Por Nicola Patel Filho - 07/11/2015
Os destaques deste informativo são:
1) Constitucional: Não ofende a Constituição Federal lei federal que dispensa o registro em cartório do contrato de alienação fiduciária de veículos.
2) Penal:
a) O Acordo de Extradição entre Países do MERCOSUL não autoriza a extradição quando a pena a cumprir seja inferior a 6 meses.
b) Não é cabível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao condenado por crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico.
Não ofende a Constituição Federal lei federal que dispensa o registro em cartório do contrato de alienação fiduciária de veículos.
O Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento conjunto do RE n. RE-611639 e das ADI’s 4333 e 4227, entendeu constitucional a dispensa de registro do contrato no Registro de Títulos e Documentos das alienações fiduciárias de veículos automotores.
O Código Civil de 2002 dispõe:
“Art. 1.361. Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível que o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor.
§ 1o Constitui-se a propriedade fiduciária com o registro do contrato, celebrado por instrumento público ou particular, que lhe serve de título, no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do devedor, ou, em se tratando de veículos, na repartição competente para o licenciamento, fazendo-se a anotação no certificado de registro.”
De plano, observa-se que o atual Código Civil, ao tratar da instituição de propriedade fiduciária de veículos, exige apenas o registro na repartição competente para o licenciamento.
No mesmo sentido, trata o art. 6º, caput, da Lei 11.882/2008:
“Art. 6º. Em operação de arrendamento mercantil ou qualquer outra modalidade de crédito ou financiamento a anotação da alienação fiduciária de veículo automotor no certificado de registro a que se refere a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, produz plenos efeitos probatórios contra terceiros, dispensado qualquer outro registro público.”
O Tribunal observou que os requisitos atinentes à formação, validade e eficácia de contratos privados consubstanciariam matéria evidentemente ligada à legislação federal e não ao texto constitucional.
Embora o exercício em caráter privado da atividade notarial e de registro estivesse previsto no art. 236 da CF, não haveria conceito constitucional fixo e estático de registro público.
Pelo contrário, o § 1º do mesmo dispositivo estabelece a competência da lei ordinária para a regulação das atividades registrais. Como no pacto a tradição seria ficta e a posse do bem continuaria com o devedor, uma política pública adequada recomendaria a criação de meios conducentes a alertar eventuais compradores sobre o real proprietário do bem, de modo a evitar fraudes, de um lado, e assegurar o direito de oposição da garantia contra todos, de outro.
De acordo com o legislador, a exigência de registro em serventia extrajudicial acarretaria ônus e custos desnecessários ao consumidor, além de não conferir ao ato a publicidade adequada. Para o leigo, seria mais fácil, intuitivo e célere verificar a existência de gravame no próprio certificado de propriedade do veículo, em vez de peregrinar por diferentes cartórios de títulos e documentos ou ir ao cartório de distribuição, nos Estados-Membros que contassem com serviço integrado, em busca de informações.
Por fim, em respeito ao direito adquirido, ao apreciar a constitucionalidade dos §§ 1º e 2º do art. 6º da Lei 11.882/2008, que declara nulos os convênios celebrados entre os órgãos de trânsito estaduais e os titulares das serventias extrajudiciais, o Colegiado conferiu interpretação conforme à Constituição aos dispositivos em exame, de modo a permitir que os convênios já pactuados até a edição da lei tivessem vigência até o término do prazo estabelecido, vedada qualquer prorrogação.
O Acordo de Extradição entre Países do MERCOSUL não autoriza a extradição quando a pena a cumprir seja inferior a 6 meses.
A Segunda Turma do STF negou pedido de extradição formulado em desfavor de nacional argentino condenado a 6 (seis) anos de reclusão.
No caso, o extraditando permaneceu preso no período compreendido entre 16.8.2006 e 30.5.2011, tendo cumprido 4 anos, 9 meses e 14 dias da pena imposta. Já no Brasil, fora preso em 23.1.2015, por força de decreto de prisão preventiva para fins de extradição, permanecendo preso desde então.
O art. Artigo 2, item 2 do Acordo de Extradição dentre Países do MERCOSUL, promulgado pelo Dec. 4.974 de 2004, dispõe que:
“Se a extradição for requerida para a execução de uma sentença exige-se, ademais, que a parte da pena ainda por cumprir não seja inferior a seis meses.”
Considerando que o período em que o extraditando esteve detido no território brasileiro deve ser detraído do total ainda por cumprir, tem-se a pena remanescente inferior a 6 meses, pelo que incide a cláusula restritiva disposta no artigo 2, item 2, do já aludido acordo de extradição.
Não é cabível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao condenado por crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico.
Não é possível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao condenado pelo crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico (CP, art. 129, § 9º, na redação dada pela Lei 11.340/2006).
De acordo com inciso I do art. 44 do Código Penal (CP), não viabiliza a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos quando o crime for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa.
Com advento da Lei 9.099/1995, a doutrina passou a sustentar que a vedação abstrata prevista no art. 44 do CP implicaria violação ao princípio da proporcionalidade, não havendo razão para impedir a conversão da reprimenda a autores de delitos que poderiam ser agraciados com a transação penal ou suspensão condicional do processo.
Afinal, se o autor pode ser agraciado, por exemplo, pela transação penal antes mesmo do início da ação penal, em que a obrigação possui identidade com as penas alternativas, por que não autorizar a substituição ao final da condenação?
No entanto, essa linha argumentativa não teria espaço em relação ao crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico; por duas razões:
1) a pena máxima prevista para esse delito — três anos —, impede a transação penal (Lei 9.099/1995, art. 61); e
2) a existência de comando proibitivo previsto no art. 41 da Lei Maria da Penha (“Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995”).
Assim, mesmo que o referido artigo autorize a substituição da pena desde que não implique o pagamento isolado de multa, ela (a substituição) deve preencher os requisitos esculpidos no art. 44 do CP, inclusive a ausência de violência ou grave ameaça.
Vejamos a redação do art. 17 da lei 11.340/2006:
“Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.”
Diante desses fundamentos, a Segunda Turma concluiu que não cabe substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em relação aos crimes praticados com violência ou grave ameaça e em ambiente doméstico.
Nicola Patel Filho é advogado, bacharel em Direito pela Universidade Barriga Verde (UNIBAVE), especialista em Direito Penal e Processo Penal pela Escola do Ministério Público do Estado de Santa Catarina. Aprovado nos concursos de Delegado de Polícia de Polícia Civil no Estado do Paraná (2013) e de Delegado de Polícia Civil do Estado de Santa Catarina (2015). Membro do Grupo de Estudos e Aperfeiçoamento de Polícia Judiciária da Associação de Delegados de Polícia de Santa Catarina. .
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