686.
[48] TOSCANO JR. A inviolabilidade do lar...p. 10
[49] AMBOS, K. Las prohibiciones de utilización de pruebas em el proceso penal alemán- fundamentación teórica y sistematización”. p. 40.
[50] AMBOS. Las prohibiciones de utilización... p. 40.
[51] ZAFFARONI, E. R. et. All. Direito Penal Brasileiro: teoria geral do direito penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2003.
[52] OLIVEIRA, E. P. de. Processo e Hermenêutica na tutela penal dos direitos fundamentais. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 152.
[53] AGUIAR (1993) apud CABEZUDO BAJO. La restricción de los derechos fundamentales. p. 190.
[54] CABEZUDO BAJO. La restricción de los derechos fundamentales. p. 194.
[55] CABEZUDO BAJO cita dentre outras medidas “tales como reserva de ley organica, la garantia del contenido esencial, la motivación de la limitación del derecho, el cumplimiento del principio de proporcionalidad o el 'mayor valor' de los derechos”. La restricción... p. 221.
[56] CABEZUDO BAJO. La restricción... p. 222.
[57] AVOLIO, L. F. T. Provas ilícitas: interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 5. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2012. p. 41
[58] Cinquenta anos de jurisprudência... p. 686
[59] STS (1993) apud MORALES MUÑOZ. Diligencias de investigacion en el proceso penal: La diligencia de entrada y registro. Tercer presupuesto: autorizacion judicial. Procedimiento para su práctica. Efectos de las entradas y registros domiciliarios inconstitucionales. p. 11.
[60] Conforme se verifica do inc. XI do art. 5º, as outras hipóteses são consentimento válido do morador, desastre, prestação de socorro ou durante o dia por determinação judicial.
[61] TORNAGHI, H. (1978) apud CARVALHO. Processo Penal e Constituição... p. 91.
[62] Conforme esclarece Zaffaroni, “el principio pro homine es próprio del derecho internacional de los derechos humanos e impone que em la duda se decida siempre em el sentido más garantizador del derecho de que se trate”. Proceso Penal y derechos humanos: código, principios y realidad.
[63] A CF determina, em seu art 5º, § 1º, que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.”
[64] STS (1990) apud MORALES MUÑOZ. Diligencias de investigación: Registro Domiciliario. Cuestiones generales y consentimiento titular. Situaciones de flagrancia. p. 20.
[65] MARTÍN MORALES, R. Entrada en domicilio por causa de delito flagrante. In Revista electrónica de Ciencia Penal y Criminologia. p. 3.
[66] KARAM, M.L. Liberdade, intimidade, informação e expressão. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 38.
[67] Em sentido contrário, baseado em Camargo Aranha, Lima afirma que “por flagrante delito deve-se entender qualquer hipótese de flagrante, e não somente o flagrante próprio, 'pois o constituinte não poderia ignorar todos os casos de flagrante restringindo-se somente ao primeiro deles'”. LIMA, M. P. Curso de Processo Penal, vol. II. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. Também neste sentido, LOPES JR. sustenta que “havendo flagrante delito (art. 302 do CPP), poderá a autoridade policial ingressar na casa e proceder à busca dos elementos probatórios necessários”. in Direito Processual Penal... p. 699.
[68] Apud RHC 39.530-PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, disponibilizado no dje em 19/09/2013.
[69] GOMES, L.F. et. All. Lei de Drogas Comentada: artigo por artigo. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
[70] RHC 39.530-PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, disponibilizado no dje em 19/09/2013.
[71] HC 222.173-DF, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, disponibilizado no dje em 01/12/2011. p. 6.
[72] Apelação Criminal 1.016.120-5, rel. Des. Rogerio Kanayama, 3ª Câmara Criminal.
[73] Importante salientar, com Coutinho, que a lei possui limites linguísticos de interpretação: “Daí que, como parece primário, o que se delimita ao Poder Judiciário é a verificação da adequação possível, ou seja, se a norma criada pelo interprete não escapa da regra e, assim, do raio de alcance da estrutura linguística do enunciado, das suas palavras. Destarte, não pode -e não deve- o Poder Judiciário (porque abusivo, dado extrapolar suas atribuições), em reconhecendo como correta a adequação possível, impor outra, de sua lavra, quiçá por a entender mais justa, ou por bondade, ou por capricho ou outro fundamento. Isto seria decisionismo (Ferrajoli) e interessa pouco à democracia porque se não pode definir, senão pela cabeça do autor, aquilo que seria o justo, o bondoso, o caprichoso ou qualquer outro atributo utilizado. COUTINHO, J. N. De M. Dogmática e limites linguísticos da lei. In Diálogos Constitucionais: direito, neoliberalismo e desenvolvimento em países periféricos. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 232.
