Inovação e geração de emprego como um fenômeno da sociedade do conhecimento

28/02/2017

Por Guilherme Wünsch – 28/02/2017

A guinada em consideração do trabalhador como um sujeito cuja identidade se reconhece na proteção do trabalho, demonstra uma inexorável progressão da reafirmação da identidade profissional que retira do Direito do Trabalho o espaço de “bloco monolítico, definidor de uma identidade profissional única, para dar lugar a uma diversidade cada vez maior de institutos jurídicos”.[1] Dentro deste contexto, evidencia-se que as relações entre o Direito do Trabalho e o desenvolvimento tecnológico se tornam cada vez mais importantes para retirar do trabalho a ideia de prestação de serviço para contraprestação pecuniária rumo a uma ideia de desenvolvimento da negociação nas empresas, com a renovação da figura do contrato de trabalho, lastreada na amplitude da incerteza tecnológica e como isto influenciará, futuramente, as formas de organização do trabalho.

É interessante observar que Alain Supiot considera que essa relação entre Direito e técnica já se dava na relação com o Direito do Trabalho, sendo umas de suas representações mais precoces e claras. Dividida essa relação em três tempos, tem-se, em um primeiro momento, a Revolução Francesa com o assentamento das bases jurídicas da economia de mercado e da revolução industrial. Já no segundo momento, tem-se o maquinismo industrial como fonte das condições de trabalho desumanas e degradantes, com a exploração do trabalho da mulher e das crianças, e, em um terceiro momento, tem-se o desenvolvimento do Direito do Trabalho servindo aos países industriais como forma de limitação da sujeição do ser humano às ferramentas, com a sua proteção física, fazendo do trabalho um instrumento de bem-estar.

É inegável que a relação entre Direito e técnica não ratifica apenas uma relação pautada pela conjunção ‘e’. Não se trata de aqui estudar apenas o Direito e a Técnica, mas sim constatar que o Direito é parte da própria técnica. O Direito serve como forma de proteger o “homem das fantasias de onipotência geradas pela potência das máquinas”.[2] O que se verifica é a existência de questionamentos levantados pelas novas tecnologias, que provocam o Direito, sem fazê-lo desaparecer neste cenário, senão pelo contrário, a provocação da técnica ao Direito evidencia que ele se encontra atrasado em definições relativamente ao progresso técnico e que não pode querer submeter os avanços científicos a princípios jurídicos de caráter imutável. Agora já não mais falando em Direito e técnica, mas sim Direito enquanto técnica, desvela-se a necessidade de tornar o seu conteúdo um reflexo dos avanços tecnológicos a partir de valores humanos.

Neste sentido, Mattos e Guimarães compreendem que a geração de emprego e renda com base em atividades de ciência, tecnologia e inovação ainda é um tema controvertido e polêmico, porquanto o aumento dos sistemas de produção provocada pela ampliação da importância do conhecimento é uma forma de alavancar a relação entre capital e trabalho.[3] Nesta relação complexa, o ser humano deixa de ser um simples operador e passa a assumir tarefas novas, marcadas pelo uso intenso do conhecimento, gerando consequências econômicas, sociais, filosóficas e ideológicas que rompem com os pilares básicos do processo de desenvolvimento.

O uso da ciência, tecnologia e inovação como fator de geração de empregos se desvela, desta forma, a partir de três pilares, dentro da visão exposta por Mattos e Guimarães: a) o desenvolvimento de um produto inovador, de grande valor agregado e intensivo em conhecimentos gerados; b) um processo inovador, como um conjunto de procedimentos e tecnologias que compõem um sistema produtivo e eficaz em conhecimento direto; c) um empreendimento inovador, ou seja, uma organização composta por pessoas, processos, produtos, gestão e cultura gerados pelo processo de ciência, tecnologia e inovação.[4]

Destarte, os autores apontam, pelo menos, quatro estratégias para o processo de geração de emprego e renda por meio da ciência, tecnologia e inovação, como o desenvolvimento de laboratórios de pesquisa em universidades, permitindo uma aplicação eficaz dos investimentos em ciência e tecnologia; os institutos de pesquisa e desenvolvimento, com a geração de novos conhecimentos que se transformem em resultados e benefícios para a sociedade; os centros de pesquisa e desenvolvimento de empresas, em que estas dialoguem com as instituições científicas e tecnológicas para a criação da cultura da inovação, atingindo novos mercados e gerando emprego e renda; por fim, as incubadoras de empresas e parques tecnológicos, como ambientes de inovação que oferecem condições para transformar o conhecimento em produtos, transferindo-se o conhecimento científico para as tecnologias de mercado, desenvolvendo-se talentos com a criação de produtos com valores altamente agregados.

Trata-se, portanto, do desenvolvimento de conhecimentos e condições para a geração de empregos e renda a partir do empreendedorismo inovador, em que o desenvolvimento tecnológico cria novas condições do desenvolvimento do trabalho, e, por conseguinte, um repensar da gestão destes contratos de trabalho, mantidos com empregados que assumam uma visão inovadora, inspiradora e ousada, em que não apenas o trabalho manual se torne o exemplo da criação de renda e identificação do trabalhador no seio social, mas em que o conhecimento se torne mola propulsora de processos inovadores de ampliação do mercado de trabalho. Eis assim a possibilidade de afirmação da técnica como um horizonte último a partir do qual se descobre todos os campos da experiência, não no sentido procedimental, mas como uma condição que decide o modo de se fazer experiência. Ou seja, a mudança daquela condição homem-sujeito e técnica-instrumento para a técnica que dispõe da natureza e do ser humano, que agora encontra-se nesse horizonte já desvelado pela técnica, que decide a forma como ele irá perceber, pensar, sentir e projetar as coisas.


Notas e Referências:

[1] SUPIOT, Alain. Crítica do direito do trabalho. Tradução: Antônio Monteiro Fernandes, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002. p.336.

[2] SUPIOT, Alain. Homo juridicus: ensaio sobre a função antropológica do Direito. Tradução: Maria Ermantina de Almeida. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p.144.

[3] MATTOS, João Roberto Loureiro de. GUIMARÃES, Leonam dos Santos. Gestão da tecnologia e inovação uma abordagem prática. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p.12-13.

[4] MATTOS, João Roberto Loureiro de. GUIMARÃES, Leonam dos Santos. Gestão da tecnologia e inovação uma abordagem prática. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p.16.

MATTOS, João Roberto Loureiro de. GUIMARÃES, Leonam dos Santos. Gestão da tecnologia e inovação uma abordagem prática. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

SUPIOT, Alain. Crítica do direito do trabalho. Tradução: Antônio Monteiro Fernandes, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002.

SUPIOT, Alain. Homo juridicus: ensaio sobre a função antropológica do Direito. Tradução: Maria Ermantina de Almeida. São Paulo: Martins Fontes, 2007.


Guilherme WunschGuilherme Wünsch é formado pelo Centro Universitário Metodista IPA, de Porto Alegre, Mestre em Direito pela Unisinos e Doutor em Direito pela Unisinos. Atualmente, é advogado do Programa de Práticas Sociojurídicas – PRASJUR, da Unisinos, em São Leopoldo/RS e Advogado Pleno Coordenador da Área Trabalhista do Escritório Santos Silveiro Advogados, com atuação no RS e PR. Professor da UNISINOS e professor convidado dos cursos de especialização da UNISINOS.


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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