GASLIGHTING E A CONDUTA DO OBSTETRA DURANTE O PARTO

18/05/2022

Coluna Direito Médico e da Saúde

Recentemente ganharam espaço nas mídias brasileiras várias denúncias de mulheres contra obstetras por gaslighting durante o parto. O termo inglês significa, de modo simples, o abuso sutil (às vezes, nem tanto). Uma maneira de o homem manipular a mulher. O homem distorce, e a mulher se anula, passando a crer que estava agindo de modo errado. Imagine-se tal situação em um parto, um momento singular.

Por isso, desde o ano de 1994, a Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia reconhece ser o parto um momento de vulnerabilidade. Como tal, portanto, exige cuidado, isto é, respeitar tanto a mulher quanto o nascituro. O gaslighting dos obstetras durante o parto pode ser entendido a partir das mais variadas formas de desrespeito e de violações ocorridas durante a assistência à gravidez, ao parto e ao pós-parto. Para a Organização Mundial de Saúde também é possível ser conceituado como a

apropriação do corpo da mulher e dos processos reprodutivos por profissionais de saúde, na forma de um tratamento desumanizado, medicação abusiva ou patologização dos processos naturais, reduzindo a autonomia da paciente e a capacidade de tomar suas próprias decisões livremente sobre seu corpo e sua sexualidade, o que tem consequências negativas em sua qualidade de vida

Fica evidenciada, e não poderia ser diferente, ser injustificável, sob qualquer pretexto, a prática do gaslighting  pelo obstetra durante o parto. Contudo, torna-se um problema diferente quando o mesmo é analisado desde o ponto de vista do Direito. Não há um conceito jurídico para o tema. Não significa, entretanto, inexistirem mecanismos que possam ser aplicáveis à espécie.

Nesse sentido, é dever do obstetra dar ciência ao paciente de todos os procedimentos e das demais questões relativas ao pré-natal, ao parto e ao pós-parto. Daí a existência dos denominados planos de parto. As intercorrências não previstas, à evidência, restam, sempre, orientadas à preservação da vida. Mesmo que soe óbvio: como cientificar previamente o gaslighting ?. É como avisar alguém que será destinatário de um ilícito e que ,pelo simples fato de ter sido avisada, haverá ausência de responsabilidade do obstetra?

É sabido, entretanto, que a responsabilidade do obstetra é uma obrigação de meio. Em outras palavras: acaso não alcance o resultado esperado, somente será responsabilizado na hipótese de negligência, de imperícia ou de imprudência. Trata-se, então, de saber se eventual gaslighting durante o parto é um “fim que justifica o meio”. Não. Não há excludência entre ambos os elementos da pergunta.

O gaslighting gera danos físicos e emocionais tanto para o nascituro quanto para a parturiente e sua extensão, para os dois, não é mensurável. As práticas médicas evoluem, muitas vezes, em ritmo mais acelerado do que os próprios costumes sociais. No caso do gaslitghting, entretanto, seria conveniente que os obstetras que o praticam estivessem em consonância com uma sociedade da terceira década dos anos dois mil.

 

 

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

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