Muitas tecnologias em Saúde não possuem registro na ANVISA e por isso não são comercializadas no Brasil.
A legislação pátria proíbe a importação de medicamentos e outros produtos sem o registro sanitário. Inclusive há a criminalização da conduta, conforme prevê o artigo 273, § 1º-B, I[1] e o artigo 334-A, § 1º, inc. II, ambos do Código Penal.
Os Tribunais brasileiros julgam com frequência processos criminais em que se discute o tema.
Em resumo, é possível diferenciar pelo menos duas situações:
a) importação para fins comerciais: neste caso, há crime, nos termos da legislação penal, pois inexiste tutela urgente de algum Direito à Saúde, já que a finalidade imediata é a prática um ato comercial, visando o enriquecimento daquele que realiza a conduta em razão da possibilidade de causar risco à incolumidade pública;
b) de outro lado, não é possível criminalizar, de plano, a conduta do cidadão que importa baixa quantidade de medicamento sem registro na ANVISA, para uso particular, sem a finalidade comercial, e sem onerar os cofres públicos. Neste caso, o direito fundamental à busca do melhor tratamento médico, principalmente se custeado pelo próprio cidadão, não exige uma prestação positiva do Estado. Assim, é possível discutir a ausência de tipificação criminal, nos termos do artigo 196 e seguintes da Constituição.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região – TRF4 – tem decisões que permitem a não aplicação de sanção penal em razão da insignificância jurídica do fato. Neste sentido:
“PENAL. PROCESSO PENAL. RECURSO CRIMINAL EM SENTIDO ESTRITO. IMPORTAÇÃO IRREGULAR DE MEDICAMENTOS. QUANTIDADE. ALEGAÇÃO DE USO PRÓPRIO. INSIGNIFICÂNCIA. 1. Acolhendo o posicionamento atual deste Tribunal, o enquadramento típico da conduta de internalizar medicamentos passa pela análise do princípio da especialidade. 2. Partindo-se da conduta geral para a conduta especial, a importação de mercadoria que dependa de registro, análise ou autorização de órgão competente, é enquadrada como contrabando, inserido no art. 334-A, § 1º, inc. II, do Código Penal, em sua redação atual. Havendo a introdução do elemento especializante "produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais", a conduta passa a estar subsumida ao art. 273 do Código Penal, denominado pela lei como falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais. Por fim, se a substância contida no medicamento internalizado está descrita nas listas da Portaria MS/SVS nº. 344/1998 e atualizações da ANVISA, a conduta resta enquadrada como tráfico de drogas, tipificado no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, com base no art. 66 da mesma lei. 3. Eventual aplicação do art. 273, § 1º-B, do Código Penal deve observar as consequências do julgamento da arguição de inconstitucionalidade pela Corte Especial deste Tribunal, quais sejam, a depender da quantidade e destinação dos medicamentos internalizados: aplicação integral do art. 273 do Código Penal; aplicação do preceito secundário do art. 33, caput, da Lei nº. 11.343/2006; desclassificação para o art. 334-A do Código Penal; ou aplicação do princípio da insignificância. 4. Hipótese de internalização de medicamento em diminuta quantidade e ínfimo potencial lesivo, destinado a uso próprio, a conduta é insignificante para o Direito Penal. Precedentes desta Corte. 5. Recurso do Ministério Público Federal desprovido. [grifado] (TRF4 5007500-67.2016.4.04.7002, OITAVA TURMA, Relator DANILO PEREIRA JUNIOR, juntado aos autos em 06/02/2017)”
Para o reconhecimento da insignificância penal da conduta de importação particular de medicamento não registrado na ANVISA é preciso comprovar: “a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada.”[2]
Assim, é preciso compatibilizar os princípios da segurança sanitária e da proteção integral ao Direito à Saúde, de modo e equilibrar adequadamente as normas constitucionais e não causar danos à Sociedade e aos cidadãos.
[1] Art. 273 - Falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais:
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e multa.
§ 1º-A - Incluem-se entre os produtos a que se refere este artigo os medicamentos, as matérias-primas, os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em diagnóstico.
§ 1º-B - Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no § 1º em relação a produtos em qualquer das seguintes condições:
I - sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente;
[2] STJ, REsp 1581525/SP, Relator Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, j. 20/06/2017, DJe 26/06/2017.
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