Informativo 805 do STF

16/11/2015

Por Nicola Patel Filho - 16/11/2015

Nesse informativo os destaques são:

1) Constitucional:

a) É incompatível com a ordem constitucional vigente a utilização de termos com forte conotação discriminatória na definição de conduta criminosa, tais como “pederastia ou outro” e “homossexual ou não” previstos no art. 235 do Código Penal Militar.

b) É constitucional lei complementar distrital que dispõe sobre programas e projetos específicos de ordenamento do espaço urbano quando compatíveis com as diretrizes fixadas no plano diretor.

2) Processo Penal: Compete à Justiça Federal processar e julgar a prática de crime consistente em disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente (ECA, artigos 241, 241-A e 241-B) quando praticados por meio da rede mundial de computadores.


É incompatível com a ordem constitucional vigente a utilização de termos com forte conotação discriminatória na definição de conduta criminosa, tais como “pederastia ou outro” e “homossexual ou não” previstos no art. 235 do Código Penal Militar.

O plenário, por maioria, declarou “não recepcionado” pela Constituição Federal as expressões “pederastia ou outro” e “homossexual ou não” constantes no art. 235 do Código Penal Militar; in verbis:

Pederastia ou outro ato de libidinagem - Art. 235. Praticar, ou permitir o militar que com êle se pratique ato libidinoso, homossexual ou não, em lugar sujeito a administração militar: Pena - detenção, de seis meses a um ano.

Antes de analisar a constitucionalidade de tais expressões, os Ministros pontuaram que haveria diferenças não discriminatórias entre a vida civil e a vida da caserna, esta que é marcada por valores que não seriam usualmente exigidos, de modo cogente e imperativo, aos civis. Trata-se das chamadas relações especiais de sujeição, em que a relação administração pública e servidor é agravada para buscar determinados fins públicos.

Ao tratar das relações especiais de sujeição, Branco afirma:

Há pessoas que se vinculam aos poderes estatais de forma marcada pela sujeição, submetendo-se a uma mais intensa medida de interferência sobre seus direitos fundamentais. A existência de uma relação desse tipo atua como título legitimador para limitar os direitos fundamentais, isto é, justifica possíveis limitações dos direitos dos que fazem parte dela. (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 9ª, ed. Saraiva, São Paulo-2014)

Por essa razão, a tutela penal do bem jurídico protegido pelo art. 235 do CPM é compatível com a constituição.

Por outro lado, o dispositivo legal objeto da ADPF, ao manter expressões com forte carga pejorativa (“pederastia ou outro”; “homossexual ou não”), estimularia condutas odiosas ao promover discriminação em desfavor dos homossexuais.

Pontuaram que o reconhecimento do direito à liberdade de orientação sexual constitui liberdade essencial do indivíduo. Sendo assim, tais expressões violam os princípios da dignidade humana e da igualdade, bem como a vedação à discriminação odiosa.

Assim, concluiu o tribunal que a lei não poderia se utilizar de expressões pejorativas e discriminatórias, considerando o reconhecimento do direito à liberdade de orientação sexual como liberdade essencial do indivíduo.

ADPF 291/DF, rel. Min. Roberto Barroso, 28.10.2015. (ADPF-291)


É constitucional lei complementar distrital que dispõe sobre programas e projetos específicos de ordenamento do espaço urbano quando compatíveis com as diretrizes fixadas no plano diretor.

O plenário do STF considerou constitucional lei complementar do Distrito Federal que dispõe sobre a disciplina de projetos urbanísticos em lotes integrados por unidades autônomas e áreas comuns condominiais.

Primeiramente, cumpre frisar que a Constituição confere competência concorrente aos entes federativos para fixar normas gerais de urbanismo (art. 24, I e § 1º, e 30, II), sendo que, aos Municípios, é atribuída posição de preponderância a respeito de matérias urbanísticas.

A Corte considerou que nem toda matéria urbanística relativa às formas de parcelamento ou à ocupação do solo deve estar inteiramente regrada no plano diretor.

Diante disso, a norma impugnada, ao estabelecer uma forma diferenciada de ocupação e parcelamento do solo urbano em loteamentos fechados, complementou o plano diretor do Distrito Federal, sendo considerada compatível com a Constituição Federal.

RE 607940/DF, rel. Min. Teori Zavascki, 29.10.2015.


Compete à Justiça Federal processar e julgar a prática de crime consistente em disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente (ECA, artigos 241, 241-A e 241-B) quando praticados por meio da rede mundial de computadores.

O plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar Recurso Extraordinário com repercussão geral, atribuiu à Justiça Federal a competência para processar e julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente (ECA, artigos 241, 241-A e 241-B) quando praticados por meio da rede mundial de computadores.

Sabe-se que a competência da Justiça Federal é estipulada de forma taxativa no texto constitucional. No caso em apresso, o Tribunal observou que a competência federal decorreria inciso V do art. 109 da CF:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

(...) V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente.

Do dispositivo supra, extrai-se que os requisitos para se estabelecer a competência da Justiça Federal são:

1) crimes previstos em tratado ou convenção internacional;

2) a internacionalidade da prática criminosa (iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente).

No caso em apreço, o Tribunal considerou que o tipo penal decorreria do art. 3º da Convenção sobre o Direito das Crianças da Assembleia Geral da ONU, texto que teria sido promulgado no Brasil pelo Decreto 5.007/2004.

Assim, os crimes de seriam produto de convenção internacional subscrita pelo Brasil para proteger as crianças da prática nefasta e abominável de exploração de imagem na internet.

Ademais, ao considerar a amplitude do acesso ao sítio virtual, no qual as imagens ilícitas teriam sido divulgadas, estaria caracterizada a internacionalidade do dano produzido ou potencial.

Portanto, o Plenário considerou que os crimes previstos nos artigos 241, 241-A e 241-B do Estatuto da Criança e do Adolescente são de competência da Justiça Federal quando evidenciada a internacionalidade da prática criminosa, fato este que se verifica quando utilizada a rede mundial de computadores.

Para uma análise mais aprofundada do tema, segue estudo dos colegas Rômulo de Andrade Moreira Alexandre Morais da Rosa, com o qual concordo integralmente: http://emporiododireito.com.br/pornografia-com-criancas-e-adolescentes-na-internet-de-quem-e-a-competencia-por-romulo-de-andrade-moreira-e-alexandre-morais-da-rosa/

RE 628624/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, 28 e 29.10.2015.


Nicola Patel Filho

Nicola Patel Filho é advogado, bacharel em Direito pela Universidade Barriga Verde (UNIBAVE), especialista em Direito Penal e Processo Penal pela Escola do Ministério Público do Estado de Santa Catarina. Aprovado nos concursos de Delegado de Polícia de Polícia Civil no Estado do Paraná (2013) e de Delegado de Polícia Civil do Estado de Santa Catarina (2015). Membro do Grupo de Estudos e Aperfeiçoamento de Polícia Judiciária da Associação de Delegados de Polícia de Santa Catarina. .


Imagem Ilustrativa do Post: Comando Militar do Nordeste (CMNE) sob nova direção // Foto de: Ministério da Defesa // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/ministreiodadefesa/14331179036

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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