[74] Como magistralmente leciona Miranda: “A eficácia da justiça é também um valor que deve ser perseguido mas, porque numa sociedade livre os fins nunca justificam os meios, só é aceitável quando alcançada lealmente, pelo engenho e arte, nunca pela força bruta, pelo artifício ou pela mentira, que degradam quem os sofre, mas não menos quem os usa” in Constituição Portuguesa … p. 361.
[75] ROSA, A. M, da. Guia compacto de processo penal conforme a teoria dos jogos. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014.
[76] People of the Philippines vs Armando Compacion y Surposa. G.R. Nº 124442, July 20, 2011).
[77] People of the Philippines vs Armando Compacion y Surposa. G.R. Nº 124442, July 20, 2011.
[78] OLIVEIRA. Processo e hermenêutica... p. 157.
[79] “A los efectos de lo dispuesto en el párrafo anterior, será causa legítima para la entrada y registro en domicílio por delito flagrante el conocimiento fundado por parte de las Fuerzas y Cuerpos de Seguridad que le lleve a la constancia de que se esta cometiendo o se acaba de cometer alguno de los delitos que, em materia de drogas tóxicas, estupefacientes o sustancias psicotópicas, castiga el Código Penal, siempre que la urgente intervención de los agentes sea necesaria para impedir la consumación del delito, la huida del delincuente o la desaparición de los efectos o instrumentos del delito”.
[80] Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 98.
[81] Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 111.
[82] Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 122 e ss..
[83] Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 123.
[84] Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p 123.
[85] Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 124.
[86] Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 124.
[87] Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 124.
[88] MARTÍN MORALES, R. Entrada en domicilio por causa de delito flagrante. Revista electrónica de Ciencia Penal y Criminologia. p. 3.
[89] ROSA. Guia compacto de processo penal... p. 116.
[90] “[...] sem dúvida um mecanismo fundamental dessa distribuição desigual da criminalidade são os estereótipos de autores e vítimas que, tecidos por variáveis geralmente associadas aos pobres (baixo status social, cor, etc.), torna-os mais vulneráveis à criminalização (…). A clientela do sistema penal é constituída de pobres (minoria criminal) não porque tenha uma maior tendência a delinquir mas precisamente porque tem maiores chances de serem criminalizados e etiquetados como delinquentes. As possibilidades (chances) de resultar etiquetado, com as graves consequências que isto implica, se encontram desigualmente distribuídas de acordo com as leis de um second code constituído especialmente por uma imagem estereotipada e preconceituosa da criminalidade.” ANDRADE, V. R. P. de. Sistema Penal máximo x cidadania mínima: códigos de violência na era da globalização. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 53 e ss.
[91] TOSCANO JR. A inviolabilidade do lar...
[92] BAUMAN, Z. Vigilância líquida: diálogos com David Lyon. Rio de Janeiro: Zahar: 2013. p. 58.
[93] BAUMAN, Z. Medo líquido. p. 193.
[94] BAUMAN, Z. Vigilância líquida... p. 99.
[95] “A técnica volkisch (ou popularesca) consiste em alimentar e reforçar os piores preconceitos para estimular publicamente a identificação do inimigo da vez”. ZAFFARONI, E. R. O inimigo no direito penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007. p. 57
[96] BAUMAN. Medo líquido. p. 160.
[97] BAUMAN, Z. Vidas desperdiçadas. Rio de Janeiro: Zahar, 2005. p. 44
[98] BAUMAN. Vidas desperdiçadas. p. 108.
[99] BAUMAN, Z. Confiança e medo na cidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2009. p. 41.
[100] ZAFFARONI. Direito Penal brasileiro... p. 201.
[101] ZAFFARONI. Direito Penal brasileiro... p. 243.
[102] BAUMAN. Vigilância líquida. p. 80.
[103] OLIVEIRA. Curso de Processo Penal...
[104] Mesmo que este seja aplicada de forma totalmente divergente e manipulada daquela que é aplicada no direito americano ou europeu.
[105] ROSA. Guia compacto de processo penal... p. 70.
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Iuri Victor Romero Machado é Graduando em Filosofia pela Universidade Federal do Paraná. Especialista em Direito Penal e Processo Penal pelo curso Luiz Carlos/OPET. Especialista em Ciências Criminais pela Universidade Tuiuti do Paraná. Pesquisador do Grupo Modernas Tendências do Sistema Criminal. Advogado.
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